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Cachalote: 'HQ não depende de literatura'

Anica

Usuário
Influências distintas inspiraram Daniel Galera e Rafael Coutinho na criação de Cachalote, como conta o escritor na seguinte entrevista, feita por e-mail.

Existem quadrinhos sem existir literatura?

Eu não iria tão longe. Embora na maioria dos casos o quadrinho também seja literatura, ele é uma forma de arte independente. A narrativa por meio de ilustrações sequenciais pode prescindir do que entendemos como literário para contar uma história ou expressar alguma coisa. Dizer que os quadrinhos dependem da literatura seria cometer uma injustiça. Mas o fato é que a articulação da imagem sequencial com a literatura tende a funcionar tão bem que ficamos tentados a enxergar essa relação de dependência.

Como aconteceu o diálogo entre as linguagens?

Antes de trabalhar no roteiro propriamente dito, fiz algumas versões mais literárias das histórias, em forma de prosa mesmo. Em cima desses textos iniciais, foi surgindo o roteiro mais técnico, descrevendo quadrinhos individuais, distribuindo diálogos e quebras de página, etc. Ainda que Cachalote seja resultado de uma mistura de ideias e argumentos originais, meus e do Rafa, creio que nas etapas iniciais a minha voz literária se impôs no desenvolvimento das histórias. Procurei trabalhar o subtexto das tramas como se fossem contos, insinuando os principais conflitos e emoções dos personagens por trás do que está explícito e dando chaves para que o leitor possa acessar essas camadas mais profundas. A relação passada do Rique com o pai, por exemplo, não chega a ser narrada, mas é insinuada e é importantíssima para entender o personagem. Muitos aspectos narrativos do livro são análogos ao que busco alcançar quando escrevo prosa.

Desde o início, os desenhos seriam em preto e branco?

Chegamos a pensar em usar uma paleta de cores reduzida, com apenas três ou quatro tons, mas ainda no início do projeto a decisão pelo preto e branco se tornou definitiva. Não acho que as cores chegariam a transformar muito o livro em termos narrativos. Essa decisão coube ao Rafa, era uma opção artística dele.

A figura do cachalote faz pensar no monólito negro de 2001, filme de Stanley Kubrick, além de lembrar de Nietzsche ("O homem é uma corda atada sobre um abismo, um hiato entre dois nadas.")

Nunca tive Kubrick e Nietzsche como referências conscientes para esse livro, mas acho que há bastante sentido porque de certo modo todos os personagens da HQ estão passando por confrontos significativos com seus destinos, seja por uma reavaliação da própria identidade, uma busca afetiva ou a dissolução repentina de uma situação de segurança. E são quase todos solitários. De qualquer modo, prefiro evitar interpretações acabadas dessas histórias. Eu não as tenho. Elas são um pouco abertas de propósito. E nossas influências ao longo do processo foram muito variadas, quase aleatórias. Músicas da PJ Harvey, contos do Chekhov, o surrealismo quase real dos filmes do David Lynch. Um filme chinês, Summer Palace, de Lou Ye, certamente influiu no tom de algumas histórias. Eu tinha visto esse filme semanas antes de começarmos a trabalhar na HQ e fiquei encantado, mostrei para o Rafa. A gente foi coletando incontáveis inspirações desse tipo e mastigando para ir dando forma às nossas próprias narrativas.

INFLUÊNCIA CHINESA

Na criação de Cachalote, Daniel Galera e Rafael Coutinho não ficaram fechados a influências - preferiram montar um caleidoscópio a partir de referências diversas, como filme de Lou Ye, Summer Palace, de 2006, sobre a garota que abandona a família no interior, em busca de uma carreira em Pequim. Na universidade, ela descobre um mundo de liberdade política e sexual que a leva a participar do protesto na Praça da Paz Celestial. Por conta desse tom político, Ye foi proibido de filmar por cinco anos.

Fonte: Estadão

***

e aí q q 6 achäo? =F

Já discutimos isso antes aqui, e lembro que alguém (acho que o Luciano) tinha uma visão parecida sobre a relação quadrinho e literatura. Mas como chegou gente nova no fórum é sempre bom reabrir a discussão, hehe
 
[align=justify]Não tenho uma opinião muito definida sobre isso, mas tendo a concordar com os caras quando dizem que é uma forma de arte independente, e não uma junção de imagens e literatura. A forma como ocorre a relação entre as imagens e a literatura é que o diferencial. Uma complementa a outra, redimensionando a sua significação. Embora não dê para dizer isso de todos os quadrinhos (creio eu), é um ponto que acho interessante, pois a personificação dos personagens e a representação do que eles pensam, como agem etc. etc. etc. se dão por meio das gravuras. Acho isso bem curioso, pois o quadrinho não é só Literatura nem só Arte Gráfica.[/align]
 
Verdade, já tínhamos começado uma discussão sobre o assunto.

Como as minhas opiniões vão mudando conforme o conhecimento que vou agregando, deixo claro que os comentários que farei são o que vale agora para o pouco que conheço.

Existem quadrinhos sem existir literatura?

Eu não iria tão longe. Embora na maioria dos casos o quadrinho também seja literatura, ele é uma forma de arte independente. A narrativa por meio de ilustrações sequenciais pode prescindir do que entendemos como literário para contar uma história ou expressar alguma coisa. Dizer que os quadrinhos dependem da literatura seria cometer uma injustiça. Mas o fato é que a articulação da imagem sequencial com a literatura tende a funcionar tão bem que ficamos tentados a enxergar essa relação de dependência.

Concordo em parte com o que foi dito. É verdade que não existira quadrinhos sem literatura, mas não vejo essa relação num um resultado final como a nona arte ser independente. Os quadrinhos ou mangás são uma arte composta e altamente dependente das suas bases.

Não adianta uma arte muito boa se o texto não existir, sendo que ele não precisa estar explicito dentro dos quadros, nesse caso estamos falando do roteiro à ser seguido.

As letras, palavras e frases podem não estar lá, ao vivo e se fazendo presentes de corpo e alma, porém são necessárias na formula que compõe a obra.

Exemplificando uma forma de processo podemos colocar da seguinte forma: autor cria história (pode ser o próprio ilustrador criando a história), ilustrador lê essa história e dá vida aquelas cenas que não estão em movimento visual, autor ver ilustrações e diz se as imagens correspondem ao que ele havia pensando do texto e podem ser uma representação gráfica de escrito. O processo também pode ser totalmente ao inverso, começando com a ilustração, o importante é que em determinado momento as duas artes (literatura e pintura) se encontraram para forma algo novo.

No final existe uma dependência forte, porque a forma em que o roteiro é escrito vai influenciar no resultado. E, mesmo não querendo não fazer essa afirmação, acredito que o roteiro também pode ser largamente influencia pela arte. Vejo muito dessas "mudanças" no que diz respeito a arte oriental. Se um mangá é mais sério, com ilustrações mais fortes, dificilmente terá um texto composto por uma linguajem ou tipo de escrita mais infantil. Claro que existem exceções e vez ou outra aparecem mangás de traços fortes e "maduros" com uma textualidade infantil.

Concluindo o pensando, volto a dizer que a nona arte (quadrinhos, mangás e tirinhas) são uma arte resultante ou composta.
 
[align=justify]Falou e disse o Breno. É isso mesmo, acho que os quadrinhos oscilam entre esses dois pólos: arte independente e composta. Não dá para dizer que é só um nem que é só outro. É que justamente a junção de duas linguagens diferentes condiciona os quadrinhos no sentido de que ela se torna uma linguagem particular, com suas próprias propriedades, sem que isso negue que ela dependa de Literatura ou de arte visual. Creio ser esse um dos motivos pelos quais HQs são tão interessantes.[/align]
 
“CACHALOTE” FAZ APROXIMAÇÃO ENTRE QUADRINHOS E LITERATURA

http://universofantastico.wordpress.com/2010/06/30/cachalote-faz-aproximacao-entre-quadrinhos-e-literatura/

Por Paulo Ramos, do Blogue dos Quadrinhos (que é muito bom, mas meio chato para linkar postagens específicas)

"Uma das mudanças mais sensíveis na adaptação de um romance para os quadrinhos é a perda da profundidade dos personagens. Na troca de linguagem, há a tendência de fixação nas cenas mais relevantes da trama. A imagem tende a suprir ou resumir muitos das descrições ou reflexões feitas pelo narrador.

“Cachalote”, que começou a ser vendido neste fim de mês (Quadrinhos na Cia, 280 págs., R$ 45), navega contra essa corrente. Consegue levar para os quadrinhos justamente o que as adaptações deixam de lado: a minuciosa construção dos personagens, elemento caro à linguagem literária.

O ethos dos protagonistas é formado devagar, ao longo das páginas, muitas delas silenciosas, levando o leitor a inferir por meio da imagem o momento vivido pela pessoa. De tão trabalhada, essa forma de narrar é o que desponta do álbum, mais até do que as histórias em si, criadas pelo escritor Daniel Galera e pelo desenhista Rafael Coutinho.

“Cachalote” conta paralelamente seis histórias ao longo de três capítulos. A que abre e fecha a obra, enigmática, envolve uma senhora idosa. As demais têm homens como protagonistas. Apesar de não se cruzarem, as tramas têm em comum o fato de os personagens lidarem com distintas formas de decadência pessoal. Cada um procura, então, encontrar um rumo para a vida.

O ator chinês beberrão e relapso, acusado do assassinato de um colega. O escultor que vê no cinema uma válvula de escape para o marasmo. O escritor deprimido que mantém uma relação de amizade com a ex-esposa. O funcionário de uma loja de ferragens que se apaixona e tem pudores de fazer com a namorada o mesmo sexo masoquista de antes. O playboy que deixa de viver às custas do dinheiro do tio.

A parceria entre Galera e Coutinho funciona. As imagens falam por si, são autônomas às palavras em vários momentos, fruto do minucioso trabalho do desenhista, que se dedicou à tarefa por dois anos e meio. Coutinho deixa sua marca na obra e dissocia de vez sua imagem profiisional da do pai – é filho do cartunista Laerte. A leitura sugere que ele pensou com cuidado cada um dos quadrinhos das quase 300 páginas, muitos com bons resultados de experimentação narrativa.

A dupla procurou fazer finais abertos a cada um dos seis contos. Isso cria uma sensação de incompletude, uma não-correspondência à expectativa do leitor, que passou páginas e páginas acompanhando a construção e o desenrolar dos personagens. O mesmo vale para a baleia que intitula a obra. Aparece em poucos momentos, mais sugerindo do que articulando sua presença no título.

“Cachalote” teve um primeiro lançamento no sábado passado, em São Paulo, na loja que tem o mesmo nome do álbum e que tem o desenhista como um dos sócios. Os autores farão outros dois lançamentos nesta semana, um no Rio de Janeiro e outro em Porto Alegre (leia serviço no fim da postagem).

O lançamento, enfim, diz a que veio a obra. O eficiente marketing da Companhia das Letras ajudou a construir uma expectativa em torno do álbum, que teve matérias de destaque em mais de um veículo de imprensa e uma prévia na revista “Piauí”. Houve até quem rotulasse o trabalho como o “lançamento do ano”, burburinho que a editora sabiamente soube alimentar. Exagero (até porque estamos apenas no meio do ano).

“Cachalote” tem qualidades, muitas delas em torno do trabalho ímpar de Rafael Coutinho. Mas não é a obra revolucionária que se apregoa. Mesmo a apropriação da forma de narrativa literária já foi vista em outros projetos quadrinísticos.

O que é revolucionário, isso sim, é a proposta da RT Features, empresa que bancou a parceria entre Galera e Coutinho. A proposta é dar a prioridade do projeto à Companhia das Letras. Se aceito, a editora publica e a RT fica com os direitos de adaptação para outras mídias.

A empresa já patrocina outras parcerias de escritores e quadrinhistas, como as de Angélica Freitas e Odyr Bernardi, em ”Guadalupe”, e Ronaldo Bressane e Fabio Cobiaco, em “V.I.S.H.N.U.”, para ficar em dois exemplos já noticiados por este blog.

A se pautar por “Cachalote”, o resultado tende a dialogar com um público não leitor de quadrinhos e ajuda a construir um novo mercado para a produção nacional. É algo novo, que pode render bons resultados."
 

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