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Amada (Toni Morrison)

Lucas_Deschain

Biblionauta
[size=medium][align=center]Amada (Toni Morrison, 1987)[/align][/size]

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Sinopse:

[align=justify]Livro mais conhecido da escritora americana Toni Morrison, prêmio Nobel de Literatura de 1993, Amada ganhou o Pulitzer de 1988 e em 2006 foi eleito pelo New York Times a obra de ficção mais importante dos últimos 25 anos nos Estados Unidos. Em 1998 recebeu uma adaptação cinematográfica - A bem-amada -, com Oprah Winfrey no papel principal.
A história se passa nos anos posteriores ao fim da Guerra Civil, quando a escravidão havia sido abolida nos Estados Unidos. Sethe é uma ex-escrava que, após fugir com os filhos da fazenda em que era mantida cativa, foi refugiar-se na casa da sogra em Cincinatti. No caminho, ela dá à luz um bebê, a menina Denver, que vai acompanhá-la ao longo da história.
Amada tem uma estrutura sinuosa, não-linear: viaja do presente ao passado, alterna pontos de vista, sonda cada uma das facetas que compõem esta história sombria e complexa. Considerado um clássico contemporâneo, faz um retrato a um tempo lírico e cruel da condição do negro no fim do século XIX nos Estados Unidos.

"A versatilidade e a abrangência técnica e emocional de Toni Morrison não têm limites. Não há como duvidar de sua estatura como uma das personalidades mais proeminentes da literatura americana de todos os tempos. Amada é um livro arrepiante."
- Margaret Atwood, The New York Times[/align]

Fonte: Companhia das Letras

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[align=justify]Terminei esse livro no sábado passado e devo dizer que é uma obra-prima mesmo. Poucos livros conseguem ser tão tocantes e profundamente elaborados tanto em sua escrita quanto na coragem de tratar de temas tão cristalizados no senso comum. Amada é uma daquelas obras para se ler ficando arrepiado a todo instante. A não-linearidade serve de emblema para a complexidade da realidade dos ex-escravos (mas ainda profundamente escravizados sob outras formas) nos Estados Unidos de 1873. Alguém mais aí leu?[/align]
 
Epa, comprei esse livro recentemente, às cegas, sobre ele só sabia que havia ganhado o Pulitzer e que era de uma Nobel porque estava escrito na contracapa. Quando ler volto aqui pra comentar. ;) Mas seu comentário fez com que ele saltasse umas posições na lista de espera de leitura, rs.
 
Ah é? Pulou mais umas quantas posições. :sim:
Vou andar com ele na bolsa a partir de agora, just in case. ;)
 
Dessa vez não sei se vou poder ajudar muito... Até fiquei curioso pela história, no início, e interessado pelo cenário histórico, mas não fui muito com o estilo da Toni Morrison. Os discursos dela muitas vezes me pareciam forçados, propositalmente tortuosos, com metáforas estranhas... Não sei, não me afinei com o livro. Verdade que foi eleito pelos críticos como o melhor romance americano dos últimos 25 anos, mas isso foi só campanha da Oprah... XD

Por exemplo, tem aquela parte em que...

... os caçadores de escravos chegam para buscá-la, quando a Morrison explica que ninguém corre para avisar Sethe da chegada porque estariam cheios da fartura da festa da noite anterior. Isso para mim não faz o mínimo sentido. Inveja dos vizinhos é uma coisa, deixar que sejam recapturados para a escravidão é totalmente diferente, está em outro nível. Além da explicação ser fraca, incomoda também a maneira como a Morrison tenta encobrí-la com esse discurso sobre a fartura, a inveja, etc.


Agora estava vendo que a história foi baseada em fatos reais, especialmente na vida da Margaret Garner, e pelo pouco que consta no Wikipedia, já dá para ter a impressão que uma versão não-ficção seria mais interessante. Algumas coisas fariam bem mais sentido...

como o fato de que, aparentemente, todos os filhos da Margaret haviam sido gerados pelo seu senhor, o que explicaria melhor sua revolta em permitir que sua filhinha viesse a passar pelo mesmo, mais tarde. Outra coisa, na história real eles não são pegos de surpresa em uma vila qualquer. Eles estão ainda em processo de fuga e resistem à bala.
 
[align=justify]Opa, contraponto é sempre uma boa. Vamos lá:

Gigio, não lembro dessa parte em que a fartura impediu que os vizinhos avisassem Sethe dos caçadores de escravos. Você pode ser mais específico? O trânsito entre as temporalidades conquanto seja bastante nítido, pode ser confuso em alguns pontos esparsos. Aliás, esse diálogo de temporalidades é algo muito legal e acredito não ser somente o uso de "técnicas de narrativa modernas", é algo mais significativo para mim, mas depois comento aqui.

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Não sabia dessa história da Margaret Garner, legal mesmo, quero ler o artigo todo depois. O que me chamou mais a atenção no livro da Morrison é o tratamento que ela dá ao tema da escravidão, sem ficar caindo em sentimentalismos que acabem por truncar o tom crítico na medida certa. Dizer que a escravidão é um horror é algo "normal" por conta de todo o processo histórico que nos conduziu aos dias de hoje (o que não quer dizer que não hajam opiniões contrárias ou que a discriminação racial tenha acabado, longe disso, aliás), mas dar visibilidade a experiências cotidianas dos escravos sem tratá-los como pobres vítimas que nada faziam do que sofrer em silêncio é colocá-los como completamente submissos e passivos, coisa que eles não foram.

Isso achei um dos trunfos do livro, é e não é sobre escravidão, trata os ex-escravos (mas ainda "escravos" em diversos aspectos) como pessoas tentando se reerguerem de um passado que moldou o que eles são, que influenciou a maneira como eles concebem a realidade, a si próprios, seus destinos e suas ações; e não como escravos deixando-se abater pela ex-condição de escravos, embora ela exista e seja dimensão presente de suas vidas. Tem um momento em que Sethe pensa que a condição para ela seguir em frente é colocar o passado no esquecimento. É isso, o peso histórico e mnemônico é dimensão ontológica deles, mas eles não são essencializados como escravos, eles também são sujeitos preocupados com outras questões, concernentes desde a sobrevivência quanto à escolha do que vão fazer naquele dia específico.[/align]
 
[align=justify]Certos assuntos requerem muita ousadia em sua abordagem, certas questões estão tão espinhosamente incrustadas no senso comum ou tão naturalizadas através de uma perspectiva tida como "auto-evidente" que qualquer tentativa de pensá-la a partir de outros prismas enfrentará ferrenhas resistências. Esse é um dos motivos pelos quais o livro Amada (1987), de Toni Morrison pode ser considerado uma das grandes obras da literatura mundial.

Toni Morrison (1931- hoje) teve seu talento e perspicácia reconhecidos por diversos prêmios literários, inclusive o que talvez seja o maior nesse sentido, o Nobel de Literatura, em 1993. A Academia Sueca sublinhou, ao laureá-la, sua “força visionária e relevância poética”, duas características que podem ser tranqüilamente vislumbradas em Amada.

O “simples” fato de abordar a questão da escravidão, por mais que essa tenha “oficialmente” terminado, mostra como a questão da discriminação racial e preconceito ainda estão borbulhando nas relações sociais, aflorando ocasionalmente e constituindo-se prática cotidiana dependendo do entorno social que as circunda. Aprofundar um olhar sobre o período pós-abolição, procurando deslindar como a extinção “oficial” da escravidão foi um processo que não pôs um fim para a “questão racial”, desconstruindo certas visões de um dos baluartes da democracia e da igualdade, é, definitivamente, um ato de ousadia.[/align]

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Lucas_Deschain disse:
Gigio, não lembro dessa parte em que a fartura impediu que os vizinhos avisassem Sethe dos caçadores de escravos. Você pode ser mais específico? O trânsito entre as temporalidades conquanto seja bastante nítido, pode ser confuso em alguns pontos esparsos.

Pois é, em nenhum momento fica mais destacada essa alternância temporal do que quando se está procurando um trecho específico... :hahano:

Não consegui encontrar exatamente a parte que liga a festa à falta de aviso no dia seguinte, mas lembro que tinha algo assim... Bem, o melhor que pude localizar foi isto:

It made them furious. They swallowed baking soda, the morning after, to calm the stomach violence caused by the bounty, the reckless generosity on display at 124. Whispered to each other in the yards about fat rats, doom and uncalled-for pride.

(Está na página 162 de uma edição com 322 páginas)


Não sei, você tem razão quanto a ser um livro que "é e não é sobre escravidão", isso é um ponto alto, mas por outro lado o leitor aproveita muito pouco dessa condição complexa que deve ter sido a dos ex-escravos. No caso da Sethe, por exemplo, ela quase não demonstra esse aspecto. O dilema dela está essencialmente na relação com a Amada, e decorre muito mais de uma expressão de remorso, orgulho e pressão da opinião pública.
 
[align=justify]Creio que existem vários dramas que se sobrepõem (bem como as temporalidades), de modo que ambos estejam imbricados de forma complexa ao longo do texto. O drama de Sethe é tão pessoal quanto socialmente compartilhado por diversos outros sujeitos. OK, ela tem um diferencial que, creio eu, não encontra tantos paralelos assim: a morte da filha, mas ainda assim, guardando a especificidade de sua trajetória, não se pode dizer que perder entes queridos seja uma das marcas mais contundentes dos escravos fugidos ou mesmo de escravos não-fugidos?

E, nesse sentido ainda Gigio, mais uma vez discordo de você: o drama pessoal não é, digamos assim, concebido fora de um entorno social, o drama de Sethe é tão individual quanto também o é compartilhado por outros vários. Apesar da questão da Amada, que é uma peculiaridade da trajetória dela, diversas outras facetas de sua vivência devem ser levados em consideração, como a trajetória incrustada na escravidão, a memória silenciada, a cruel condição pós-abolição etc. Vejo Sethe como uma personagem ficcionalmente sui generis mas que não deve ser separada de suas contrapartes históricas e a própria visão que a Morrison tinha em mente ao criá-la. Afinal, qual eram os objetivos da autora ao dar vida a tal personagem?

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Para dar prosseguimento a discussão: a morte de Amada foi uma das questões que ficaram obscuras para mim. Gostaria de discutir melhor as circunstâncias que envolveram o ato, as motivações, as influências, os desdobramentos e as condições em que o evento fatídico ocorreu. Explico-me: tratar da morte de uma criança é sempre uma questão intrincada porque mexe com noções muito arraigadas no senso comum e em nossa forma de pensar. Levantar esse questionamento é deveras ousado, queria compreender melhor as intenções da Morrison ao fazê-lo.[/align]
 

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