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[L][Maedhros][Fogo]

Maedhros

Whadahell?
FOGO

Quando acordasse, o Diabo estaria em minha frente. Cínico, bizarro, os dentes à mostra, o sobretudo envolvendo sua forma quimérica. Mas o alento da morte bloquearia de imediato minhas emoções mundanas — entre elas o medo — e eu começaria a acompanhar o anfitrião sem esboçar reações.

Seguiríamos por corredores disformes, conduzindo ao nada. No meio do trajeto ele se viraria bruscamente para mim, dizendo: "arrepende-se de algo?". Eu responderia que não sem pestanejar, mas ao mesmo tempo minha mente se recusaria a recolher-se em súplica. Numa lembrança antiga, uma voz sopraria como a brisa da campina. O Diabo nada diria, talvez alheio àquele devaneio, mas meus olhos estariam imersos na visão de Beatriz, que dançava impávida so sussuro do sol. O momento seria fluido e perpétuo, como num sonho lúcido.

Andaríamos mais, e o calor aumentava. Novamente ele se voltaria para mim e repetiria: "arrepende-se de algo?". Dessa vez mais alto e com mais força, seu olhar ávido por me extrair confissões. Beatriz surgiria novamente. Eu a veria na relva, nós dois em meio a beijos, seu vestido branco se manchando de terra úmida. Estaríamos absortos em nosso próprio fogo, que ardia no frio do outono e singrava sob os corpos trêmulos.

Chegaríamos num ponto crítico, onde o corredor desembocaria num saguão bastante parecido com o Inferno que se costuma imaginar. Ali, a dor estaria presente em cada voz, em cada alma torturada, em cada olhar suplicante. Naquele lugar o espírito do mundo se faria louco e negro, intenso em sua própria anarquia.

Novamente ele se voltaria para mim de súbito, mas dessa vez me apontaria com seus dedos carbonizados, de forma acusativa, e usaria a voz em plenos pulmões. "Arrepende-se de algo?".

Nisso ele conseguiria. Tomaria minha mente em suas mãos e escolheria o lampejo de passado que lhe tivesse mais serventia. Nesse momento, o peso se faria insuportável e eu cairia no chão de joelhos, os olhos fitando o chão de ossos à minha frente. Ali estaria Beatriz. Seu sorriso unânime voltado para mim. Suas mãos graciosas em meu rosto podre. Seu coração errôneo.

Sem pensar, eu tomaria seu pescoço e a trucidaria com mãos nuas. Ela se debateria, inutilmente, até o último instante. Seu fogo tornaria-se pânico, depois ódio, e enquanto isso o Diabo se alimentaria de cada gota de seu desespero.

Quando tudo estivesse acabado, eu ergueria a cabeça. Mas o Diabo não estaria mais ali, sádico perante a morte. Estaria me oferecendo a redenção que eu nunca esperara ter a chance de obter. Mas ao mesmo tempo, ainda estaria me observando de algum lugar além de nossos olhos e de nosso próprio fogo, suspirando pelo nosso agouro eterno e infalível.

O pesar agora passara. A lua já estava alta, e banhava nossos corpos na luz lamentosa da manhã. Jazíamos na relva doce da colina, Beatriz e eu. O fogo, ainda entre nós, não se extinguira. E tudo conspirava contra aquele momento puro, inclusive eu mesmo.
 

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