Notícia velha falando do antigo Papa copta, Shenouda III e da situação dos cristãos árabes no Oriente Médio:
Os últimos anos de Shenouda III dão uma boa mostra das dificuldades e complexidades da situação política, cultural e religiosa do Oriente Médio. O Cristianismo oriental é tema pouco visível, mas é de capital importância para o futuro das sociedades e da convivência cultural e religiosa da região. E o fato que tem ficado cada vez mais patente mesmo para a grande mídia, é que a dicotomia ditadura-democracia não basta para explicar o processo pelo qual passa o Oriente Médio. As ditaduras seculares ou semi-seculares que caíram e estão em risco de cair não eram exatamente pró-cristãs ou defensoras ardorosas das minorias que existem em seus territórios; mas mantinham conflitos religiosos sob algum controle. As democracias populares que supostamente as sucederão são muito mais suscetíveis a surtos e movimentos fundamentalistas ou islamistas sem nenhum respeito por direitos e minorias tradicionais. Para se ter ideia do tipo de mentalidade que pode prevalecer, tenha-se em mente que o grão-mufti da Arábia Saudita afirmou recentemente, sem nenhum receio, que
“é necessário destruir todas as igrejas” da Península Árabica.
Papa Shenouda III faleceu em março desse ano
É por isso que autoridades cristãs, como o próprio Shenouda III, eram ou muito reticentes ou mesmo contrárias às revoltas populares (que, todavia, também uniram cristãos e muçulmanos jovens e esperançosos nas ruas). O patriarca Gregório III Laham (que é líder da Igreja Melquita, uma igreja bizantina árabe em comunhão com Roma, ou seja, parte integrante da Igreja Católica) vê na Síria de Assad, essa mesma que é capaz de brutalidades indizíveis contra manifestantes, um exemplo de convivência religiosa a ser imitado; ele pede que o Ocidente não ajude a mudar o regime, mas ajude o regime a mudar. O patriarca ortodoxo antioqueno é da mesma opinião.
Em certo sentido, a própria existência de cristãos árabes e orientais (que se dividem em quatro grandes grupos institucionais: católicos de vários ritos, ortodoxos, pré-calcedonianos como os coptas – também chamados de ortodoxos, o que às vezes gera confusão – e assírios) é uma refutação da tese do embate civilizacional entre árabes muçulmanos e ocidentais cristãos. Para os governos ocidentais, são um inconveniente, vítimas de violação de direitos por parte (ou pela negligência) de governos aliados, radicalmente contrários à presença estrangeira em seus países e apoiadores da causa palestina. Pelos islamistas, são pintados como uma verdadeira quinta coluna ocidental.
Bom, na MINHA opinião, o texto está muito exato ao relacionar a Primavera Árabe com um Inverno Cristão, porque se trata é de uma Primavera Islâmica mesmo e isso só vai redobrar as perseguições contra os coptas no Egito assim como ocorrerá (e já ocorre) com os cristãos ortodoxos antioquinos e siríacos na Síria (assim como os coptas, os siríacos são não-calcedonianos). Ou seja, por mais que ecumenistas, pacifistas e outros palhaços bradem aqui e acolá, o Islã fundamentalista (cá entre nós, o Islã de forma geral) está cagando pros cristãos. Onde eles puderem se instalar como tradição religiosa e força política, irão criar mais e mais mártires. É com isso que me preocupo.
Mas certas coisas são animadoras:
A política externa particular dos ortodoxos russos
Ellen Barry Do New York Times - O Globo
MOSCOU — Enquanto o Ocidente busca pressionar o Kremlin para ajudar a parar os massacres na Síria, diplomatas de Damasco foram conduzidos ao coração de um dos principais santuários da ortodoxia russa. Em exibição dedicada ao cristianismo sírio numa catedral perto do Kremlin, eles se solidarizaram com uma ansiedade compartilhada: o que aconteceria se Bashar al-Assad fosse deposto?
Está claro que o governo russo é contrário à intervenção na Síria, parceiro de longa data e última base de apoio no Oriente Médio. Menos conhecida é a posição da Igreja Ortodoxa Russa, que teme que as minorias cristãs sejam varridas por uma onda de fundamentalismo islâmico desencadeada pela Primavera Árabe. Este argumento atingiu o auge na Síria, cuja população minoritária de cristãos, de cerca de 10%, tem sido relutante em se juntar à oposição sunita muçulmana contra Assad, temendo a perseguição.
— Alguém disse alguma vez que George Soros era o único cidadão americano que tem sua própria política externa — disse Andrei Zolotov Jr., um dos principais escritores sobre religião e editor-chefe do “Russia Profile”. — Bom, o patriarcado de Moscou é a única entidade russa com sua própria política externa.
Antes das eleições, Vladimir Putin buscou o apoio dos líderes religiosos russos, prometendo dezenas de milhões de dólares para reconstrução de locais de adoração e financiamento estatal para escolas religiosas. Mas o metropolita (arcebispo) Hilarion de Volokolamsk não pediu dinheiro, e sim que Putin prometesse proteger as minorias cristãs no Oriente Médio.
— Então assim será — disse Putin. — Não há dúvida quanto a isso.
O pedido foi um dos que mergulharam profundamente na geopolítica, já que as minorias cristãs estão alinhadas com diversos governos que enfrentaram levantes populares. A tensão era aparente ao redor da visita do patriarca Kirill a Damasco no fim do ano passado. Na época, as Nações Unidas estimavam que 3.500 pessoas tinham sido mortas enquanto as forças do governo tentavam suprimir o levante, e a Liga Árabe havia suspendido a Síria em uma tentativa de aumentar a pressão diplomática.
O metropolita Hilarion de Volokolamsk disse que “alguns analistas tentaram dissuadir o patriarca da visita, dizendo que há desordem na Síria, que o regime Assad está isolado internacionalmente e sob grande pressão”. Ele afirma que “qualquer interpretação da visita do patriarca à Síria como apoio ao regime de Assad é totalmente infundada”. Ainda assim, fotos da procissão do patriarca pelas ruas ao lado de sua contraparte síria mostravam pessoas carregando mastros com o retrato de Assad.
O reverendo Nikolai Balashov, vice-presidente do Conselho do Departamento de Relações Exteriores do Patriarcado de Moscou, disse que a turbulência no Oriente Médio tornou mais importante o envolvimento da igreja:
— Formar uma política externa sem levar em conta o fator religioso pode levar a uma catástrofe e à morte de milhares e milhões.