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Jornalista vive um ano seguindo preceitos bíblicos de forma literal

Morfindel Werwulf Rúnarmo

Geofísico entende de terremoto
Embora judeu, A.J. Jacobs se considera agnóstico, ou seja, não segue realmente uma religião. Porém, durante um ano, seguiu todas as regras da Bíblia em busca de uma resposta para a pergunta: Deus existe?

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A Bíblia continua sendo o livro mais vendido do mundo e um dos mais antigos. Porém, poucos a leem e seguem seus ensinamentos ao pé da letra. Até porque muito do que a Bíblia instrui está dentro de um contexto específico, cultural, ou para determinado tempo, pessoa ou povo.

Como pontua o missionário cristão Pedro Paulo Coulibaly Brito, a Bíblia ensina princípios e valores que devem nortear a vida diante dos propósitos de Deus para seu povo, sendo assim, necessário buscar o entendimento desses propósitos. “Por exemplo, na época da inflação altíssima no Brasil, deveríamos estocar o máximo de alimentos possível porque poderia haver falta de algum produto depois ou o preço aumentar. Mas por que estocar alimentos hoje? Não faz sentido.”

Porém, algumas religiões, sobretudo as judaicas –– que não adotam o Novo Testamento ––, interpretam a Bíblia de modo literal e seguem ainda grande parte de seus ensinamentos. Mas, seguindo de modo literal ou não, geralmente quem lê a Bíblia acredita nela, logo, crê na existência de Deus, certo? Não exatamente. Um jornalista americano resolveu viver um ano sob todos os mandamentos bíblicos.

Arnold Stephen Jacobs, conhecido como A.J. Jacobs, escreve para a “Esquire”, revista voltada para o público masculino. Além disso, é escritor. Embora, seja judeu, Jacobs cresceu em uma família extremamente secularizada de Nova York. Logo, costumava pensar em seu judaísmo como não sendo uma grande coisa. Não frequentou nenhuma escola de hebraico nem comeu matzá –– pão sem fermento –– e o mais perto que sua família chegou perto do judaísmo foi colocar uma estrela de Davi no topo da árvore de Natal.

Durante longo tempo, Jacobs pensou na religião como algo arriscado para o mundo moderno, com um potencial de abuso por demais elevado. E acabou chegando à conclusão de que ela “desapareceria com o passar do tempo, do mesmo modo que outras coisas arcaicas também sumiram. A ciência estava a caminho”. Segundo ele, “algum dia iríamos todos viver num paraíso neoiluminista, onde todas as decisões seriam tomadas com base numa lógica cartesiana, à moda do sr. Spock, de Jornada nas estrelas”.

Porém, como se reconhecesse certa visão equivocada, Jacobs começou a querer explorar a religião, além de deixar algum ensinamento acerca do assunto para seu filho de 2 anos, Jasper. Mas não sabia como. Encontrou inspiração em seu ex-tio Gil, um homem nos padrões de poder ser chamado o mais religioso do mundo. Iniciou sua vida como judeu, se tornou hindu, se autodenominou guru –– época em que se sentou durante oito meses num banco de parque em Manhattan sem pronunciar uma única palavra, antes de se converter em cristão renascido.

Em algum momento dessa jornada espiritual, Gil decidiu interpretar a Bíblia ao pé da letra. De forma totalmente literal. “A Bíblia diz para se prender dinheiro à mão (Deuteronômio 14: 25), por isso ele sacou 300 dólares do banco e amarrou as notas à palma de sua mão com uma linha”. Ações desse tipo. Por isso, Jacobs decidiu seguir o plano. Porém, de forma mais abrangente. Os motivos, segundo ele: escrever o livro; adquirir um “visto” para o mundo espiritual do qual se mantinha distante; preencher um vazio em seu coração.

A primeira providência foi achar Bíblias, além de materiais sobre o tema e lê-los todos. Depois, começar a seguir as leis impostas ao povo de Deus, independentemente das diferenças culturais e temporais entre os escritos e os dias atuais. O primeiro deles: deixar barba e cabelo crescerem, seguindo o mandamento bíblico de não tocar nos pelos. Ao fim do ano, a barba de Jacobs já estaria ultrapassando os 15 centímetros.

“Eis aqui o meu plano: na faculdade aprendi sobre a teoria da dissonância cognitiva. Ela diz, em parte, que se nos comportarmos de certa maneira, nossas crenças irão por fim se alterar a fim de se conformarem com o nosso comportamento. Portanto, é isso o que estou tentando fazer. Se agir como alguém que é fiel a Deus e O ama durante vários meses, então eu me tornarei fiel a Deus e O amarei. Se orar todos os dias, então talvez eu passe a crer no Ser a quem estou dirigindo minhas orações”.

Veja a cena: Jacobs, de pé em sua sala de estar com as mãos apontadas para cima como se fosse uma antena santa em busca de captar o sinal divino, recita “a seguinte passagem de Jó: ‘Nu saí do ventre de minha mãe e nu voltarei; o Senhor o deu, e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor!’. É uma linda passagem, entretanto sinto-me um tanto estranho ao pronunciá-la. É raro que eu diga a palavra senhor, a não ser quando seguido por dos anéis. Não costumo pronunciar a palavra Deus sem que venha precedida de ‘Ó meu!’”

E assim como essa, várias e engraçadas foram as histórias de Jacobs em busca de seu objetivo, o que resultou no livro: “Um ano bíblico”. Nesta matéria são narradas algumas dessas histórias.

O foco principal de Jacobs, até pelo fato de ser judeu, foi dado ao Antigo Testamento, onde também está a maior parte das leis concedidas ao povo hebreu. Na primeira semana, ele deu atenção aos seguintes versículos:

1° dia: “Tema a Deus e obedeça aos seus mandamentos, porque esse é o dever de todo homem” (Eclesiastes 12:13)
2° dia: “Crescei e multiplicai-vos” (Gênesis 1:28)
3° e 4° dias: “Não terás outros deuses diante de mim” (Êxodo 20:3)
5° dia: “Nem usarás roupa de dois estofos misturados” (Levítico 19:19)
6° dia: “Não cobiçarás” (Êxodo 20:17)
7° dia: “Por sete dias, vos alegrareis perante o Senhor, vosso Deus” (Levítico 23:40)

Como pode se ver, o livro é narrado em formato de Diário, o que dá um aspecto interessante à narração e concede ao leitor a oportunidade de saber exatamente quando os fatos ocorreram. Porém, também torna a leitura mais cansativa, principalmente quando se sabe quantos dias ainda faltam para acompanhar.

Grande parte das histórias envolve sua família e também caracteriza uma exposição de sua esposa Julie e seu filho Jasper. Por exemplo, ao leitor mais atento de posse das informações dadas por Jacob, é possível calcular exatamente quando sua esposa está em seu ciclo de menstruação. Além dos hábitos de seu filho. O ano bíblico de Jacobs ocorreu entre setembro de 2005 e setembro de 2006.

Situação espiritual

Como já dito, um dos objetivos de Jacobs ao encarar tal experiência foi descobrir a existência da Deus. Assim, há também uma busca por certa mudança espiritual. Durante o andamento do livro, o escritor vai fazendo algumas pontuações acerca de sua situação espiritual, ao que ele chama “atualização”. Ele já começa seus relatos falando a respeito disso, como já vimos, mas separei os trechos que demonstram a evolução de seu estado de espírito ao longo do livro:

“30º dia. […] a palavra que me vem à mente é desconectado. Já estou desempenhando o papel de um Homem Bíblia há um mês, no entanto é exatamente assim que me sinto: desempenhando um papel. Um personagem. […] Este meu alter ego é um ser tão distinto que decidi passar a chamá-lo por um nome diferente. Jacó.”

“36º dia. Uma atualização espiritual: continuo sendo agnóstico. Sinto-me um pouco mais confortável pronunciando a palavra Deus –– graças à pura repetição, isso já me não faz mais suar. No entanto, a ansiedade foi substituída pela frustação. E, para ser franco, pelo enfado”.

“70º dia. Vários de maus amigos estão esperando que eu fale como uma versão ambulante da Bíblia King James. Eles querem que eu –– ou ao menos o meu alter ego Jacó –– pronuncie palavras e expressões como ‘vós’, ‘Ai de vós’ e ‘Todo aquele que…’. […] Eu procuro participar do jogo da melhor forma possível. Entretanto, isso não é uma das maiores prioridades em minha lista.
[…] Não, falar de acordo com a Bíblia requer uma mudança muito mais radical do que elevar em algum grau o nível de meus discursos. Requer, antes, uma mudança completa do conteúdo de minhas conversas, tais como: não mentir, não reclamar e não fazer fofocas”.

“84° dia. Tenho procurado amar o meu próximo. Contudo, em Nova York, isso é particularmente difícil. Esta é uma cidade indiferente e reservada. Eu nem mesmo sei o nome de meus vizinhos, quanto mais amá-los”.

“169° dia. Dei um passo atrás, de novo, em termos espirituais. Minha fé anda frágil. Pequenas coisas me fizeram retornar a um agnosticismo puro. […] Se minha espiritualidade pudesse ser avaliada por números como os do índice Nasdaq, a tendência geral seria até aqui a de uma elevação gradual, contudo com muitas baixas e, neste instante, eu estou numa das grandes. Isso está me deixando preguiçoso. […] Continuo orando várias vezes ao dia, mas, quando oro, pronuncio as palavras com a mesma emoção de quando faço um pedido numa lanchonete. Sempre me vem à mente o versículo de Isaías em que ele bate contra os israelitas hipócritas”.

“238º dia. Uma atualização espiritual: estou enrolado. Minha fé em Deus muda a toda hora. Passo por três fases, distribuídas de forma equilibrada ao longo do dia. Enquanto digito estas palavras, estou na fase dois. No entanto, isso pode mudar quando eu estiver terminando o parágrafo seguinte. Primeiro, há a velha e confortável posição: o agnosticismo. Ainda não apaguei isso totalmente, e ele ressurge principalmente quando leio sobre extremismo religioso. A segunda fase tem tudo a ver com a recém-descoberta reverência pela vida. A vida não é apenas uma série de reações moleculares. Existe uma centelha divina dentro dela.

O termo oficial é ‘vitalismo’. Sempre pensei no vitalismo como uma relíquia do século XIX –– na mesma categoria em que se enquadram as sanguessugas e a frenologia. Mas agora sou crente. Pelo menos às vezes. A terceira fase, o nível mais elevado, é quando acredito em algo mais específico, num Deus que se importa, que presta atenção à minha vida, que ama. Por que não existiria um Deus? Faz tanto sentido existir um Deus quando não existir um. De outro modo, a própria existência seria fortuita demais”.

“324º dia. Não sei o que está acontecendo comigo. Meu amigo Paul me enviou um vídeo do YouTube por e-mail. Eu o abri. O vídeo exibia uma repórter de noticiário de TV lendo algumas notícias sobre o mercado acionário quando de repente uma enorme luminária despenca e a acerta na cabeça. Ela cai da cadeira e some de vista. Todos os comentários de pessoas que assistiram ao vídeo diziam que aquilo era engraçadíssimo. Mas eu não entendi a graça. Parecia algo muito triste. Passei vinte minutos no Google tentando descobrir o nome da pobre repórter para lhe enviar uma mensagem desejando que melhorasse logo ou que ganhasse a ação na justiça por uma indenização. Não consegui encontrá-la. O que está acontecendo comigo?”

“378º dia. Falta apenas um dia para terminar. […] A Bíblia me fez ser uma pessoa melhor? É difícil afirmar, mas eu espero que sim. Ao menos um pouco. […] Será que creio no Deus tradicional da Bíblia? Bem, não no mesmo sentido em que os antigos israelitas acreditavam. Eu jamais poderia chegar ao ponto de aceitar um Deus que arregaça suas mangas e interfere em nossas vidas como um romancista faz com suas personagens. Eu continuo sendo agnóstico. Mas agora sou um agnóstico reverente. O que não é uma contradição, juro a você. Agora acredito que, havendo ou não um Deus, existe o sagrado. A vida é sagrada. […] É possível que os próprios seres humanos tenham criado essa sacralidade, mas isso não diminui seu poder ou importância”.

“Não tocar mulheres nos dias de sua menstruação”

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Representação da mulher com fluxo de sangue cuja história é narrada em Lucas 8
“Caso esteja se perguntando, Julie entrou no período de menstruação ontem –– o que são más notícias em dois sentidos. Primeiro, significa que nossos esforços de crescer e multiplicar falharam mais uma vez. Segundo, isso eleva a busca de se viver segundo a Bíblia a um novo e completo nível de embaraço.

A Bíblia hebraica desestimula os fiéis a tocar uma mulher durante uma semana após o início de sua menstruação. Até o momento neste meu ano, seguir esta regra foi apenas algo levemente desconfortável, nada pior do que isso. Na realidade, tem o seu lado bom: ela combina muito bem com o meu eterno transtorno obsessivo-compulsivo e com a minha germofobia, e por isso acabou se tornando uma brilhante e conveniente desculpa para que eu evitasse tocar em 51% da população humana.

Quando uma amiga minha se aproximar para me beijar no rosto, eu desvio minha cabeça do caminho como um boxeador numa luta. Uma colega tenta apertar minha mão para me cumprimentar e eu recuo por motivo de segurança.

–– Sinto muito, isso não é permitido.
–– Ah, sim. Está bem.

Em geral, para por aí. Em geral, mas não sempre. Veja só está conversa que tive com uma amiga australiana de Julie, Rachel, com quem nos encontramos no Central Park na semana passada.

–– Não tem permissão para isso? O que você quer dizer?
–– Bem, você pode estar… impura.
–– Que negócio é esse de ‘impura’?
–– Você sabe. No seu ciclo.

Fiz uma pausa. Ela me olhava perplexa. Decidi, então, que era uma boa hora para evitar o contato no olho e olhar para o chão.

–– Ah, você quer dizer que eu posso estar menstruada? Não se preocupe, eu fiquei menstruada semana passada.

Instante no qual ela me abraçou. Não tinha como fugir.

Estranhamente, Rachel não está sozinha nisso. Uma pequena parcela das amigas de Julie, que me deixaram surpreso com sua franqueza, deram-me informações detalhadas, voluntariamente, sobre seus ciclos biológicos. A editora de fotografia da Esquire chegou a ponto de me enviar um e-mail com seu cronograma. E ainda perguntou se eu também não o queria numa planilha de Excel.

Julie […], porém, não está se sentindo nem um pouco lisonjeada. Ela considera todo esse ritual uma ofensa. […] Eu também não estou gostando. […] É preciso estar sempre em alerta –– sem sexo, é claro, mas também sem dar as mãos, sem tocar nos ombros, sem bagunçar os cabelos, sem dar beijo de boa-noite. Quando lhe dou as chaves do apartamento, deixo-as cair em sua mão de uma altura segura de 15 cm.

[…] Quanto a não deitar numa cama impura, dessa estou livre. Julie e eu não compartilhamos a mesma cama. Aparentemente, quando durmo, fico me remexendo como um marlim depois de fisgado e lançado à praia. Por isso, Julie optou por duas camas de solteiro lado a lado."

Uma experiência completamente diferente: o Novo Testamento

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Uma das várias representações de Jesus, o Deus cristão no qual os judeus não acreditam
Jacobs seguiu seu planejamento e entrou na ambientação do Novo Testamento logo no início do mês de maio –– o nono mês. E começou com o primeiro versículo do livro de João: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”. Na verdade, essa foi uma experiência completamente nova para Jacobs. Afinal, ele é judeu.

Eis o relato do início de sua aventura pelo Livro Cristão: “243º dia. Hoje é o primeiro dia de minha vida segundo o Novo Testamento. Estou tão nervoso quanto fiquei no início dessa experiência, mais nervoso até do que no próprio primeiro dia, mais ainda do que quando telefonei para o Guru Gil. Por um lado, mal posso esperar para mergulhar nisso de cabeça. Deverá ser um aprendizado intenso. Antes desse ano, eu sabia apenas o básico sobre o Novo Testamento e o cristianismo. […] No entanto, quero obter um conhecimento mais profundo, e isso será bom para mim. Além disso, parecer ser o momento adequado para isso. É difícil discutir com o fato de que hoje o Novo Testamento exerce mais influência nos Estados Unidos do que o Antigo. Ou, para ser mais preciso, a interpretação cristã literal da Bíblia exerce mais influência do que o método exegético judaico. Não engulo essa de que estamos à beira de uma teocracia, mas com certeza o cristianismo evangélico produz um impacto enorme em nossas vidas. Por outro lado, estou enlouquecido. Já me sentia oprimido pela complexidade de minha própria tradição e agora vou me aventurar em terreno ainda mais estranho. Contei a Julie que estava com dor de cabeça por causa do estresse.

–– Você não tem que fazer isso, sabia? –– disse ele.
–– Se não fizer, estarei contando só metade da história –– respondi.
–– Mas é uma metade bem importante.

“Verdade. Mas […] eu vou entrar na água e ver o que acontece. E antes de fazer isso preciso enfrentar uma série de questões importantes. A primeira dessas questões é a seguinte: se vou mudar o meu foco de atenção para o Novo Testamento, será que devo continuar seguindo todas as regras da Bíblia hebraica? Em outras palavras, devo manter a barba e as franjas? […] A maioria [dos cristãos] parece dizer: Você precisa aceitar Jesus, mas não precisa fazer a barba. O que é um alívio. Quero manter minha barba. Não estou preparado para abrir mão de meus rituais. Isso seria como se eu corresse apenas 30 km de uma maratona. Portanto, a não ser que exista alguma contradição nas leis –– por exemplo, a interpretação literal de olho por olho contradiz a interpretação literal de oferecer a outra face ––, eu seguirei tanto o Antigo quanto o Novo.

Minha próxima grande questão é esta: sendo um judeu, como lido com a questão da divindade de Cristo? Para ter um experiência literal legítima do Novo Testamento eu deveria aceitar Jesus como Senhor. Mas simplesmente não consigo. Li o Novo Testamento diversas vezes e embora eu pense em Jesus como um grande homem, não saí da experiência aceitando-o como o Salvador. Ainda não tive o meu momento ‘estrada para Damasco’”.

Jacobs não especifica a referência que faz no final, mas “estrada para Damasco” diz respeito à história de conversão do apóstolo Paulo. Antes, quando ainda era chamado Saulo, ele perseguia cristão, prendendo-os e matando-os. Contudo, a caminho da cidade síria de Damasco, Saulo vê uma imensa luz que o cega. Escuta a voz de Deus e acaba se convertendo e se tornando um dos principais nomes do Novo Testamento e, talvez, o maior apóstolo cristão.

A relação de Jacobs com essa parte da Bíblia é algo interessante e a partir da página 288 –– quando começa a narração dos fatos ocorridos no nono mês –– o livro acaba ficando mais leve, pois não há tanto rigor no cumprimento das regras. Isso acontece devido à concepção de que a morte de Jesus de certa forma anulou grande parte das outras regras seguidas ao pé da letra no Antigo Testamento, como o sacrifício de animais para remissão dos pecados.

E, como acontece por todo o livro, as maiores influências do aprendizado de Jacobs foram sentidas por sua família. Duas situações em particular marcam essa fase: a primeira em relação à sua esposa, Julie. Acontece que ele mantinha em seu palmtop um arquivo a respeito de todas as falhas dela para, em discussões futuras, poder relembrar e dizer como forma de argumento. Contudo, depois de ler 1 Coríntios 13, em que fala sobre o amor ser paciente, bondoso e de que não guarda rancor, Jacobs resolve contar a ela sobre o arquivo e depois destruí-lo.

“–– Você não está zangada?
–– Como poderia ficar zangada? –– responde ela. –– É de dar pena que você precise disso.
–– Bem, estou com dificuldade para me lembrar das coisas ultimamente.”

A outra fica por conta de Jasper. Ele é um garoto, pelo que se apresenta no livro, mimado. Certo dia, Jacobs vai pegá-lo no berço e acaba levando uma pancada no rosto dada pelo próprio filho. Ele, depois de relutar, dá a outra face, assim como Jesus. Mas depois o adverte a pedir desculpas. Algo novo para Jasper, que emburra e não obedece. A briga dos dois dura muito tempo, até que, vencido pelo cansaço, Jasper se desculpa. Uma vitória para Jacobs.

“Devo apedrejar os adúlteros”

“As escrituras hebraicas prescrevem uma quantidade imensa de penas capitais. Pensa na Arábia Saudita, multiplique pelo Texas e a seguir triplique. Não era apenas por assassinato. Você também poderia ser executado por adultério, por blasfêmia, por desrespeitar o sábado judaico, por perjúrio, por incesto, por bestialidade e feitiçaria, entre outros. Um filho rebelde poderia ser condenado à morte. Como também poderia um filho bêbado ou glutão recorrente.

O método de punição mais comum mencionado na Bíblia hebraica é o do apedrejamento. Portanto, concluo que no mínimo eu deveria tentar apedrejar alguém. Mas como?

Não poderia lhe dizer quantas pessoas já me sugeriram que eu usasse pedras de crack e deixasse adúlteros e blasfemadores drogados. O que não deixa de ser uma ideia interessante. No entanto, eu não uso drogas desde os tempos em que estudava na Brown University, quando escrevi um ensaio para minha aula de antropologia sobre o simbolismo oculto em se fumar maconha num bong, uma espécie de narguilé. (A Brown era um tipo de universidade onde um ensaio deste tipo conseguia de fato obter uma nota bem alta.)

Em vez de fazer isso, cheguei à conclusão de qual seria a minha saída: a Bíblia não especifica o tamanho das pedras, portanto eu usaria pedrinhas minúsculas.

Há alguns dias, recolhi um punhado de pedrinhas brancas do Central Park, que amontoei nos bolsos de trás das minhas calças. Agora, só me faltavam algumas vítimas. […] Estava descansando num parquinho público no Upper West Side, do tipo em que se encontra aposentados sentados nos bancos comendo sanduíches de atum.

–– Ei, você está vestido de um jeito esquisito.

Eu me volto para olhar. O interlocutor é um senhor na casa dos setenta, eu diria. Ele é alto e magro e está usando um daqueles quepes que motoristas de táxi costumavam usar nos filmes dos anos 1940.

–– Você está vestido muito estranho. Por que está vestido assim?

Eu estou usando minhas borlas recobertas de franjas e, já há um bom tempo, vestindo sandálias e carregando uma bengala feita de um galho de bordo cheio de nós que comprei por 25 dólares na internet.

–– Estou tentando viver segundo os mandamentos da Bíblia. Os Dez Mandamentos, apedrejar os adúlteros…
–– Você está apedrejando os adúlteros?
–– É, estou apedrejando os adúlteros.
–– Eu sou um adúltero.
–– Você é um adúltero atualmente?
–– Sou. Hoje à noite, amanhã, ontem, duas semanas atrás. Você vai me apedrejar?
–– Se for possível, sim, isso seria ótimo.
–– Eu lhe dou um soco na cara. Mando você para o cemitério.

Ele estava sério. Aquele não era um amável velhinho irritado. Era um velho totalmente irado. Era um homem com setenta anos de hostilidade sobre suas costas.

Eu retiro minhas pedrinhas do bolso traseiro.

–– Eu não iria apedrejá-lo com pedras grandes. Só com essas pequeninas.

Então, eu abro a palma da mão para lhe mostrar as pedrinhas. Ele dá um rápido bote, apanha uma e em seguida a atira contra o meu rosto. Ela passa zunindo.

Eu fico paralisado por alguns segundos. Não esperava que aquele senhor de cabelos brancos tomasse a dianteira. Agora, contudo, não havia mais nada que me impedisse de retaliar. Olho por olho!

Eu apanho uma das pedrinhas que restaram e a lanço contra seu peito, e ela ricocheteia.

–– Vou lhe dar um soco bem na boca –– diz ele.
–– Bem, você realmente não devia cometer adultério –– respondo.

Ficamos encarando um ao outro. Meu pulso disparou.

Nossa disputa de quem encarava mais durou uns dez segundos, e então ele vai embora esbarrando em mim ao passar."

"Vou construir uma cabana dentro de casa"

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Cabana construída pelos hebreus no deserto. Baseado em uma assim, Jacobs tentou reproduzir a sua
“A Bíblia apresenta instruções específicas sobre como construir a Arca de Noé –– 300 por 50 por 30 cúbitos, com um teto e três andares de madeira de cipreste. Por sorte, eu estou isento de ambos esses projetos. […] Entretanto, a Bíblia me ordena que construa algo mais: uma cabana. Uma vez por ano, devemos edificar uma cabana e habitar nela durante uma semana, para relembrar as que foram construídas pelos antigos hebreus quando vagaram pelo deserto durante quarenta anos. […] Falando com franqueza, a ideia de construir uma grande estrutura tridimensional me deixa preocupado. Não sou um cara habilidoso. […] Procuro me consolar dizendo a mim mesmo que a cabana será uma excelente mudança de todos os mandamentos negativos, os ‘Não farás’. Aqui temos um claro ‘Farás’. Por isso, mergulho de cabeça no projeto e me vejo às voltas com a primeira questão: onde instalar minha cabana? A laje no topo do prédio parece ser uma opção lógica. Assim, telefono para o síndico do condomínio explico meu plano.

–– Não posso deixar que faça isso –– diz ele. –– É uma questão de responsabilidade civil.
–– E o que me diz do pátio?
–– O pátio só tem acesso por um apartamento.
–– Que apartamento?
–– Isso não vai dar certo. Você não pode construir uma cabana no pátio.

Portanto, prossigo com meu plano reserva: construir uma cabana em nossa sala de estar. Isso não é o ideal por duas razões. A primeira delas é ser uma cabana em nossa sala de estar. A segunda razão é que minha cabana –– chamada sukkah em hebraico –– não passaria na inspeção nem mesmo do rabino mais negligente e maria vai com as outras dos Estados Unidos. Os rabinos afirmam que as cabanas devem ser construídas ao ar livre e em conformidade com dezenas de outras regras.

–– Não seria mais fácil simplesmente usar a cabana do terraço do centro comunitário judaico? –– pergunta Julie.
–– Talvez –– respondo. –– Eu, no entanto, teria a sensação de estar trapaceando.

Explico a Julie que estou numa missão solitária para encontrar a essência da Bíblia. Sou um aventureiro solitário. Tenho que traçar o meu próprio caminho.

–– Muito bem, mas soa como se você estivesse gerando trabalho para si mesmo.

[…] Às 11h da manhã, começo a pregar as vigas mestras, segurando pregos na boca e suando muito mais. Três horas depois, graças à planta de um projeto que baixei da internet, feito para pessoas simplórias como eu, de fato tenho um esqueleto de uma legítima cabana. Que prontamente tomba como num filme de Buster Keaton e se desmonta ao bater contra a parede. Reinicio o processo de montagem, dessa vez acrescentando escoras extras, e por fim a estrutura permanece de pé.

— Ó, meu Deus! — exclama Julie ao chegar em casa.

Pergunto-lhe se aquilo a incomoda.

— Um pouco. Mas estou mais atônita ainda por você ter conseguido construir alguma coisa. Ela é enorme!

Julie inspeciona minha cabana. Ela possui quatro vigas de madeira recobertas por uma grande lona branca que está quase roçando em nosso teto. O interior é simples, porém decorado com ramos de árvores frondosas e de salgueiros. Julie se espreme entre a cabana e o aquecedor a fim de obter uma nova perspectiva. Ela avista os blocos de cinza e cimento e os examina para certificar-se de que não arranharam o piso.”

Fonte

Esse livro foi publicado em 2007, mas achei que aqui era o melhor lugar. Ou talvez devesse ter postado na parte de Literatura?
 
Lembro de ter lido uma matéria sobre esse cara na revista Superinteressante há algum tempo. Não deixa de ser interessante o modo com que ele tenta viver do modo descrito pela Bíblia, apesar de encontrar coisas absurdas (não sei nem como ele não falou de escravos). No fim a maioria dos cristão acaba por seguir só as partes que lhes convêm.
 
–– Sou. Hoje à noite, amanhã, ontem, duas semanas atrás. Você vai me apedrejar?

Véio çafadooooooooooooo!!

De qqr forma ia morrer todo mundo lá no karatê (menos a Lynn q nunca traiu e mais uns poucos, rç). O resto? Tem um q leva a esposa em uns eventos e a amante em outros.

Eu acho um absurdo... por incrivel q pareça nisso ainda sou "conservadora", adultério e traição não tem perdão pra mim. Mas matar o home já são outros 500... e se a esposa dele sabe e não faz nada... fazer oq!
 

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