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Demian (Herman Hesse)

Pips

Old School.
[align=right]"A ave sai do ovo. O ovo é o mundo. Quem quiser nascer tem que destruir um mundo. A ave voa para Deus. E o deus se chama Abraxas."
[/align]
Como pagamento de uma dívida, uma amiga minha prometeu devolver o valor restante em livros. Quando disse que os livros estavam em mãos, comentei algo sobre Demian e ela, atônita, perguntou se eu o havia lido. Consenti que sim e logo veio o questionamento se eu queria o livro apenas para ter. Refleti por alguns instantes e tentei perceber se realmente era verdade, se eu o leria outra vez. A resposta veio em menos de uma semana (sem aquela obrigação de prazo para devolver), reli o livro com grato prazer.

Essa obra de Hermann Hesse constitui, de acordo com muitos, numa trilogia que acompanha três fases da vida de um ser humano: Sidarta como a busca espiritual (ou a infância), O Lobo da Estepe como o confronto da velhice e Demian como o descobrimento de si mesmo através da rebelião as convenções morais e familiares.

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RE: Demian

Bem Pips, Hermann Hesse!
Uma beleza de sintonia!

Parece, hoje, que todos querem realizar os desejos, todos eles e principalmente os mais imediatos. Certos elementos temperados pelo fogo criam resistência, ou poderia dizer que, resistir ao fogo de seus impulsos, cria bons elementos.

Tenho uma sincera preocupação com nossos moços. Carecem de bons exemplos e também de acesso a informações de qualidade.

As mulheres perderam a fé em seus homens, nas instituições de seus homens e as expectativas sobre seus homens e resolveram ser, ao mesmo tempo, um bom homem e uma boa mulher. Estou generalizando, é claro. Mas, se você observar com atenção, verá que destruímos o exército, destruímos a polícia, destruímos os políticos e a imprensa é feminina e loura (termo pejorativo, sinônimo de ignorante), ou seja, fofoqueira e busca a glória de seus 15 segundos.

Eu não gosto que seja assim, mas se não pudermos conceber homens de fibra, que resistam aos seus desejos primários, que permitam que sua energia chegue ao topo de seu esqueleto, ou seja, o cérebro e o ilumine, ...

Tive a felicidade de conhecer excelentes homens. Sei que tive um privilégio que alguns não tiveram e acho que devo a esses homens, no mínimo um olhar atento para a descendência e seu rumo.

Muitas mulheres, criaram seus filhos respeitando o feminino(observação/criatividade/sensilibidade/etc.) e muitas não souberam como fazê-lo, a esses resta que sejam pescados por alguma leitura que os faça vislumbrar um caminho de crescimento pessoal, ou, alguém que lhes indique caminhos. Um desses livros você acaba de apresentar e acresce a favor do leitor, um homem o indicou.

Um post ótimo. Hoje estou grata Pips e diria que vaidosa por conhecer você um pouco melhor.
 
RE: Demian

li o lobo da estepe primeiro. um excelente livro. semana passada li demian e pretendo ler sidarta em breve.

não gostei de demian. as personagens são muito anti-sociais e ainda se vangloriam por isso. não que eu não goste de histórias de gente excêntrica e solitária, mas o sinclair é um cara muito chato.

hesse não parecia conhecer muito bem o universo feminino quando escreveu esse livro. por mim, sinclair sabia tanto de mulheres quanto nietzche. ou menos
 
RE: Demian

Eu adorei Demian. Acho que os personagens são anti sociais porque o livro traz ideias introspectivas, de auto conhecimento (sem ser auto ajuda), mas que nos faz problematizar sobre práticas. Eu identifiquei logo de cara e queria achar um Demian para me guiar para dentro de mim, ou o Demian sou eu? Qual será o segredo de Tostines rsrsrs
 
RE: Demian

A prática do bullying? Ou de como se arrepender de passar o tempo de estudos se autodestruindo com álcool e nem mesmo se divertir com isso?

Depois li Sidarta. Sidarta pelo menos teve uma fase carnal plena.

Agora traço um paralelo. Sinclair está para o fogo do jeito que Sidarta está para a água. Pelo menos em relação à contemplação.
 
[align=justify]Li Demian semana passada e preciso discutir ele com alguém.

Pode ser que tenha coincidido com um momento específico da minha vida, ou talvez seja o fato de eu ter pego o livro com poucas pretensões, mas achei o livro sensacional, de um humanismo absurdamente esplendoroso.

Já vi gente dizer que acha Hesse auto-ajuda barata, mas discordo veementemente disso, ainda mais se considerarmos o tempo em que ele escreveu Demian e a força das idéias contidas no livro. Creio que o humanismo que ele propala, principalmente através do que ele chama de "sinal de Caim" e pela exortação da potencialidade da vontade humana, não seja tão raso quanto as "receitas prontas" que vemos pelas estantes de auto-ajuda da vida.

Hesse consegue estender um olhar para o futuro, construindo uma elegia a potencialidade humana e enfatizando a necessidade de evoluir, de crescer, de fazer romper a casca do ovo; mas apoiando-se no passado, coisa que a mentalidade "pra frentex" (passado é coisa de museu e brabeiras adjacentes) dos gurus da auto-ajuda aceita e propugna. É no passado que devemos nos apoiar, extraindo dele o que é necessário para nos tornarmos qualitativamente melhores e mais capazes.

O rito de passagem de Sinclair vai além da transição infância-vida adulta, é um processo de complexificação da consciência e de tomada de atitude em relação a sua existência, para fazer-se util ao mundo e a humanidade. Sinclair não só deixa o status de infante como também torna-se humano no sentido lato da palavra.

Putz, tomara que mais alguém resolva juntar-se a mim nessa ressureição de tópico, porque esse livro merece ser discutido mais ainda.[/align]
 
O humanismo de Demian e Sinclair estão em seus defeitos. Eles são muito "metidinhos" e desprezam a vida cotidiana saudável. E ainda são muito frescos. Pode ser que eu esteja sendo muito imparcial, afinal, O Lobo da Estepe é um dos meus livros preferidos, é o cão chupando manga.

O começo fala sobre a infância de Sinclair, um muleque mimado que rouba dos pais porque não sabe bater nem apanhar, ou procurar uma solução mais inteligente. Pelo menos aí o Demian se sobressai. Mas, pô, por hipnose manipulação a la Paulo Coelho "Quando você quer alguma coisa, todo o Universo conspira para que você realize seu desejo"?! Fala sério.

A fase carnal do Sinclair é chinfrim. Alcóolatra deprimido metido a besta afogador de mágoas. Nem sabe se divertir. E ainda faz pose de triste porque acha que esse é seu charme. Mas teve o Pistorius. O Pistorius me agradou porque ele é um tanto insano. Também era introspectivo e anti-social como Sinclair, mas pelo menos ele estudava, praticava suas crenças e ainda fazia música. Não era autodestrutivo filhinho da mamãe E as histórias sobre Abraxas são muito interessantes. Por mim, puro maniqueísmo (ou não, porque em Abraxas os opostos são misturados, não água e óleo). Mas eu não sou expert em misticismo nem história pra extrair muito de Abraxas.

E o final. Ponto final. A Primeira Guerra Mundial realmente detonou com o espírito do mundo. Um trauma da humanidade.
 
[align=justify]Pois é, Luís, essa parte do Universo conspirando para você conseguir foi forçadíssimo, soou como auto-ajuda mesmo, tenho que admitir que também fiquei temeroso ao ler essa parte. Mas ainda penso que o Hesse tem alguns fatores que "conspiram" a seu favor nesse ponto em específico (lá vamos nós para a falta de capacidade de síntese do Lucas_Deschain):

a) o fato de ele ter escrito isso como um romance de formação (o famoso buildings roman): a entrada na maturidade, a transição, os ritos de passagem que a formação de Sinclair perpassa são reflexo da experiência individual de Hesse, são reflexos da própria formação dele mesmo. Isso não invalida a universalidade da obra, não só porque todos passam por isso (bom, nem todos se compreendermos maturação no sentido lato do termo), mas também porque a Alemanha vivia um período intrincadíssimo, já que era acusada de culpada da Primeira Guerra Mundial, vivia um derrotismo e encontrava-se imersa em uma mentalidade que havia condenado o país a um conflito de proporções mundiais. Demian, a meu ver, representa um esforço louvável para desvencilhar-se dessa mentalidade e construir a base de uma nova concepção a respeito da realidade. Quebrar o ovo para fazer nascer o pássaro é a metáfora disso, tanto para a questão nacional quanto para o âmbito pessoal/individual;

b) essa coisa de "acreditar na vontade" e "universo conspirando a seu favor" soa como auto-ajuda, mas, apesar de minhas ressalvas quanto a isso, venho aqui em defesa do Hesse. Creio que o que ele quis fazer aí foi justamente exortar a humanidade a mudar de atitude e usar de toda a potencialidade de sua vontade e de seus atos para evitar a todo o custo que uma tragédia como a Primeira Guerra Mundial voltasse a acontecer. Para fazer isso a humanidade teria que romper suas concepções até então estabelecidas e evoluir qualitativamente para um novo modo de pensar, uma nova mentalidade, onde a guerra fosse vista como execrável;

E aí, Rodovalho, consegui mudar sua opinião? XD (se não, ainda tenho alguns argumentos a tiracolo aqui)[/align]
 
a) O livro foi escrito em 1919 e, pelo que deduzi, a história se passa antes da Primeira Guerra e termina com o começo dela. Hesse estava vivenciando esse clima de derrotismo, mas a história se passa no pré-guerra, e, exceto pelo final, pouca coisa se mostra relacionada a ela. A história não é sobre a mentalidade de um povo, é mais sobre o indivíduo e auto-conhecimento. Talvez o conceito de Abraxas, misturando o bem e o mal, possa ter alguma relação com aceitar os efeitos destrutivos da guerra e seguir em frente, e ainda assim é muita extrapolação. E pior: faz tempo que li o livro, mas Demian se enlista e vai pra guerra! Isso pra mim é personalidade de Hemingway. Nada de mentalidade guerra execrável. A menos que Demian tenha ido pra guerra como um agitador sabotador.

b) Hmmm... o Demian olha no chantagista mirím nos olhos e convence ele a parar de ganhar uma fortuna. Só com a força do pensamento faz que Sinclar seja realocado pelo professor a se sentar perto dele. Isso pra mim é paranormalidade de entortar colheres com a força do pensamento. Nada a ver com ajudar o homem a se tornar o super homem com cueca em cima das calças.

Recomendo O Lobo da Estepe. Esse sim criticava esse gosto nacionalista alemão pra ir pra guerra e matar e se matar por nada.
 
Luis, a graça é justamente os dois serem "metidinhos", é um romance de formação. Você precisa crer no mundo perfeito para ele ser destruído.

Sinclair não sabe se divertir porque ele não foi criado daquela maneira, ele simplesmente foi jogado ao mundo assim como Demian abdicou do seu. É tudo uma alegoria sobre crescimento. Você não deve levar as "idades" em consideração, é uma mistura de sonhos e realidade. Demian é sobre a infância e adolescência, só que de maneira figurada. Assim como Sinclair faz alusões a bíblia, etc.
 
[align=justify]Putz, Rodovalho, tu me deixou encucadaço agora.

Até peguei o livro para dar uma olhada e a guerra da qual o Demian participa no final do livro só pode ser a Primeira Guerra Mundial, e eu passei batido por ela! :vergonha: É que ele só fala que "nossa situação com a Rússia não está nada boa" ou algo parecido, nem liguei nada, ainda mais sabendo que o livro foi escrito em 1919.

Enfim, sob a luz das novas circusntâncias, tive que reler o último capítulo e ter uma visão mais geral sobre tudo. Um dos pontos que penso que devemos discutir (hehehe, lá vamos nós de novo):

Sobre o fato de Hesse ter talvez tido uma visão positiva da guerra: meu maior medo foi esse, pensei que Hesse tinha sido um entusiasta do conflito, o que certamente ia mudar minha visão sobre ele. Nesse ínterim pensei o seguinte:

1. Hesse, conforme está lá no último capítulo, entendeu a guerra como o catalisador de forças que proporcionaria a guinada rumo a uma nova concepção de mundo e consequentemente de uma nova realidade, ou seja, a guerra foi o fator que causou a quebra da casca do ovo. Ele não foi favorável a guerra, mas viu-a, usando suas próprias palavras, como parte do destino, naquela linha meio mística que o Demian adorava usar;
2. essa visão dele sobre a guerra é no mínimo questionável, paira longe da realidade concreta, pois enxerga ela de um ponto de vista místico, semi-transcendetal, como um rito de passagem da humanidade a um novo mundo. Com isso, ele a interpreta longe da realidade material, em que o conflito aparece como consequência direta do choque dos imperialismos e toda aquela parada que já estudamos. Ou seja, ele deixa passar o cerne do conflito, enxergando-o como uma situação-limite pela qual a humanidade passava, horroroso sim, mas de certa forma "inevitável";

Resumo da Ópera (definitivamente não-definitivo, passível de crítica e discordância) e minhas opiniões: tendo escrito Demian pós-Primeira Guerra Mundial, Hesse construiu uma visão particular do conflito, onde não entravam as interpretações sobre as razões materiais, políticas, diplomáticas, econômicas etc. do evento, mas sim o peso que ele teve para a humanidade enquanto experiência histórica dramática que constitui momento sui generis para uma possível transformação, tanto em sua consciência quanto em sua existência.

Não se pode negar que ele mistifique um tanto o conflito que pela primeira vez levou o complemento "mundial", entendendo como algo fatalista; mas Hesse o faz buscando extrair dessa experiência uma lição para a humanidade, para que ela se torne melhor, que mude os rumos pelos quais caminha. Essa visão pragmática da guerra incomoda sim (minha visão do livro já mudou um bocado, hehe), mas não deixa de ter certo sentido, já que, dentro da lógica "hessiana", ela constitui momento determinante para uma nova etapa, o rompimento com uma tradição passada cujo resultado foi a tragédia da Primeira Guerra Mundial.

...[/align]
 
[align=justify]Estava olhando o prefácio da edição de Sidarta, que na verdade é o discurso de atribuição do Nobel para o Hesse em 1946, proferido pelo Dr. Kjell Strömberg; da Coleção Biblioteca dos Prêmios Nobel de Literatura e achei um trecho bem interessante, palavras do próprio Hesse, e fiquei pensando sobre a questão da visão que ele fazia da guerra que comentei no post anterior:

Ele declarou-se partidário da "idéia de supranacionalidade e da internacionalidade do espírito e do seu engajamento a servir não à guerra e suas destituições mas à paz e à reconciliação entre os povos." (p. 13)

O que entendo é que a visão da guerra em Demian é a de desaprovação, mas vista como uma espécie de fatalidade, da qual, tendo já ela terminado (o livro é de 1919), deveria-se ser extraída a lição para uma nova realidade, para uma nova etapa da civilização ocidental, na qual a Alemanha faria também parte, como fica patente no seguinte trecho, retirado da mesma página: "Para o laureado do ano, o Prêmio que acabava de lhe ser conferido significava menos uma homenagem pessoal que um reconhecimento do papel que podia representar ainda a contribuição alemã à civilização comum, ou melhor: um gesto de apaziguamento suscetível de reabrir a todos os povos do mundo o caminho para uma cooperação espiritual..."

Enfim, isso esclarece um pouco a visão de Hesse acerca da guerra e ajuda a compreender Demian como a narrativa de um rito de passagem. Fiquei pensando agora: a Primeira Guerra Mundial representou para Hesse uma espécie de doloroso rito de passagem para a humanidade?[/align]
 
Demian não me pareceu alguém que teria uma visão positiva ou negativa de qualquer coisa porque ele era absolutamente imparcial. O que me intriga é que para alguém que conseguia influenciar as pessoas a satisfazerem seus desejos com tanta facilidade fizesse parte de um grupo de pessoas impotente diante da guerra. Essa guerra inevitável. Uso o assassinato do arquiduque Franz Ferdinand como argumento a favor do pacifismo. Mas isso não significa que sem o assassinato a guerra seria evitada. As potências européias estavam armadas até os dentes, prontas para brigar, só precisavam de uma desculpa para se jogar umas as outras. Sem o assassinato, outro acontecimento detonaria a guerra.

O misticismo pode se mostrar bem nocivo quando se despreza ao extremo o mundo material. Essa face do misticismo é o fatalismo e tem muitas origens, seja acreditar num destino inevitável ou numa outra vida, sem se preocupar com a vida atual. Será que Hesse viu como lado positivo da guerra o fato dela ser mundial? Ainda prefiro um mundo sem guerras do que a criação das Nações Unidas. Quanto ao Prêmio Nobel, seria uma tentativa de apaziguar os ânimos dos escritores laureando um alemão?
 
[align=justify]Boas questões Rodovalho.

Primeiramente não entendi o que você quis dizer quando disse que Demian é imparcial. Imparcial em que sentido? Em relação a guerra? em relação aos sem o "sinal de Caim" (a quem ele chega a se referir como "rebanho")?

O misticismo (não sei se esse é o termo correto, mas vamos usando-o com reservas até encontrarmos outro mais adequado) é certamente nocivo quando se despreza os aspectos materiais. Não sei dizer se Hesse ignorava isso ou se simplesmente quis deixá-los fora de sua obra (ambas são opções plausíveis), creio que sabendo mais de sua vida e lendo suas outras obras possamos talvez ter uma idéia mais concreta a esse respeito.

De minha parte penso que não era o intuito dele reconhecer as causas econômicas e políticas do período, mas sim explorar as consequências do conflito para a humanidade a nível espiritual, digamos assim; quais seriam as consequências do conflito para a humanidade enquanto uma reunião de seres da mesma espécie e que defendem um tipo de civilização onde a idéia de guerra está presente e sendo levada a cabo. Creio que as questões que ele toca em Demian se referem mais a consciência do que a organização da sociedade materialmente falando. É óbvio que essa visão deixa lacunas, mas elas foram abandonadas não por ignorância de sua existência, mas sim porque o autor procurou interrogar-se a partir de outro prisma.

Será que Hesse viu como lado positivo da guerra o fato dela ser mundial?

O Hesse não via com bons olhos a guerra, não a defendia, embora tenha chegado a se alistar. O artigo "Ó companheiros, não esses acordes" (em tradução livre e meio capenga) é tido como uma crítica de Hesse à guerra e a conclamação aos intelectuais germânicos em não se matarem pelo patriotismo. (Fonte: Wikipedia), ou seja, sua visão a respeito do conflito era a de não-apoio e repúdio.

O que vejo como sendo a causa de Demian ser do jeito que é, é justamente a concepção de fatalidade da guerra que o autor tem, ele não a questiona enquanto resultado da ação humana, mas como parte de um destino inexorável (talvez não tão radicalmente assim). Aceitando a impossibilidade de voltar no tempo para evitar a guerra, ele ocupou-se em defender uma nova consciência da civilização onde a guerra não voltasse a acontecer.

Quanto ao Prêmio Nobel, seria uma tentativa de apaziguar os ânimos dos escritores laureando um alemão?

Creio que vendo a grosso modo sim. É um reconhecimento de que a Alemanha não deveria ser excluída da civilização ocidental, com a qual ainda poderia muito contribuir, apesar das atrocidades que Hitler protagonizou e comandou. Entra naquele post anterior meu, no qual a congregação espiritual dos povos seria o resultado da premiação de Hesse.

Acho que isso tenha talvez a ver com o reconhecimento por parte da Academia Sueca de que os alemães não são naturalmente nazistas e de que a Alemanha não é nazista por natureza, ou seja, ela faz parte da civilização e não podemos condenar os que lá vivem e as gerações posteriores por um erro do qual não são partidários. Além do mais, o Hesse foi proibido durante o Terceiro Reich por ser considerado não-nacionalista ou não-patriótico ou não-favorável ao governo nazista, premiá-lo era endossar suas críticas a esse período nefasto da História da humanidade e a necessidade de não esquecer tais acontecimentos.[/align]
 
Ontem, ocorreu um caso pitoresco. Estava em um sebo, garimpando alguns livros com um amigo meu, quando um outro cliente viu que esse meu amigo tinha separado um livro do Herman Hesse. Ele, então, elogiou o autor e disse que uma frase em Demian tinha mudado sua visão de mundo, quando ainda era jovem. Não sei repetir, exatamente, mas era algo sobre a necessidade de esquecer parcialmente o passado para poder mudar o futuro.

Definitivamente, vendo tantas recomendações de peso, vou colocar Demian na minha lista futura de leituras.
 
[align=justify]Putz, Tatarana, será que ele não estava enganado? O que o Demian fala é que o passado nos dá fôlego para mudar o presente e consequentemente arquitetar o futuro. Pensando bem, acho que faz sentido sim, porque Demian vem justamente quebrar com as tradições obtusas que permeavam a Alemanha e ditavam suas políticas, esquecer parcialmente equivale a selecionar o que de melhor pode haver para continuar seguindo no presente e preparando o porvir.

É por isso que acho que Demian daria um ótimo título para o Clube da Leitura.

Obs.: Estou há vários dias tentando escrever uma resenha decente para o Demian, mas tem muita coisa para dizer e parece que cada vez está mais difícil, ainda mais com uma discussão tão rica como essa que estamos tendo aqui.[/align]
 
Demian é definitivamente um livro que indico veementemente a todos e que possui uma sensibilidade humanista para tratar de intricadas questões concernentes ao processo de amadurecimento e do “tornar-se humano” que considero prolíficas para compreender-se enquanto criatura bem como para inspirar qualquer um que tenha sido afetado pelo mistério que ronda a espécie humana e sua caminhada histórica.

Tenho que confessar que Demian foi uma das leituras mais prolíficas que já fiz. Quando terminei de ler pensei comigo mesmo que esse livro geraria ótimas discussões em um Clube da Leitura, pois congrega fatores dos mais diversos que permitem aborda-lo de maneiras diversos, a partir de vários âmbitos e através de vários aspectos. Não que isso seja exclusividade dele (seria tolice pensar tal coisa), mas talvez seja aquela coisa da qual a Anica costuma falar: há um momento certo para que se leia um clássico (Demian, aliás, nem é tão clássico assim), creio que era meu momento de ler Demian.

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No pórtico da casa de Sinclair há um brasão que retrata uma ave, essa ave serve de metáfora para que Demian faça despertar em Sinclair a compreensão de que para que a ave possa voar, é preciso que a casca do ovo se rompa, ou, para que Sinclair se torne um adulto no sentido lato do termo é preciso romper com os moralismos e convenções a que está preso, é preciso que ele extravase a esfera do mundo infantil para que possa, pleno e consciente, adentrar nos domínios do mundo adulto e da sociedade humana como um todo.

Contudo, o bildungsroman aparece não somente a nível individual, representando a situação de Sinclair, mas também, em âmbito mais abrangente, a situação da humanidade a nível espiritual. A Guerra foi um evento que dilacerou as gerações posteriores por destruir um mundo e lançar as bases de outro. A guerra, usando a metáfora de Demian, rompeu a casca do ovo para despertar para um novo momento para a humanidade, e Hesse coloca-se então como entusiasta e esperançoso desse mundo, que, viria a ser trucidado novamente com a Segunda Guerra Mundial.

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Confira a primeira e a segunda partes antes de iniciar a leitura dessa resenha.

A constatação parece ser um dos principais pontos em que Demian insiste em fazer Sinclair compreender. Nesse mundo marcado por um quase culto a vida regrada, demarcada e praticamente ditada por convenções, moralismos e planejamentos racionais previsíveis e constantes; a transição sofrida, adversa e plena de obstáculos, renúncias e profundas reflexões aparece como processo desequilibrador, que atenta contra concepções automatizadas e faz o ser humano abrir sua mente para uma nova realidade, uma nova forma de enxergar o mundo, uma nova forma de com ele relacionar-se.

Não à toa, portanto, que Hesse tenha escrito Sidarta. Imaginem qual não deve ter sido a sensação do autor ao entrar em contato com a filosofia e a sabedoria indianas. O reconhecimento de um elo espiritual que une a todos os seres humanos, que os faz serem mais do que seres mortais feitos de carne, mas criaturas cujo invólucro carnal é apenas a parte mortal, já que o espírito e as marcas que deixamos na História, essas nos garantem a eternidade.

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[align=justify]Há um momento na obra em que Demian diz que nada pode impedir alguém quando sua vontade é levada a cabo. Esse trecho parece soar como simplista e dependendo do leitor até como auto-ajuda barata. Mas creio que essa exortação da vontade constitui no esforço compreensível de mostrar que os rumos que a humanidade percorriam eram passíveis de mudança, não eram naturais, arraigados ao DNA humano, mas sim construções sócio-históricas, que poderiam ser transformadas pelas mãos humanas.

Vale lembrar que mesmo passando-se na véspera da Primeira Guerra Mundial, o livro foi escrito quando as pilha de escombros ainda se avolumavam pela Europa. O fantasmagórico limiar a que a humanidade tinha chegado com o conflito de proporções nunca vistas até então (ainda mais sendo Hesse alemão e vivenciando a situação adversa e desconfortável de culpabilidade que foi imputada a Alemanha no pós-guerra) mobilizou a escrita de Hesse, que fez dela uso para reforçar essa questão.[/align]

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