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No mito de Babel, as línguas se diferenciam e os homens não são mais capazes de se comunicar entre si. É a torre da confusão.
No mundo de hoje, nos apartamos das PRÓPRIAS palavras. Falamos o tempo todo sem capacidade de entender o que essas palavras mesmas significam (e parece que quanto mais alguns estudam e usam certos termos, com muita carga psicológica e delimitação de ideologias, menos compreendem o que gastam a vida inteira estudando).
Assim surge o crítico do mercado culpando o embargo americano pela miséria favelada de Cuba, assim surge a feminista criticando a objetificação do corpo feminino pelo homem e sendo a favor da legalização da prostituição ao mesmo tempo.
É nesta toada que surge o cara que tem nojo da ditadura militar e usa camiseta do Che, assim como o crítico do moralismo exigindo leis e punição contra palavras que podem ofender "minorias".
Uma das palavras que mais sofre com o fetichismo, a crença na palavra divorciada de seu significado, mais supersticiosa do que um hocus pocus alquimista, é a palavra "polêmica".
Cada vez que vemos a dita cuja por aí podemos apostar: não dividirá opiniões de forma alguma - na verdade, será só a repetição do que todo mundo pensa.
É a arte de dizer que vai "chocar" e, com isso, arrancar esperados bocejos do seu alvo e rios de aplausos de seus pares - como se polêmica não fosse, justamente, para ir contra o que sua própria platéia considera esperado.
As polêmicas de hoje são sempre fazer piada com o reverendo Marco Feliciano, criticar a polícia, falar contra a sociedade hipócrita (um pouquinho mais antigo do que Sócrates, só) ou fazer sexo em público (Diógenes já despachava um amigo do interior pro Rio no meio da rua há um certo tempinho atrás), naquela crença adolescente de que fazer sexo é algo revolucionário, para campeões (tem gente que não larga a adolescência e acredita que berrar que vestiu a peruca no careca surpreende tanto quanto dizer isso com 14 anos).
A turma antenada garante que o povo não tem educação e precisa ler mais. Que Maluf é corrupto. Que Paulo Coelho não é literatura. Que as pessoas votam mal. Que futebol é menos importante do que política.
É o humorista a favor fazendo "polêmica" com ninguém dar tanto mérito para o partido no governo assim, é a polêmica blogueira garantindo que a classe média sofreu menos do que os pobres que tacaram fogo em seus corpos. É o professor universitário se achando perseguido por dizer algo inédito, que o professor dele ensinou para toda a sala e que todos os amigos dele ensinam igualzinho, sempre puxando saco de alguém poderoso que possa lhes render alguns trocados por isso.
Nada hoje em dia é mais sonífero do que a polêmica da vez. Nada segue mais a manada do pensamento único do que um polemicão da vez.
Em menos de 10 páginas de ABC da Literatura, de Ezra Pound, somos informados de que as poesias de Goethe e de todo o Romantismo não são mais do que todos os grandes trovadores medievais já haviam feito, que Shakespeare conhece muito pouco da vida e do ritmo artístico do que Chaucer, que Poe e Byron nunca fizeram um poema sem pelo menos 7 graves defeitos. Já tentou fazer esse tipo de polêmica por aqui? Ou faz igual o humorista que não tem coragem de fazer piada com muçulmanos?
Mas deixa eu apostar, na próxima você vai zoar o Bolsonaro em busca de aplauso fácil, né?