• Caro Visitante, por que não gastar alguns segundos e criar uma Conta no Fórum Valinor? Desta forma, além de não ver este aviso novamente, poderá participar de nossa comunidade, inserir suas opiniões e sugestões, fazendo parte deste que é um maiores Fóruns de Discussão do Brasil! Aproveite e cadastre-se já!

Contos de até 100 caracteres, pré-Twitter-age

Haleth

Sweet dreams
Bem, como diria Salomão, não há nada de novo debaixo do sol, né? rsrs...

Matéria de Car*los Wil*li*an Lei*te | car*loswil*li*an@uol.com.br

Embora não seja reconhecido como um gênero literário — sendo associado às tendências de vanguarda e ao minimalismo —, os “microcontos” ganharam um grande número de adeptos nas duas últimas décadas. A partir do início dos anos 1990, estudos e antologias começaram a abordar o tema de forma enfática, resultando em centenas de publicações em todo o mundo.

Ainda que pareça, as micronarrativas de ficção não são algo recente. Grandes nomes da literatura mundial como Tolstói, Jorge Luis Borges, Bioy Casares, Julio Cortázar e Ernest Hemingway já incursionaram pelo tema. O escritor guatemalteco Augusto Monterroso, que morreu em 2003, é tido como um dos fundadores do “gênero” com o conto “O Dinossauro”, escrito com apenas trinta e sete letras e considerado o menor da literatura mundial, na época: “Quando acordou o dinossauro ainda estava lá.” O norte-americano Ernest Hemingway também é o autor de outro famoso microconto, com apenas vinte e seis letras: “Vende-se: sapatinhos de bebê nunca usados.” No Brasil, o pioneiro foi o escritor Dalton Trevisan, com o livro “Ah, é?”, de 1994. Mesmo não havendo nenhuma regra clara, uma das definições para o microconto seria o limite de 150 caracteres, incluindo espaços.

Para esta edição, reuni 30 microntos de autores brasileiros e estrangeiros, extraídos dos livros “Not Quite What I Was Planning”, “It All Changed in an Instant” e “Os Cem Menores Contos Brasileiros do Século”, além do jornal “Observer”, e do suplemento literário “Babelia”, do jornal “El País”.


“Sem crédito no vale-teletransporte, esperou pela recarga em planeta inóspito.”
(Alexandre Rosas)

“Olha, Pai, eu tentei, mas acho que não deu muito certo não...”
(Antônio Prata)

“Um homem, em Monte Carlo, vai ao cassino, ganha um milhão, volta para casa, se suicida.”
(Anton Tchekhov)

“Quando acordou o dinossauro ainda estava lá.”
(Augusto Monterroso)

“70 anos, algumas lágrimas, orelhas peludas.”
(Bill Querengesser)

“O suicida era tão meticuloso que teve que refazer diversas vezes o nó da corda para se enforcar.”
(Carlos Seabra)

“Uma vida inteira pela frente. O tiro veio por trás.”
(Cíntia Moscovich)

“Quase uma vítima da minha família.”
(Chuck Sangster)

“A velha insônia tossiu três da manhã.”
(Dalton Trevisan)

“Conheceu a esposa em sua festa de despedida.”
(Eddie Matz)

“Vestiu os artefatos, beijou o filho com ternura e saiu pro último trabalho sobre a Terra.”
(Edival Lourenço)

“Vende-se: sapatinhos de bebê nunca usados.”
(Ernest Hemingway)

“Uma gaiola saiu à procura de um pássaro.”
(Franz Kafka)

“2 de agosto: a Alemanha declarou guerra à Rússia. Natação à tarde.”
(Franz Kafka)

“Nascido no deserto, ainda com sede.”
(Georgene Nunn)

“Então você acredita em mim de qualquer maneira?”
(James Frey)

“O homem estava invisível, mas ninguém percebeu.”
(José María Merino)

“A mulher que amei se transformou em fantasma. Eu sou o lugar das aparições.”
(Juan José Arreola)

“Eu escolhi paixão. Agora sou pobre.”
(Kathleen E. Whitlock)

“Fui me confessar ao mar. O que ele disse? Nada.”
(Lygia Fagundes Telles)

“Se Eu não acreditar em Mim, quem vai acreditar?”
(Marcelino Freire)

“Morreu”
(Marcelo Rota)

“Escrever sobre sexo, aprender sobre o amor.”
(Martha Garvey)

"Sem futuro, sem passado. Nada perdeu."
(Matt Brensilver)

“Pegou o chapéu, embrulhou o sol, então nunca mais amanheceu.”
(Menalton Braff)

“Ouvi um barulho no portão, fui ver era a Lua nova.”
(Nei Duclós)

“Assistindo calmamente de cada moldura da porta.”
(Nicole Resseguie)

“Alzheimer: conhecer novas pessoas todos os dias.”
(Phil Skversky)

“Eu perguntei. Eles responderam. Eu escrevi.”
(Sebastian Junger)

“Eu ainda faço café para dois.”
(Zak Nelson)
 
Algumas dessas são bem famosas, tipo a do Hemingway, mas tem umas outras bem boas na lista, como essa última, "Ainda faço café para dois". Mas quem é Zak Nelson? (Já perguntei ao Google.)

Essa do Tchekhov tem uma lógica diferente, mas é bem interessante também.
 
Essa do dinossauro, "Quando acordou o dinossauro ainda estava lá.”, eu lembro q tinha no livro de português no ensino medio...

Gostei desse:
“Uma vida inteira pela frente. O tiro veio por trás.”
(Cíntia Moscovich)
 
Eu ainda acho a do Hemingway é a mais bem feita de todos... (ok, pode ser meu tino maternal falando mais alto, rs.) Tem umas meio sem gracinha. "Morreu." Jura? ¬¬ Ou então "Escrever sobre sexo, aprender sobre amor". :P Lugar comum nem pensar, né?
Também gostei das que vcs dois destacaram, e acrescento essa: "2 de agosto: a Alemanha declarou guerra à Rússia. Natação à tarde". Tem uma quebra mt bacanuda.
"A mulher que amei se transformou em fantasma. Eu sou o lugar das aparições" é bem mais explícita que as outras, mas achei bonita essa imagem que foi construída. Fiquei oscilando entre uma interpretação romântica e uma mais dramática, rs. Prefiri a romântica. =)
 
Acho complicado chamar isso de literatura, hein; por consequência, impossível chamar de conto. No máximo, são frases inteligentes, engraçadas, mas às vezes nem isso. Todos nós temos nossos lampejos de sagacidade; eu mesmo devo ter por aí espalhado na net algum dito jocoso ou talvez inteligente que poderia ser chamado de microconto e literatura, e sem querer querendo!

Senão, sério, se "Morreu" é um conto e é literatura, qualquer palavra o é. E se tudo é literatura, nada é literatura, porque a própria definição do termo perderia o sentido.
 
Ai, não sei o que dizer, Calib... Talvez seja mais uma "expressão literária" do que literatura propriamente dita - o que não qualifica, mas também não invalida. Obviamente nem tudo é literatura, mas consideraria algo para-literário (desqualificado como gênero, mas relevante como experiência de leitura), e assim, poderia chamar de conto, ou microconto. Ok, faltam-me bases argumentativas mais sólidas, mas acho que deu pra entender o que quis dizer.
Uma foto 3x4 não é "fotografia artística", mas desde que eu vi uma "exposição" de fotos 3x4 na faculdade (eram muitas, muitas!), comecei a pensar se tudo não depende de contexto...
 
O problema do microconto é que ele é um tipo de fôrma que só ganharia relevo numa coletânea ou quando em grande quantidades, pois aí poderia construir um corpus de importância e de análise paralelo ao de um conto ou de uma narrativa de maior envergadura, como mais ou menos a envergadura de um poeta como Petrarca só pode ser posta à de Dante quando consideramos o Canzoniere como um todo -- que se quiséssemos pegar apenas um soneto e comparar com a Divina Comédia estaríamos assinando ou um atestado de óbito ou de imbecilidade. Agora o microconto analisado de forma separada, a meu ver não restam dúvidas de que se trata de uma fôrma literária inferior, pois se funda numa concisão de caracteres que cerceia a exposição e o desenvolvimento de determinado assunto...

É como se o microconto tivesse aquele propósito de fazer o que os grandes artistas fazem, que é, com um verso ou com uma frase, "possuir um verdadeiro poema ou um verdadeiro conto em sua essência", conforme ouvimos muito dizer. A questão é que se versos como "Estavas, linda Inês, posta em sossego", de Camões em Os Lusíadas, são considerados como um verdadeiro poema por si só, não quer dizer que um verso qualquer possa também ser um poema por si só (até mesmo outros versos de Os Lusíadas não podem ser considerados -- a maioria, aliás), que no caso camoniano esse efeito só foi possível graças a um acúmulo poético e dramático de força ímpar e que recai nesse verso, como o caso do "To be, or not to be: that is the question" de Hamlet ou o "Chaos will come again" de Othello. Agora você querer criar uma frase, ou um verso, ou qualquer coisa de caráter extremamente reduzido, que consiga toda essa carga poética capaz de gerar tamanha carga de representabilidade... É aí que pode residir a falha do microconto.
 

Valinor 2023

Total arrecadado
R$2.434,79
Termina em:
Back
Topo