Entretanto, o espírito do mito é o de explicar o inexplicável...
Há uma certa certeza que nunca se deve ter ao refletirmos sobre mito/ mitologia.
Francis Bacon, por exemplo, na obra subintitulada "A Sabedoria dos Antigos" tenta decifrar o significado dos mitos/ mitologias gregas.
Acima de tudo, tudo o que é inventado pela mente humana, imaginado, sempre tem, de uma forma ou de outra, ecos no seu próprio eu, no próprio homem.
Não é exatamente a função da mitologia explicar o inexplicável ou algo externo a nós, embora essa questão possa ser um dos motivos, mas nem de longe o principal. No caso particular de um mito (uma ideia admirada, respeitada, famosa, carismática), tbm encontra respaldo numa análise de anseios que o homem nunca conseguiria preenchê-los por si só. Daí inventou a fantasia, que é um meio do homem conseguir encontrar a "matéria-prima" que fará com que seus desejos e ímpetos se tornem parcialmente reais, através da sensibilidade.
Qual o motivo da fantasia ou mitologia? Diversão? Buscar o significado do oculto que podemos perceber indiretamente? Não. Antes, ambos, fantasia e mitologia (que às vezes se misturam ou mesmo são capazes de ser uma coisa só, como na obra de Tolkien), têm a função de ser uma referência de valores morais e éticos. Repare bem que em toda fantasia e mitologia há atos de heroísmo inauditos, etéreos, exemplares acima de quaisquer outras considerações. E os valores ditos morais são defendidos e explanados de uma forma que faz qualquer um de nós valorizarmo-los como se fosse um meio de recuperarmos algo que perdemos no decorrer da nossa vida: a pureza, a inocência, a retidão.
Em toda obra mitológica/ fantástica, há mais um componente de lições, pregações (não no sentido pejorativo, superficial e clicherizado) do que antes um ato de interpretação daquilo que o homem não conhece. Com certeza há a questão de buscar o sobre-humano em nós mesmos em personagens fictícios, como se fosse uma outra dimensão e personalidade do homem que deveria existir ou ser valorizada concomitantemente junto à realidade em que vivemos.
Francis Bacon refere-se a toda mitologia (em especial a Grega, mas valendo tbm para a nórdica, celta, etc) como uma grande alegoria, máxima, sobre nós mesmos: nossas qualidades que achamos estar perdidas ou ausentes, mas tbm nossos defeitos mais vis; medos, incertezas e capacidade de realizar obras maravilhosas como tbm aquelas que provocam toda sorte de males.
Esse mundo alternativo imaginário da mitologia/fantasia serve como um ponto máximo com o qual o homem pode realizar todas as suas inquietações ligadas a desejos, inclusive, de tentar dar sentido a algo que nossa mente imagina como ideal. É a nossa mente querendo ser aquilo que, proporcionado pela imaginação, nunca poderíamos alcançar devido a limitações diversas impostas por uma sociedade demasiadamente racional e materialista. Portanto, esse mundo maravilhoso que evocamos, seja o de Tolkien, seja o de qualquer grande autor, serve para que sempre possamos viver a verdadeira vida.
Toda a síntese de bons valores que atualmente se perdem em meio a um turbilhão de sentimentos e atitudes negativas do mundo real, se encontram no meio desse escape de alguns poucos homens visionários, através de suas obras seminais e eternas. Todas as mensagens que podemos tirar de uma obra de mitologia fantástica são tão simples mas ao mesmo tempo, inabaláveis quanto à natureza de nos fazer crer que somos mais do que pensamos ou de nossas funções num mundo urbano cheio de distorções e obscuridades. A Mitologia procura nos lembrar de algo que somos ou gostaríamos de ser. Embora possa ser apenas um meio de brincar com a criatividade e materializar coisas do subconsciente que poderíam ser a antítese das referências que erroneamente incrustamos como ideais numa sociedade deveras submissa demais e auto-crítica de menos.