Eu só tinha um avô por parte de mãe e uma avó por parte de pai, e uma relação muito boa com eles. E eles também tinham uma relação muito boa entre si. Eram vizinhos a mais de 40 anos.
Bairro no subúrbio de uma cidade pequena, relativamente violento. Tanto quanto poderia ser um bairro de cidade pequena, onde, jogam TKOF no arcade com o traficante local.
Ambos se casaram novamente no começo dos anos 90, e eu (e a maior parte dos netos), não tiveram uma relação muito boa com o marido da minha avó, ou a esposa do meu avô.
Um era um homem antigo, com costumes antigos (dormir muito cedo, limitações para ver televisão, brincar no quintal e fazer barulho). Já a esposa do meu avô era bem falsa e manipuladora, (problemas de família envolvendo herança deixada pela minha avó materna), fazia com que o todo o tratamento dos netos, bom, ou não era direcionado como resposta aos nossos pais. Era bem difícil saber como ela iria nos tratar em cada visita.
Ir na casa de um, significava ir na casa do outro também. Morávamos relativamente perto: cidade pequena do interior. Era fácil nos vermos aos finais de semana. Por morarmos perto não havia o costume de dormir nos meus avós.
Ambos tinham casas grandes, com um quintal calçado e chão de terra com horta nos fundos.
A casa da minha avó era num terreno grande e comprido, numa travessa bem pequena e tranquila, era comum os vizinhos colocarem as cadeiras de área na calçada e ficar conversando.
O marido da minha avó plantava cana-de-açúcar e ainda tinha o moedor de cana, era comum tomar garapa geladinha. Minha avó fazia muitos pães, bolachas e bolos. E sempre comprava muitos doces, e nos mimava com roupas e dinheiro vivo (de dois a cinco reais, mas para uma criança era uma fortuna). Mas não me lembro de receber brinquedos.
A casa da avó era sinonimo de encontro entre os netos, brincadeiras e muitas risadas. A casa com quintal grande, com uma ou duas redes na garagem, jardim, e um pouco de terra era o bastante para garantir a diversão dos 6 netos bagunçando e irritando o marido dela
Depois a mote do marido, a idas a cada da minha avó começaram a ficar mais frequentes, ora por medo de deixa-la sozinha por muito tempo, ora pelo ultimo pedido dele, em ser velado na casa. Deixou o lugar com um ar sombrio. A partir disso meu irmão começou a dormir lá, até irmos mora em definitivo.
A essa altura a casa já não tinha mais um ar nostálgico, o ambiente era o mesmo, com pouquíssimas mudanças, mas eu estava diferente, claro, mais velho. Levava poucos amigos la, namorada foi apenas uma. Sentia ainda que aquele lugar não era meu. Mesmo com meu quarto e minhas coisas. Parecia de alguma forma errado, morar lá, isso atrapalhou por muito tempo as lembranças da minha infância.
Minha avó morou até seus últimos dias na casa. Sua morte foi muito inesperada. Foi internada em ma tarde com as dores de sempre e trinta e seis horas mais tarde foi a óbito. Não velamos seu corpo na casa, ela sempre falava das más lembrança do corpo do marido lá.
Nos mudamos menos de um ano depois, era difícil perder alguém próximo, mais difícil ainda morando junto. Os filhos resolveram vender a um primo próximo, pelo menos ia ficar dentro da família. Para eles era um alento, mas totalmente indiferente para quem a casa seria vendida. A menos que fosse para algum dos filhos, o acesso a casa como local de reunião familiar iria desaparecer. E foi o que houve, o tal primo comprou, reformo e nunca mais houve noticias ou fotos da casa.
Meu avô morava numa descida, a casa era alta para quem olhasse da rua, com muitas escadas e uma rampa de garagem bem grande. Era divertido brincar nas escadas de acesso ao quintal e área coberta da sala. Era de madeira, mas com o tempo os comodos foram substituídos por alvenaria.
Meus primos moravam longe, então era raro encontrar primos para brincar por la. Fora nos finais de ano. Mas havia rede para balançar e meu avô era muito atencioso, adorava jogar dominó, e contar histórias e nos levava para horta. Havia também um papagaio e uma cachorra, ambos dóceis. A esposa do meu avô não nos dava tanta atenção, então tinhamos certa liberdade para brincar e bagunçar.
Em 2006, se não me falha, meu avô se mudou. Depois de mais de 40 anos morando no mesmo lugar, a esposa dele conseguiu leva-lo para longe. Os dois AVCs que ele sofreu "ajudou", já que a nova casa quase não tinha degraus para leva-lo na cadeira de rodas. A briga que se iniciou entre meus tios foi grande, até finalmente no ano de sua morte ele (2009) conseguiu voltar. Já não era o mesmo, era triste ver um senhor que até o inicio de seus oitenta anos andava para cima e para baixo, e do dia para noite estava numa cadeira de rodas, falando pouco, resmungando muito, e por fim, acabou debilitado numa cama. Sua casa já não tinha a mesma alegria, meu avô havia mudado muito. As idas eram tristes e frequentes já que a essa altura morávamos com minha avó. E ele veio a falecer algum tempo depois.
Um dos últimos pedidos do meu avô, foi o de ser velado em casa.
A esposa do meu avô morou por um tempo na casa, até meus tios alugarem um lugar que ela pudesse ficar, até a casa ser vendida e repartida. E foi vendida para um amigo do meu tio.
A real é que, quando dá saudades eu abro o street view para ver como as casas estão hoje em dia, mesmo as fotos sendo e 2011, dois anos depois da minha partida.