Cain
Usuário
"I was never faithful
And I was never one to trust
Borderlining schizo
And guaranteed to cause a fuss"
Placebo, Black Eyed
And I was never one to trust
Borderlining schizo
And guaranteed to cause a fuss"
Placebo, Black Eyed
Border-line ela dissera-lhe. Essas coisas - depressões, neuroses, compulsões - andavam na moda, ele não levou a questão a sério. Nunca imaginou que ela pudesse mesmo se matar, as crises, os benzodiazepínicos e barbitúricos, a arma (herança do avô) dentro da gavetinha do criado-mudo: tudo parecia um excitante charme alternativo, não uma ameaça real. Após três meses de relacionamento, namoro soava muito antiquado, sentia-se mais animado, ela também parecia feliz, então por que diabos encher-se de comprimidos com gim e vomitar toda a cama antes de morrer, sozinha?
Se ao menos ela tivesse, se arrependido, feito como nos filmes americanos, os paramédicos salvariam sua vida sem muita dificuldade, mais algumas sessões infrutíferas de análise e tudo voltaria ao normal: os dois, juntos, felizes. Mas dificilmente a vida era tão promissora quanto Hollywood mostrava.
Deu a volta na cama, segurando o vômito que subia para dialogar com o cheiro do vômito dela, abriu a gaveta do móvel envelhecido, pegou o pequeno revólver e deu dois passos pra trás - o cheiro era quase insuportável. O fato já estava consumado, encostou a arma contra a cabeça, "como Romeu e Julieta" sorriu, irônico, quase lírico.
Entretando, não aperta o gatilho, lança a arma sobre o inerte e frio corpo, pega o casaco e sai.
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Aluno brilhante no colégio, cursou Física e Matemática pura, formou-se como primeiro da turma em ambas; pós-graduação, mestrado e doutorado baseados na teoria da unificação dos campos. Tinha muito potencial - todos diziam - e almejava descobrir a verdade a respeito da natureza sub-atômica. Vinte longos anos de estudo passaram-se até deparar-se com uma nova verdade, acreditando (ele e todo resto) ter descoberto a verdadeira explicação para a mecânica das partículas, morreu tão infeliz quanto qualquer homem: saber mais não fez a menor diferença.
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le rêve ou em busca do sono perdido
Acordara, não conseguia recordar qual a última vez que sonhara antes dessa noite, podia muito bem não ter sonhado até hoje. Sobre seu peito pesava uma sensação de iluminação desconfortante, decorrente do sonho - agora já esvanecido - no qual havia conhecido a Verdade. Esforçou-se então para encontrar as imagens oníricas perdidas em sua mente. Conforme passavam os minutos, mais claramente percebia tudo que revelara-se como um tesouro perdido.
A excitação presente transformou-se em ansiedade, o suor escorria por seu corpo. Em um impulso entendeu o que deveria fazer, lançar-se à última tentativa! Ergueu o corpo já molhado da cama, enclinou-se e passou a tatear nervosamente o chão sob a cama... Enfim achou o que procurava: o revólver nunca antes usado pesava na palma de sua mão, abriu o tambor e sorriu de alegria ao avistar que as seis balas ainda estavam ali.
Encontrava-se totalmente relaxado, posicionou o cano contra a têmpora direita e, sem respirar fundo, apertou o gatilho em busca do sono perdido.
Pedro Schuch Schulz