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Catatau (Paulo Leminski)

Anica

Usuário
Copiando aqui o que postei ontem lá no Hellfire Club:

Ganhei o livro há quatro anos e confesso que sempre começava mas depois largava no meio. Minha teoria era de que Catatau deveria ser lido em um fôlego só. Quando percebi que jamais conseguiria ler dessa maneira, larguei mão e resolvi ler aos poucos, como pessoas normais fazem com os livros, sabe? De qualquer forma continuo achando que a experiência teria sido milhares de vezes mais legal se eu pudesse ler assim, e mais: ler em voz alta.

Catatau é isso, uma experiência. Um “romance ideia”. É uma leitura diferente, com uma intenção diferente partindo do autor. Nas palavras do próprio Leminski: “O Catatau é o fracasso da lógica cartesiana branca no calor, o fracasso do leitor em entendê-lo, emblema do fracasso do projeto batavo, branco, no trópico.”1

Por isso se você gosta de obras com enredos redondinhos, narrativas lineares e outras facilidades literárias, é melhor (infelizmente) passar longe do livro. Acredito que basta dizer que Catatau tem um só parágrafo para ter uma idéia do que estou falando. Mas se você vencer o “medo” de obras ditas “difíceis” (Joyce, Rosa, alguém?), eu devo dizer que a leitura é muito recompensadora, e a verdade é que lá pela página 30 você já pegou o “jeito” da coisa e lê sem qualquer problema.

Catatau surgiu de um estalo que Leminski teve enquanto dava aula de História. “E se Descartes tivesse vindo para o Brasil com Nassau?” O que vemos é exatamente isso. Temos Descartes (Cartésio) esperando Artiscewsky - no melhor estilo Vladimir e Estragon esperando Godot. Vemos o que Descartes vê, do jeito alucinado que ele enxerga o lugar onde está. A fala toda mescla diversas linguagens, numa tentativa de representar o que era a fala do Brasil na época. Neologismos diversos, além da utilização direta de tupi, latim, japonês, italiano, holandês, francês, grego, espanhol, inglês e alemão.

E mais do que brincar de forma brilhante com o sentido das palavras, é impressionante perceber o ritmo que ele dita durante a narrativa, que apesar de prosa em alguns momentos parecem poesia, é quase como se você estivesse lendo um dos haikais dele. E no meio de toda a confusão do pensamento da personagem, alguns momentos geniais com aquelas frases típicas do Leminski (por exemplo “Num universo impreciso, é preciso ser inexato, dizer sempre quase antes do dito.”). E é por isso que eu insisto na ideia da leitura de Catatau em voz alta, até para esse ritmo ficar mais óbvio, mais destacado.

O livro é realmente genial, e como falei anteriormente, vale a pena vencer o medo de não compreendê-lo . Como falou o próprio autor, “Dentro do Catatau, o leitor perde a mania de procurar coisas claras.”2 e o fato de mexer dessa maneira com quem lê a obra faz dela ainda melhor.É claro, tive a sorte de ler a edição crítica da Travessa dos Editores, que além do texto original ainda traz índice onomástico, estudo dos procedimentos neológicos, iconografia entre outros “detalhes” que no final das contas só ajudam a enriquecer a leitura. Uma pena que aparentemente essa edição está esgotada no momento.

1. LEMINSKI, Paulo. Catatau Curitiba: Travessa dos Editores, 2004. p.271 [?]
2. LEMINSKI, Paulo. Catatau Curitiba: Travessa dos Editores, 2004. p.273 [?]

Para ajudar em uma provável garimpada em sebos:

Capa:
leminskicatatau.jpg

428 páginas
16,5 x 21 cm
ISBN: 85-89485-14-5
 
Eu tive enorme curiosidade para ler! Quando fui procurar não tinha nos sebos e era meio caro nas livrarias. :timido:

Vou atrás outra vez!
 
Anica disse:
A esfinge indecifrável, artigo de Marcio Renato dos Santos sobre Catatau (aproveitando que saiu essa edição nova pela Iluminuras)

Eu ia postar "Onde achar?", mas obrigado pela informação da reedição pela Iluminuras, Anica. Adoro essa editora e suas orelhas-destacáveis/marcadores-de-página.
 
No final de 2010, foi lançada pela Iluminuras – depois de seis anos – uma nova edição do Catatau, romance-idéia (nas palavras do seu autor) publicado em 1975 por Paulo Leminski. Qual a primeira surpresa que dá para imaginar da maioria? “Nossa, ele não escreveu só poesia?” Pois é, o tão famoso poeta curitibano também fez suas incursões pelo mundo da prosa, mas sem deixar a poesia de lado.

Quem resolver ler esse livro nonsense, vai perceber de cara que não tem em mãos uma narrativa tradicional, mas sim uma grande experiência literária que atenua as fronteiras entre prosa e poesia por cerca de 200 páginas. Quem já leu Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, Ulysses ou Finnegans Wake, ambos de James Joyce, vai reconhecer de cara a loucura formal do texto e talvez não vai sentir tanta dificuldade quanto outras pessoas, mas mesmo assim não vai ler tão no “automático” quanto leria José de Alencar.

[continue lendo...]
 
Alguém nunca imaginou que ele pode simplesmente ter queimado um beque enquanto datilografava? É o mesmo tipo de coisa que me irrita no jazz e em Kerouac: essa efusiva torrente de notas sobre nada. Alguns se maravilham com o despropósito de filigranas fúteis e arabescos encurvados sobre si como aleatórias gotas de chuva ao vento, mas eu prefiro discurso engendrado com rigor formal...

Mas o Leminski poeta exige respeito.
 
Alguém nunca imaginou que ele pode simplesmente ter queimado um beque enquanto datilografava? É o mesmo tipo de coisa que me irrita no jazz e em Kerouac: essa efusiva torrente de notas sobre nada. Alguns se maravilham com o despropósito de filigranas fúteis e arabescos encurvados sobre si como aleatórias gotas de chuva ao vento, mas eu prefiro discurso engendrado com rigor formal...

Mas o Leminski poeta exige respeito.

Gosto do Leminski poeta e tenho o Catatau, mas apenas li trechos, nunca inteiro. Pode ser uma sugestão para o Clube de Leitura (seria muito divertido procurar os significados para todos aqueles neologismos amalucados e misturas de palavras)...
Mas discordo do Umav, porque mesmo a aleatoriedade está sob regras. Só que por vezes, quando não entendemos a lógica por trás dela, não percebemos isso. Leia um trecho aqui:

(...)
Antes de ser, pague, sisifíssimo senhor! Esbangalhe as fantasmagonias de bibelonhas, valha-me, Baal! Assim é: macaquinismos em acontechego, triunfanias e suas iniguarias em bom brocardo! Agora, sim! Mesmo que nem por isso tenha que estar o que te dizia então, aí é que são elas, o perigo! Eis que arre minha regra não via de ver, nem era preciso de vez que de mais a mais tal e qual mais vale um não-sei-o-quê que dois para o que der e for. Isso a troco de que coisa é que se faça? Faz diferença se era uma vez melhor ignorar, faltar e morrer que deus-me-livre de você é que sabe, eu que o diga, que vá? Nesta estratagédia de despercídio, quem escapafede? Occam é lamentável. Esvazie um enxame de consflência, dê-me uma volta de conscidência, acrediste em retritos, qual não admira astromissão! Só não me vem de trela e letra, que minha estrela não é maneira, controle? Meu mais alto estigma de consideralação, sondagens cardíacas! Se, passe a hipótese, não houvesse mau gosto, que seria da queda de Francantartinobra, o que é, é o que seguiremos a ver? Amor com amor se paga, que sai mais barato. Vão os anéis e fiquem os dedos, fuçando o nariz, cutucando a mesma tecla, unha na ferida. Deus só dá nozes para quem nogueira! A ralé em geral com sua proverbial aptitude de fazer provérbios, de dizer bobagem, de acreditar em deuses, de ver errado em linhas certas, de cair na dança sem saber latim — o povo, digo, esse sim. Duma nau em avante, — terra cega, quem tem ouvidos afinados na oitiva, cale-se!
<...>

 
Sempre tive curiosidade para ler esse livro,ainda mais quando li um trecho dele no Distraídos Venceremos do Leminski.Mas nesses últimos meses já reli Grande Sertãoe e li Ulisses,to de boa com esse tipo de experiência por enquanto.
 
Acho que não quero mais tentar entender esse livro... li várias páginas ontem tentando entender e acabou me dando dor de cabeça. Vai ver o melhor mesmo é fazer o que sugeriu a Anica e ler em voz alta só por diversão (e também pra desenrolar a língua). ;)
 
Lembrete: encher o saco da Anica até ela indicar Leminski no autor da semana.
 
Para quem é de São Paulo, na virada cultural vai rolar a leitura na íntegra de Catatau na Casa das Rosas.
 
Anica, eu sei que vc já falou (na resenha do Hellfire) que o livro não tem muita linearidade e um enredo muito definido... mas tem de saber algo de história pra entender melhor a obra?
Assim como saber bem sobre Descartes etc...
 
acho que um tico de história do brasil da época em que se passa a história, mais um pouco sobre as teorias de descartes (de modo geral mesmo) ajuda a enriquecer a leitura =] aquela coisa, a escolha não foi por acaso. vale lembrar que leminski chegou a dar aula de história, então ele tinha lá conhecimento (e uma teoria) quando resolveu misturar brasil com descartes.
 
Sobre a dor de cabeça de ler o Catatau: acho que não falei isso na resenha, mas (pessoalmente) acho que existem duas maneiras de se ler esse livro:

1) com minúcia quase que filológica, buscando entender em detalhes toda a composição textual da obra para uma melhor compreensão, o que faz dessa leitura EXTREMAMENTE demorada;

ou 2) susse, lendo em voz alta, de preferência, e apreciando todo o potencial da linguagem.

Ainda vou além e digo que, assim como dizem do Finnegans Wake, esse lido não é pra ser ~entendido~, mas sim apreciado justamente pelo não entender. Talvez pareça um objetivo pedante escrever algo pra dizer que só você mesmo entende, mas a questão (bem moderna) é: o que todo mundo entende por completo? E o que todo mundo entende igual? O que o Catatau faz é jogar isso na cara da gente pelas constantes sátiras a Descartes em meio à doideira tropical.

Mas essa é a minha opinião, é claro. Esse é um livro de que se dá pra se (e se deve) falar muito ainda.
 

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