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Carlos Drummond de Andrade

Ogden

Usuário
Nossa!!!!!!!!
Ontem foi o centenário do meu maior ídolo em se tratando de poesia!! O autor com quem eu mais me identifico! O cara que eu considero o maior poeta do ´seculo 20!!!!!!!

Carlos Drummond de Andrade!!! 8O

e eu esqueci dessa data... :(

O que vocês acham dele? Concordam comigo?

Qual é o poema preferido de vocês (da autoria do tio Carlão, é claro)?

o meu é

Poema de Sete Faces
e um outro, chamado José, se eu não me engano...

fora o poema da pedra, que eu não sei se o titulo é "No meio do caminho havia uma pedra" ou "Havia uma pedra no meio do caminho"... pode não ser nenhum desse dois titulos, mas é um poema genial!
 
eu fiz um trabalho sobre ele....
realmente os poemas dele são demais.... alguns são idiotas....
Peraí q eu vou pegar alguns....
 
A Bunda, que Engraçada
A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica
Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora - murmura a bunda - esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.
A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.
Lá vai sorrindo a bunda. Vai feliz
Na carícia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda,
redunda.
 
Cota Zero
Stop.
A vida parou
ou foi o automóvel?





No Meio do Caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

 
Memória

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais do que lindas,
essas ficarão.



Imortalidade

Morre-se de mil motivos
E sem motivo se morre
De saudade,
Morreu o poeta
Sem morrer a eternidade.
Ele que fez de uma pedra
Louvor para sua cidade
Gauche, grande destro
Sem querer celebridade
Pelos mil que era
Num só se fez único
Ficando em seu primeiro
Caráter de bom mineiro
Jamais morrerá
E sempre será.
 
Drummond na cabeça!

Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.


José

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, proptesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

José

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, proptesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?
José

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, proptesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Poema de Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos , raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo,
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundom,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

Poema Patético

Que barulho é esse na escada?
É o amor que está acabando,
é o homem que fechou a porta
e se enforcou na cortina.

Que barulho é esse na escada?
É Guiomar que tapou os olhos
e se assoou com estrondo.
É a lua imóvel sobre os pratos
e os metais que brilham na copa.

Que barulho é esse na escada?
É a torneira pingando água,
é o lamento imperceptível
de alguém que perdeu no jogo
enquanto a banda de música
vai baixando, baixando de tom.

Que barulho é esse na escada?
É a virgem com um trombone,
a criança com um tambor,
o bispo com uma campainha
e alguém abafando o rumor
que salta de meu coração.
 
Eu te amo



Eu te amo porque te amo.

Não precisas ser amante,
e nem sempre saber sê-lo.

Eu te amo porque te amo.

Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.

Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque te amo
bastante ou demais em mim.

Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.

Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem
( e matam )
a cada instante de amor.

Carlos Drummond de Andrade

ps: Ideal pra qm acordou de bem com a vida :grinlove:
 
Liteliniel disse:
Dé, parabens pra ele!!! (na verdade eu não conheço muito de poesia...) :roll:

Entao recupere o tempo perdido e comece a conhecer :D :wink:

Rapto

Se uma águia fende os ares e arrebata
esse que é uma forma pura e que é suspiro
de terrenas delícias combinadas;
e se essa forma pura, degradando-se,
mais perfeita se eleva, pois atinge
a tortura do embate, no arremate
de uma exaustão suavíssima, tributo
com que se paga o vôo mais cortante;
se, por amor de uma ave, ei-la recusa
o pasto natural aberto aos homens,
e pela via hermética e defesa
vai demandando o cândido alimento
que a alma faminta implora até o extremo;
se esses raptos terríveis se repetem
já nos campos e já pelas noturnas
portas de pérola dúbia das boates;
e se há no beijo estéril um soluço
esquivo e refolhado, cinza em núpcias,
e tudo é triste sob o céu flamante
(que o pecado cristão, ora jungido
ao mistério pagão, mais o alanceia),
baixemos nossos olhos ao desígnio
da natureza ambígua e reticente:
ela tece, dobrando-lhe o amargor,
outra forma de amar no acerbo amor.


Carlos Drummond de Andrade :mrgreen: :obiggraz:
 
Desejo

Desejo a você...
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua Cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender uma nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel...
E muito carinho meu.
 
Putz! Se eu conseguisse lembrar de "Sentimento do Mundo" ou aquele que fala sobre o medo que diz "e nascerão flores amarelas e medrosas..." eu postaria estes dois poemas aqui. Mas Drumond é muito bom!
 
Puxa.. peço sinceras desculpas se alguém se sentir ofendido com minha colocação... É uma opinião. Respeito Carlos Drummond, mas todas as poesias dele que andei lendo, achei que eram medíocres. Não sei.. não achei aquele sentimento, todo aquele conteúdo que poetas como Casimiro de Abreu, Augusto dos Anjos, Álvares de Azevedo colocam em suas poesias. Apesar de serem de épocas diferentes, estes outros escritores parece que realmente sentiam a poesia. Parece que poesia e poeta eram um só, coisa que infelizmente não achei em Carlos Drummond de Andrade. :tsc:
 
Kra, eh a sua opiniao.. se vc acha isso...
Eu naum posso falar nada, porque nao conheço muito de poesia, sinceramente...

Mas, tem uma que eu li e adorei:

O homem; as viagens

O homem, bicho da Terra tão pequeno
chateia-se na Terra
lugar de muita miséria e pouca diversão,
faz um foguete, uma cápsula, um módulo
toca para a Lua
desce cauteloso na Lua
pisa na Lua
planta bandeirola na Lua
experimenta a Lua
coloniza a Lua
civiliza a Lua
humaniza a Lua.

Lua humanizada: tão igual à Terra.
O homem chateia-se na Lua.
Vamos para Marte - ordena as suas máquinas.
Elas obedecem, o homem desce em Marte
pisa em Marte
experimenta
coloniza
civiliza
humaniza Marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro - diz o engenho
sofisticado e dócil.
Vamos a Vênus.
O homem põe o pé em Vênus,
vê o visto - é isto?
idem
idem
idem.

O homem funde a cuca se não for a Júpiter
proclamar justiça junto com injustiça
repetir a fossa
repetir o inquieto
repetitório.

Outros planetas restam para outras colônias.
O espaço todo vira Terra-a-terra.
O homem chega ao Sol ou dá uma volta
só para tever?
Não-vê que ele inventa
roupa insiderável de viver no Sol.
Põe o pé e:
mas que chato é o Sol, falso touro
espanhol domado.

Restam outros sistemas fora
do solar a col-
onizar.
Ao acabarem todos
só resta ao homem
(estará equipado?)
a dificílima dangerosíssima viagem
de si a si mesmo:
pôr o pé no chão
do seu coração
experimentar
colonizar
civilizar
humanizar
o homem
descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
a perene, insuspeitada alegria
de conviver.

 
Meu poeta favorito... E minha poesia favorita é a Flor e a Naúsea


A FLOR E A NÁUSEA

Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
 
já fiz vários trabalhos sobre ele... :wink:
gosto de ler as suas crônicas e poesias!! :mrgreen:
 
Continuando na onda de ressuscitar tópicos do Literatura, aproveitemos o #DiaD dos 110 anos do nascimento do Drummond para homenagea-lo :g:

Confesso que conheço muito pouco de poesia, então aproveitem pra mostrar a quem não conhece a qualidade dele! :g:
 
Putz! Queria, agora, o post que fiz, lá no Clube de Leitura do Meia Palavra, sobre o poema de sete faces. :cry:
 
Acho que está aqui, Cléo XD


Não me julguem, mas ando sem muita paciência com Drummond. Mas, porém, contudo, entretanto, todavia, tentarei mostrar a minha interpretação do poema:

A primeira estrofe fala sobre nascimento do poeta. E nos reserva, também, uma coisa importante, o "gauche", o esquerdo, o torto, o que comete o desvio. Se não for gauche, se não cometer o desvio, não se cria. Não se tem o nascimento da escrita literária. A criação do texto literário é algo que corresponde a desvios.

Na segunda estrofe, temos uma metonímia bem no primeiro verso: "as casas espiam os homens". As pessoas dentro das casas espiam os homens. Vamos pegar, como referencial, Itabira, a cidade de Drummond. Cidadezinha pequena, as pessoas ficam nas janelas olhando a vida acontecer. E ficam "fofocando", mesmo. E termina essa estrofe falando que há tantos desejos.

A ideia dos desejos é retomada na estrofe seguinte, e aí, sim, temos uma noção de sexualidade. Mais uma vez, a metonímia prevalece. "Pra que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração". O poeta espia as mulheres. E temos, nesse contexto, um conflito entre ver e sentir.

Na próxima estrofe, desenha-se a imagem de Drummond, "o homem atrás do bigode".

A próxima estrofe retrata não o homem abandonado por Deus, mas o homem que abandonou suas crenças. Não é questão de ser religioso, gente. É questão de que se você é do interior (tô falando por Minas), seu processo de socialização é muito marcado por crenças. Drummond tem isso de se sentir "abandonado por Deus" quando sai do interior para cidade grande, mas na verdade, ao abandonar a cidadezinha cheia de crenças, é ele quem, de certa forma, abandona a Deus. Essa estrofe remonta, sim, um momento de angústia, um momento de solidão (assim como o declarado por Jesus, conforme a Bíblia). Esse sentimento de "abandonado por Deus" também está presente no belíssimo "Um homem e seu carnaval", do qual transcrevo a primeira estrofe:

Deus me abandonou
no meio da orgia
entre uma baiana e uma egípcia.
Estou perdido.
Sem olhos, sem boca
sem dimensões.


"Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não uma solução": Ironia. A poesia Modernista encarava a rima como uma prisão. Então, ele usa uma rima pobre (porque ele usa palavras da mesma classe, dois substantivos), "mundo" e "Raimundo", para dizer que uma rima não é uma solução. (e eu coloquei os três versos na mesma linha só para ficar mais fácil para eu digitar, não quero estragar a estética do poema. Não me processem!)

"Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração": aqui ele sai da tensão (tive de me segurar para não escrever TEMÇÃO. ) da estrofe anterior. E, aqui, também, eu acho importante lembrar de como Drummond retoma essa relação mundo/coração em um outro poema (do qual gosto MUITO. Gosto mil vezes mais do que gosto do Poema de Sete Faces), "Mundo grande": "Nao, meu coração não é maior que o mundo. É muito menor."

"Eu não devia te dizer", eu digo porque sou gauche. Eu digo porque bebi. Eu digo porque sou poeta. Então, ignore essa negação, eu devia e quero te dizer tudo isso. Eu devia e quero tornar externa essa angústia de ver/sentir. Eu te digo porque você criou o mundo em sete dias, Deus. E eu criei o meu poema com sete estrofes.











Daqui a pouco tão me chamando de O garoto do cachê do google :rofl:
 
Valeu, Biel. :abraco:

A minha experiência mais marcante com Drummond aconteceu na graduação. Em um belo dia, em uma aula na qual estávamos lendo poesia, a professora perguntou quem gostaria de ler José. Respondi, "posso ler?" meio que sem pensar no que tinha acabado de fazer (agir sem pensar = sinônimo de Cleonice. :lol:). Aí ela disse que sim. Gelei. Sou tímida. Então, me levantei, e comecei a ler. Quando terminei a leitura, a professora estava com um sorriso no rosto. Foi a primeira vez que falei, durante a aula dela. Mas, depois disso, ela descobriu que eu só falava se me perguntassem algo. Aí passou a me perguntar coisas em todas as aulas. No semestre seguinte, ela me chamou para participar de um projeto de iniciação científica. Não preciso nem dizer que, hoje, essa professora é a minha orientadora do mestrado, né?
 

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