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Eru sabia de tudo?

Maglor disse:
"Ilúvatar" significa "pai de todos", ou seja, em outros termos, o criador de todos. Eru, o Único, era o único capaz de criar seres com livre-arbítrio, tão livres quanto ele próprio, independentes de qualquer outra vontade. Tolkien associa a natureza divina nunca ao conhecimento do futuro, mas justamente à capacidade de Criar: criar coisas do nada ("Eä!) e criar espíritos, seres com Vida.

Sei que vou fazer uma comparação meio herege, mas eu comparo o poder de um deus ao de um mestre de RPG. Todo mundo sabe que ele dita os rumos e acontecimentos das personagens e lhe dá escolhas em suas ações. Apesar de toda a liberdade de fazerem o que quizerem (e mandar pro espaço aquela saga que levou meses pra sair >.<) ninguém questiona a palavra final do mestre. A história seguirá em seu percurso e com alguma "intervenção divina" na trama para que tudo resulte em glória e diversão.
 
Elring disse:
Sei que vou fazer uma comparação meio herege, mas eu comparo o poder de um deus ao de um mestre de RPG. Todo mundo sabe que ele dita os rumos e acontecimentos das personagens e lhe dá escolhas em suas ações. Apesar de toda a liberdade de fazerem o que quizerem (e mandar pro espaço aquela saga que levou meses pra sair >.<) ninguém questiona a palavra final do mestre. A história seguirá em seu percurso e com alguma "intervenção divina" na trama para que tudo resulte em glória e diversão.
Mas o mestre planeja as ações dos jogadores, e muitas vezes desenvolve um caminho baseando-se no que acredita que os jogadores irão escolher para seu caminho, mas em momento algum ninguém sabe como vai acabar, e nem ao menos de qual forma(e direção) cada um caminhará para possivelmente chegar no mesmo lugar que muitos outros.Todos almejam a vitória, mas cada um caminha para ela de acordo com seus atributos e facilidades.:cerva:
 
Gabriel disse:
Só que no momento em que Tolkien disse que Eru = Deus cristão, ele automaticamente atribuiu todas as características do Deus cristão a Eru, entre as quais está a onisciência.

Não necessariamente. Por mais que saibamos que as lendas que ele criou devessem representar as próprias crenças pessoais dele, esse raciocínio encontra muitos problemas. Se Eru é simples e meramente o Deus cristão, e não uma "versão mitológica" dele, devemos rever a questão de terem sido os Valar-anjos que deram forma ao Mundo, e não o próprio Deus. Se formos levar além as comparações com o cristianismo, não podemos ignorar o fato de que Melkor foi banido do mundo, não podendo mais atuar diretamente nele; não há paralelo no cristianismo para isso.

Eru é, dentro da construção do legendário de Tolkien, o Deus cristão, tanto quanto os Valar são anjos. São formas mitológicas de ver esse passado real em imaginação, dentro do que eu consigo entender.


Elring disse:
Sei que vou fazer uma comparação meio herege, mas eu comparo o poder de um deus ao de um mestre de RPG.

Também não sei até que ponto podemos ir com algumas comparações, mas vale o exercício. Se Eru for um mestre de rpg, ele tem como delinear limites e linhas gerais, mas as ações dos personagens dos jogadores será sempre exclusiva deles. O mestre, a partir do conhecimento deles dos personagens e do mundo como um todo, pode deduzir com uma margem relativamente grande de chance de acerto o que irá acontecer e o que os personagens irão fazer. Mas isso cabe a eles, e só a eles. O que o mestre vier a "saber" do futuro é fruto da dedução por chances que ele fez.
 
Última edição:
Maglor disse:
Não necessariamente. Por mais que saibamos que as lendas que ele criou devessem representar as próprias crenças pessoais dele, esse raciocínio encontra muitos problemas. Se Eru é simples e meramente o Deus cristão, e não uma "versão mitológica" dele, devemos rever a questão de terem sido os Valar-anjos que deram forma ao Mundo, e não o próprio Deus. Se formos levar além as comparações com o cristianismo, não podemos ignorar o fato de que Melkor foi banido do mundo, não podendo mais atuar diretamente nele; não há paralelo no cristianismo para isso.

Eru é, dentro da construção do legendário de Tolkien, o Deus cristão, tanto quanto os Valar são anjos. São formas mitológicas de ver esse passado real em imaginação, dentro do que eu consigo entender.

Uma coisa não interfere na outra. Eru é igualado ao Deus cristão pelo que ele é, como o Ser iniciador de tudo, não pelo o que ele fez ou deixou de fazer ser igual ou não ao que é contado na Bíblia: o fato de ter acontecimentos no legendário que diferem daqueles da Bíblia não invalida isso, muito pelo contrário, pois Tolkien não queria "recontar a Bíblia de maneira mitológica".

Eru continua sendo o Deus cristão independente dos Valar terem moldado Arda no legendário e de o mundo ter sido criado em seis dias na Bíblia apenas por Deus. São simplesmente visões diferentes do mito criacional: uma dos elfos (legendário) e outra dos homens após o arredondamento do mundo, a saída de Aman dos Círculos do Mundo e o desvanecer dos elfos (bíblica). Eru/Deus é justamente o único ponto verdadeiramente em comum entre as duas visões, pois são a mesma entidade.
 
Maglor disse:
Não necessariamente. Por mais que saibamos que as lendas que ele criou devessem representar as próprias crenças pessoais dele, esse raciocínio encontra muitos problemas. Se Eru é simples e meramente o Deus cristão, e não uma "versão mitológica" dele, devemos rever a questão de terem sido os Valar-anjos que deram forma ao Mundo, e não o próprio Deus. Se formos levar além as comparações com o cristianismo, não podemos ignorar o fato de que Melkor foi banido do mundo, não podendo mais atuar diretamente nele; não há paralelo no cristianismo para isso.
Mas Maglor, existe sim um paralelo na bíblia para o banimento de Melkor:

"E vi descer di céu um anjo, que tinha a chave do abismo...ele prendeu o Diabo e Satanás e o amarrou-o por mil anos. E lançou-o no abismo..."
apocalipse, 20: 1-3.

Gabriel disse:
Uma coisa não interfere na outra. Eru é igualado ao Deus cristão pelo que ele é, como o Ser iniciador de tudo, não pelo o que ele fez ou deixou de fazer ser igual ou não ao que é contado na Bíblia: o fato de ter acontecimentos no legendário que diferem daqueles da Bíblia não invalida isso, muito pelo contrário, pois Tolkien não queria "recontar a Bíblia de maneira mitológica".
Exatamente isso que acho, o fato de Eru ser igualado ao deus cristão é só nos ponto de suas caracteristicas e não de seu atos.
 
Última edição:
Gabriel disse:
Uma coisa não interfere na outra. Eru é igualado ao Deus cristão pelo que ele é, como o Ser iniciador de tudo, não pelo o que ele fez ou deixou de fazer ser igual ou não ao que é contado na Bíblia: o fato de ter acontecimentos no legendário que diferem daqueles da Bíblia não invalida isso, muito pelo contrário, pois Tolkien não queria "recontar a Bíblia de maneira mitológica".

Exatamente por não pretender recontar a Bíblia que há divergências, não só nos acontecimentos, mas em conceitos. A figura da qual falamos é a mesma, mas contada por pontos-de-vista diferentes. Eru é o Deus cristão, mas é a forma élfica de vê-lo e compreendê-lo, é a forma que Tolkien passou em sua obra, antes de um conceito pré-concebido. Assim como os Valar e Maiar seriam a forma élfica de ver os "anjos".

E há alguns pontos razoavelmente demonstráveis, já que temos ao menos um exemplo de algo que Eru não demonstrou saber de antemão, que é a morte de elfos em Arda, através do Diálogo de Manwë e Eru:

- Manwë falou a Eru: Veja! Existe um mal em Arda que não vimos antes. Os quendi, que tu fizeste imortais, estão sofrendo com a separação de seus espíritos e corpos.(...) Não há nenhum meio pelo qual suas vidas possam ser renovadas para seguir os cursos que tu planejastes?

Além disso, é um tanto forçoso assumirmos que Eru simplesmente sabia que iria destruir Númenor, por exemplo. Uma atitude intempestiva como aquela ser premeditada é, no mínimo, difícil de se conceber.

Sem nos esquecermos do grande problema que é conciliar, racionalmente, a idéia de livre-arbítrio e de pré-conhecimento do futuro (quando não associado a dedução); ao falarmos em livre-arbítrio o futuro simplesmente "ainda não existe", ou apenas existe em estado de imaginação, potência.


Shantideva disse:
Mas Maglor, existe sim um paralelo na bíblia para o banimento de Melkor:

"E vi descer di céu um anjo, que tinha a chave do abismo...ele prendeu o Diabo e Satanás e o amarrou-o por mil anos. E lançou-o no abismo..."
apocalipse, 20: 1-3.


Vou falar sem ter muito conhecimento mesmo. O Apocalipse, não por acaso chamado "Livro das Revelações", não trata só de eventos futuros?
De qualquer forma, para o nosso assunto aqui do tópico, é um detalhe.
 
Maglor disse:
E há alguns pontos razoavelmente demonstráveis, já que temos ao menos um exemplo de algo que Eru não demonstrou saber de antemão, que é a morte de elfos em Arda, através do Diálogo de Manwë e Eru:

- Manwë falou a Eru: Veja! Existe um mal em Arda que não vimos antes. Os quendi, que tu fizeste imortais, estão sofrendo com a separação de seus espíritos e corpos.(...) Não há nenhum meio pelo qual suas vidas possam ser renovadas para seguir os cursos que tu planejastes?


Com esse "que não vimos" (que, aliás, foi mal traduzido: no original é "did not look for" = "não esperávamos") Manwë está se referindo a ele e aos outros Valar, não a ele e a Eru, pois Eru obviamente esperava por isso: ele apenas não havia apresentado tudo a respeito de seus Filhos aos Valar na Música - lembra que ele retirou a visão da Canção de Arda
antes que ela terminasse? -, e é sobre uma dessas coisas desconhecidas (a separação de fëa e hröa) que Manwë pede esclarecimentos a Eru.


Além disso, é um tanto forçoso assumirmos que Eru simplesmente sabia que iria destruir Númenor, por exemplo. Uma atitude intempestiva como aquela ser premeditada é, no mínimo, difícil de se conceber.

Não necessariamente, se tu enxergar a "intepestividade" como um modo de ficar claro ao resto dos Filhos para "não cruzarem a linha que lhes foi determinada". Eru teve que dar uma "lição" nos revoltosos, e estes serviram de exemplo para os outros. Burrices extremas, como a de Ar-Pharazôn, exigem medidas extremas, hehe.

Sem nos esquecermos do grande problema que é conciliar, racionalmente, a idéia de livre-arbítrio e de pré-conhecimento do futuro (quando não associado a dedução); ao falarmos em livre-arbítrio o futuro simplesmente "ainda não existe", ou apenas existe em estado de imaginação, potência.

A onisciência não interfere necessariamente no livre-arbítrio. Eru sabe o que seus Filhos farão (porque ele é onisciente), e eles têm liberdade para fazer o que quiser: ele simplesmente optou por não interferir (embora também pudesse caso quisesse).

Independente de que caminho escolham (e eles têm plena liberdade para escolher o caminho que quiserem), Eru tem conhecimento de todos esses caminhos... e todos invariavelmente levam a concretização de seus desígnios (como visto desde o Ainulindalë). Como eu já disse antes em outras discussões por aqui, isso seria um livre-arbítrio "relativo". Não existe livre-arbítrio "pleno" porque isso implicaria na ignorância do "destino final" por parte de Eru (coisa que não acontece) - o mesmo se dá com Deus e o Apocalipse: no final, será tudo como Ele determinou - ele deixou cada um seguir seu caminho, mas no final terão que prestar contas por isso... ou seja, não importa o que façam, as duas opções de "destino final" (salvação ou danação) já foram estabelecidas por Deus.
 
Gabriel disse:
Com esse "que não vimos" (que, aliás, foi mal traduzido: no original é "did not look for" = "não esperávamos") Manwë está se referindo a ele e aos outros Valar, não a ele e a Eru, pois Eru obviamente esperava por isso
Eu realmente não corri atrás do original para fazer a citação. De qualquer forma, que Eru esperasse que houvesse morte de elfos em Arda é de fato difícil de não se imaginar. Mas se ele sabia, não devia ser em razão da Música, conforme esse mesmo texto:

[FONT=&quot]
The new conception proceeds, in outline, as follows. The Music of the Ainur had contained no prevision of the death of Elves and the existence of their 'houseless' fëar, since according to their nature they were to be immortal within the life of Arda.

Então, como poderia saber disso? Por uma suposição lógica, provavelmente.

[/FONT]
Não necessariamente, se tu enxergar a "intepestividade" como um modo de ficar claro ao resto dos Filhos para "não cruzarem a linha que lhes foi determinada". Eru teve que dar uma "lição" nos revoltosos, e estes serviram de exemplo para os outros. Burrices extremas, como a de Ar-Pharazôn, exigem medidas extremas, hehe.
Foi uma medida extrema, com certeza, mas transmite, ao menos a mim, a idéia de um estado de fúria propriamente. Realmente esse episódio não é bom para exemplificar porque fica aberto a interpretações. Eu confesso que tenho dificuldades em imaginar a implosão de um país-ilha inteiro, com milhares de pessoas, sem associar isso a um comportamento furioso - sentimento que só se justifica, a princípio, a algo minimamente inesperado.


A onisciência não interfere necessariamente no livre-arbítrio. Eru sabe o que seus Filhos farão (porque ele é onisciente), e eles têm liberdade para fazer o que quiser: ele simplesmente optou por não interferir (embora também pudesse caso quisesse).

Mas há uma grande pergunta: como se conhece o futuro ("conhecer" em um sentido bem estrito, fazendo a distinção em relação a "deduzir"), se ele simplesmente não existe, na medida em que depende de outros? Não simplesmente conhecer todos os caminhos, mas como se conhecer especificamente o caminho que será o seguido.


Independente de que caminho escolham (e eles têm plena liberdade para escolher o caminho que quiserem), Eru tem conhecimento de todos esses caminhos... e todos invariavelmente levam a concretização de seus desígnios (como visto desde o Ainulindalë).

Realmente, o conhecimento de todos os "caminhos", por uma mente que concebemos como infinitamente sábia, é possível - é o que Mandos fazia, embora em um nível de sabedoria (e, portanto, do que Tolkien chama de "previsão") muito menos elevado e mais sujeito a erros. Mas o conhecimento prévio (conhecimento como simples "saber", com aquela diferenciação de "dedução por chances") de qual caminho será o seguido esbarra na existência de outras vontades livres e independentes, imprevisíveis até mesmo por ainda não existirem. A previsão/conhecimento via dedução é acessível a qualquer um; Tolkien fala sobre ele no Ósanwë-kenta. O conhecimento simplesmente pelo conhecimento, prévio a qualquer coisa e independente de qualquer fonte, é que é o alvo da discussão.

Ou seja, não é apenas conhecer todos as possibilidades e sabermos que invariavelmente os desígnios de Eru serão alcançados, pois isso é questão de "dedução"; mas sim como se conhecer qual a possibilidade específica, dentre todas, que será a real.

O "destino final", que é a realização do Plano de Eru, é certo, por uma questão de estel. Mas tem elementos de indeterminação. Ele será necessariamente Bom, pois essa é a promessa de Ilúvatar - mas tão melhor quanto, por exemplo, maior for o mal no mundo: pois todo ele será não só curado, mas convertido em algo bom ("[FONT=&quot]For he that attempteth this shall prove but mine instrument in the devising of things more wonderful, which he himself hath not imagined"). Uma Arda não maculada por Melkor seria completamente livre do Mal, portanto Boa e perfeita; Arda Curada, também totalmente livre do Mal, seria um outro estágio, que incluiria o Mal como forma do passado e todas as suas conseqüências boas, sendo ainda "mais Boa" do que Arda não maculada.[/FONT]
 
Maglor disse:
Foi uma medida extrema, com certeza, mas transmite, ao menos a mim, a idéia de um estado de fúria propriamente. Realmente esse episódio não é bom para exemplificar porque fica aberto a interpretações. Eu confesso que tenho dificuldades em imaginar a implosão de um país-ilha inteiro, com milhares de pessoas, sem associar isso a um comportamento furioso - sentimento que só se justifica, a princípio, a algo minimamente inesperado.

Tem centenas de paralelos bíblicos para esse caso, mas basta citar um dos mais conhecidos: Sodoma e Gomorra. (Aliás, as condições para a destruição das duas cidades e de Númenor são realmente bem similares. :think: ) E Deus sabia o que aconteceria, pois é onisciente: ele realmente é dado a momentos de fúria no Antigo Testamento, não por acontecer algo "inesperado", e sim por ele realmente se indignar com certas atitudes de seus Filhos. Creio que foi o mesmo com Eru nesse caso, em mais um paralelo.

Mas há uma grande pergunta: como se conhece o futuro ("conhecer" em um sentido bem estrito, fazendo a distinção em relação a "deduzir"), se ele simplesmente não existe, na medida em que depende de outros? Não simplesmente conhecer todos os caminhos, mas como se conhecer especificamente o caminho que será o seguido.

Ah, mas essa é A grande pergunta paradoxal da maioria das teologias, não? :mrgreen: Eu, como ateu, considero tudo isso uma balela das mais falhas e um dos indícios de que toda a questão de Deus e livre-arbítrio é história da carochinha. No entanto, como nesse caso Eru = Deus, essa história da carochinha em tese tem que ser verdadeira dentro dos mitos do legendário, hehe.

Enfim, tudo levará ao que Eru tinha planejado desde o início, independente do que faça desde um Vala até uma formiga: tudo converge para a realização do "Plano". Ele realmente já havia planejado todos os caminhos possíveis dentro da sua mente imensurável; dá até pra citar algo que embasa isso, do trecho que tu mesmo colocou antes, do diálogo entre Manwë e Eru:

Não há nenhum meio pelo qual suas vidas possam ser renovadas para seguir os cursos que tu planejastes?

E Eru fornece o "meio" a Manwë, de modo que tudo continue a se encaminhar para a realização do Plano. Se isso não é livre-arbítrio relativo, eu não sei o que é. :mrgreen:
 
Última edição por um moderador:
Gabriel disse:
Tem centenas de paralelos bíblicos para esse caso, mas basta citar um dos mais conhecidos: Sodoma e Gomorra. (Aliás, as condições para a destruição das duas cidades e de Númenor são realmente bem similares. :think: ) E Deus sabia o que aconteceria, pois é onisciente: ele realmente é dado a momentos de fúria no Antigo Testamento, não por acontecer algo "inesperado", e sim por ele realmente se indignar com certas atitudes de seus Filhos. Creio que foi o mesmo com Eru nesse caso, em mais um paralelo.
Eu também gosto dessa comparação. Já falei sobre ela exatamente na lista, tem um tempinho. Encaixa direitinho mesmo.


Ah, mas essa é A grande pergunta paradoxal da maioria das teologias, não? :mrgreen: Eu, como ateu, considero tudo isso uma balela das mais falhas e um dos indícios de que toda a questão de Deus e livre-arbítrio é história da carochinha. No entanto, como nesse caso Eru = Deus, essa história da carochinha em tese tem que ser verdadeira dentro dos mitos do legendário, hehe.
Eu também tenho problemas com isso. :) Mas, numa boa, acho que levarmos ao pé da letra essa igualdade "Eru=Deus" traz problemas. Acho mesmo que é uma forma simplista de ver esse assunto. Porque, sim, se Eru é Deus, sem tirar nem por, não podemos excluir, por questão de comodidade e conveniência, as ações dele e considerar apenas a "essência". Se o Deus cristão é aquele que está na Bíblia, é não apenas todas as características dele, mas inclui-se aí tudo o que ele fez. É algo devidamente "registrado" e integrante da doutrina religiosa - e, por conseqüência, da comparação. Eru/Deus, no caso, seria um ponto de congruência entre a mitologia élfica e a "mitologia" cristã, exatamente como os Valar/anjos.

Se estamos tratando de Tolkien, estamos falando da versão élfica desses contos (e aí,claro, inclui-se o que Tolkien escreveu sobre essa versão élfica em cartas, etc). Não necessariamente precisamos importar, portanto, as incongruências da "versão humana" dos contos, se elas não constam na élfica. Temos muitas citações sobre o livre-arbítrio nas cartas, algumas especialmente diretas e explicativas, e temos também explicações sobre o que Tolkien considerou como um verdadeiro diferencial entre a natureza divina de um ser e a natureza de um outro. Em nenhum momento Tolkien coloca a oposição livre-arbítrio X onisciência (termo que eu nunca li em um livro de Tolkien), embora dê grande atenção ao primeiro e à sua necessária existência; Tolkien também nunca coloca que a característica de um ser divino é o conhecimento prévio do futuro, mas a capacidade de ilimitada de Criar (na carta 156 Tolkien resume as propriedades de Deus como sendo "the one wholly free Will and Agent"). Tolkien chega a dizer que Eru é incapaz de deliberar sobre o fim de um ser que ele criara sem desfazer a natureza dele, ou seja, Ilúvatar fez Sauron imortal e com livre-arbítrio e se ele quisesse terminar com a existência de Sauron deveria necessariamente terminar antes com a sua natureza, que inclui o livre-arbítrio.


E Eru fornece o "meio" a Manwë, de modo que tudo continue a se encaminhar para a realização do Plano. Se isso não é livre-arbítrio relativo, eu não sei o que é. :mrgreen:
Aqueles "cursos que tu planejastes" não são exatamente os cursos da natureza dos elfos? O trecho é esse:

[FONT=Arial, Helvetica, sans-serif]
Manwë falou a Eru: Veja! (...) Os quendi, que tu fizeste imortais, estão sofrendo com a separação de seus espíritos e corpos. Muitos dos fëar dos elfos na Terra-média estão sós, e até mesmo em Aman há um também desabrigado. Os fëar desabrigados nós chamamos a Aman para protegê-los da escuridão, e aqui eles esperam. O que será deles mais adiante? Não há nenhum meio pelo qual suas vidas possam ser renovadas para seguir os cursos que tu planejastes?
[/FONT][FONT=Arial, Helvetica, sans-serif]

Esses "cursos" são a unidade entre espíritos e corpos e tudo mais que envolve a natureza élfica.
[/FONT]
 
Maglor disse:
Eu também tenho problemas com isso. :) Mas, numa boa, acho que levarmos ao pé da letra essa igualdade "Eru=Deus" traz problemas. Acho mesmo que é uma forma simplista de ver esse assunto. Porque, sim, se Eru é Deus, sem tirar nem por, não podemos excluir, por questão de comodidade e conveniência, as ações dele e considerar apenas a "essência".
Não é por questão de conveniencia ou comodidade, mas se Eru=Deus Cristão, em todos os aspectos, inclusive no que tange á suas ações, teríamos, uma obra alegórica, coisa que Tolkien abominava, vc bem sabe. Essa questão de Eru ser em sua essencia o Deus Cristão, parece ser a mesma lógica aplicada pelo autor para outras coisas dentro de sua obra, como Númenor, por exemplo.

Maglor disse:
Em nenhum momento Tolkien coloca a oposição livre-arbítrio X onisciência (termo que eu nunca li em um livro de Tolkien), embora dê grande atenção ao primeiro e à sua necessária existência; Tolkien também nunca coloca que a característica de um ser divino é o conhecimento prévio do futuro, mas a capacidade de ilimitada de Criar (na carta 156 Tolkien resume as propriedades de Deus como sendo "the one wholly free Will and Agent"). Tolkien chega a dizer que Eru é incapaz de deliberar sobre o fim de um ser que ele criara sem desfazer a natureza dele, ou seja, Ilúvatar fez Sauron imortal e com livre-arbítrio e se ele quisesse terminar com a existência de Sauron deveria necessariamente terminar antes com a sua natureza, que inclui o livre-arbítrio.

Taí algo completamente novo pra mim. Nunca li a carta 156. Até agora, tenho discutido o assunto, sempre considerando Eru=Deus cristão, com todas as suas caracteristicas inerentes, ignorava completamente a informação grifada acima. De acordo com esta infromação, não só Eru não era onisciente, como tb não era onipotente. Então dentro da definição que temos de Deus, Eru não podia ser considerado um.
 
Acompanhei a conversa dos dois amigos sobre Eru = Deus cristão, e mesmo com tamnhas semelhanças aqui colocadas por Gabriel, a respeito da onisciência de Eru, o uso de comparações bíblicas, e tudo mais, creio que nesse ponto seria interessante levarmos em consideração a Carta de número 131 - A Milton Waldman. Nesta temos Tolkien negando sua intenção de recriar de forma mítica uma mitologia já existente, mas sim de tentar criar um novo mito, um novo mito criacionista, um novo mito sobre a Terra em si.
Tendo em vista isso, podemos também relacionar o fato de que a maioria das partes bíblicas seriam breves cópias de mitos pre-existentes de tribos próximas dos hebreus. Mas não é esse o fato de maior valor.
Em todo mito criacionista existem semelhanças, o homem sempre tenta representar o desconhecido com uma paradoxal semelhança.
Tolkien cria um ambiente mítico diferente em grande (senão em toda) parte do ambiente mítico hebreu. Obviamente não é irrelevante o fato de Tolkien em suas obras colocar sua interpretação de mitos pre-existentes inconscientemente, sendo ele cristão.
Mas sua vontade não era de recriar a bíblia de forma mítica, e sendo assim devemos sempre tentar ver o que há de novo em seu mito, sem estar ligado sempre a comparações e alusões, pois se assim fizermos iremos desconsiderar muitos mitos pre-existentes por semelhanças, e mesmo plágios, como no caso hebreu, onde a parte que vem a tratar do dilúvio e da arca, é nada mais que uma versão plagiada de um mito mesopotâmico.
Assim como disse Gabriel, também sendo ateu, não consigo ver com bons olhos a questão livre arbítrio e onisciência, pois são incompatíveis.
Mas a esse dilema o tópico não se atem, então também não atemo-nos a ele.
A questão original, Eru = Deus cristão, creio eu que não. Pois assim como foi dito, não era a vontade de Tolkien recriar mitos, mas sim criar um mito (anglicano) que trata-se de seu povo, de sua língua, uma construção mítica elaborada, e assim o fez. Sendo essa sua vontade, e sendo ela tão vívida em sua obras, na ambientação, nas línguas, e em muitas outras partes, não vejo o porque de tentar ver Eru como o deus cristão, sendo que o próprio mito cristão recebeu influências, mudanças, plagiou outras crenças, e nem por isso as pessoas o tratam como um mito "influênciado", mas como "o mito" verdadeiro [alguém deveria lhes dizer que não há verdade absoluta]. Espero que não entendam mal esta parte, não desejo de forma alguma que as obras sigam esse caminho de imposição e carnifícina assim como foi com o cristianismo, não =]; que apenas seja vista por seu conteúdo e beleza mítica.

Abraços.
 
Última edição:
O debate tá demais! E lendo novamente algumas partes do Silmarillion, fiquei com algumas dúvidas. No Ainulindalië está dito que o Ëa foi moldada a partir dos Temas criados pelos Ainur e não pelo próprio Eru, ou seja, tudo foi criado a partir dos desejos de cada um deles - embora não soubessem que Ilúvatar tornava realidade seus pensamentos. E após a conclusão foi-lhes mostrado uma breve visão daquilo que haviam cantado e retirado antes que contemplassem o desfecho final. Novamente, sem que os Ainur esperassem, Eru inseriu seus Filhos dentro da Música.
Aqui fica minha dúvida. Se a Música foi transformando-se em um duelo entre Melkor e os Ainur, como pode haver uma conclusão da Música com a inserção de um elemento totalmente alheio a seus criadores sem o conhecimento absoluto do Regente maior?
 
São esses fatos interessantes de se imaginar, pois realmente existem semelhanças com mitos pre-existentes, mas também existem interpretações (as quais somos livres a fazê-las) que não mostram claramente essas semelhanças, e ao meu ver são essas em maior número do que as inevitáveis semelhanças.

Abraços.
 
Shantideva disse:
Não é por questão de conveniencia ou comodidade, mas se Eru=Deus Cristão, em todos os aspectos, inclusive no que tange á suas ações, teríamos, uma obra alegórica, coisa que Tolkien abominava, vc bem sabe. Essa questão de Eru ser em sua essencia o Deus Cristão, parece ser a mesma lógica aplicada pelo autor para outras coisas dentro de sua obra, como Númenor, por exemplo.
Exatamente isso que eu quis dizer, embora eu não saiba se de uma forma tão clara. :)
Um bom tema para um tópico seria justamente até que ponto Tolkien foi feliz na sua idéia de não ser alegórico, mas eu concordo contigo. Eu acho que Eru é a versão "élfica", do pontos de vista da história e do conhecimento dos elfos, do que hoje nós conhecemos como "Deus católico", que Tolkien cria. É o mesmo "ser" visto de uma outra forma, e aí estão as eventuais "diferenças", pelo que eu entendi.


Taí algo completamente novo pra mim. Nunca li a carta 156. Até agora, tenho discutido o assunto, sempre considerando Eru=Deus cristão, com todas as suas caracteristicas inerentes, ignorava completamente a informação grifada acima. De acordo com esta infromação, não só Eru não era onisciente, como tb não era onipotente. Então dentro da definição que temos de Deus, Eru não podia ser considerado um.
Eu escrevi muito mal aquele trecho. Dá a entender que as duas informações estão na mesma carta. Vou citar direito agora.

[FONT=&quot]
carta156 disse:
for the point of view of this mythology is that 'mortality' or a short span, and 'immortality' or an indefinite span was part of what we might call the biological and spiritual nature of the Children of God, Men and Elves (the firstborn) respectively, and could not be altered by anyone (even a Power or god), and would not be altered by the One, except perhaps by one of those strange exceptions to all rules and ordinances which seem to crop up in the history of the Universe, and show the Finger of God, as the one wholly free Will and Agent.
Esse trecho está em um contexto que fala sobre os numenorianos e a natureza de homens e elfos, então Tolkien fala da capacidade de Eru de, agindo em Eä, gerar acontecimentos simplesmente imprevisíveis para quaisquer outros; seriam os "milagres". Em seguida vem a "definição" dessa capacidade como sendo Eru "o único Agente e Vontade completamente livre".
Isso que eu vejo como a definição de Tolkien para a natureza divina de Eru.


O que eu falei do Sauron estava em outra carta, que eu sempre lembro:

[/FONT]
211 disse:
That Sauron was not himself destroyed in the anger of the One is not my fault: the problem of evil, and its apparent toleration, is a permanent one for all who concern themselves with our world. The indestructibility of spirits with free wills, even by the Creator of them, is also an inevitable feature, if one either believes in their existence, or feigns it in a story.
[FONT=&quot]O que eu entendo disso é: Sauron foi feito imortal e com livre-arbítrio. Feito assim pelo próprio Eru. Se ele foi feito imortal, não poderia ser morto, nem mesmo por Eru - a não ser, lógico, que Eru resolvesse revogar a imortalidade e o livre-arbítrio de Sauron (caracteríticas da natureza dele), mas então estaríamos falando de outra situação. A princípio, parece o seguinte: Eru pode fazer tudo, até o ponto em que ele decide não poder fazer algo, por alguma razão (que deve ser muito boa, afinal, é Eru).


[/FONT]
Aracáno Elessar disse:
A questão original, Eru = Deus cristão, creio eu que não. Pois assim como foi dito, não era a vontade de Tolkien recriar mitos, mas sim criar um mito (anglicano) que trata-se de seu povo, de sua língua, uma construção mítica elaborada, e assim o fez. Sendo essa sua vontade, e sendo ela tão vívida em sua obras, na ambientação, nas línguas, e em muitas outras partes, não vejo o porque de tentar ver Eru como o deus cristão
Não sei se podemos ir tão longe, Aracáno. Tolkien chama Eru de "Deus", nas Cartas, não uma ou duas, mas muitas vezes, e com letra maiúscula mesmo. Tolkien pretendia criar um mito que fosse a "verdadeira origem" de todos os outros, e nesse "verdadeiro" acho que devemos entender o que ele considerava e cria como verdadeiro; nisso está incluso a sua Fé pessoal. Arda não é um outro mundo, mas uma versão imaginária de um passado mitológico da Terra em que vivemos, e para Tolkien há Deus. A obra dele deveria não só ser coerente internamente, na forma de uma história bem escrita, mas ser assim "crível" porque ela deveria ser "real", ter fragmentos de realidade transmitidos pelo ponto de vista dos elfos. Nessa "realidade" necessariamente deve estar o que é essencialmente Verdadeiro para Tolkien, e absolutamente nada era mais importante e fundamental para ele do que Deus.


Elring disse:
Se a Música foi transformando-se em um duelo entre Melkor e os Ainur, como pode haver uma conclusão da Música com a inserção de um elemento totalmente alheio a seus criadores sem o conhecimento absoluto do Regente maior?
Eu acho que foi assim: os Ainur cantaram livremente, "com seus próprios pensamentos e recursos", mas jamais poderiam fugir ao tema inicial proposto por Eru ("E tu, Melkor, verás que nenhum tema pode ser tocado sem ter em mim sua fonte mais remota"). Os Ainur tiveram liberdade para imaginar, mas não para criar. Ao final da Música Eru mostrou-lhes uma visão do que cantaram, mas não havia realidade nenhuma ainda. Esta só passou a existir quando Eru criou Eä, mas ela ainda não era como na Música, era apenas "algo que Existe", mas sem forma. A Música em si era apenas pensamento. A Música foi como uma história que os Ainur contaram entre si, como um planejamento; o que veio a de fato acontecer dependeu apenas da vontade dos Ainur, não necessariamente do que eles "planejaram".
 
Maglor disse:
Não sei se podemos ir tão longe, Aracáno. Tolkien chama Eru de "Deus", nas Cartas, não uma ou duas, mas muitas vezes, e com letra maiúscula mesmo. Tolkien pretendia criar um mito que fosse a "verdadeira origem" de todos os outros, e nesse "verdadeiro" acho que devemos entender o que ele considerava e cria como verdadeiro; nisso está incluso a sua Fé pessoal. Arda não é um outro mundo, mas uma versão imaginária de um passado mitológico da Terra em que vivemos, e para Tolkien há Deus. A obra dele deveria não só ser coerente internamente, na forma de uma história bem escrita, mas ser assim "crível" porque ela deveria ser "real", ter fragmentos de realidade transmitidos pelo ponto de vista dos elfos. Nessa "realidade" necessariamente deve estar o que é essencialmente Verdadeiro para Tolkien, e absolutamente nada era mais importante e fundamental para ele do que Deus.

Mas Maglor qual a utilidade do começo: "Não sei se podemos ir tão longe Aracáno":ahn?: ? Afinal tudo o que você escreveu são conclusões colocadas por ele a princípio, pois a primeira vez que eu vi alguém tratando da História de Tokien como um prelúdio (abertamente) foi por iniciativa dele :roll: ; perdoe se você já tinha esta opinião antes:oops: , mas não me lembro de tê-lo visto concordar no tópico em que discutimos e questionamos a veracidade de toda a história, ou em outros :cerva:.

A única parte que pode estar estranha, dependendo do ponto de vista foi o que ele falou sobre o Deus dos Hebreus, por que afinal para os Hebreus o Deus deles era o Deus que iria ajudá-los, em toda a linhagem deles, que ajudaria apenas a eles, tanto é que em muitos trechos biblícos este Deus não se importa com as outras nações, portanto não era assim tão bom para com todos; mas lembrando que até mesmo a bíblia foi escrita seguinte um ponto de vista, Aracáno só quis enfatizar que Eru não favorece um ou outro povo, sendo essa a distinção do Deuse em questão (sendo esta também a razão de se poder aceitar que de certa forma Eru também era o mal, pois dele vem Melkor, já o Deus cristão é o Deus apenas do bem [afinal Lúcifer é tratado com "menos importância", por não intervir de forma direta, e ao se rebelar, não se voltar diretamente contra o plano dos humanos, por não ser este seu desejo], mas isso é muito relativo). Não contesto o fato de Eru ser oniciênte ou não, ou a questão inclusa com o livre-arbítrio, o que digo é que Tolkien além de criar uma nova visão do mundo, ele cria também uma nova visão de Deus.

Namárië nildonyar ar nai Valar laituvar lë!

Eldariel.
 
Maglor, sim, para Tolkien há deus, mas ele mesmo na carta 131 diz que não gostaria de criar uma mitologia anglicana, como a de Arthur, pois nela estava presente o cristianismo. Sendo assim, mesmo ele crendo, e usando como exemplo de deus único, o hebreu, ele não pretendia em sua obra colocá-lo como alegoria do mesmo. Veja:

Havia o grego, e o celta, e o romance, o germânico, o escandinavo e o finlandês (que me afetou consideravelmente); mas nada inglês, a não ser materiais empobrecidos de literatura de cordel. É claro que existia e existe todo o mundo arturiano, mas este, por muito poderoso que seja, foi naturalizado de forma imperfeita, associado com o solo britânico mas não com a língua inglesa; e não substitui o que eu sentia estar faltando. Por um lado sua "faerie" [terra encantada] é demasiado opulenta, e fantástica, incoerente e repetitiva. Por outro lado, mais importante: está envolta, e explicitamente contém, a religião cristã.
Por razões que não elaborarei, isso me parece fatal. Mitos e contos de fadas, como toda arte, precisam refletir e conter em solução elementos de verdade (ou erro) moral e religiosa, mas não explicitamente, não na forma conhecida do mundo primário e "real".


Tolkien diz isso claramente, que em sua nova mitologia não gostaria desses elementos.

Abraços.
 
Salve amigos! Até onde pude acompanhar, mais uma dúvida está surgindo dentro deste tópico, a natureza divina de Eru. Que tipo de deus ele era, já que o Mestre Tolkien não queria criar qualquer analogia cristã em seus textos. Confesso que mitologia celta e escandinava eu conheço lhufas. Só posso arricar um palpite de que Ilúvatar seria um deus equivalente a Gaia ou Chronos. Mas é só uma hipótese.
 
Carta 131 disse:
Mitos e contos de fadas, como toda arte, precisam refletir e conter em solução elementos de verdade (ou erro) moral e religiosa, mas não explicitamente, não na forma conhecida do mundo primário e "real".

O problema de Tolkien não era que alguma obra contivesse valores religiosos, mas que eles fossem explícitos, como é com os contos arturianos e como aconteceu com seu amigo C.S.Lewis. Nestes o foco é, em muitas histórias, temas explicitamente cristãos, e isso para Tolkien tirava o valor de um "conto de fadas".

A obra de Tolkien é completamente cheia de valores notadamente cristãos (como o arrependimento, o perdão, a fé, a perseverança). A objeção que ele faz na carta 131 não é a isso, mas a que isso seja feito explicitamente, ou bem próximo disso. Quando o leão Aslan sacrifica a própria vida e então ressuscita, temos uma alegoria nítida para a morte e ressurreição de Cristo. Era isso que Tolkien não desejava em seus contos, e vale para quando perguntam se o sacrifício de Frodo era o sacrifício de Jesus, ou se a ressurreição de Gandalf era a ressurreição de Jesus.

Contudo, como lidamos com isso quando lemos que Tolkien chama Eru de "God", Melkor de "Satan", os Ainur de "Anjos", quando a rebelião de Melkor é chamada de "Queda de Anjos", temos referência à encarnação do Um no Athrabeth etc? Isso tudo não pode ser deixado de lado.
 

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