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Fracasso

Vail Martins

Usuário
Daqui eu observo. Aqui eu estou, e não estou.
Sou o mesmo que, não te influencia, mas aconselha. Ainda assim não a sua vontade, não a sua mente, mas aquela centelha eterna, sua alma imortal, que foi expirada por nosso pai junto com todas as outras naquele momento antigo, naquele dia de luz.
Não posso fazer muita coisa, não diretamente, não decisivamente. Por que aqui estou, mas ainda assim não estou.
Você foi dormir mais cedo para esquecer a fome, eu acalentei um sono rápido, com sonhos tranqüilos numa terra feliz, rezei para que a noite perdurasse; e quando acordou, sentindo novamente a fome te tomar por inteiro e te enfraquecer no mesmo momento em que abriu os olhos, eu chorei. Pois não pude fazer nada.
Quando chorou, achando-se infeliz, por que este mundo aparentemente não teria lugar para você, não um digno, eu te disse que foi um dos escolhidos para nutrirem uma alma forte. E sua vida neste mundo iria te propiciar isto, infelizmente. Pena que você não me escuta, pena que você não pode me escutar.
Hoje de manhã, andava ao seu lado enquanto caminhava, os olhos frios e a expressão dura, e achei estranho.
O vendo aqui de cima, é mais um ponto brilhante como todas as outras pessoas, cada uma delas com um meu igual a acompanhá-la. Mas eu não os observo, os ignoro mas os vejo, pois só tenho olhos pra você. É a razão de minha existência.
Não posso fazer muita coisa para te proteger, e isso me amedronta.
Queria ser como São Jorge, cavaleiro; diz-se entre os meus que ele poderia te desviar das balas, tirá-lo da frente do carro, arrancar o veneno de tuas mãos. Ouço que diante do perigo ele se colocaria à sua frente e gritaria defronte à adversidade que você é protegido do mal pelas falanges do senhor, empunhando sua espada flamejante.
Às vezes sonho com isso. Estando algum momento num futuro incerto e distante onde possa finalmente te falar, quando enfim você já me escutaria: “Vê¿ Estava ali, naquele dia quando precisou...” , e você me abraçaria, recompensando-me pela eternidade de vigilância. E eu poderia chorar, finalmente, e te dizer como foi difícil e como fiquei preocupado e aflito várias vezes com você num mundo tão perigoso.
Quando entrou naquela loja, eu sabia o que poderia acontecer. E te dei vários milhares de sinais. O sol saiu detrás das nuvens e brilhou forte, convidando à vida, a brisa acariciou sua pele para acalmá-lo. Mas você não estava atento a essas coisas.
Você pegou alguma coisa e correu, mas fraco, não era veloz. Alguns homens ferozes na suas inocências te perseguiram e eu te vi sem saída.
Neste momento eu me coloquei à sua frente e gritei como São Jorge faria.
Mas não fui ouvido. E antes que acabasse de gritar os projeteis me atravessaram, mas não pararam em mim, como queria, para te proteger. Por que estou aqui e não estou
 
A morte não é uma punição. É uma libertação. Ou não.

Um assassinato e uma desculpa esfarrapada. Já basta os trapos em farrapos para denunciar o direito de ser morto sem uma boa causa. O sol pode nascer de novo e dar aquela impressão que é a última vez, pode algum sentimento medroso aparecer e dizer que vai dar errado, pode a fome apertar, comer as tripas por dentro. O que pode a Providência fazer a não ser se livrar de uma vez de todos os tormentos?

A morte é uma desculpa esfarrapada. A morte é uma solução desnecessária. E que não venham os carrascos cobrando a gratidão. Virá os abutres dos telejornais, os vermes do telespectadores com suas opiniões de mesa de buteco. Virá o herói com cueca em cima das calças e sua invulnerabilidade imaginária enfrentar chumbo de verdade, bem pesado, bem mirado. E o angustiante sangue fora das veias.

Afinal, para que servem os anjos? A felicidade mora aqui comigo até segunda ordem.
 

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