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Melkor representa Lúcifer, O Anjo Caído??

Siiiim, já ouvi falar do Black Book of Arda, mas colocar o Melkor como bonzinho já acho forçação.

Por incrivel q pareça o Capiroto não aparece no VT fazendo zona, enquanto o deus judaico-cristão mata milhares só no dilúvio. A treta-mor é com o Jó e mesmo assim o "shaitan" que aparece pode ser qualquer "opositor", não o Capiroto em si.

AGORA, o Melkor treta o Silmarillion INTEIRO, enquanto Eru só intervém em questões importantíssimas como Númenor. Fazer o Melkor "lecau" é, por incrível que pareça, mais inverossímil que o Capiroto.
 
Sim, verdade....como eu já falei antes aqui...a noção verdadeira do Demônio Judaico-Cristão não está na "letra" do Velho Testamento ou do Novo....mas, sim, na leitura do "espírito" que jaz de permeio entre um e outro ( com uns empréstimos pontuais do apócrifo Livro de Enoque)....No domínio do innuendo e das entrelinhas.

Inclusive é por isso que, a bem da verdade, a vilanização de Melkor funciona MELHOR teologicamente do que a do Satã estritamente "bíblico" (que é uma espécie de Promotor Público , servidor de Jeová e não uma potência rebelada antagonística)...

E é por isso que a visão gnóstica do Silmarillion no Black Book of Arda soa "fake" por muito bons que possam ser os méritos literários das autoras que, dizem, foram muito esforçadas ( eu mesmo só comecei a ler mas é que tenho que parar muito pra dar risadas)
 
Última edição:
Verdade.

Mea culpa.

O próprio Dostoievski acaba sendo apenas uma voz dentro do imenso caleidoscópio polifônico que é toda a sua obra e se eu me deixei encantar por essa canção (de serpente?) é impossível não se embrenhar e se perder, mesmo que por vaidade, no discurso labiríntico do autor. E compreender sua função não apenas narrativa como seu conteúdo artístico, seu valor estético.

Ademais, sobe gnosticismo, isso de Deus criador malvadão tem seus precursores em Zaratustra, Mani e, apaziguadamente, em Orígenes, que tento conciliar seu gnosticismo com o cristianismo ortodoxo. Foi parcialmente sem sucesso. Mas fica a dica para quem, de um ponto de vista politeísta, pagão, ateísta ou o que seja, considerar uma versão história alternativa de Deus e do 'diabo'. Enfim, a Ortodoxia precisou lutar muito, inclusive intelectualmente, para se colocar como a posição dominante, por séculos ela foi suplantada e correu risco de extinção pelo arianismo e outras heresias.

Como cristão ortodoxo é de um lado que me filio, mas jamais deixei de pesquisar e me fascinar com as demais Tradições, tentando exaurir delas sua Verdade própria. Mesmo com o propósito mais humilde, mas igualmente valoroso, de estudar a obra de Tolkien, essa pesquisa amorosa é válida, é bela, é moral.
 
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Retomando a análise sobre o ''tolkienizado'' em ''Melkor, o Satanás 'tolkienizado''', discorramos sobre as diferenças entre Morgoth e Sauron, o seu ''grão vizir'', a quem Melkor traiu mas que viria a ser o seu sucessor.

Como disse antes, Morgoth era um mero corruptor, porém este não não era o caso de Sauron, Gorthaur era um dominador e, para comprovar isto, basta analisar os seus respectivos anéis. O de Melkor (Arda, este planeta) representa a dispersão do seu poder e portanto da sua diminuição de mais poderoso dos Valar ao menos poderoso deles; enquanto que o de Sauron ("The One") representa a concentração de suas capacidades inatas e uma ampliação das mesmas.

Mairon, ao contrário de Morgoth, não se opunha à existência de outras inteligências além da sua na Terra, contato que elas estivessem sob o seu comando. Ele era capaz até mesmo de fazer o bem, caso isto lhe conviesse.

Sauron era um político, Melkor era um louco.

Mas...

O fato é que, por mais que tenha feito, Gorthaur fracassou em última instância em seu plano de submeter todas as vontades possíveis à sua, enquanto que Morgoth teve pleno sucesso em contaminar, com a sua força vital, tudo o que existe no Planeta Terra.

Ou seja, como corruptor, Melkor foi muito bem sucedido.

Está certo que, neste processo de contaminação, ele perdia o controle sobre a energia que dispersava (e aí há a dúvida se ele poderia ''drená-la'' de volta a si e se isto seria do interesse de Morgoth, afinal tal processo de ''drenagem'' levaria a uma descontaminação de Arda pois, por maior que seja, esta energia não é infinita), mas isto talvez seja a evidência maior de que Melkor praticou um longo ritual de suicídio assistido por seguidores, a princípio, incautos.

Seria a execução de Morgoth o fim da mitologia criada por Tolkien e tudo o que veio depois um mero, e imenso, epílogo?

Arda irremediavelmente desfigurada...

Isto dá o que pensar sobre como o Professor via o mundo e a vida.

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Última edição:
Para se desfazer ou se remediar a desfiguração de Arda, para Tolkien, só uma Nova Criação mesmo e isso já entra nas cripto-profecias dentro do Legendarium sobre o Homem que encarnaria o Terceiro Tema. Cristo.

Isso já se vê n'O Senhor dos Aneis mesmo, como Arda vai se tornando um mundo cada vez mais e mais cinzento, velho e cansado, que faz os eldar, particularmente após o sofrimento cósmico da Guerra do Anel, a última grande e ontológica manifestação do poder destrutivo do Anel de Morgoth, vão abandonando a Terra-média para o refúgio de Valinor. O fim do mundo para os eldar, mas os edain enfrentariam ainda muitos terríveis séculos e lutas, não mais contra nenhum Vala ou Maia, mas contra a ameaça muito concreta e humana dos efeitos nas sociedades humanas do Mal semeado.

Segundo a teologia, o mundo subcriado não poderia ser revitalizado de dentro, nem mesmo pelos Ainur. Tal grande intervenção, aquela que não baniria o Mal, mas o faria recuar através de um grande milagre encarnacional, um sacrifício humano mais fundamental e salvífico... bom, há indicações disso. Esse papel só cabe ao Homem Fundamental, o Macrantropo, o Homem Total.

Eru vem até nós. Nasce, vive, sofre, morre e ressuscita. E reina.
 
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Um aspecto pouco citado da biografia de Melkor é a rejeição que este sofreu da parte de Varda,

Elbereth não apenas repeliu Morgoth, ela também se apaixonou por seu irmão gêmeo (e muito menos poderoso), Manwë.

Ora, não é preciso muito esforço para perceber o estrago que tal fracasso amoroso causaria em uma personalidade tão egocêntrica e propensa à autodestruição quanto a de Melkor.

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Um aspecto pouco citado da biografia de Melkor é a rejeição que este sofreu da parte de Varda,

Elbereth não apenas repeliu Morgoth, ela também se apaixonou por seu irmão gêmeo (e muito menos poderoso), Manwë.

Ora, não é preciso muito esforço para perceber o estrago que tal fracasso amoroso causaria em uma personalidade tão egocêntrica e propensa à autodestruição quanto a de Melkor.

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Sorte que depois apareceu um certo maia pra consertar o estrago feito no coraçãozinho negro do vala!!

xDDDD

Saurita s2 Melkinho
 
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O Triângulo Amoroso

@AnninhaDuque, o próprio Tolkien, como foi dito em postagens anteriores desse tópico, chamava Melkor de O Diabolos dessas histórias ( em carta não publicada em livro falou explicitamente que Sauron era servo de "Satã") e deixou claro que a Arda, o Mundo onde a Terra-Média é um continente, é o nosso planeta Terra num passado recuado milhares e milhares de anos, talvez dezenas, talvez até centenas de milhares, "eras" do Mundo...

Quanto à questão da Alegoria tem minha postagem aí , feita há ANOS atrás, justamente por causa de perguntas como a sua.

Então eis a grande surpresa nesta questão: não há resposta!

Tolkien JAMAIS admitiu alegorias em suas obras. Elas não fazem analogia à nada. Foram feitas sem fazer referência à nada, pelo menos não de maneira consciente.


Mesmo assim, a Obra tolkieniana não faz alusão direta a nada disso. E não tinha intenção alguma de recontar a mitologia dos povos escandinavos.

Da mesma forma, também não fazia alusão alguma ao cristianismo. Gandalf nunca foi baseado em Cristo, nem Frodo, nem ninguém.

No entanto não há como negar a influência indireta do pensamento católico de Tolkien em sua Obra. (...)
Portanto, Gandalf não é cristão e nem pagão. Ele é um personagem do Legendarium de Tolkien, uma obra intencionalmente à parte desses dois preceitos. Mas que bebia indiretamente nestas fontes.

Melhor dizendo, na minha opinião: resposta tem, ela só não é simples ou simplista como algumas pessoas poderiam querer que fosse (ninguém aqui desse fórum).

E, a propósito, textos de Tolkien conectados com o Legendarium que se passam já dentro de períodos "históricos" do nosso Mundo fazem, sim, alusão direta às analogias, tanto "dentro" quanto "fora" da obra. No Book of Lost Tales II os elfos de Tol Erëssea identificaram Manwë com Odin e Tulkas com Thor.

Aí torna-se necessário, para não gerar confusão, qualificar melhor o que você quis dizer como sendo "à parte" . A resposta élfica famosa do "sim e não" meio que se aplica aí nessa de responder se Tolkien queria ou não aludir de propósito a alguma coisa pré-existente.

Para esclarecer a questão vejamos o que o próprio Tolkien disse a respeito do conteúdo católico e cristão do Senhor dos Anéis:

Carta 142:Acredito que sei exatamente o que você quer dizer com ordem da Graça; e, é claro, com suas referências à Nossa Senhora, sobre a qual toda a minha própria pequena percepção da beleza, tanto em majestade como em simplicidade, é fundamentada. O Senhor dos Anéis obviamente é uma obra fundamentalmente religiosa e católica; inconscientemente no início, mas conscientemente na revisão.

The Lord of the Rings is of course a fundamentally religious and Catholic work; unconsciously so at first, but consciously in the revision. That is why I have not put in, or have cut out, practically all references to anything like 'religion', to cults or practices, in the imaginary world. For the religious element is absorbed into the story and the symbolism.

O Tolkien não usou "indiretamente" ou inconscientemente as fontes cristãs não. Ele sempre quis e/ou esperou que o seu uso fosse "óbvio" na hora de se analisar ou interpretar o Senhor dos Anéis e isso foi feito de maneira intencional.Ele, inclusive, disse em carta não coligida em livro que a "fé cristã era, de longe, a fonte suprema e mais poderosa" do seu trabalho.

Concluding, Tolkien notes that ``...if I may say so, with humility, the Christian religion (which I profess) is far the most powerful ultimate source.


Manutenção consciente no processo de revisão de elemento inconsciente já incluído na redação é algo proposital e deliberado.O Tolkien admitiu isso numa boa. Mas, então, como é que o Tolkien sai dizendo que não queria incutir uma mensagem no texto sendo que admite o emprego de simbolismo?

A resposta pra isso é dessas cheias de firulas e nuances mas que são absolutamente comuns e corriqueiras em se tratando de JRRT.

Em primeiro lugar, ao contrário do que o seu post dá a entender, Snaga, Alegoria e analogia não são a mesma coisa como já foi dito em outras ocasiões.

Diferença entre Alegoria e Analogia

-10-2009, 19:11
Ilmarinen
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Re: Os elfos tem algum 'Deus'?
Citação:
Post Original de Eruvadhor Balkmadua
Na minha opinião, as obras de Tolkien nos remete a fazer constantes comparações com a Realidade, o que pra mim é bastante normal, mas vai ficando meio chato...Depois de tantos tópicos explicando que Tolkien não pensou em fazer comparações com outras obras,Enfim, acho esta discussão desnecessária, vamos aceitar o que Tolkien escreveu de coração aberto, sem querer fazer comparações com outros textos, outras mitologias e tudo mais...Eru é Eru...um ser divino...Deus é Deus...outro ser divino,
Eruvadhor, sinto muito, mas aí você está cometendo um equívoco, comum entre o Fandom, confundir alegoria e analogia, mas que é uma armadilha que costuma prejudicar bastante a compreensão da obra. Será bom porque o seu post vai ajudar a esclarecer muita coisa para as pessoas que já postaram aqui

O fato de Tolkien não ter feito suas histórias como alegorias não implica em dizer que ele não queria que elas fossem comparadas com outras obras, muitas vezes essa comparação , inclusive, é essencial para se entender o que ele queria explicar ( nas cartas ele usou esse recurso várias vezes). O Mundo retratado em Tolkien é o nosso planeta Terra em uma era antiga imaginária, Eru Ilúvatar é o Deus Judaico Cristão como o próprio Tolkien disse em uma entrevista em 1971. Confira logo aí embaixo e no link respectivo:

D. Gerrolt: Há uma característica outonal ao longo do todo de O Senhor dos Anéis, em um caso um personagem diz que “a história continua, mas eu pareço ter perdido o rumo dela...” porém, tudo está enfraquecendo, empalidecendo, pelo menos em direção ao fim da Terceira Era. Toda escolha tende à violação de alguma tradição. Agora isso me parece ser um pouco como a citação de Tenysson "a velha ordem muda, dá lugar a uma nova, e Deus se realiza de muitas maneiras". Onde está Deus em O Senhor dos Anéis?

J.R.R. Tolkien: Ele é mencionado uma vez ou duas.

D. Gerrolt: Ele é o Único?

J.R.R. Tolkien: O Único… sim.

D. Gerrolt: Você é de fato um teísta?

J.R.R. Tolkien: Oh, eu sou um católico romano! Um devoto católico romano.


Tais comparações são analogias e não alegorias. As analogias são diferentes de alegorias porque a comparação não é "fechada", para se entender uma alegoria vc TEM que comparar com um evento ou imagem original específica, o que não ocorre com a analogia ( podemos dizer , então, que alegoria é um "tipo" particular de analogia que funciona como uma "chave" decodificadora).

Analogia

ANALOGIA

Relação de semelhança entre duas coisas. De ampla aplicação na literatura, as analogias estabelecem-se entre textos, personagens, estilos, ideias, conceitos, autores, etc. Por esta capacidade de instaurar um princípio de identidade entre coisas que, genericamente, são desiguais, a analogia aproxima-se de figuras como a alegoria, a comparação, a metáfora e o símile. Diz-se que certos textos constituem analogias ou são análogos de outros, por exemplo, alguns contos de Chaucer de The Canterbury Tales (c.1387-1400) são versões análogas de outras histórias precedentes que se encontram no Decameron (1351-53) de Boccaccio ou no Confessio amantis (c.1386-1390) de John Gower. Um texto ou objecto é análogo de outro quando se estabelecem entre ambos uma determinada correspondência, mas não em todas as relações possíveis de determinar.
Alegoria

É a ausência dessa obrigatoriedade que faz Tolkien falar em "aplicabilidade" em relação ao que ele fazia. Para completar, Tolkien temia , principalmente, comparações com a política contemporânea da sua época, paralelos entre Stálin e Sauron ou entre Mordor e a Alemanha nazista e não , necessariamente, analogias com a Bíblia e outros textos mitológicos.

O desenvolvimento da fábula da Esfinge grega depende de duas condições essenciais para se constituir como alegoria: não estar limitada a um fim didáctico, como todas as fábulas (sem a conclusão do enigma, a tragédia de Sófocles não poderia progredir); não jogar com a significação metafórica, isto é, não produzir mais do que uma leitura do sentido abstraído, porque é próprio da alegoria não fazer uso da ambiguidade ou da plurissignificação, sob pena de se perder a ilação moral procurada.

Então, Tolkien pode ter comparado a Dagor Dagorath ao Ragnarök nórdico mas isso não implica em dizer que eles são idênticos e que a comparação com o Apocalipse bíblico também não se aplica.Também não significa que um "simboliza" o outro, embora eles possam remeter um ao outro, como , aliás, Tolkien admitiu que a "morte e ressurreição de Gandalf podia lembrar alguém dos Evangelhos" sem que ele fosse um representante na Terra Média do Cristo (que ainda estaria por nascer no Mundo de Tolkien). Diferente do Aslan de Lewis que não "remetia" ao Cristo mas que ERA o Cristo em uma realidade paralela.

Como já dito, analogia com outras mitologias, inclusive a Judaico Cristã, é algo que Tolkien fez frequentemente quando isso servia para facilitar o entendimento_O próprio Tolkien fazia comparações nas Cartas com histórias de outras mitologias que vão desde a Judaico/Cristã até a Nórdica e a Finlandesa passando pela Greco Romana.

Alguns exemplos encontrados nas Cartas e em HoME:

- admitiu que a Virgem Maria era a inspiração pra iconografia e simbolismo/caracterização de Galadriel.

-Comparou Manwë a Odin e Tulkas a Thor

-comparou Elendil a Noé e, por extensão, a Queda de Númenor ao Dilúvio.

-disse que Gandalf era um "viandante odinico"

-Chamou explicitamente Númenor de Atlântida.

-disse que Túrin Turambar era um compósito de Sigurd, Kullervo e Édipo.

-falou que Beren e Lúthien era Orfeu e Eurídice ( mitologia grega) com os sexos trocados.

-comparou a Ultima Batalha de sua mitologia com o Ragnarök nórdico duas vezes

-chamou Melkor de "O Diabolus dessas histórias"

- E , muito importante para os propósitos desse tópico comparou a devoção dos elfos aos Valar ao sentimento de Dulia que os católicos têm pelos seus santos, que são, como os Valar, intercessores dotados de poder recebido de Deus ( Ilúvatar), poder "delegado" e derivativo que não faz deles onipotentes, por isso não recebendo Latria ( A Adoração genuína que é dada só a Deus na Teologia Católica.). Para os católicos os Santos recebem Dulia, a Virgem, Hiperdulia, e a Latria é reservada para a Santíssima Trindade.

Então, respondendo ao tópico: os Elfos tinham um "Deus" sim, como os Numenoreanos tinham, era Eru Ilúvatar que, no mundo da Quinta ou Sexta Era passou a ser chamado de Jeová ou Elohim, o Deus Judaico Cristão. A "reverência" que os elfos tinham pelos Valar é análoga ( intencionalmente) ao culto dos Santos Católicos em comparação explícita feita por Tolkien, mas os Valar NÃO SÃO "adorados" no sentido que os deuses gregos ou nórdicos o eram, como geradores das almas dos seres criados. Isso é uma prerrogativa só atribuída a Ilúvatar e a mais ninguém.

Isso , entrentanto, não impediu que homens posteriores (vindos depois da Quarta Era), não cientes dessa distinção, tenham passado a adorar os Valar a despeito deles próprios. No Legendarium de Tolkien os Valar são os "originais" "de verdade" por detrás dos deuses mitológicos dos diversos panteões da Terra. Isso não refletia a crença no período retratado por Tolkien, ( por isso lá não haveria "culto" ou religião dos povos fiéis, os praticantes de religião eram idólatras "satanistas" que veneravam Sauron e/ou Melkor) mas passou a ser realidade em eras posteriores do nosso Mundo ( que é Arda transfigurada).

Conrad Dunkerson definiu isso muito bem e de forma sucinta em um bate boca com Michael Martinez ( "Os Valar eram ao mesmo tempo nunca ou sempre "deuses pagãos" dependendo de como nós definimos isto") :
The Valar were either never or always 'pagan gods' depending on how we define it. From the earliest versions of the story through the latest they were consistently creations of Iluvatar (thus NOT 'pagan gods'), but also sometimes worshipped as gods in their own right by the uninformed (thus 'pagan gods' in some sense). It is inaccurate to say that this situation changed.
__________________

Por isso sou mais inclinado a concordar com o Meneldur nesse tópico. O Gandalf é uma síntese deliberada e proposital de elementos cristãos e pagãos sem que as analogias implícitas nesses elementos, todas aplicáveis, fossem feitas com o intuito de transformar o personagem em alegoria de Cristo ou de outro personagem qualquer.

Mesmo assim, o Legendarium de Tolkien pode ser interpretado como o próprio Humphrey Carpenter disse, o biógrafo oficial estabelecido pelos herdeiros dele, como "complementando o Cristianimo".

E, no contexto do Mundo Subcriado de Tolkien, os vislumbres e analogias pagãs são entretecidas no Padrão da história da Terra-Média com o intuito de sugerir que a história do Legendarium é a "verdadeira história" por detrás das "estórias" das diversas mitologias. É por isso que, como já foi dito, no Livro dos Contos Perdidos II, os elfos identificaram Manwë com Odin e Tulkas com Thor , Númenor é equiparada com Atlântida e a ida de Frodo pro Avalónnë em Erëssea foi comparado com a partida do rei Arthur pra Avalon pelo próprio autor falando como criador onisciente.

Então, do mesmo modo, Gandalf e Túrin Turambar seriam arquétipos que teriam se desdobrado pra gerar as lendas que mais tarde teriam dado origem ao aspecto de Odin como "Viandante bruxo" com chapéu de abas largas e bastão/lança e à idéia de jovem impetuoso matador de Dragões que foi, mais tarde, tranformado em Sigurd e/ou Siegfried na Escandivávia e Alemanha e, ao mesmo tempo, à figura do jovem superdotado que pratica incesto sem querer com uma irmã e se suicida na ponta da própria espada falante que é a base da história do Kullervo finlandês.

Essas idéias não são mutuamente excludentes.Se Túrin pode ser ao mesmo tempo " escandinavo-teutônico" ( como Sigurd/Sigfried) mas, também, finlandês ( como Kullervo) por que Gandalf não pode ser, ao mesmo tempo, pagão( aludindo a Odin e/ou a Merlin) e cristão( sendo um análogo tipológico do Cristo)?

Então, histórias como o Conto de Adanel são criadas deliberadamente pra serem reflexos e análogos de contrapartes bíblicas como a história de Adão e Eva do Livro do Genesis. Ou será que a semelhança Adão e Adanel não parece tão intencional quanto Atalantë/Atlântida?

Embora Tolkien não tenha criado Gandalf e sua história como uma versão alegórica ou um sósia extraplanar do Cristo de nosso Mundo Primário, como C.S. Lewis fez com Aslan em Narnia ,e ele tenha mesmo usado elementos de Odin , fazendo dele um "Viandante Odínico" é , certamente, também fato que Tolkien intencionalmente imbuiu simbolismo católico e cristão no personagem de Gandalf.

Ele mesmo admitiu esse paralelismo inerente no conceito de Gandalf morrendo e ressuscitando como ressuscitou dizendo que isso "pode lembrar alguém dos Evangelhos" embora isso não tenha sido feito como uma versão alternativa da Ressurreição do Cristo tal como a que aconteceu no Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa.

Carta 181

A este mal Saruman sucumbiu. Gandalf não. Mas a situação tornou-se tão agravada pela queda de Saruman, que o 'bem' foi obrigado a um esforço e a um sacrifício maiores. Assim Gandalf enfrentou e experimentou a morte; e voltou ou foi enviado de volta, como diz, com poder aumentado. Mas embora alguém possa nisto ser lembrado dos Evangelhos, não é realmente a mesma coisa de forma nenhuma. A Encarnação de Deus é uma coisa infinitamente maior do que qualquer coisa que eu ousaria escrever. Aqui estou apenas me referindo a Morte como parte da natureza, física e espiritual, do Homem, e com Esperança sem garantias. Isso é porque eu considero o conto de Arwen e Aragorn como o mais importante dos Apêndices; é uma seqüência da história essencial, e é apenas colocada assim, porque não poderia ser trabalhada na narrativa principal sem destruir sua estrutura: que é planejada para ser 'hobbito-central', isto é, primeiramente um estudo do enobrecimento (ou sagração) dos humildes.

Essa "lembrança" ou aplicabilidade faz do episódio um análogo ou analogia que é diferente do conceito de alegoria por dar margem à plurissignificação. O lance da Morte e Ressurreição é "aplicável" na Comparação com Cristo mas também pode se referir a Balder e Odin e outros personagens de posição similar como Osiris na mitologia egípcia.

Vejamos aí: Odin é um "Peregrino Cinzento", feiticeiro, que perambula pelo Mundo com um chapéu de abas largas recebendo diversos nomes alternativos e tendo intenções secretas que envolvem os Grandes Desígnios e Destinos que regem o Mundo? Sim. Gandalf comparte todas essas características com ele, certamente. Odin, como o Cristo Bíblico, que é uma variante de temas difundidos por todo o Paganismo Indo-Europeu, morreu e ressuscitou ao se enforcar e empalar na árvore do Mundo.

Entretanto, Odin não foi "encarnado" em forma humana sujeita às vicissitudes da carne material "normal" , como Gandalf foi quando ele e os demais Istari, que também sofreram processo similar, foram enviados pra Terra-Média. Isso é uma analogia de Gandalf que se aplica ao Cristo e a outros "avatares" como Krishna e Rama mas não inclui Odin.

http://en.wikipedia.org/wiki/Incarnation_(Christianity))


Carta 156:Arrisco-me a dizer que ele era um ‘anjo’ encarnado - estritamente um espírito, isto é - com os outros Istari, magos, ‘aqueles que sabem’ - um emissário dos Senhores do Oeste, enviado à Terra-média com a grande crise de Sauron assomando no horizonte. Por ‘encarnado’ quero dizer que eles foram incorporados em corpos físicos sujeitos a dor e cansaço, e a afligir o espírito com medo físico, e a serem ‘mortos’, embora, auxiliados por seus espíritos angélicos possam resistir por muito tempo, e só mostrar moderadamente seu esgotamento por preocupação e trabalho.


Do mesmo jeito, o episódio da transfiguração, quando Gandalf ressuscitado aparece como vulto trajado de branco resplandescente na presença de 3 testemunhas também é uma reminiscência "analógica e tipológica" bíblica que remete diretamente e intencionalmente ao Cristo mas não se aplica a Odin.

Mateus 17:1-9
1. Seis dias depois, tomou Jesus consigo a Pedro, Tiago e João seu irmão, e elevou-os à parte a um alto monte.
2. E foi transfigurado diante deles: seu rosto resplandeceu como o sol, e suas vestes tornaram-se brancas como a luz.
3. E eis que foram vistos Moisés e Elias conversando com ele.
4. Então Pedro disse a Jesus: "Senhor, é bom estarmos aqui; se queres, farei aqui três tendas; para ti uma, para Moisés uma e uma para Elias!".
5. Falava ele ainda, quando uma nuvem de luz os envolveu e da nuvem saiu uma voz dizendo: "Este é meu Filho, o Amado, que me satisfaz: ouvi-o".
6. Ouvindo-a, os discípulos caíram com a face por terra e tiveram muito medo.
7. aproximando-se Jesus, tocou neles e disse: "levantai-vos e não temais".
8. Erguendo eles os olhos a ninguém mais viram, senão só a Jesus.
9. Enquanto desciam do monte, ordenou-lhes Jesus dizendo: "A ninguém conteis esta visão, até que o Filho do Homem se tenha levantado dos mortos".

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E esse tipo de simbolismo , Tolkien disse, foi incluido "subconscientemente na redação mas mantido conscientemente na revisão". Então essa "síntese" é proposital e deliberada e embora , no contexto do Mundo de Tolkien, esses eventos precedam a qualquer noção contemporênea que possamos ter de Paganismo ou Cristianismo e, nesse sentido, Snaga está certo em dizer que Gandalf "não é pagão nem cristão", eles são referências tipológicas propositais porque , no fim das contas, se dão no mesmo Mundo, já que a realidade da Terra-Média é uma versão de fantasia de um período da nossa Pré-História e não um Mundo Paralelo independente com uma história "à parte". O que ocorre lá então é Presságio e Prelúdio pro que vem depois. A isso se chama "tipologia".

Citando uma mensagem minha antiga relativa a esse tópico:


Diversos elementos do Legendarium de Tolkien no SdA acabam sendo aquilo que se chama Tipologia nos Estudos da Bíblia , prefigurações de Revelações cristãs que haveriam de surgir mais tarde.

Então, do mesmo jeito que na Bíblia , Nimrod , construtor da Torre de Babel ( um Zigurate) era considerado tipologia do Anticristo ( lembrando que Tolkien batizou Sauron, construtor de torres idólatras, de Zigur em HoME IX) e Moisés e Isaías são considerados tipologias de Jesus, em Tolkien, Gandalf, Frodo e Aragorn acabam sendo tipologias do Cristo Encarnado, prelúdios da sua Vinda. Gandalf, que já era um ser divino encarnado em forma humana, um Istar enviado pelos Valar, morre e ressuscita ( elemento também presente em Balder e Odin e em outros numerosos deuses pagãos), se transfigura em vulto de branco resplandescente na frente de 3 testemunhas como o Cristo nos Evangelhos.

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Middle Earth’s Messianic Mythology Remixed: Gandalf’s Death and Resurrection in Novel and Film

Aragorn é o rei que volta e cura os enfermos e Frodo supera as tentações e carrega uma cruz cada vez mais pesada, o Anel do Poder.

Priest_Prophet_and_King

No mesmo sentido, Galadriel acaba fazendo o papel de mediadora, guia e conselheira, numa tipologia da Virgem Maria já que o poder que ela maneja, a luz de Eärendil que vem do Silmaril sagrado, é usado, exatamente, como se fosse uma cruz contra a "vampírica" Shelob, num episódio onde os hobbits acabam manifestando Glossolalia, falando em linguas desconhecidas para eles.

Aí embaixo, como anexo, texto excelente em inglês contendo a análise detalhada das comparações entre Odin e Gandalf com citações dos textos pertinentes.

Ring31.jpg

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Última edição:
Ver anexo 70115

O Triângulo Amoroso

@AnninhaDuque, o próprio Tolkien, como foi dito em postagens anteriores desse tópico, chamava Melkor de O Diabolos dessas histórias ( em carta não publicada em livro falou explicitamente que Sauron era servo de "Satã") e deixou claro que a Arda, o Mundo onde a Terra-Média é um continente, é o nosso planeta Terra num passado recuado milhares e milhares de anos, talvez dezenas, talvez até centenas de milhares, "eras" do Mundo...

Quanto à questão da Alegoria tem minha postagem aí , feita há ANOS atrás, justamente por causa de perguntas como a sua.
Valeu
 
Lilith não é nem nunca foi uma deusa mesopotâmica.

Na verdade, é lá que não poderia ser, já que é onde primeiro surge uma diferenciação mais clara e técnica entre divindades e demônios. Para fins de comparação, no Egito, na mesma época, daemons (embora identificados somente por funções específicas) por vezes ainda eram associados com divindades. Deuses sumério-mesopotâmicos eram adorados, convidados, recebiam sacrifícios e hinos. Havia uma preocupação excessiva em se buscar sempre estar em agrado com eles, uma vez que (pelo menos no início) os Povos Mesopotâmicos não tinham uma perspectiva boa sobre a sua relação com deuses: a maioria dos deuses não era vista como favorável aos humanos (provavelmente como um reflexo das condições naturais difíceis em que viviam) e acreditavam que a sua relação deveria ser estabelecida sempre diplomaticamente.

Já demônios eram na maioria das vezes tomados como intrusos e deveriam ser espantados, pois eram associados a males diversos, principalmente doenças, pragas e todo tipo de desgraça; e o poder das divindades era justamente o que era usado para espantar esses demônios, o que é refletido no fato de que a magia mesopotâmica era constantemente preocupada com fórmulas de exorcismo e purificação, tendo textos que invocam por exemplo, quatro divindades (Shamash, Sîn, Ninurta e Nergal, por exenplo) em uma mesma fórmula com essa finalidade. É possível ver em toda coletânea de textos mágicos dessa época que existe uma obsessão constante com ideias de purificação e limpeza espiritual em geral, tendo exorcistas (āšipus) imbuídos de fórmulas para combater males que vão desde demônios, a bruxas, fantasmas e maldições, como se vê nas traduções de Tzvi Abusch e Alan Lenzi.

Existiam alguns poucos demônios que eram espeitados pragmaticamente, como Pazuzu, rei dos demônios que dominava o Vento Sudoeste, mas nesses casos faziam isso justamente para espantar outros demônios menores (sendo um caso famoso os amuletos para espantar um demônio feminino chamado Lamashtu).

A origem do que alguns tentam associar como "Lilith", claramente se encontra na segunda categoria. Lilu, lilitu ou ardat-lili eram um tipo de demônio/espírito maligno, muito associado a morte de crianças, abortos ou morte de mães durante o parto, por vezes também com conotações sexuais, no que parece ser uma espécie de proto-succubus (e.g, ver M. J. Geller no comentário The Exorcist’s Manual [KAR 44]). Diz-se que eram intrinsicamente parasitas, incapazes de ter filhos/as e com um leite venenoso.

Elas nunca foram interpretados como divindades, mas sempre espíritos perigosos e que deveriam ser espantadas a todo custo. Sua natureza parasitária e demoníaca aparece até nos mitos principais, como no mito de Inanna e a árvore huluppu, onde tal árvore é atacada por três pragas (uma serpente, uma kisigil-lila e um anzu). Kisigil-lila é geralmente traduzida como "moça fantasma", e é tido também como um tipo de "lilith".
Mesmo a famosa Placa de Relevo de Burney (na imagem abaixo), que alguns diziam ser associada a Lilith quando foi encontrada e até hoje eu vejo o pessoal falando como se fosse, já se sabe em assiriologia e nas pesquisas arqueológicas que na verdade se trata de Inanna (ou, em correntes minoritárias e pouco prováveis, Ereshkigal).

Também "Lilith" não é, ao menos originalmente e fora da cultura pop, a primeira mulher de Adão. Uma referência a "Lilith" na Torá aparece somente em Isaías 34:14, não em Genêsis, quando o profeta fala que Edom será destruída e apenas bestas do deserto, chacais, bodes selvagens e לִּילִ֔ית (lî-lîṯ) vão estar por lá. Mas até onde me consta, é dentro do uso de classe de demônios mesopotâmica que eu expliquei (uma influência provavelmente advinda do exílio na Babilônia), e tem quem diga que o uso é meramente metafórico. A tradução de Mechon-mamre inclusive fala somente em "sátiros" e "monstros noturnos", a Septuaginta (tradução grega koiné) fala em "centauros", a Vulgata fala em "lâmia" e a King James fala somente "animais noturnos".

A história de Lilith ser a primeira mulher de Adão só aparece bem depois, no Alfabeto de Ben Sirá, que vejam só: é uma comédia judaica. Nela, também o Rei Salomão depilou a virilha peluda da rainha de Sabá, Noé amaldiçoa um corvo e a filha de Nabuconodosor tem problemas com flatulência excessiva. Era um mero gênero de comédia, provavelmente para estudiosos e intelectuais medievos dos círculos judaicos.
A figura de Lilith aparece também depois em outros poucos escritos medievais como Midrash Abkir, Zohar e textos cabalísticos como o Tratado da Emanação Sinistra no século 18, mas nenhum pretendendo ser uma fonte teológica ou fazendo jus ao papel que geralmente associam a ela por aí.

Autor: Simon Alhazread
 
Lilith não é nem nunca foi uma deusa mesopotâmica.

Na verdade, é lá que não poderia ser, já que é onde primeiro surge uma diferenciação mais clara e técnica entre divindades e demônios. Para fins de comparação, no Egito, na mesma época, daemons (embora identificados somente por funções específicas) por vezes ainda eram associados com divindades. Deuses sumério-mesopotâmicos eram adorados, convidados, recebiam sacrifícios e hinos. Havia uma preocupação excessiva em se buscar sempre estar em agrado com eles, uma vez que (pelo menos no início) os Povos Mesopotâmicos não tinham uma perspectiva boa sobre a sua relação com deuses: a maioria dos deuses não era vista como favorável aos humanos (provavelmente como um reflexo das condições naturais difíceis em que viviam) e acreditavam que a sua relação deveria ser estabelecida sempre diplomaticamente.

Já demônios eram na maioria das vezes tomados como intrusos e deveriam ser espantados, pois eram associados a males diversos, principalmente doenças, pragas e todo tipo de desgraça; e o poder das divindades era justamente o que era usado para espantar esses demônios, o que é refletido no fato de que a magia mesopotâmica era constantemente preocupada com fórmulas de exorcismo e purificação, tendo textos que invocam por exemplo, quatro divindades (Shamash, Sîn, Ninurta e Nergal, por exenplo) em uma mesma fórmula com essa finalidade. É possível ver em toda coletânea de textos mágicos dessa época que existe uma obsessão constante com ideias de purificação e limpeza espiritual em geral, tendo exorcistas (āšipus) imbuídos de fórmulas para combater males que vão desde demônios, a bruxas, fantasmas e maldições, como se vê nas traduções de Tzvi Abusch e Alan Lenzi.

Existiam alguns poucos demônios que eram espeitados pragmaticamente, como Pazuzu, rei dos demônios que dominava o Vento Sudoeste, mas nesses casos faziam isso justamente para espantar outros demônios menores (sendo um caso famoso os amuletos para espantar um demônio feminino chamado Lamashtu).

A origem do que alguns tentam associar como "Lilith", claramente se encontra na segunda categoria. Lilu, lilitu ou ardat-lili eram um tipo de demônio/espírito maligno, muito associado a morte de crianças, abortos ou morte de mães durante o parto, por vezes também com conotações sexuais, no que parece ser uma espécie de proto-succubus (e.g, ver M. J. Geller no comentário The Exorcist’s Manual [KAR 44]). Diz-se que eram intrinsicamente parasitas, incapazes de ter filhos/as e com um leite venenoso.

Elas nunca foram interpretados como divindades, mas sempre espíritos perigosos e que deveriam ser espantadas a todo custo. Sua natureza parasitária e demoníaca aparece até nos mitos principais, como no mito de Inanna e a árvore huluppu, onde tal árvore é atacada por três pragas (uma serpente, uma kisigil-lila e um anzu). Kisigil-lila é geralmente traduzida como "moça fantasma", e é tido também como um tipo de "lilith".
Mesmo a famosa Placa de Relevo de Burney (na imagem abaixo), que alguns diziam ser associada a Lilith quando foi encontrada e até hoje eu vejo o pessoal falando como se fosse, já se sabe em assiriologia e nas pesquisas arqueológicas que na verdade se trata de Inanna (ou, em correntes minoritárias e pouco prováveis, Ereshkigal).

Também "Lilith" não é, ao menos originalmente e fora da cultura pop, a primeira mulher de Adão. Uma referência a "Lilith" na Torá aparece somente em Isaías 34:14, não em Genêsis, quando o profeta fala que Edom será destruída e apenas bestas do deserto, chacais, bodes selvagens e לִּילִ֔ית (lî-lîṯ) vão estar por lá. Mas até onde me consta, é dentro do uso de classe de demônios mesopotâmica que eu expliquei (uma influência provavelmente advinda do exílio na Babilônia), e tem quem diga que o uso é meramente metafórico. A tradução de Mechon-mamre inclusive fala somente em "sátiros" e "monstros noturnos", a Septuaginta (tradução grega koiné) fala em "centauros", a Vulgata fala em "lâmia" e a King James fala somente "animais noturnos".

A história de Lilith ser a primeira mulher de Adão só aparece bem depois, no Alfabeto de Ben Sirá, que vejam só: é uma comédia judaica. Nela, também o Rei Salomão depilou a virilha peluda da rainha de Sabá, Noé amaldiçoa um corvo e a filha de Nabuconodosor tem problemas com flatulência excessiva. Era um mero gênero de comédia, provavelmente para estudiosos e intelectuais medievos dos círculos judaicos.
A figura de Lilith aparece também depois em outros poucos escritos medievais como Midrash Abkir, Zohar e textos cabalísticos como o Tratado da Emanação Sinistra no século 18, mas nenhum pretendendo ser uma fonte teológica ou fazendo jus ao papel que geralmente associam a ela por aí.

Autor: Simon Alhazread
Desculpa aí mas Allazread ( que , coincidentemente, lembra Albdul Alhasred do Necronomicon está por fora nessa aí:
Vejam pq:



(não acho que um "scholar" que usa um nick pra homenagear um personagem do Lovecraft com a história do Alhazred mereça muito crédito numa matéria como essa. Vou detalhar meus motivos mais tarde ser for o caso do material aqui não ter dirimido as dúvidas.


 
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