Um oceano de Linux em Sinbad
Por Michelle Delio
05:20 PM Jul. 01, 2003 PT
Há mil anos, as aventuras do marujo Sinbad já faziam sucesso. Agora, o antigo herói ganha vida nova com a ajuda do Linux. Sinbad - A Lenda dos Sete Mares, o novo longa de animação da DreamWorks que estréia esta semana nos Estados Unidos, é a primeira produção hollywoodiana a ser criada inteiramente com esse sistema operacional. Mais de 250 estações de trabalho HP rodando Red Hat Linux são o núcleo da plataforma gráfica da DreamWorks.
A animação de Sinbad provou ser um teste exigente para o sistema livre. Segundo os animadores, quando o projeto começou, há quatro anos, as tecnologias necessárias para pôr em prática as idéias da equipe de produção ainda não existiam. Começar o trabalho foi um exercício de fé: os animadores começaram na esperança de que, quando chegasse a hora de fazer as cenas mais difíceis, a tecnologia de que precisavam já estaria disponível.
Os maiores problemas enfrentados pelos animadores eram as mulheres e o oceano. O filme possui inúmeras cenas ambientadas no mar. Os movimentos da água estão entre as coisas mais difíceis de serem animadas de forma realista. Os modelos matemáticos necessários para garantir que as ondas, marolas e respingos tenham um aspecto convincente e interajam da forma que as platéias esperam são um verdadeiro desafio computacional, afirma Skottie Miller, engenheiro da DreamWorks.
Mike Balma, estrategista comercial de Linux da HP, disse que a empresa trabalhou com o departamento de efeitos da DreamWorks para desenvolver um meio de apressar a produção das cenas envolvendo água. Se tivessem sido feitos pelo método tradicional, segmento por segmento, os oceanos do filme teriam prolongado em anos o seu tempo de produção.
Eles apresentaram uma solução inovadora: em vez de compor o oceano quadro a quadro, seria mais eficiente simplesmente renderizar um oceano inteiro e deixar que se movesse sozinho. Uma vez pronto esse cenário virtual, os animadores poderiam captar os segmentos necessários para cada cena, com os ângulos que melhor atendessem aos seus propósitos, acrescentando os elementos de paisagem necessários para cada trecho.
"Quem curte animação vai adorar as simulações de água", disse Miller. "O mesmo vale para os navios. Sinbad e sua tripulação passam boa parte do filme a bordo do Quimera. Os modelos do navio são incrivelmente detalhados. Usamos 20 mil texturas para obter o visual perfeito".
As sereias, criaturas que atraem os marujos contra ilhas rochosas, são os personagens mais perigosos enfrentados por Sinbad - e também as mais difíceis de animar. A equipe da DreamWorks estudou movimentos de ginástica, balé e dança moderna e analisou horas de filmagens submarinas para compor os movimentos suaves que estas "mulheres de água" poderiam fazer.
Mas as sereias ainda pareciam bonecas de plástico até que o departamento de efeitos acrescentou às cenas um sistema de partículas - uma técnica que cria automaticamente milhares de pequenos pontos de imagem capazes de interagir entre si, cada um com suas próprias características de luz e sombra - criando as cortinas d'água de aspecto natural que dão a esses seres sua aparência líquida.
O cabelo das sereias foi, também, um desafio. Cada uma delas tinha dezesseis mechas de cabelo, cada uma com, no mínimo, sete controles usados pelos animadores para manipular sua forma. Fazer com que uma dessas mechas se movesse do jeito certo era difícil, mas fazer com que todas ganhassem o movimento correto foi um verdadeiro teste de tecnologia e paciência. Os animadores admitem que, em vários momentos durante a produção, suas sedutoras sereias se pareciam mais com medusas monstruosas do que com qualquer outra coisa.
Muitos dos personagens de Sinbad foram desenhados a mão e depois integrados ao cenário, criado por computador. Para isso, a DreamWorks usou um programa chamado Toon Shooter, com o qual é possível escanear desenhos e incorporá-los sem falhas aos gráficos digitais. "Era importante encontrar um meio de incorporar estes personagens sem perder as qualidades mágicas criadas pelos animadores", diz Balma, da HP. "O Toon Shooter é uma forma totalmente automática de recolher estas imagens e colocá-las em cenas tridimensionais".
A DreamWorks usava o Unix em seus computadores, mas mudou para o Linux há alguns anos por acreditar que o sistema é o futuro da animação, conta Miller. "O Linux oferece uma forma econômica de colocar os computadores mais rápidos do mercado diante de nossos animadores", ressalta.
A DreamWorks usou servidores Linux para criar imagens detalhadas a partir de contornos simples em Shrek, seu longa metragem premiado com o Oscar. Com Sinbad, a maioria dos 250 animadores trabalhou diretamente com o Linux, usando estações de trabalho com processamento 3D acelerado e dois monitores da HP. "Ouve-se muito a respeito do Linux não estar pronto para funcionar em máquinas desktop", disse Jeff Wood, diretor de marketing de produtos para estações pessoais da HP. "Bem, este é um exemplo de que o Linux está mais do que pronto: centenas de animadores usaram o sistema para produzir um filme diretamente a partir de suas máquinas".