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[L] [Drakon][Baia de Los Tigres]

Lukaz Drakon

Souls. I Eets Them.
[Drakon][Baia de Los Tigres]

Baia de Los Tigres
Parte 1

Dias atuais.

Em um bairro pobre do lado da cidade, apenas uma luz em todo o edifício estava acessa. Edifício, pois aquilo tinha deixado de ser um prédio de apartamentos havia muito tempo. Isso aconteceu mais ou menos na mesma época, com todo o bairro. O motivo, ninguém sabia ao certo. Alguns diziam que se tratava das fábricas, outros, que os bairros estavam como as roupas, entrando e saindo de moda.

A verdade era que em um período de um ano, o bairro tinha perdido todo o glamour e toda a beleza que precisaria para ser um bairro de classe alta. E depois disso, tudo que sobrou foram os prédios, com a sua arquitetura ‘inovadora’ e as antigas casas, quase todas vazias e ocupados por gatos, travessos e brincalhões que muitas vezes serviam de almoço para alguns sem teto.

E era nesse lugar que estava John. Pensativo como sempre, ele havia comprado seu apartamento quando todos estavam se mudando. Na época ele tinha dinheiro, poder e o que mais desejasse, mas o dinheiro tinha acabado, a sua mulher tinha ido embora com um cara que parecia ter 100 anos a mais que ele. Todos poderiam pensar que John ficava horas e horas em casa por isso, mas não era verdade. Ele tinha se sentido aliviado dela ter ido embora, já que ela nunca parava de falar e às vezes ele não conseguia ouvir seu próprio pensamento.

Ele agora estava pensando em seu passado. Na cidade de Los Tigres mais exatamente. Em como conseguiu crescer lá. Tanto pessoalmente quanto financeiramente. Pensava se Los Tigres continuava com todas aquelas pessoas estranhas e aquele clima doido. Ou vice-versa. Pensava se valia à pena voltar para esse mundinho que ele havia abandonado há tanto tempo e pensava como todos iam reagir ao seu possível retorno, caso isso acontecesse. Ninguém gostava muito dele antes de partir, ninguém gostaria de vê-lo voltar.
 
Parte 2

A mesma pergunta batia na cabeça de John durante o dia todo. Desde quando foi caminhar pelas ruas até na hora que não conseguiu se concentrar ao ler um jornal perdido na praça. Voltar? - Ele dizia a si mesmo. – Voltar para que? Para onde? Recomeçar eu posso recomeçar aqui mesmo, não é preciso voltar a lugar nenhum para isso.

E foi com esse pensamento que ele se pegou andando até a estação de trem e olhando os horários e destinos de cada trem. Cada lugar novo, cada bom lugar para se visitar. Quando tinha conseguido seu primeiro salário, tinha prometido a si mesmo que viajaria. Iria para todo canto que sempre quis ir. Infelizmente isso nunca aconteceu, sempre estava preocupado demais com outras coisas. Nunca com destinos, nunca com viagens.

Ficou na estação durante quase toda a estação. Olhando o telhado, feito com telhas de zinco apoiadas em vigas de aço. Quase todas enferrujadas, enegrecidas e comidas pela ferrugem. Aquilo parecia que ia cair em sua cabeça. Olhava para todos os lados, para todos os cantos. Percebia os pássaros cantando nas árvores próximas e no telhado. Percebia as pessoas passando a sua frente, até mesmo a menina que insistia em lhe fazer careta, achando que ele não havia a visto. Olhava para tudo e para todos. Tinha vivido quase uma vida inteira antes de completar 30 anos, e pensava onde recomeçar uma nova. Olhava, inclusive para a placa de preços e destinos, e sempre se lembrava da pergunta. Voltar por que? O que havia deixado lá para que voltasse?

Resolveu então, dar uma chance ao azar. Comprou a maldita passagem e resolveu voltar para casa, para arrumar as malas. Ia aproveitar as três lojas de moveis usados para se desfazer da sua casa e arrumar algum dinheiro. Coisa que muitos já haviam feito naquela região. Vendeu quase tudo. Guardando apenas roupas e objetos pessoais, via tudo saindo pela porta com um misto de felicidade e tristeza. Gostava daquele lugar. Era sua casa, mesmo agora, pobre. Tudo ali era seu, menos o próprio apartamento, que já estava sem água e sem eletricidade a vários dias. Seria questão de tempo até a hipoteca vencer, de novo, e o apartamento ser pedido pela imobiliária. Iria, então, devolve-lo logo. Menos dor de cabeça para eles e para si mesmo.

Depois de tudo vendido e malas prontas. Preparou-se para voltar a estação. Ia pedir um táxi, se achasse um, pois em uma época todos por ali eram seus conhecidos. Época de gastança e orgulho, que ele, por dentro, reprimiu. Havia passado, dificilmente voltaria, e ele sabia que por mais que quisesse, ia ser diferente. Parou o primeiro táxi e entrou. Descobriu, tardiamente, que não era nenhum conhecido seu. O homem, baixo, mas muito forte, tinha voz áspera e profunda. Daquelas de podem facilmente assustar uma criança. Saiu, primeiro vagarosamente, mas somente para dar uma acelerada brusca e correr até a estação. ‘Até parecia que ele mesmo estava perdendo o trem’ pensou John, e riu baixinho, esquecendo de onde estava indo.

Pegou o trem das 4 da tarde, pois queria tentar chegar de dia ainda. Ver os lugares que havia conhecido a muito tempo atrás. Pagou a corrida, e ouviu uma reclamação do taxista por não ter gorjeta, que saiu cantado os pneus. Arrumou suas coisas em um guarda-volume e resolveu tomar um café, aproveitar o tempinho que restava ali. O café tinha um ar de nostálgico, não sabia se era o estilo ou o madeiramento, que estava desbotado e precisando de varias mãos de verniz para esconder todas os defeitos. Na fachada, pode ver o néon escrito ‘Café Fierro’ mas duvidava se ainda funcionava. Nada mais parecia funcionar lá, nem mesmo o sorriso falso da garçonete, que o recebeu depois de quase 10 minutos de espera. Parecia uma boneca de porcelana, toda enfeitada com brincos e pulseiras, daquelas brilhantes e que você compra em qualquer esquina, para fingir que tem jóias. Voltou para dentro tão rápido quanto chegou e logo em seguida trouxe o café.

John tomou e pagou, achando caro. Pegou sua bagagem no guarda-volume e se dirigiu para o trem. Teve que despachar uma delas, pois era grande demais. Nenhum problema – ele pensou – vai estar no mesmo lugar quando eu chegar lá. Entrou e pegou um assento perto da janela. Queria ver a paisagem, sentir o cheiro das montanhas e olhar para o mundo. Depois de alguns minutos, toca o sino, o trem parte. Vai no seu embalo, com o barulho dos trilhos de trilha sonora para uma imensidão verde que se desfraldava a sua frente, conforme o trem ia passando. Depois de cerca de 1 hora de viajem, resolveu perguntar para alguém o tempo da viajem. Resolveu fazer isso para o homem que recolhia os bilhetes.

-Ah, senhor?
-Sim? – respondeu o homem, sem expressão alguma. Sem sorrir, sem olhar nos olhos. Nada.
-Quanto tempo de viajem até Los Tigres?
-Cerca de 4 horas, por que?
-Não costumava ser apenas um?
-Sim, mas isso foi antes da queda do túnel. Parece que decretaram que não dava para reergue-lo. Muitas infiltrações.

John voltou para o assento. As coisas estavam fugindo das suas escolhas. Teria que enfrentar Los Tigres à noite. Mas ele não sentiu medo. Sabia que encontraria um lugar para dormir. O único problema é que esse lugar era o último do mundo onde você gostaria de passar uma noite.
 
Parte 3

John estava tendo um sono tranqüilo, quando foi cutucado pelo bilheteiro. John olhou para ele, esperando que disse-se algo, mas ele apenas se garantiu que John estava acordado. Nesse momento, quase todos já haviam saído do trem.

Do lado de fora, já na estação de Los Tigres, John percebeu que nada mudara, pelo menos não ali. A velha estação feita de tijolinhos a vista e madeira continuava quase a mesma. A única coisa que mudara é que uma pequena parte havia ruído. Como era uma estação muito pequena, limparam os trilhos e amontoaram os destroços por ali mesmo, só colocando uma pequena faixa para indicar que pessoas não deviam andar por ali.

Olhou para a bilheteria, onde uma mulher simpática lhe olhou de volta, com cara de sono. Quando John se aproximou, percebeu que ela não estava com sono, mas sim que seus olhos estavam inchados e vermelhos. Ao fundo, podia-se ouvir uma música que parecia ter sido gravada no inicio da carreira de Tonico e Tinoco.

Ao se aproximar mais, percebeu que os olhos estavam mais vermelhos que esperava, mas era um vermelho diferente daquele de quando aparece quando chora. Decidiu, nesse instante que pararia de pensar nesse tipo de coisa, pois estava em Los Tigres, e isso mais que tudo mostrava como estava realmente lá.

-Boa noite senhorita – disse John – gostaria de saber onde deixam as malas que são despachadas.
-O senhor chegou nesse último trem?
-Bom, a não ser que tenha algum outro lugar para parar aqui e eu não saiba, sim.
-Não, não – ela tentou dar um sorriso forçado, mostrando seus dentes amarelados – é que muitos se queixam de que as malas não chegam e vem reclamar dias depois.
-Ta, entendi. Mas poderia responder a minha pergunta?
-Ahn, claro, poderia me entregar o seu bilhete, por favor?
-Eu acabei de sair do trem. Quando costumo fazer uma viajem de trem, eu entrego o bilhete. – John queria acabar logo com aquilo. Os bancos do trem não são do tipo mais confortáveis do mundo e estava dolorido. Além disso, aquela menina na sua frente, que não parecia ter mais de 18 anos estava o irritando, claramente sem condições de trabalho. Naquele exato momento, quando percebera a pergunta estúpida que fez, ela ruborizou a ponto de combinar com os seus cabelos ruivos claros.
-Claro senhor, ahn, desculpe-me. Não sei o que estou fazendo. Qual o seu nome então?
-John Jonathan.

A menina levantou uma sobrancelha e pensou em muitas piadinhas que poderia fazer com aquele nome. Mas seu trabalho já estava em risco com as constantes reclamações de passageiros que se sentiam enjoados ao sentir o cheiro que vinha da cabine de bilhetes. Tentou ficar calma, mas percebeu, para sua felicidade, que já estava vendo tudo em dobro.

-Ah, droga. – Ela balbuciou. –
-Oi, estava falando comigo? – Retrucou John. –
-Não, não. Ahn, desculpe, pode repetir o seu nome?
-John Jonathan.
-Desculpe a intromissão, mas isso é nome ou sobrenome?
-Tanto faz.
-Tanto faz. Ok.
-Olhe menina, como é o seu nome?
-Marisa.
-E quantos anos você tem?
-18.
-Tudo bem, 18. Encontre a bagagem, por favor, Marisa, é tudo que peço.

Enquanto ela procurava rápido na lista de pessoas o trem partia. John virou-se, com esperança de ver o quanto à cidade havia crescido, já que quando saiu de Los Tigres a estação era o último ponto da cidade. Nada ia além dela. Quando menino, ele a chamava de ‘fronteira’ pois a cidade acabava ali.

-Ahn, senhor. - Marisa a chamava de volta. –
-O que?
-Temos um pequeno problema.
-Pequeno problema. O que você chama de pequeno?
-Bom senhor, parece que a sua mala não embarcou.
-Foi o que pensei, não é pequeno problema, é um problema enorme. Onde ela está?
-Nesse momento, provavelmente na outra estação.
-Tudo bem. - tudo bem uma ova pensou John. Tudo que queria estava na outra mala, teria que se virar com menos da metade das suas coisas. - O que eu faço para recupera-la?
-Temos duas opções. O senhor pode ir lá e buscar, e nesse caso pagamos por toda a viajem, ou podemos trazer ela até aqui para o senhor.
-Então faça isso.
-Ahn, fazer o que senhor?
-Traga a mala aqui oras.
-Sim senhor.
-O Grande Hotel ainda existe?
-Sim senhor, se o senhor quiser eu posso... – Mas antes de Marisa terminar a frase John já estava caminhando calmamente para fora da estação. Para dentro de Los Tigres.

Los Tigres nunca foi uma cidade grande, por isso sempre manteve aquele seu clima do interior. Ela era uma cidade extremamente agradável. Haviam ruas asfaltadas, esgoto, eletricidade, tudo que uma cidade precisa ter. O problema é que ela ficava em um pequeno planalto, o que tornava o acesso muito ruim. Carros demoravam muito, e precisavam de um bom motor para conseguir vencer os 50 quilômetros de subida íngreme. O trem, por outro lado, ia com mais calma, contornando a serra.

John vislumbrou que muito pouco mudara desde a sua partida. As ruas asfaltadas continuam sendo apenas seis. Exatamente o que era necessário para cobrir o centro da cidade. Olhar para aquilo fazia com que John olhasse no tempo, vendo tudo como se tivesse acabado de começar a década de 80, de como tudo estava começando a dar certo para todos. A cidade, com que em um clima noir, ainda mantinha pouca iluminação nas ruas, deixando tudo de um jeito mais obscuro. E enquanto caminhava, John sentia que atrás que algo o seguia. Olhares, pensamentos. A cidade poderia estar vazia, mas era só do seu ponto de vista.

Depois de 5 minutos de caminhada parou a frente de uma construção antiga. Um prédio velho, com pouco mais de quatro andares, com uma grande porta de madeira maciça fechada na frente. No escuro, ele não conseguia distinguir muita bem a cor, mas parecia que o prédio havia sido feito com barro puro. Tonalidades de vermelho fosco mesclavam-se com um marrom escuro, formando um embaralhado de cores e tonalidades impossível de se distinguir. Dentro, poderia-se ouvir uma música tocando calmamente no rádio, como se preguiçosa. John a reconheceu, era touch me, do The Doors, e sabia exatamente quem estava ouvindo aquilo. Pensando nisso, estufou o peito, criou coragem e bateu na porta. Pode ouvir os passos apressados e a uma voz dizendo ‘quem será a essa hora?’. Quando a porta abriu, todas as suspeitas tinham se ido, era exatamente quem pensara.

Do outro lado, estava uma mulher de seus 35 anos, tentando ver quem estava do outro lado da porta, naquele quase escuro que os postes proporcionavam. Foi quando resolveu colocar os óculos que reconheceu e nesse exato momento ficou alarmada.

-Deus! John! É você?!
 

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