Pips
Old School.
Dalva e Moacir é um conto de Luis Fernando Verissímo:
Foi adaptado para as telas com roteiro e fotografia de Felippe Cordeiro (esse que vos escreve), filmado totalmente em estúdio.
Moacir ao Quadrado
Dalva e Moacir eram jovens e se amavam, mas os pais dela proibiram o romance e os dois decidiram se matar. Tomaram insecticida. Primeiro a Dalva, depois o Moacir. Mas o Moacir não morreu. Os familiares da Dalva tentaram invadir o hospital para acabar de matar o Moacir, que depois da alta teve que fugir da cidade. Voltou dez anos depois, e a primeira coisa que fez foi ir ao cemitério procurar o túmulo de Dalva. Não foi difícil encontrar. Havia uma multidão em volta do túmulo. Segundo o zelador do cemitério, era assim todos os dias. Vinha gente de longe para visitar o túmulo.
- Porquê?
- É uma história famosa. Um pacto suicida. Faz anos.
- Ela e o namorado?
- É. Mas ele não morreu. Continua aí.
- Onde?
- Na cidade. Andou fora uns tempos, depois voltou. O senhor não é daqui?
- Sou. Não. Era.
A cidade não mudara nada, mas Moacir não encontrou nenhum conhecido. Entrou num bar e pediu um guaraná. A moça atrás do balcão serviu o guaraná sem olhar para ele. Estava olhando para um moço sentado atrás de uma mesa, no fundo do bar. Um moço com um ar sombrio, a barba por fazer. A moça sacudiu a cabeça e disse:
- Coitado.
- Quem é? - perguntou Moacir.
- Não conhece? É uma história famosa. Um pacto suicida. Ela morreu, ele sobreviveu. Desde então ficou assim. Dá uma pena.
- Como é o nome dele?
- Moacir.
Naquela noite, Moacir foi a outro bar. Não era do seu tempo. Muito movimento, a garotada na calçada, carros estacionados na frente com as portas abertas e o som em alto volume. Dentro do bar, Moacir avistou o falso Moacir. Ar sombrio, o cabelo caído na testa, um copo de uísque sobre a mesa à frente.
Era o centro das atenções. Obviamente, o herói trágico da cidade.
- Olha ele lá - disse uma moça ao lado de Moacir. - Eu fico toda arrepiada.
Eram duas adolescentes de pé na calçada, cerveja na mão. Estavam com uma turma.
- Porquê? - quis saber Moacir.
- Já pensou? Dá uma vontade de ir lá consolar, não dá?
- Parece filme - disse a outra, que também ficava toda arrepiada só de olhar o coitado.
Moacir entrou no bar e abriu caminho no meio da multidão até a mesa do impostor. Puxou-o pela frente do suéter preto de gola rolê e gritou:
- Seu pulha! Seu verme!
Aos que apartaram, Moacir disse, depois, que ficara indignado.
Estivera no túmulo da Dalva aquela tarde e não aguentara ver aquele pulha, aquele verme, sentado ali, tomando uísque. Era o responsável pela morte da santa. Devia estar era tomando insecticida, isso sim.
Quando saiu do bar, em meio a reprovação geral, Moacir passou pelas duas adolescentes que o olharam com desdém.
- Eu, hein? - disse uma delas.
Foi adaptado para as telas com roteiro e fotografia de Felippe Cordeiro (esse que vos escreve), filmado totalmente em estúdio.
Moacir ao Quadrado