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A voz e o grito

Haleth

Sweet dreams
[align=right]Nenhum grito fala o que a voz diz.[/align]

Estava em seu apartamento, não sei dizer se sozinha, aliás, não saberei dizer muita coisa sobre ela naquele momento. Mas algum incômodo escorria de seus dedos, bastava ver o teclado encharcado do computador.

Era um daqueles dias em que sentia uma comporta de represa se abrir dentro do peito. Seus dedos eram o único escape que conhecia até então, e estavam entupidos. Todas as palavras se embatucavam, passando apenas os batuques. Não era de estranhar que o tamborilar no teclado nada produzisse no editor de texto. Sentia-se uma despatriada da terra das palavras.

Pegou o violão enconstado na mesa do computador. Lá também seus dedos eram ineficientes. Era como uma criança que só sabia emitir fonemas em sol maior enquanto seu espírito ombreava Waldir Azevedo. Pelo menos agora ela entendia porque bebês choravam com tanta frequência.

Não sabia mais o que fazer com toda aquela torrente que já alcançava a altura de seu pescoço e respingava nos olhos. Começava a prender a respiração e afundar. Nesse momento suas falanges já se debatiam em tudo o que via pela frente: paredes, mesa, portas, o próprio corpo. Esfregou a cara mil vezes como se a fricção estimulasse os músculos a buscar alguma palavra dormente ou esquecida nas dobras das juntas.

Desesperada, debruçou-se na janela e gritou.
Eu estava longe, por isso tudo o que percebi foi uma voz feminina se precipitar nono andar abaixo e morrer atropelada pela buzina dos carros. Não houve pedestre que não olhasse para cima, mesmo sem saber em qual direção.

Assim como ela, também sou ignorante das artes, embora as aprecie muito. Gostaria de dizer se aquela voz era um soprano, um contralto ou algo do tipo, mas tudo o que posso afirmar é que era tão penetrante que senti meus dedos dos pés vibrarem e os olhos marejarem. Por pouco não consigo refrear um aplauso esfuziante.
 
Não consigo me lembrar de um filme em que vi em que a personagem tinha poderes especiais, além do poder de derreter toda quando ficava triste. Enterrada, com lama até o pescoço. Apedrejada por adultério no mundo radical islãmico?

Ela se jogou da janela do quinta andar. Nada é fácil de entender...

Não entendi muito bem. Por um momento pensei que a escritora morasse no nono andar. Por um momento pensei que a voz contralto ou de soprano pudesse ser uma lavadora de vidraças. Mais é muito mais fácil achar escritoras do que lavadoras de vidraças, lavadoras de vidraças trabalhando sem equipamentos de segurança. Seria o grito o suficiente para assustar alguém que estava na sacada ou na janela? Seria suicídio? Seria tudo isso lindo? Podia ser psicopatia aplaudir e tentar analisar o alcance vocal numa hora dessas. Podia ser TPM. Mas não tem gente que ri em velórios?

Nenhuma fala diz o que a voz grita?! Até um conto diz. Ou tenta dizer. Se o barulho da cidade fosse tão intenso que o grito fosse abafado pelo ruído um corpo que cai a careta de agonia aquele último segundo e a fração de segundo. isso diria sim. Até para os surdos
 
A interpretação de suicídio e de lavadora de vidraças foram novas pra mim. =) A ideia era expor a agonia de uma mulher que tenta escrever e não consegue, e extravasa gritando pela janela. Quem morre é a voz dela, mas só agora me dei conta dessa figura de linguagem acidental.

Quanto ao narrador... Bem, vai que ele é fã da Yoko Ono? hahaha
 
estranhei o trecho "Mas algum incômodo escorria de seus dedos...". certeza q ñ seria "algo" no lugar d "algum"? ou o sentido q ñ ficou claro o suficiente pra mim?
 
Foi o sentido (ou a falta de clareza na escrita). O incômodo é o mote da história, ele que ia escorrendo, aquoso, até quase afogá-la. Eu quis tentar materializar a abstração. Experiências, experiências...nunca se sabe quando vão dar certo, rs.
 

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