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Foi Apenas um Sonho (Revolutionary Road, Sam Mendes, 2008)

Lucas_Deschain

Biblionauta
[size=medium][align=center]Foi Apenas um Sonho (Revolutionary Road, 2008)[/align][/size]

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[align=justify]Sinopse:

Anos 50. Frank (Leonardo DiCaprio) e April (Kate Winslet) formam um casal feliz. Eles sempre se consideraram especiais e prontos para levar uma vida seguindo ideais. Ao se mudarem para uma casa na Revolutionary Road eles ficam orgulhosos por declarar independência da inércia suburbana que os rodeava. Porém logo eles percebem que estão se tornando justamente aquilo que não queriam ser. Frank está em um trabalho insignificante e tem medo de tudo, enquanto que April é uma dona de casa infeliz. Decidida a mudar a situação, April propõe que comecem tudo de novo, deixando de lado o conforto da atual casa e recomeçando em Paris. Só que, para executar este plano, eles chegam aos seus extremos.

Ficha Técnica:

Título original: (Revolutionary Road)
Lançamento: 2008 (EUA, Inglaterra)
Direção: Sam Mendes
Atores: Leonardo DiCaprio, Kate Winslet, Michael Shannon, Ryan Simpkins.
Duração: 119 min
Gênero: Drama

Fonte: AdoroCinema

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Acho que tem bastante coisa passível de discussão acerca desse filme. De minha parte, digo que gostei bastante, principalmente por conta dos atores e pela direção que prezou por uma narrativa mais enxuta e bem orquestrada. Além disso, é preciso ressaltar que o tema, embora não seja pioneiro, é uma questão que vale muito a pena discutir, pois se assemelha à situação de muita gente, não necessariamente pelo casamento ou pelo trabalho, mas pela vida em sentido mais amplo. E aí, o que acham?[/align]
 
Reparou que o livro está na lista da Times dos melhores do século XX, Lucas? Mas nem foi por isso que li, mais por causa do comentário do Nick Hornby de que seria um romance excepecional e pouco conhecido... :dente:

Me parece que essa é uma daquelas histórias sobre os anos 50 nos EUA que mostram que as pessoas não estavam tão conformadas com aquela vida "perfeita" do pós-guerra, que os tempos já estavam em ebulição para as transformações dos 60. Outro livro excelente de que se pode tirar essa ideia é "Coelho Corre", do Updike.

Não que seja a mais essencial, mas uma cena de que sempre me lembro do "Foi Apenas um Sonho" é aquela em que...

... o Frank, pensando que iria para a França, começa a resolver todas as pendências do trabalho da forma mais despreocupada possível... Sempre lembro disso quando estou trabalhando... :hahano:
 
[align=justify]Nem tinha percebido Gigio, valeu pela dica, tenho que conferir, até para perder um pouco essa falta de vontade de ler o livro depois de ter visto o filme.

Pois é, os anos 50, período em que imperava o assim chamado 'estado de bem estar social' trouxe uma inquietação muito peculiar, pois se por um lado o conforto se tornava possível (não para todos obviamente) e houvesse uma tranquilidade com o aumento de salários, desenvolvimento de bens de consumo, facilitações na compra de casas e ingresso em empregos, a própria padronização da vida e do trabalho começam a se tornar monstros de angústia.

Isso é algo muito interessante de se pensar, pois a falta de sentido do trabalho (e mesmo da vida doméstica em alguns momentos) mostra como a burocracia e a própria maneira como a organização do trabalho e da vida social cerceiam a mudança ou quaisquer chances de se subtrair a essa lógica. Aquela vidinha pacata que agradava outrora acaba por se tornar um claustro.

Acho particularmente interessante o momento em que o Frank e a April contam para os vizinhos, aquele casal que vai dançar com eles depois, que irão para a França. Um mal estar toma conta da mulher e do homem, um misto de inveja e de raiva, não pude deixar de lembrar daquela música da Rita Lee (se não me engano) que fala sobre como a felicidade alheia incomoda. É bem isso, é como se todos estivessem amarrados e a solidariedade de condição lhes desse força para seguir. Quebrar esse elo que os prendia incomodava os demais, por estarem eles mesmos presos naquela situação.

A parte sobre o Frank estar mandando um 'f***-se' para o trabalho é muito boa mesmo, só esperava que ele fosse ser mais ousado nas suas manobras, achei que ele ia mandar impropérios na cara do chefe ou qualquer coisa assim. Fiquei me imaginando na mesma situação, aquela leveza de liberdade, de a qualquer alteração do chefe mandar tudo às favas, putz, muito bom.

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Para continuarmos a discussão: o título em inglês (Revolutionary Road) mais do que a rua onde eles moram é uma ironia sobre como o nome não condiz com a situação dos moradores, certo? Por que tudo o que havia de revolucionário se esvai quando a chance de enquadramento (com um melhor salário) aparece para Frank. Achaste a mesma coisa?[/align]
 
Foi o melhor filme que vi no ano.

Sam Mendes utilizou a mesma fórmula de Beleza Americana, sem ser repetitivo: o retrato de uma vida classe média, extremamente vazia.

Uma vida que questionamos tanto quando mais jovens e que nos vemos cada vez mais envolvidos com o passar dos anos. Sem que a gente perceba, os sonhos de rodar e mudar o mundo se transformam numa carteira assinada e em prestações a pagar. Há a sensação de sufoco, há o desejo de romper, mas a hipoteca da casa rouba-nos a coragem. Então, Revolutionary Road vira Foi apenas um sonho.

Como reverter?

Depois que terminou o filme, fiquei com o trecho de uma frase do O Grande Mentecapto, de Fernando Sabino, ecoando:

"... nossa vocação irrealizada de peregrinos ..."
 
[align=justify]Bem lembrado Cantona o Beleza Americana, nem tinha me lembrado dele, mas acho que é bem isso. Particularmente prefiro o Kevin Spacey, mas também gosto da atuação do Leonardo Di Caprio, XD

Estou na página 300 de Liberdade, do Jonathan Franzen, e uma das questões sobre as quais o livro incide também é essa da 'vidinha' de classe média, de como ela pode se tornar vazia e claustrofóbica.

Esse arrefecer de sonhos em troca de uma pretensa segurança (que se mostra nem tão segura assim) é um dos grandes dilemas da (pós)modernidade, creio eu, porque se parece a terra prometida em um momento, em outro se torna um limbo de estagnação, de vazio truncado, que pela sutileza com que apresenta a segurança e o conforto, mina a força de lhe forçar a crítica ou de lhe percecer as limitações. Lidar com essa problemática não é nada fácil, até porque esse tipo de vida está fortemente impregnado em nossa mentalidade.[/align]
 
Tenho o livro e bastante vontade de ler. Quando o filme saiu no cinema eu fiquei *bem* empolgado em ver, mas acabei não vendo na época e até hoje. O título original é estranhamente absurdamente lindo.

Do Beleza Americana eu não gosto tanto quanto a maioria. Acho quase todo o filme histérico demais, e não sou grande fã do Alan Ball. Mas ainda é melhor do que o Felicidade, do Solondz. Ah, e o final é muito, muito bonito.
 
Na faculdade o grosso dos seminários, trabalhos e afins, surgem com os últimos meses do ano. Nessa semana, preparando um deles, li um pequeno livro da coleção Tudo é História, da Editora Brasiliense: O nascimento das fábricas - Edgar de Decca. Nele, o historiador diz que a maior vitória da sociedade burguesa, nos primórdios da Revolução Industrial, foi o de introjetar um relógio moral dentro do coração de cada trabalhador. Sendo assim, o conceito de tempo útil, também apregoado pela Igreja, determinou uma forma de conduta ao homem, de dedicação e glorificação ao trabalho, imposta com sutileza, através das idéias e não mais da força bruta que gerava contestações igualmente violentas. Vindo lá de trás, Edgar de Decca escreve que o próprio conceito da palavra trabalho ganhou novo significado, deixando de ser vendido como castigo, mas como algo que "enobrece o homem" e, com um requinte maior de marketing trabalhista, o trabalho alardeou-se como fator de mobilidade social. O homem simples poderia ascender socialmente através de seu próprio suor. O pobre, finalmente, poderia ser introduzido ao meio burguês.
Numa sociedade como a nossa, onde o deus trabalho é soberano e somente quem rende sacrifícios a ele pode ser considerado cidadão de bem, todos crescemos bombardeados por esses conceitos e o reproduzimos geração após geração. Mas a insatisfação que notamos em todos os setores, inclusive nos mais elevados, mostram que a verdadeira natureza do homem é peregrina, criativa, artística e não devota do trabalho alienante. Frank, de Foi apenas um sonho, e Lester Burnham, de Beleza Americana, só para ficarmos em Sam Mendes, são dois personagens que travam essa batalha entre as aspirações humanas e a realidade imposta pela carteira profissional. Uma realidade sedutora, pois oferece - sabendo que não se vive sem esperança - o acesso ao mundo burguês, com carro do ano, casa própria e férias remuneradas numa pousada na praia ou no campo, junto da família perfeita e feliz. No entanto, há a rotina desgastante que acaba por desfazer as ilusões. A família sufoca, os sonhos cobram a conta, o emprego adoece. Distribui-se a culpa entre todos, menos ao deus trabalho, por condicionamento. Troca-se de mulher, compra-se uma TV de 60 polegadas para compensar o fato de não ser o Indiana Jones e muda-se de emprego. Um novo emprego, que também exigirá uma subida ao altar para o sacrifício ao deus impiedoso, mas que garante o FGTS e um descanso depois de 35 anos de adoração:

- Eu prometo me renunciar em teu nome... Amém.

Como diria o filósofo Cap. Nascimento, nosso Sun Tzu: O sistema é foda!
 
“Mas a insatisfação que notamos em todos os setores, inclusive nos maiselevados, mostram que a verdadeira natureza do homem é peregrina, criativa,artística e não devota do trabalho alienante.” Cantona

Essa natureza peregrina, artistica, nunca vai encontrar espaço nesse atual estágio de vida neoliberal em que vivemos. Um mundo globalizado em que, padrões comportamentais são impostos, e as individualidades são sufocadas. Será preciso uma revolução cultural e comportamental para desatar esse nó cego? O saudoso Chico Science disse: “uma grande tempestade vem vindo, é preciso um" guarda-chuva" enorme para nos proteger” A tempestade era aglobalização que na época quase ninguém se utilizava do termo, mas Science estava “antenado” e sabia que chegaria com força. A preocupação dele era com a cultura regional, pois achava que o processo de globalização iria sufocar a cultura brasileira (regionais) impondo conceitos e padrões fora do nosso contexto socio-cultural. De certa forma estamos meio que condenados por esse“sistema fodástico”. Desculpe por ter fugido um pouco do tema central. Achei interessante a colocação do Cantona sobre o trabalho alienante.Vende-se um sonho. Mais a realidade é outra.
 
Uma das cenas do filme demostra muito bem essa perda de individualidade. Frank (Leonardo DiCaprio) desce na estação e segue para o escritório com uma porção de outros como ele, todos de terno, chapéu e jornal debaixo do braço. Caminham de forma mecânica, perdidos na multidão que cria o anonimato.
 
Uma das cenas do filme demostra muito bem essa perda de individualidade. Frank (Leonardo DiCaprio) desce na estação e segue para o escritório com uma porção de outros como ele, todos de terno, chapéu e jornal debaixo do braço. Caminham de forma mecânica, perdidos na multidão que cria o anonimato.

Não tinha me tocado dessa parte Cantona, muito bem lembrado. A partir do momento em que o Frank aceita o trabalho, ele nega sua individualidade pela sedução do dinheiro, verdade, ele se torna 'mais um' na multidão de trabalhadores.

Mas acho que tem um lado de que temos que falar: na condição dele, quais de nós não tomaríamos a mesma decisão? Não estou querendo nos chamar de hipócritas nem dizer que realmente tomaríamos a mesma decisão, mas não é algo a se pensar? Ele bem que poderia ter ido para Paris, se dado bem, conseguido uma forma de subsistência supimpa e tudo o mais, mas também poderia ter se dado mal e se arrepender pro resto da vida, porque só porque ele negou certo conjunto de valores isso não quer dizer que eles deixem de existir. E ao continuar a existir, eles continuam pressionando-o constantemente.

Então não se trata aqui, penso eu, de chamá-lo de ganancioso nem mesquinho nem covarde nem narcisista nem egoísta, mas sim que, dentro das condições em que ele se encontrava, é possível entender os porques de suas decisões. Ao mesmo tempo em que o sonho se apresenta (no momento em que alguém procura por a cabeça para fora da logicidade de sua realidade), ele se encontra cerceado por todos os cantos. No fim das contas é uma angústia.

E aí pensando no que o Cantona falou:

Cantona disse:
“Mas a insatisfação que notamos em todos os setores, inclusive nos maiselevados, mostram que a verdadeira natureza do homem é peregrina, criativa,artística e não devota do trabalho alienante.”

penso que é essa é uma das condições mais excruciantes que vivemos, pois como seres pensantes faz parte de nossa natureza compreender a realidade e buscar formas de nos realizar nela, mas ao mesmo tempo em que saímos de nossa ignorância nos vemos esmagados pela dureza da realidade cerceada e 'programada'.
 
Lucas, nas circunstâncias em que Frank se encontrava, com um terceiro filho a caminho, arriscaria dizer que todos tomaríamos a mesma decisão.

No bosque:

Quando Frank, de mãos dadas com April, diz que estão indo para Paris porque não aguentam mais o vazio e a falta de esperança, John responde:

- Muitos enxergam o vazio, mas poucos percebem a falta de esperança.

Nesse momento, é dada a sentença: não há como fugir do vazio. Pode-se burlá-lo, com a esperança de Paris. Mas note, uma esperança, um sonho que não se pode concretizar, pois então deixaria de ser sonho. Como Frank se sentiria se descobrisse que a Paris de seus anos de juventude, um refúgio nas suas lembranças, fosse uma cópia francesa do seu subúrbio americano? Com o que burlar o vazio com essa constatação?
 
Estou na página 300 de Liberdade, do Jonathan Franzen, e uma das questões sobre as quais o livro incide também é essa da 'vidinha' de classe média, de como ela pode se tornar vazia e claustrofóbica.

Hoje, comprei esse livro, Lucas. Como não tenho o dom de ler mais de um livro ao mesmo tempo, depois que acabar Fahrenheit 451 (clube da leitura), vou de Liberdade.

Há braços!
 

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