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Enquanto Agonizo (William Faulkner)

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Gigio disse:
Por isso continuo mantendo minha hipótese de que se há alguma crítica social no Faulkner, ela ocorre apenas indiretamente. E que ele tem lá o seu quê de Tolkien... XD

Putz, juro que tinha pensado no Tolkien quando escrevi o último post, até porque bastante do que falei nesse mesmo post foi um pouquinho do que discuti e defendi no meu TCC, que é justamente sobre O Senhor dos Anéis. Maneiro!

Acho que o motivo das nossas discordâncias não é tão grande assim, é questão de matizar melhor a forma como compreendemos o diálogo entre a realidade histórico que circunda o autor e a tradução dessa realidade (sob infinitas e complexas formas) em literatura. Acho que o que nos separa nesse sentido é o que existe entre dois momenta: o da percepção da realidade ou, para usar os termos do E.P. Thompson, a experiência histórica de Faulkner; e o da produção literária mais ou menos per se, como uma linguagem ou produção "independente".

Da realidade (me acho meio megalomaníaco usando esse termo, mas espero que entenda as limitações imbricadas no uso dessa palavra em relação a seu significado sem aspas) à ficção há muita coisa, de modo que a ficção ganhe uma autonomia relativa em relação ao solo histórico em que plantou suas raízes. A liberdade criativa existe e é uma bela armadilha para historiadores incautos, ao passo que faço minha mea culpa aqui: só li Enquanto Agonizo, não li outros livros do Faulkner e não conheço informações biográficas mais precisas nem detalhes mais específicos sobre a realidade histórico em que ele viveu, por isso a superficialidade de certas análises que aqui faço.

Existem um zilhão de outros fatores a serem considerados, e não vou listá-los aqui para não me tornar mais exaustivo do que já sou comumente. Então, mantenho a minha posição de que sim, havia crítica social em Enquanto Agonizo, entretanto, a forma como essa crítica era feita, que interesses serviam de leit motiv para Faulkner e seu "peso" em relação a outras dimensões da obra são fatores que precisam ser pesados quando da análise.

A obra pode conter crítica social (esse conceito, aliás, deveria ser refinado aqui na nossa discussão), mas definitivamente existiram outras preocupações na cabeça do Faulkner, como desenvolver novas formas de narrar, novas perspectivas para a literatura, uma renovação de velhas formas, o usufruto das liberdades criativas e das sensibilidades múltiplas com as quais um autor dialoga etc. etc. etc. Acho que o que não podemos é cair em monismos ou interpretações mecânicas, que digam que Enquanto Agonizo É ISSO ou É AQUILO.

Se o universo de feitura da obra está imerso em tamanha complexidade, qualquer discussão, análise ou inferência sobre a obra tem que estar apta a reconhecer e saber interpretar essa complexidade.

Talvez eu tenha exagerado no peso que dei a crítica social por estar imerso em um universo de interpretação bastante voltado ao Steinbeck, até porque minha pesquisa de Mestrado é sobre esse autor, mas são subjetividades que tem que ser levadas em conta. Um quinhão de Tolkien certamente o Faulkner tinha (embora essa associação seja um patcha anacronismo, XD ) e cabe a nós analisá-lo.

Ufa! Eu não consigo escrever pouco mesmo, foi mau.

Gigio disse:
E o que mais você tem descoberto sobre esses anos 20 e 30 do Sul??

Estive lendo várias bibliografias sobre os Estados Unidos na década de 20, e, fiquei abismado com a força que a Ku Klux Klan tinha no Sul do país (o livro diz que haviam de 4 a 5 milhões de membros, que contribuíam com dinheiro para a atuação do "movimento", que promovia queima de cruzes e assassinatos de negros frequentemente de acordo com registros da época). Embora a obra do Faulkner não toca na questão racismo diretamente (pelo menos não essa em específico) há de se considerar que essa mentalidade estava disseminada pela região, o que, por sua vez, pode alimentar preconceitos que se aproximam dessa discriminação e perseguição, até porque grande parte da população pobre dessa região era negra. O que a Toni Morrison escreveu em Amada, embora se refira ao ano 1873 ou a pós-abolição, mostra que o histórico de racismo e outros tipos de preconceitos eram realidades presentes nessa região.

Os estereótipos existentes nessa região tiveram grande crítica por parte de intelectuais, artistas e escritores dessa época, a antropologia, inclusive, que ganhara importantes contribuições com as obras de Franz Boas, teve participação ampla na descontrução de determinismos e reducionismos em relação às populações dessa região. [/align]
 
Terminei de ler Enquanto Agonizo agora e como ficou muita coisa na minha cabeça quis ver se encontrava algum tipo de “debate” na internet. Acabei achando esse fórum e não consegui resistir a responder esse tópico, mesmo que seja meio antigo e talvez não haja mais discussão.

A loucura do Darl é muito estranha, terminei o livro tendo a sensação de que o livro fosse sobre ele. O fato dele saber tudo que os outros não notam (li aqui algo sobre ele ter um tipo de telepatia, não tinha pensado nisso, mas é algo interessante), ele ter ficado louco ao longo do livro (no começo ele me pareceu bem objetivo) e de repente ter começado a falar como o Vardaman. Eu achei que tinha alguma coisa errada com o livro na tradução, que na verdade não era o Darl e sim o Vardaman, mas agora parece que é isso mesmo, ele começou a falar que a mãe é um peixe também, e a se referir a ele mesmo na terceira pessoa! A impressão dele ser o principal do livro pode ser também pela maioria dos capítulos serem narrativas dele, mas o que me interessou foi quando decidiram interná-lo para que não houvesse um processo. Pareceu irônico quando quiseram interná-lo, uma vez que o que ele queria fazer, queimar a mãe, parecia a única coisa lógica da história toda e eu acho que Cash também achava isso apesar de que “não há nada que justifique a destruição deliberada daquilo que um homem construiu com o seu suor e onde guardou o fruto do seu suor”.

E no final o Anse tem uma nova mulher é isso mesmo? Faulkner disse que o Anse não tinha conhecido a nova Mrs. Bundren antes de tudo, então o que ele quer transmitir é a facilidade de substituir Addie? E todo aquele “Deus sabe que eu faço tudo o que um homem pode fazer” era por uma dentadura?

Também fiquei com a impressão de uma certa solidariedade feminina. O capítulo da Addie é sensacional, dá quase pra sentir em você o quanto a vida dela é miserável, ou o quanto ela achava que era miserável, que ser mulher era simplesmente maternidade. O sofrimento da Dewey Dell por estar grávida, nossa senhora, aquele cara na farmácia, os dez dólares e as palavras do Lafe que ela fica repetindo “O Lafe disse que eu podia arranjá-lo na farmácia, deu-me dez dólares”, dá vontade de fazer alguma coisa mas nem você sabe o que poderia fazer para ajudá-la. Tudo isso somado com a facilidade de encontrar uma nova Mrs. Bundren parece muito uma tentativa deliberada de trazer a tona problemas feministas.

Isso tudo foi o que eu meio que interpretei até agora, porque com certeza vou ler esse livro de novo. O que ficou no ar é o porque do Cash saber, antes do famoso final “Está é a Mrs. Bundren”, que aquela era a casa da nova Mrs. Bundren, que existia uma Mrs. Bundren que não era sua mãe.

Sem dúvida é um livro triste, não teve salvação pra ninguém no final, a não ser para Anse. Se é que uma dentadura e uma nova Mrs. Bundren é salvação para ele.
 

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