O julgamento do ex-presidente iraquiano Saddam Hussein começou hoje em Bagdá. Saddam se declarou inocente dos crimes contra a humanidade de que é acusado. Questionado pelo juiz que preside o caso, Saddam apenas respondeu "não-culpado". Os outros sete réus na corte também se declararam inocentes.
Já no início do processo, Saddam discutiu com o presidente do tribunal, que pedia que ele dissesse seu nome, documento de identidade e ocupação. Saddam recusou-se a fazer sua apresentação dizendo que era "presidente do Iraque". "Não reconheço nem você nem o tribunal que você preside", disse ele.
"Também não reconheço a agressão contra o Iraque e conservo meu direito constitucional como presidente do Iraque de não responder suas perguntas, pois o que foi construído sobre o vazio está vazio", acrescentou. Além disso, rejeitou as ordens do presidente do tribunal de voltar a se sentar para dar passagens aos outros acusados.
Saddam Hussein é o único dos oito acusados que veste terno e tem uma grande barba, mas sua atitude parece muito mais desafiadora que a dos outros acusados, sete altos funcionários de seu regime. O processo contra Saddam Hussein começou às 12h24 hora local (7h24 de Brasília) dentro da Zona Verde, no centro de Bagdá, em um edifício que serviu de quartel-general do partido Baath.
A equipe de cinco juízes do tribunal é presidida pelo magistrado curdo Razgar Mohammed Amin, procedente de Suleimaniya.
Entre os sete colaboradores de Saddam estão seu vice-presidente, Taha Yassin Ramadã, e seu meio-irmão, Barazan Ibrahim al Hassan al-Tikriti, que era também responsável dos serviços de inteligência. Todos eles são acusados do assassinato de 143 xiitas após o atentado fracassado contra o antigo presidente ocorrido em Duyail, ao norte de Bagdá, em julho de 1982.
A defesa de Saddam quer adiar o caso para ter mais tempo de preparo e afirma também que o tribunal, criado durante a ocupação norte-americana em 2003, é ilegítimo. Sadadm, que foi capturado há dois escondido em um buraco, compareceu em meio a um esquema de segurança sem precedentes, mesmo para um país em guerra.
Premier iraquiano assiste ao julgamento
Líderes iraquianos estavam na corte, incluindo o vice-primeiro-ministro Ahmad Chalabi e o vice-presidente do Parlamento, Hussain al-Shahristani, cientista nuclear preso por ter se recusado a trabalhar no programa de armas de Saddam. Ambos são da maioria xiita, oprimida por Saddam, mas que agora está no poder sob proteção dos EUA. "É muito importante que a justiça seja feita e seja visto que foi feita", disse Chalabi.
O governo do Iraque, liderado por inimigos de Saddam e que busca popularidade antes das eleições de dezembro, espera que o julgamento anime a população diante da insurgência, dois anos e meio depois do início da guerra.
Grupos de defesa dos direitos humanos manifestaram preocupação com a possibilidade de uma "justiça do vencedor" e advertiram que o julgamento precisa ser justo e parecer justo. Os olhos no mundo estarão voltados para o julgamento para ver Saddam e para determinar se a nova liderança do Iraque conseguirá julgar o ex-ditador deposto de maneira correta.
Pena de morte
Se for considerado culpado, Saddam pode enfrentar sentença de morte por enforcamento e, de acordo com os estatutos do tribunal, qualquer sentença precisa ser executada dentro de 30 dias depois que todas as apelações forem esgotadas. Isso significa que Saddam poderia ser executado antes de ser julgado por outros crimes, como genocídio.
Fontes próximas do tribunal dizem que a sessão poderá ser adiada para que os juízes, parcialmente treinados na Grã-Bretanha no ano passado, possam estudar as moções da defesa. Saddam, 68 anos, não pode falar, a não ser confirmar seu nome quando as acusações forem lidas.
Defesa pede adiamento
Khalil al-Dulaimi, principal advogado de Saddam, disse que o cliente estava calmo e confiante de sua inocência. Dulaimi, que tem pouca experiência em casos grandes, como este envolvendo alegações de crime contra a humanidade, afirmou que pretende desafiar a legitimidade da corte.
A equipe de defesa disse que vai apresentar um dossiê de 122 pontos para mostrar que a corte, estabelecida pelos norte-americanos, não tem jurisdição sobre Saddam e é ilegal. Ele também vai pedir mais tempo para estudar as mais de 800 páginas de evidências coletadas nos últimos dois anos e que a defesa só recebeu 45 dias atrás. Ele também pode argumentar que Saddam tem imunidade presidencial.
As acusações são relativas a eventos ocorridos em 8 de julho de 1982, quando um grupo de jovens ligados ao Partido xiita Dawa tentou assassinar Saddam em seu comboio blindado em Dujail, cidade a 60 km norte de Bagdá. Em retaliação, Saddam, segundo os promotores, mandou caçar, torturar e matar dezenas de homens da cidade durante anos. Homens e mulheres também teriam sido removidos à força de Dujail, levados à prisão de Abu Ghraib e mandados para um campo de internamento no deserto, perto da fronteira com a Arábia Saudita, onde muitos "desapareceram". Helicópteros e tanques demoliram partes da cidade, fazendas e plantações.
