1. AS ANÃS BRANCAS
Em 1844, um astrônomo alemão chamado Friedrich Wilhelm Bessel descobriu uma estrela que ele não podia ver.
Eis como tudo aconteceu.
Todas as estrelas que vemos no céu estão se movendo. Elas se encontram tão distantes de nós, que os movimentos parecem muito devagar. Somente através de mensurações cuidadosas, feitas com o auxílio do telescópio, podemos notar as pequenas mudanças de posição das estrelas.
O uso do telescópio, entretanto, não é suficiente. Apenas as estrelas mais próximas da Terra mostram mudanças de posição, quando comparadas às estrelas obscuras que, por serem tão longínquas, nem parecem se mover.
Sirius é uma das estrelas mais próximas do nosso planeta. Ela fica cerca de 80 quatrilhões de quilômetros daqui, mas isto não é longe para uma estrela. Sirius é a estrela que mais brilha no céu, em parte porque está mais perto da Terra e seu movimento pode ser medido facilmente através do telescópio.
Bessel queria estudar cuidadosamente esse movimento porque, como a Terra gira em torno do Sol, continuamos vendo as estrelas de ângulos ligeiramente diferentes. Ao invés de vermos uma estrela mover-se em linha reta, vemos que ela se move de modo um tanto sinuoso, devido ao próprio movimento da Terra.
Quanto mais próxima daqui estiver uma estrela, maior será esse movimento ondulante. A distância de uma estrela pode ser calculada a partir do tamanho da ondulação, desde que ele seja medido com cuidado. Bessel estava particularmente interessado nessa questão. Na verdade, ele foi o primeiro astrônomo a calcular a distância de uma estrela. Sua proeza aconteceu em 1838.
Bessel então interessou-se em medir a ondulação do movimento produzido pela estrela Sirius. Ao medir a posição de Sirius noite após noite, Bessel descobriu mais uma sinuosidade em seu movimento, ao contrário do que ele esperava. Sirius mudava de posição porque a Terra estava girando em volta do Sol; mas havia também uma outra mudança, mais lenta, e que nada tinha a ver com o movimento da Terra.
Bessel concentrou-se nesse novo movimento e descobriu que Sirius girava em torno de alguma coisa, exatamente com a Terra se move numa órbita ao redor do Sol. Segundo os cálculos de Bessel, Sirius levaria cinqüenta anos para completar sua órbita.
Mas, o que fazia Sirius girar nessa órbita?
O nosso planeta gira em volta do Sol porque está preso à sua poderosa força gravitacional. Para Bessel, Sirius também devia estar presa a algum tipo de força gravitacional poderosa.
A estrela Sirius, porém, possui duas vezes e meia mais massa do que nosso sol (Massa significa a porção de matéria que alguma coisa contém).
Pelo modo como se movia, Sirius tinha que estar sentindo a força gravitacional de algum outro corpo tão grande que também pode ser uma estrela. Em outras palavras, Sirius e uma estrela companheira deviam estar girando em torno uma da outra. Poderíamos chamar Sirius de “Sirius A” e sua parceira de “Sirius B”.
Pelo modo como Sirius A se movia, a massa de sua companheira, Sirius B, deveria equivaler à do nosso sol.
Mas Bessel continuava não vendo Sirius B. Ela tinha que estar lá, pois a força gravitacional existia e devia partir de alguma coisa!
Logo, Bessel concluiu que Sirius B era uma estrela transformada em cinzas após ter-se queimado e que, por este motivo, havia perdido seu brilho, não podendo mais ser vista. Ele então a batizou de companheira escura de Sirius.
Mais tarde, Bessel notou que a estrela Procyon movia-se como se também tivesse uma companheira escura, “Procyon B”.
Bessel tinha descoberto duas estrelas que ele não podia ver.
Em 1862, um construtor de telescópios americano, Alvan Graham Clark, começou a fabricar uma lente para um novo telescópio. Esse tipo de lente deve ser muito bem polida, para que, através dela, possamos ver as estrelas com bastante nitidez.
Quando a lente ficou pronta, Graham Clark testou-a, olhando para Sirius através dela, a fim de verificar se essa estrela aparecia como um ponto de luz brilhante.
Graham Clark ficou surpreso ao descobrir que havia um outro ponto de luz, mais obscuro, perto de Sirius. Talvez fosse uma estrela, mas ela não constatava de nenhum dos mapas estelares que ele tinha. Quem sabe não seria apenas um defeito da lente?
Não importa o quanto Clark se esmerasse no polimento, o fato é que nunca deixou de ver aquele ponto de luz, quando olhava em sua direção através da lente.
E jamais encontrou um brilho semelhante entre as estrelas que cintilavam no céu.
Enfim, Clark percebeu que aquele ponto de luz achava-se na mesma posição supostamente ocupada pela companheira escura de Sirius. Então, teve certeza absoluta do que estava vendo.
Sirius B não era uma estrela completamente morta, afinal. Ela ainda brilhava, mas com apenas 1 / 10.000 da luz de Sirius A.
Em 1895, John Martin Schaeberle, astrônomo teuto-americano, notou um ponto de luz obscuro perto de Procyon. Era Procyon B, e ela também não estava completamente morta.
Por outro lado, os astrônomos contemporâneos de Schaeberle já sabiam mais coisas a respeito das estrelas.
Como a luz consiste em pequenas ondas de diferentes comprimentos, os astrônomos tinham aprendido a separar a luz estelar em um feixe formado por essas ondas variadas. Tal feixe é denominado espectro.
Em 1893, um cientista alemão chamado Wilhelm Wien mostrou como um espectro muda conforme a temperatura.
Wilhelm mostrou, por exemplo, que se uma estrela estivesse a ponto de se extinguir, ficaria vermelha ao se resfriar. Se Sirius B fosse uma estrela em fase de extinção, ela deveria estar avermelhada; mas não estava. Sirius B tinha uma luz branca.
Para se ter certeza disso, o espectro de Sirius B precisava ser estudado cuidadosamente. Sirius B, porém, era muito obscura e estava tão perto da brilhante Sirius A que tornava-se complicado capturar sua pequena luz e separa-la em um espectro.
Mas, em 1915, o astrônomo americano Walter Sydney Adams conseguiu produzir o espectro de Sirius B. Ele descobriu que a superfície dessa estrela estava a uma temperatura de 8.000 graus centígrados. Ela era, portanto, mais quente do que nosso sol, cuja superfície está a uma temperatura de apenas 6.000 graus centígrados.
Se uma estrela semelhante ao nosso sol estivesse à mesma distância de Sirius B, brilharia como uma estrela luminosa. Não seria tão brilhante quanto Sirius A, mas brilharia muito de qualquer maneira. Sendo Sirius B mais quente do que nosso sol, deveria então brilhar mais do que ele àquela distância. Entretanto, isto não acontece. Sirius B brilha com apenas 1 / 400 da luz que o nosso sol emitiria caso estivesse àquela distância.
Como isso é possível?
Embora a superfície de Sirius B brilhe intensamente, tudo leva a crer que essa superfície não seja muito extensa. Sirius B deve ser uma pequena estrela.
Se ela é tão obscura apesar de sua alta temperatura, então deve medir somente 48 milhões de quilômetros de diâmetro – não mais do que um grande planeta. Seriam necessárias vinte estrelas do tamanho de Sirius B, colocadas lado a lado, para preencher toda a largura do sol. Costuma-se chamar Sirius B de anã branca porque ela é branca e quente, mas muito pequena. Procyon B também é uma anã branca.
Atualmente acredita-se que as anãs brancas sejam bem comuns. Os astrônomos acham que existe uma em cada grupo de quarenta estrelas. As anãs brancas são tão pequenas e obscuras, contudo, que só podemos ver aquelas que estão mais perto de nós.
Apesar de ser tão pequena, Sirius B possui uma massa igual à do nosso sol; do contrário, ela não poderia comandar o movimento de Sirius A como sempre faz.
Se pudéssemos espremer a massa de nosso sol, deixando-o do tamanho de uma esfera não maior que Sirius B, a densidade aumentaria muito, realmente. (A densidade de um objeto nos mostra quantidade de massa comprimida em um determinado volume).
Se trouxéssemos para a Terra uma polegada cúbica da matéria de Sirius B, veríamos que ela pesaria 566 quilos por polegada cúbica. A densidade média da Terra é de apenas 90 gramas por polegada cúbica. A matéria da qual Sirius B é composta tem uma densidade maior que 6.000 vezes a densidade da matéria que compõe a Terra.
Isto é espantoso. Toda a matéria sólida que existe na Terra é feita de átomos, os quais estão sempre se tocando. Os cientistas do século XIX pensavam que os átomos fossem pequenas esferas, sólidas e duras, e que não podiam ser ainda mais comprimidas, pois já estavam encostando uma nas outras. Se fosse assim, a densidade da matéria que há em nosso planeta seria tão densa quanto qualquer outra coisa.
Em 1911, entretanto, o cientista neozelandês Ernest Rutherford mostrou que os átomos não são corpos sólidos e duros. A única parte sólida e dura de um átomo é o seu núcleo. Esse núcleo é tão pequeno, que seriam necessários 100.000 núcleos, colocados lado a lado e se tocando, para preencher a largura de um único átomo.
Em volta de cada núcleo há um ou mais elétrons, os quais possuem muito pouca massa. Os elétrons estão dispostos perto do núcleo, em camadas conhecidas como cápsulas de elétrons.
Quando dois átomos se encontram, a armadura de elétrons que está na parte externa de um desses átomos faz contato com a armadura de elétrons que está na parte externa do outro. As armaduras de elétrons são como escudos que impedem os átomos de se aproximarem demais entre si.
A força gravitacional da Terra não é suficientemente grande para esmagar esses escudos formados pelos elétrons. Nem mesmo as armaduras de elétrons que protegem os átomos existentes no centro da Terra conseguem ser esmagadas, apesar do peso que sofrem sob os milhares de quilômetros de rocha e metal espalhados pela superfície.
Isso não acontece no caso de uma estrela semelhante ao nosso sol, que tenha centenas de milhares de vezes mais massa que a Terra e cuja força gravitacional seja mais poderosa.
Os átomos existentes no centro de uma estrela possuem armaduras de elétrons esmagadas. Sendo assim, os elétrons movem-se livremente e não circulam em volta dos núcleos.
Em conseqüência disso, os núcleos também podem se mover livremente. Podem até mesmo chocar-se entre si e prender-se aos outros, provocando mudanças que produzem energia. A produção de energia é tão grande, que o centro da estrela pode atingir uma temperatura de vários milhões de graus. Um pouco desse calor vaza para a superfície da estrela em todas as direções, e é por esse motivo que ela brilha. O calor que se cria durante o processo mantém a estrela expandida e não permite que os átomos se esmaguem, exceto aqueles que estão em sua parte central.
A energia que existe no centro de uma Estela resulta da transformação de núcleos de hidrogênio (os menores encontrados) em núcleos de hélio (um pouco maiores). Eventualmente, porém, a maior parte do hidrogênio contido em uma estrela é gasto.
Mas, quando tal coisa acontece, o centro da estrela já está muito quente. O calor adicional então faz com que ela se dilate e se torne uma estrela gigante. Sua superfície enfim se esfria e ela fica avermelhada. Por isso ela é chamada de gigante vermelha.
Quando o hidrogênio está quase esgotado, as camadas finas e externas da estrela se expandem, transformando-se em um gás, que finalmente desaparece. Por outro lado, as camadas internas, que encerram a maior parte da massa da estrela, perdem toda a energia que as mantêm aquecidas. A força da gravidade puxa essas camadas rapidamente para dentro, e a estrela entre em colapso. Isso acontece tão depressa, e sob uma força de gravidade tal, que todas as armaduras de elétrons sofrem um colapso e os núcleos ficam muito próximos uns dos outros, ao contrário do que ocorre nas estrelas comuns.
A massa da estrela então se comprime e diminui de tamanho. Assim, ela se transforma em uma anã branca.
No caso do sol, isso não acontecerá antes de cinco bilhões de anos. Mas já aconteceu com algumas estrelas, cujo hidrogênio se esgotou completamente. Sirius B e Procyon B são duas delas.
2. LIMITES E EXPLOSÕES
A força da gravidade aumenta à medida que nos aproximamos de algum objeto, se toda a massa permanecer entre nós e o centro desse objeto.
Imagine-se em pé, sobre a superfície do Sol. Você seria atraído por uma força gravitacional 28 vezes mais poderosa do que a existente na Terra. Se toda a massa do sol fosse se comprimindo aos poucos e você permanecesse na superfície, que também estaria se contraindo, você se aproximaria cada vez mais do centro, e a força gravitacional continuaria crescendo.
Você estaria a 695 milhões de quilômetros de distância do centro do sol. Em Sirius B, haveria a mesma massa sob seus pés, mas você estaria a apenas 24 milhões de quilômetros do centro dessa estrela. Lá, a força gravitacional seria 840 vezes a do sol e 23.500 vezes aquela que o atrairia caso você voltasse para a Terra.
Como verificamos isto? Podemos saber se Sirius B possui realmente uma força gravitacional tão grande?
Em 1915, um cientista teuto-suíço chamado Albert Einstein criou uma nova teoria sobre a gravidade. Segundo essa teoria, quando a luz vai de encontro a uma força gravitacional, todas as suas ondas se tornam um pouco mais longas. Quanto maior for a força gravitacional, mais se alongarão as ondas de luz.
As ondas de luz mais longas que podemos ver são as da luz vermelha. Isto quer dizer que quando as ondas de luz se alongam, parecem tornar-se mais vermelhas, ou seja, elas se deslocam até a extremidade vermelha do espectro. Einstein prenunciou um deslocamento vermelho gravitacional.
Embora a força gravitacional do sol seja bem maior do que a da Terra, consegue apenas provocar um pequeno deslocamento vermelho. Este deslocamento vermelho é pequeno demais para se medir com precisão. Mas, e quanto a Sirius B, com sua poderosa força gravitacional?
Em 1925, Adams, a primeira pessoa a estudar o espectro de Sirius B, tornou a faze-lo. Ele descobriu que havia um deslocamento vermelho naquele espectro, exatamente como a teoria de Einstein predissera. Sirius B realmente possuía um campo gravitacional imenso.
Aí estava a prova final de que Sirius B era pequena e muito densa. E já que Sirius B era assim, então todas as anãs brancas também eram. A mesma coisa acontecerá com nosso sol algum dia, num futuro muito longínquo.
Mas, se a força da gravidade aumenta cada vez mais à medida que uma Estela vai entrando em colapso, o que interrompe esse colapso e faz com que ela se transforme numa anã branca? Por que as estrelas nunca morrem completamente?
Mesmo após a destruição dos átomos e o esmagamento dos elétrons, estes continuam existindo. Eles ocupam muito mais espaço do que os núcleos e impedem que a anã branca se encolha ainda mais.
Entretanto, quanto mais massa tiver uma estrela, maior será a sua força gravitacional e mais sua matéria se comprimirá. Uma anã branca com mais massa do que Sirius B se comprimiria mais e ficaria menor do que ela.
O que acontece se uma anã branca for muito densa?
Em 1931, Subrahmanyan Chandrasekhar, astrônomo hindo-americano, estudou essa questão. Ele conseguiu demonstrar que, se uma anã branca tivesse massa suficiente, destruiria a resistência imposta pelos elétrons e entraria em colapso ainda maior.
Chandrasekhar imaginou a quantidade de massa que uma anã branca deveria ter para sofrer grande colapso: 1,4 vez mais densa que a do nosso sol. Isto é denominado o limite de Chandrasekhar.
Todas as anãs brancas que os astrônomos descobriram e estudaram até hoje possuem menos massa do que o limite de Chandrasekhar.
Aí surge um problema.
Em primeiro lugar, se a massa de todas as estrelas fosse 1,4 vez menor do que a do sol, então tudo se explicaria facilmente. Todas as estrelas se transformariam eventualmente em anãs brancas, como um dia acontecerá com nosso sol.
O fato é que algumas estrelas possuem mais massa do que isso. Cerca de 2,5% de todas as estrelas do céu possuem massa 1,4 vez maior que a do sol. Pode não parecer muito, mas existem tantas estrelas que mesmo 2,5% delas é um grande número.
As estrelas do universo estão reunidas em grandes grupos chamados galáxias. A nossa galáxia é constituída de cerca de 120 bilhões de estrelas. Significa que cerca de três bilhões delas possuem uma massa maior do que o limite de Chandrasekhar. A massa de algumas chega a ser sessenta ou setenta vezes maior que a do sol.
O que acontece com elas?
Ao estudar as estrelas densas, os astrônomos descobriram que quanto mais massa elas tiverem, mais curto e tempestuoso será seu tempo de vida.
Quanto maior a massa de uma estrela, mais violentamente sua gravidade a comprimirá e ela ficará mais quente para evitar um colapso. Quanto mais alta estiver a temperatura de uma estrela, mais depressa ela gastará seu combustível, ou seja, hidrogênio. Por este motivo, o tempo de vida das estrelas densas é mais curto do que o das estrelas que possuem menor massa.
Uma estrela de massa equivalente à do Sol leva 10 bilhões de anos para gastar seu combustível, mas uma estrela três vezes mais densa gastará seu combustível em apenas meio bilhão de anos. Esta é uma das razões pelas quais existem tão poucas estrelas realmente densas. Elas não duram muito tempo.
Além disso, quanto maior for a massa de uma estrela, mais ela crescerá ao se tornar uma gigante vermelha e morrerá mais rapidamente, quando seu combustível tiver por fim se esgotado.
Quando uma estrela sofre um colapso repentino, acaba explodindo durante esse processo. Quanto mais massa tiver, maior será sua explosão.
Ao explodir, a estrela esgota todo o hidrogênio que ainda resta em suas camadas externas. Isto acontece muito rapidamente. Ela então se torna incandescente e passa a brilhar 100 bilhões de vezes mais do que antes, podendo permanecer assim durante algumas semanas.
Às vezes uma estrela obscura, vista somente através do telescópio, fica tão brilhante que se torna visível a olho nu. Os astrônomos que viveram antes da invenção do telescópio pensavam que uma nova estrela acabava de surgir no céu. Por isso, ela é chamada de nova.
Algumas novas não brilham muito e são resultantes da matéria incandescente que outra estrela lançou sobre elas. As novas bem brilhantes resultam da explosão real de estrelas densas e são atualmente conhecidas como supernovas.
Isto parecia resolver o problema criado pelo limite de Chandrasekhar. Quando uma estrela se transforma em supernova, sua explosão atira para o espaço quase toda a matéria que ela contém. Apenas uma pequena parte permanece intacta. E então sofre o colapso.
Quando uma estrela densa explode, é possível que grandes quantidades de matéria sejam lançadas pelo espaço, e a parte que sofre o colapso tenha sempre menos massa do que o limite de Chandrasekhar.
Se for assim, todas as estrelas, não importa qual seja sua massa no início, podem eventualmente se tornar anãs brancas não muito densas.
3. PULSARES E ESTRELAS DE NEUTRONS
Nem todos os astrônomos estavam convencidos de que as supernovas seriam a resposta certa para o problema do limite de Chandrasekhar.
Alguns deles continuavam se perguntando o que aconteceria quando uma estrela gigante explodisse. Parecia-lhes que somente uma determinada parte de sua massa poderia ser lançada para o espaço e que isto não seria suficiente para colocá-la abaixo do limite de Chandrasekhar. Na verdade, eles achavam que uma estrela não poderia perder mais do que 90% de sua massa, na explosão de uma supernova. Se fosse assim, qualquer estrela com mais de quinze vezes a densidade do sol certamente terminaria com uma massa (pronta para entrar em colapso) muito maior do que o limite de Chandrasekhar.
Além disso, no caso das estrelas com bastante densidade, o colapso poderia ser tão repentino que, mesmo a massa restante estando abaixo do limite de Chandrasekhar, os elétrons sofreriam um esmagamento conforme a estrela fosse comprimindo. O que aconteceria depois?
Em 1934, o astrônomo suíço-americano Fritz Zwicky e o astrônomo teuto-americano Walter Baade especularam sobre essa questão, chegando depois à seguinte conclusão:
O núcleo de um átomo é formado por dois tipos de partículas: os prótons e os nêutrons. Ambos são muito parecidos, mas cada próton possui uma carga elétrica, enquanto que cada nêutron não possui nenhuma.
Os elétrons que existem fora do núcleo dos átomos comuns, assim como dos átomos esmagados de uma anã branca, também contêm uma carga elétrica. A carga elétrica de um elétron tem exatamente o mesmo tamanho que a carga elétrica de um próton, porém as duas são espécies opostas. A carga elétrica do próton é denominada positiva e a do elétron, negativa.
Se um elétron e um próton forem pressionados um contra o outro e se juntarem, as cargas elétricas opostas de ambos se anularão entre si. Restará apenas um nêutron, sem nenhuma carga elétrica.
Zwicky e Baade achavam que, se a massa de uma estrela em colapso fosse maior do que o limite de Chandrasekhar, ou se o próprio colapso ocorresse depressa o bastante, todos os elétrons então seriam forçados para dentro do núcleo. Os prótons existentes no núcleo se transformariam em nêutrons e a estrela terminaria como um amontoado de nêutrons.
Com a ausência dos elétrons, nada mais impediria os nêutrons de irem se aproximando entre si, até se tocarem. A massa em colapso então se tornaria uma estrela nêutron.
Os nêutrons são tão menores do que os átomos, que uma estrela de nêutron seria muito pequena. O sol, por exemplo, é uma grande bola de gás quente com 1,4 milhões de quilômetros de diâmetro. Mas ainda assim, ele conservaria toda a sua massa original de antes.
Zwicky e Baade acreditavam que as anãs brancas se formariam somente a partir de estrelas que fossem pequenas demais para explodir como as supernovas. As estrelas suficientemente grandes para atingir o estágio de uma supernova sofreriam um colapso que as transformaria em estrelas de nêutrons. (O nosso sol é muito pequeno para explodir. Algum dia, ele entrará em colapso e se tornará uma anã branca, não uma estrela de nêutron.)
Mas, se uma estrela nêutron possui poucos quilômetros de diâmetro, como poderíamos verificar se a teoria de Zwicky e Baade está correta? Com certeza, nem mesmo o melhor telescópio do mundo nos permitiria ver uma pequena esfera de poucos quilômetros de diâmetro, a quatrilhões de quilômetros de distância da Terra!
Talvez haja uma solução para tal problema. Se uma estrela imensa transformar-se em uma estrela nêutron ao sofrer o colapso, a energia desprendida durante esse processo se converterá novamente em calor. A superfície da estrela nêutron deverá atingir uma temperatura de 10 milhões de graus. É quase tão quente quanto o centro do sol.
Uma superfície que esteja à temperatura de 10 milhões de graus é quente demais para emitir algo como a luz comum. Ela emite irradiação, que se parece com a luz comum mas é muito mais energética. Quanto mais energética for essa irradiação, mais curtas serão suas ondas. Logo, a irradiação emitida pelas estrelas nêutrons consiste em ondas muito curtas. Tal irradiação formada por ondas curtas é chamada de raios x.
Uma estrela de nêutron deve emitir ondas de todos os comprimentos, inclusive aquelas que constituem a luz comum e também a irradiação, com ondas ainda mais longas, tais como as ondas de rádio. Com certeza, ela deve emitir raios X.
Se pudéssemos estudar os raios X vindos de diferentes pontos do céu, então saberíamos se existem estrelas de nêutrons em algum lugar no espaço. O problema é que os raios X não atravessam a atmosfera. A luz comum consegue faze-lo, mas os raios X não.
Felizmente, desde o início dos anos 50, os cientistas podem enviar foguetes para o espaço além da atmosfera. Os instrumentos transportados por esses foguetes são capazes de analisar a irradiação proveniente do céu, antes que ela atinja a atmosfera.
Em 1963, foguetes equipados com instrumentos que podiam detectar os raios X foram lançados para o espaço, sob a direção do astrônomo americano Herbert Friedman. Descobriu-se que os raios X na verdade vinham de diferentes pontos do céu. Mas, será que partiam de estrelas de nêutron ou de outros objetos?
Um dos pontos de onde vinham os raios X era a “Nebulosa de Caranguejo”. Essa nebulosa é um rastro de gás e poeira, ou seja, de tudo o que restou após a explosão de uma gigantesca supernova, no ano de 1054. Haveria uma estrela nêutron no centro dessa nebulosa?
É difícil dizer. Os raios X poderiam estar vindo da poeira e do gás quentes. Em outras palavras, talvez não houvesse estrela nêutron alguma, lá.
Em 1964, a lua passou diante da Nebulosa de Caranguejo. Se os raios X estivessem vindo da poeira e do gás dessa nebulosa, a lua levaria algum tempo para encobri-la, e os raios X seriam interrompidos um após o outro. Se os raios X estivessem vindo de uma pequena estrela nêutron, a lua passaria de uma só vez diante dela, e todos os raios X seriam interrompidos ao mesmo tempo.
Na verdade, os raios X foram interrompidos um após o outro. Tudo levava a crer que ali não existia uma estrela de nêutron.
Entretanto, a história não terminou assim. Em 1931, o engenheiro americano Karl Jansky tinha descoberto que as ondas de rádio se parecem com as ondas de luz, embora sejam bem mais compridas do que elas. Alguns tipos de ondas de rádio atravessavam facilmente a atmosfera, como as ondas de luz, e foram essas as ondas descobertas por Jansky.
Nos anos 50, os astrônomos pensavam que, em certos casos, as ondas de rádio se fortaleciam e se enfraqueciam muito rapidamente. Elas pareciam mudar mais depressa do que os radiotelescópios conseguiam acompanhar.
Em 1967, um astrônomo britânico, Anthony Hewish, construiu um radiotelescópio próprio para captar essas mudanças ultra-rápidas.
O instrumento começou a funcionar em 1967 e, em menos de um mês, Jocelyn Bell, aluna de Hewish, já detectava rápidas emissões de ondas de rádio, também chamadas de impulsos, provenientes de algum lugar do céu. Cada impulso durava apenas um vigésimo de segundo e surgia regularmente a cada 1,33730109 segundo. Esse tempo nunca varia além de um centésimo de milhão de segundo.
Hewish e Bell observaram todo o céu e logo descobriram mais três lugares de onde partiam rápidos impulsos de ondas de rádio. Cada impulso obedecia a um período de intervalos diferente. Naturalmente, os dois cientistas não sabiam dizer o que produzia esses impulsos e por isso os chamaram de estrelas que pulsam. Esse nome foi logo simplificado para pulsares.
Outros astrônomos também localizaram pulsares. Em dez anos, mais de cem pulsares foram descobertos. Ao todo, devem existir 100.000 deles em nossa galáxia.
Um pulsar localizado na Nebulosa de Caranguejo tem o menor período de intervalos já encontrado até hoje. Os impulsos ocorrem a cada 0,033099 de segundo, ou seja, cada trigésimo de segundo.
O astrônomo nascido na Áustria Thomas Gold achava que, para criar tais impulsos, algum objeto no espaço devia estar passando por uma mudança rápida e contínua. Quem sabe ele não estaria se expandindo e se contraindo ou então girando em torno de seu próprio eixo? Talvez fossem dois objetos, um girando ao redor do outro.
Havia um problema, porém. Para produzir ondas de rádio que pudessem ser captadas a quatrilhões de quilômetros de distância, um objeto precisaria ter a massa igual à de uma estrela.
As estrelas comuns, entretanto, não poderiam mover-se tão depressa. Não seriam capazes de girar em volta umas das outras a cada segundo, de expandir-se e contrair-se e muito menos de girar ao redor de si mesmas a cada segundo. As estrelas que tentassem se mover com tal rapidez se despedaçariam.
Para efetuar essas mudanças tão rápidas, um objeto necessitaria ser muito menor do que uma estrela, além de ter uma força gravitacional poderosa que o mantivesse agregado. Nem mesmo as anãs brancas seriam suficientemente pequenas ou carregariam tão poderosa força gravitacional.
E se fosse uma estrela nêutron? Gold concluiu que esta seria a resposta. As estrelas de nêutron são bem pequenas e possuem uma força gravitacional tão poderosa que podem girar em torno de seu próprio eixo a cada segundo, ou até em um trigésimo de segundo, sem acabar se despedaçando.
Gold sugeriu que as ondas de rádio podem vir somente de certos pontos existentes na superfície da estrela nêutron. Toda vez que ela gira, um grupo de ondas de rádio é emitido em nossa direção.
Gold convenceu-se também que, como a estrela de nêutron emite irradiação, ela pode perder energia. A média de sua rotação, neste caso, diminuiria gradualmente.
O pulsar vindo da Nebulosa de Caranguejo, por exemplo, ocorre em um curto período de intervalos porque a estrela de nêutron formou-se somente há cerca de mil anos e é a mais jovem que conhecemos. Ainda não houve tempo para que sua rotação diminuísse muito, mas ela deve continuar diminuindo.
O pulsar proveniente da Nebulosa de Caranguejo foi estudado cuidadosamente, e Gold provou que estava certo. O seu período de intervalos vem se tornando ligeiramente mais longo a cada dia. A cada dia, esse período é 36 bilionésimos de segundo mais longo do que foi na véspera.
Atualmente, os astrônomos estão convencidos de que os pulsares na verdade são estrelas nêutron giratórias.
Não há dúvida de que as estrelas nêutron giratórias devem enviar todos os tipos de irradiação, e não apenas ondas de rádio. Os outros tipos de irradiação também devem chegar até nós através de impulsos.
Por exemplo, a estrela nêutron da Nebulosa de Caranguejo também emite impulsos de raios X. Cerca de 1/8 dos raios X da Nebulosa de Caranguejo provêm da estrela nêutron. Os 7/8 restantes vêm da poeira e do gás circundantes, produzidos pela supernova. Esses 7/8 confundiram os cientistas, fazendo-os pensar que não havia estrela nêutron alguma, quando a lua passou diante da Nebulosa de Caranguejo.
As estrelas nêutron também devem enviar sinais de luz. Em janeiro de 1969, descobriu-se, na Nebulosa de Caranguejo, uma estrela muito obscura cujo brilho se acendia e se apagava trinta vezes por segundo. Era a verdadeira estrela nêutron, enviando impulsos de luz, e os cientistas podiam vê-la afinal.
Desde então, uma segunda estrela nêutron tem sido vista em meio aos fragmentos de outra supernova. Ela é chamada de “Vela X-1”, pois encontra-se na constelação de Vela.
A massa da estrela Vela X-1 está acima do limite de Chandrasekhar. Esta é outra prova de que ela é uma estrela nêutron. Qualquer objeto com massa igual à de Vela X-1 jamais seria uma anã branca.
4. VELOCIDADE DE FUGA E MARÉS
Uma anã branca deve ser bastante densa e também deve ter uma força gravitacional poderosa. Entretanto, uma estrela nêutron é muito mais densa e sua força gravitacional bem mais poderosa.
No início deste livro, dissemos que uma polegada cúbica de matéria de Sirius B pesaria 566 quilos. Suponhamos que levássemos em conta uma polegada cúbica da matéria de uma estrela nêutron, com massa igual à do sol ou de Sirius B. Essa polegada cúbica apresentaria uma massa de 25 bilhões de toneladas. Uma milha cúbica do material de uma estrela de nêutron teria mil vezes mais do que o planeta Terra inteiro.
Agora, suponhamos que você pesasse 45 quilos. Se pudesse imaginar-se parado sobre a superfície do sol, pesaria perto de 1,5 tonelada. Na superfície de Sirius B, você pesaria uma tonelada.
Contudo, se estivesse na superfície de uma estrela de nêutron, cuja massa fosse igual à do sol, você pesaria 15 bilhões de toneladas.
Uma força gravitacional “poderosa” não quer dizer necessariamente que jamais o deixará escapar. Se você se mover depressa o bastante, poderá fugir até mesmo de um grande objeto. A explicação para isto é que a força gravitacional enfraquece com a distância.
Quando, por exemplo, um objeto se distancia da Terra, a força gravitacional deste planeta age sobre ele, diminuindo-lhe a velocidade, e eventualmente o faz voltar. Se o objeto se mover rapidamente, porém, ficará bem longe da Terra mesmo que sua velocidade esteja diminuindo, pois a força gravitacional do nosso planeta, aos poucos enfraquecida, não conseguirá diminuir-lhe a velocidade todo o tempo. O objeto continuará se distanciando e não voltará.
A velocidade necessária para que algo possa fugir da força de gravidade denomina-se velocidade de fuga.
No caso da Terra, a velocidade de fuga é de 11 (onze) quilômetros por segundo. Qualquer foguete que chegue à parte superior da atmosfera, à velocidade de 11 quilômetros por segundo, jamais retornará ao nosso planeta.
A velocidade de fuga da Terra é grande, mas nem tanto, pois podemos mandar espaçonaves para longe daqui. Seria mais difícil fugir de corpos celestes maiores.
Em Júpiter, planeta maior que a Terra e que possui um campo gravitacional mais forte, a velocidade de fuga é de 60,5 quilômetros por segundo. Quanto ao Sol, a velocidade de fuga é de 617 quilômetros por segundo e, finalmente, no caso de Sirius B, de 3.000 quilômetros por segundo.
Se considerássemos uma estrela nêutron, cuja massa seja igual à do Sol, a velocidade de fuga de sua superfície é de 193 milhões de quilômetros por segundo. Seria muito difícil para qualquer coisa que estivesse numa estrela nêutron escapar de sua força de atração.
A luz, entretanto, pode faze-lo. Ela viaja a uma velocidade de 300.000 quilômetros por segundo. As outras irradiações formadas por ondas semelhantes, mas que são mais longas ou mais curtas do que a luz, também viajam a essa velocidade. As ondas de rádio conseguem fugir, assim como os raios X. É por isso que podemos detectar as estrelas nêutron.
Se duplicarmos a distancia em que nos encontrávamos do centro de qualquer corpo celeste, sua força gravitacional será cortada em 1/4. Na superfície do Sol, por exemplo, estaríamos a 695 milhões de quilômetros de seu centro. Se nos movêssemos 695 milhões de quilômetros para o espaço, teríamos duplicada a nossa distância do centro do Sol, e a força gravitacional dessa estrela se reduziria para 1/4 de seu valor na superfície.
Na superfície de uma estrela nêutron, estaríamos a somente 8 quilômetros do centro. Se estivéssemos oito mil quilômetros acima da superfície, teríamos nossa distância do centro duplicada e a força gravitacional ficaria reduzida em apenas 1/4 do que seria na superfície. Portanto, a força gravitacional da estrela nêutron cai muito mais depressa com a distância.
Imagine-se bem próximo de uma estrela nêutron, apontando para a mesma para a mesma com o seu pé. Ele estaria mais perto da estrela do que sua cabeça e, por isso, sentiria uma força maior de atração. A força gravitacional da estrela nêutron diminui tão depressa com a distância que, mesmo percorrendo o pequeno espaço entre seu pé e sua cabeça, ela mudaria sensivelmente. Tendo seu pé e sua cabeça atraídos por forças diferentes, você seria esticado com uma força considerável.
Este alongamento é chamado de efeito tidal. Ele pode ser sentido mesmo com forças gravitacionais fracas, desde que o objeto tenha um tamanho suficientemente grande. A força gravitacional da lua estica a Terra somente um pouco. A água do lado que está de frente para a lua e também e também do lado oposto amontoa-se ligeiramente, provocando as marés. É por isso que o alongamento se chama efeito tidal.
5. COLAPSO TOTAL
Qual será a massa de uma estrela nêutron? Quanto mais densa uma estrela nêutron, mais forte será a sua força gravitacional interna. Se essa força gravitacional aumentar o suficiente, conseguirá esmagar os nêutrons que constituem a estrela? Os nêutrons podem suportar qualquer pressão?
Esta pergunta foi feita em 1939 pelo físico americano J. Robert Oppenheimer. Ele achava que os nêutrons não poderiam suportar qualquer pressão.
Se a massa de um corpo em fase de colapso fosse mais de 3,2 vezes a do Sol, ele não esmagaria apenas os elétrons durante seu colapso, mas também os nêutrons.
Além disso, depois que os nêutrons fossem esmagados, nada mais restaria para impedi-lo de sofrer um colapso total.
Se um corpo com massa igual à do Sol sofresse um colapso, a sua força total de gravidade não mudaria. Se você estivesse bem longe desse corpo, não notaria coisa alguma durante o decorrer do colapso.
Mas, se estivesse na superfície da massa em colapso, tudo seria bem diferente. Você estaria se aproximando cada vez mais do centro e, por isso, sentiria uma crescente força de atração.
Quando a massa tivesse atingido o estágio do colapso que a transforma em uma anã branca, você estaria pesando mais de 1000 toneladas. E quando ela chegasse ao estágio de estrela nêutron, você pesaria 15 bilhões de toneladas. Se o colapso prosseguisse e a massa passasse do estádio de estrela nêutron, você pesaria mais de 15 bilhões de toneladas no momento em que ela tivesse se reduzido a nada. Então pesaria mais do que isso, e depois mais.
O efeito tidal ficaria cada vez mais e mais forte e a velocidade de fuga aumentaria sem parar.
A velocidade de fuga é particularmente importante. Quando um objeto sofre um colapso depois de passar pelo estágio de estrela nêutron, a velocidade de fuga aumenta até ultrapassar 300000 quilômetros por segundo. Quando isso acontece, a luz, as ondas de rádio, os raios X e outras irradiações semelhantes nunca mais podem deixar esse objeto, pois não se movimentam suficientemente rápido. Aliás, nada pode escapar, visto que, para os cientistas, coisa alguma consegue ser mais veloz do que a luz. Se a luz não pode fugir, o que mais poderia?
A distância entre a superfície e o centro, no instante em que o objeto atinge o ponto de colapso no qual a luz é impedida de escapar chama-se raio de Schwarzschild. Ele foi calculado pela primeira vez pelo astrônomo alemão Karl Schwarzschild.
O raio de Schwarzschild de um objeto com massa igual à do Sol é cerca de 2,8 quilômetros. Ele medirá 2,8 quilômetros desde a superfície até o centro e outros 2,8 quilômetros dali até a superfície oposta. Significa que se o sol encolhesse e virasse uma esfera de 5,6 quilômetros de diâmetro, conservando toda a sua massa, a luz não poderia mais fugir dele. Na verdade, nada poderia.
Imagine um objeto tão pequeno quanto esse, em algum lugar do espaço. O que quer que passasse perto dele seria aprisionado. Os efeitos tidal o destruiriam em pequenos fragmentos. Os fragmentos cercariam a minúscula esfera e eventualmente seriam sugados. Tudo aquilo que fosse sugado, jamais escaparia.
O pequeno objeto se pareceria com um buraco no espaço, no qual as coisas caem e de onde nada pode sair. Ele seria absolutamente escuro, já que nem a luz ou qualquer outra forma de irradiação poderia sair. Seria, portanto, um buraco negro, como os cientistas costumam chamá-lo.
6. ENCONTRANDO BURACOS NEGROS
Podemos detectar os buracos negros de alguma maneira?
Se um deles estivesse perto da Terra, nós sentiríamos os seus efeitos gravitacionais. Suponhamos, porém, que haja um buraco negro bem longe daqui, entre as estrelas. Poderíamos afirmar que ele está lá?
Provavelmente, não. Um buraco negro com massa igual à do Sol teria menos que a metade do diâmetro de uma estrela nêutron. Além disso, o buraco negro não estaria emitindo impulsos de radiação.
Sendo tão pequeno e não enviando emissões de qualquer espécie, como então poderíamos captá-lo?
Isso talvez não seja possível. Quem sabe os astrônomos passem anos discutindo os buracos negros, sem que jamais consigam ter certeza de sua existência.
Mas, felizmente, parece haver uma saída. Embora nenhuma irradiação seja emitida pelo buraco negro, toda a matéria que eventualmente caísse dentro dele poderia enviar sinais no momento em que estivesse caindo. Ela enviaria raios X.
Qualquer pequena partícula da matéria que caísse em um buraco negro emitiria apenas uma pequena quantidade de raios X. Não haveria raios X suficientes para detectarmos o buraco negro a quatrilhões de quilômetros de distância.
Suponhamos, porém, que uma grande quantidade de matéria caísse ininterruptamente dentro de um buraco negro. Neste caso, os raios X poderiam ser emitidos em porções tão grandes que teríamos condições de detectá-los.
Entretanto, não parece provável que uma grande quantidade de matéria possa cair dentro de um buraco negro. A questão é que o espaço sideral é muito vasto. Imagine se o nosso Sol se transformasse em um buraco negro. Os planetas continuariam distantes dele, girando à sua volta, e jamais cairiam. Também não haveria muitas outras coisas realmente próximas para ele sugar.
Por outro lado, isso acontece porque o sol é uma estrela solitária, quer dizer, sem falarmos nos planetas que giram ao seu redor. Quase metade das estrelas que existem no céu estão em pares. É muito comum encontrarmos duas estrelas bem próximas, uma girando em volta da outra. Às vezes, cada uma dessas estrelas possui mais massa do que o Sol.
Vamos imaginar um par de estrelas densas, uma girando em torno da outra. A maior delas gastaria todo o seu combustível primeiro, se expandiria e viraria uma gigante vermelha, após o que explodiria, tornando-se uma supernova.
A supernova lançaria longe uma grande parte de sua massa e aquilo que restasse se transformaria em um buraco negro, depois de sofrer um colapso. Algumas porções da massa lançada durante a explosão cairiam sobre a outra estrela, que ganharia mais densidade.
O buraco negro e sua estrela irmã continuariam a girar em torno uma da outra. A estrela irmã, mais densa do que antes, então gastaria rapidamente todo o seu combustível e começaria a crescer, transformando-se por sua vez numa gigante vermelha.
As camadas externas da gigante vermelha que estivessem de frente para o buraco negro seriam puxadas até ele pelos efeitos tidal. Porções de sua matéria cairiam dentro do buraco negro, ao mesmo tempo em que emitiriam grandes quantidades de raios X.
Este processo duraria milhares de anos, e durante todo esse tempo raios X seriam enviados pelo espaço em todas as direções e em quantidades tão grandes, que seria possível detecta-los, mesmo a grandes distâncias.
Os astrônomos da Terra teriam que observar muito bem os lugares do céu de onde esses raios X estariam partindo. Se os raios X viessem de um único ponto, significaria que eram oriundos de uma estrela em colapso – de uma estrela nêutron ou de um buraco negro.
Se fosse uma estrela nêutron, os raios X chegariam como rápidos impulsos, produzidos à medida que ela girasse. Se fosse de um buraco negro, os raios X chegariam continuamente, pois esses raios não seriam oriundos do buraco negro em si, mas sim da matéria que ele estivesse sugando. Neste caso, os raios X chegariam ora em grandes quantidades ora em pequenas quantidades, ou seja, de modo irregular, conforme as quantidades maiores ou menores de matéria que estivessem sendo sugadas naquele momento.
Uma das primeiras fontes de raios X oriundas do céu foi captada em 1965, na constelação de Signus, ou Cisne. Era uma fonte particularmente forte, que recebeu o nome de “Signus X-1”. Quando os pulsares foram descobertos dois anos depois, alguns astrônomos perguntaram-se se Signus X-1 não seria também um pulsar e, portanto, uma estrela nêutron.
Os astrônomos, entretanto, estavam apenas começando a aprender sobre os raios X e por isso não dispunham de informações suficientes para dizê-lo com certeza.
Então, em 1969, foi lançado um satélite espacial que levava instrumentos apropriados para detectar raios X. O satélite detectou e localizou 161 fontes de raios X. Pela primeira vez os astrônomos tinham conseguido um vasto material para estudar.
Por volta de 1971, os instrumentos instalados naquele satélite mostraram que os raios X provenientes de Signus X-1 variavam de intensidade, de maneira irregular. Isto queria dizer que Signus X-1 não poderia ser uma estrela nêutron. Os astrônomos então começaram a indagar-se se ela não seria um buraco negro.
Eles estudaram o local no céu de onde os raios X estavam vindo e descobriram que ondas de rádio também vinham de lá.
Usando os raios X e as ondas de rádio, os astrônomos localizaram com precisão o lugar no céu que estavam procurando. Era muito próximo de uma estrela visível. Essa estrela constava dos registros como HD-226868. HD-226868 é uma estrela bastante obscura, pois encontra-se muito longe daqui. Ela deve estar a uns 10000 anos-luz, 1100 vezes mais distante do que a estrela Sirius.
Quando conseguimos imaginar tão longa distância, torna-se evidente o quão grande é essa estrela, que possui trinta vezes a massa do sol.
Ela não é uma estrela solitária, mas gira ao redor de outra estrela uma vez a cada 5,6 dias. Se uma volta é feita com tanta rapidez, então as duas estrelas devem estar bem perto uma da outra.
Os raios X não partem de HD-226868, mas sim de um ponto muito próximo dali. Na verdade, partem da companheira de HD-226868, isto é, da estrela em volta da qual HD-226868 está girando.
Considerando a média de velocidade com que HD-226868 gira, os astrônomos podem concluir que sua estrela companheira possui de cinco a oito vezes a massa do Sol.
Mesmo assim, quando olhamos para o lugar onde a estrela companheira de HD-226868 deve estar, não vemos coisa alguma. Se ela fosse uma estrela comum, com massa de cinco a oito vezes maior do que a do Sol, então teria brilho suficiente para ser vista através dos telescópios, mesmo estando 10000 anos-luz distantes da Terra.
Se não podemos vê-la, então ela deve ser realmente uma estrela que está sofrendo um colapso. As anãs brancas e as estrelas nêutron também não poderiam ser vistas àquela distância, mas nenhuma delas poderia ter essa massa sem que sofresse um novo colapso.
Por todas estas razões, muitos astrônomos acham que Signus X-1 é de fato um buraco negro, o primeiro descoberto até agora. Devem existir muitos outros.
Como vimos, os buracos negros podem se formar quando uma estrela sofre um colapso. Tais buracos negros terminam com uma massa igual à das estrelas e crescem constantemente, por causa da matéria que vão sugando. Por outro lado, pequenos corpos também podem se transformar em buracos negros se forem pressionados uns aos outros com força suficiente.
Em 1971, o cientista inglês Stephen Hawking sugeriu que isso teria acontecido na época do surgimento do universo, após um “big bang” (termo inglês para “grande explosão”). Como toda a matéria que atualmente constitui o universo tivesse explodido, algumas porções da mesma foram comprimidas em conjunto com tanta força durante essa explosão, que formaram-se pequenos buracos negros. Alguns desses buracos negro podem ter uma massa pequena como a dos planetas ou até menor, e são chamados de mini-buracos negros.
Hawking também mostrou que os buracos negros podem perder massa, entretanto. Uma parte de sua energia gravitacional é transformada em partículas fora do raio de Schwartzschild e essas partículas são capazes de escapar. As partículas fugitivas carregam consigo pedaços de matéria do buraco negro que se “evaporam” no caminho.
No caso dos grandes buracos negros, que têm massa igual à da estrela, esses pedaços se evaporam tão lentamente, que demorariam trilhões de anos para um buraco negro deixar de existir. Àquela altura, ele ganharia mais massa do que perderia, e portanto nunca evaporaria realmente.
Quanto menor for o buraco negro, mais rápido ele se evaporará e menor será sua chance de ganhar massa.
Um buraco negro pequeno de verdade deve perder massa mais depressa do que ganha. Por isso, talvez diminua de tamanho e então se evapore com muito mais rapidez, tornando-se ainda menor. Finalmente, quando está bem pequeno, ele deve evaporar-se de uma vez numa espécie de explosão que envia irradiações ainda mais energéticas do que os raios X. Essas irradiações seriam os raios gama.
Os mini-buracos negros que se formaram na época do “big bang”, 15 bilhões de anos atrás, podem agora estar desaparecendo. Hawking calculou o tamanho que eles devem ter tido no início e que tipo de raios gama deviam produzir ao explodirem.
Se os astrônomos pudessem detectar o mesmo tipo de raios gama que Hawking acredita existir, haveria uma prova de que os mini-buracos negros já foram e ainda são uma realidade. Porém, nenhum raio gama dessa espécie foi detectado até agora.
Mas isso pode acontecer a qualquer momento. E não podemos nos esquecer de que há ainda Signus X-1.
Em breve, os astrônomos deverão obter ainda mais informações sobre os buracos negros, e talvez descubram coisas surpreendentes que possam nos ajudar a entender melhor o universo.