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Alerta: o cânone literário pode causar desconforto aos universitários

Bruce Torres

Let's be alone together.
Alerta: o cânone literário pode causar desconforto aos universitários
JENNIFER MEDINA
DO "NEW YORK TIMES", EM SANTA BARBARA, CALIFÓRNIA

23/05/2014 13h01
Alunos que terão de ler "O Grand Gatsby" deveriam ser alertados sobre "diversas cenas que relatam atos sangrentos, abusivos e misóginos", como propôs recentemente um aluno da Universidade Rutgers? E livros que envolvem racismo, como "As Aventuras de Huckleberry Finn" e "Things Fall Apart" –será que eles devem vir precedidos por uma nota cautelar? As imagens sexuais da mitologia grega deveriam conter um rótulo de alerta?

As universidades dos Estados Unidos vêm enfrentando pedidos de estudantes por "alertas de risco", advertências explícitas de que material que estão por ler ou ver em sala de aula pode perturbá-los ou, como alegam alguns estudantes, despertar sintomas de síndrome de estresse pós-traumático em vítimas de estupro ou veteranos de guerra.

Os alertas, que têm origem ideológica no pensamento feminista, ganharam mais terreno na Universidade da Califórnia em Santa Barbara, onde o conselho discente solicitou formalmente que sejam adotados. Mas houve solicitações semelhantes por alunos do Oberlin College, Universidade Rutgers, Universidade de Michigan, Universidade George Washington e outras instituições.

O debate irritou muitos acadêmicos, que dizem que é preciso confiar no senso comum dos professores, e que utilizar material provocante é parte de sua missão letiva. Os alertas de risco, eles dizem, sugerem uma certa fragilidade mental que o ensino superior deve desafiar, e não proteger. Os alertas foram amplamente debatidos nos círculos intelectuais e em geral foram alvo de críticas, em revistas de opinião, editoriais de jornais e listas de discussão acadêmicas.

"Qualquer forma de norma abrangente quanto a alertas de risco é uma agressão à liberdade acadêmica", disse Lisa Hajjiar, professora de sociologia na Universidade da Califórnia em Santa Barbara, que muitas vezes utiliza descrições explícitas de tortura em seus cursos sobre a guerra. "Qualquer estudante pode solicitar isenções individuais, mas dizer que precisamos de uma abordagem unificada para todos os alunos é completamente errado. A suposição de que os alunos não devem ser forçados a lidar com algo que lhes cause desconforto, nesses casos, é absurda ou até mesmo perigosa."

Bailey Loverin, aluna de segundo ano na universidade de Santa Barbara, disse que a ideia de alertas de risco para uso geral no campus lhe ocorreu em fevereiro, quando um professor mostrou um filme explícito sobre um estupro. Ela diz ter sido vítima de abuso sexual e que, ainda que não se tenha sentido ameaçada pelo filme, procurou o professor para argumentar que os alunos deveriam ter sido avisados sobre o conteúdo do filme, antes da exibição.

Loverin traça uma distinção entre alertar alunos quanto a material que possa de fato despertar memórias de trauma –como guerra e tortura, já que muitos dos alunos de Santa Barbara são veteranos de guerra– e utilizar alertas de risco para rotular obras literárias famosas, algo que outros proponentes dos alertas de risco defendem.

"Não estamos falando de alguém desviando o olhar de algo que não deseja ver", disse Loverin em entrevista recente. "As pessoas subitamente sentem uma ameaça real à sua segurança –ainda que isso seja apenas uma percepção. Elas estão presas em uma sala de aula da qual não podem sair, ou se tentarem sair a situação rapidamente se tornará pública."

As críticas mais ferrenhas se dirigem aos alertas de risco para materiais que têm lugar estabelecido nos currículos de muitas universidades do país. Entre as sugestões de livros que deveriam receber alertas de risco estão "O Mercador de Veneza", de Shakespeare (contém antissemitismo) e "Mrs. Dalloway", de Virginia Woolf (fala de suicídio).

"Francamente isso parece parte de um movimento inevitável na direção de as pessoas esperaram cada vez mais conforto físico e conforto intelectual em suas vidas", diz Greg Lukianoff, presidente da Fundação pelos Direitos Individuais na Educação, uma organização sem fins lucrativos que defende a liberdade de expressão. "Isso só vai dificultar que as pessoas compreendam que aquilo que as ofende pode ter valor sério e importante. E falar de assuntos mortalmente sérios e desconfortáveis é parte disso."

O termo "alerta de risco" se originou na Internet. Blogs e listas de discussão feministas o empregam há mais de uma década para sinalizar aos leitores, especialmente às vítimas de abusos sexuais, que eles talvez prefiram evitar certos artigos ou imagens online.

Nos campi universitários, os defensores desse tipo de medida dizem que terminologia semelhante deve ser usada para descrever os currículos dos cursos ou as aulas. A questão veio à tona no Wellesley College este ano quando a faculdade instalou uma estátua de um homem com roupas de baixo e centenas de estudantes assinaram uma petição pela sua remoção. Escrevendo no Huffington Post, uma aluna do Wellesley definiu a escultura como "peça com potencial de deflagrar perturbação", e as signatárias mencionaram "preocupações de que ela tenha despertado memórias de agressões sexuais entre algumas alunas".

Na Universidade de Santa Barbara, em março aconteceu um confronto entre um grupo de manifestantes antiaborto que exibiam imagens explícitas de fetos abortados e uma professora de estudos da mulher, grávida, que tentou destruir os cartazes, alegando que eles lhe causavam uma sensação de medo. Depois que ela foi detida por vandalismo, agressão e roubo, mais de mil alunos assinaram uma petição de apoio à professora, afirmando que a universidade deveria impor mais restrições a conteúdo que possa deflagrar perturbações. (Até o momento, o conselho docente ainda não tratou das questões que a petição propõe, e o conselho discente não propôs quaisquer mudanças de normas.)

No Oberlin College, em Ohio, circulou um anteprojeto de guia que solicitaria aos professores a inclusão de alertas de risco nos currículos de seus cursos. O guia dispunha que eles deveriam identificar qualquer coisa capaz de "perturbar o aprendizado de um estudante" e "causar trauma", incluindo qualquer coisa que sugerisse a inferioridade de pessoas transgênero (uma forma de discriminação conhecida como "cissexism") ou dos cadeirantes ("ableism").

"Esteja consciente do racismo, classismo, sexismo, heterossexismo, 'cissexism', 'ableism' e outras questões de privilégio e opressão", o guia propõe. "Perceba que todas as formas de violência são traumáticas, e que seus alunos têm vidas anteriores e exteriores à sua sala de aula, experiências que você pode não esperar ou compreender". O guia afirma, por exemplo, que embora "O Mundo se Despedaça", um romance de Chinua Achebe que se passa na Nigéria da era colonial, seja "um triunfo da literatura que todas as pessoas do mundo deveriam ler", o texto pode "causar sensações negativas em leitores que tenham sofrido racismo, colonialismo, perseguição religiosa, violência, suicídio e mais".

Depois que diversos professores se queixaram, o anteprojeto foi removido do site da universidade, para passar por revisão mais completa por um grupo de trabalho formado por professores e alunos. Professores e administradores da faculdade devem se reunir com alunos no final do ano para preparar um guia mais abrangente.

Meredith Raimondo, diretora associada da escola de artes e ciências do Oberlin College, disse que o guia tinha por objetivo oferecer sugestões, não impor normas aos professores. Raimondo é professora de estudos americanos comparativos e co-presidente do grupo de trabalho que revisará o guia, e disse que alertar os alunos quanto a riscos seria simplesmente "uma prática pedagógica responsável".

"Eu objeto bastante ao argumento de que a garotada atual precisa deixar de ser frouxa", ela diz. "Isso ignora a realidade que temos de enfrentar. Temos estudantes que chegam a nós com questões sérias, e precisamos lidar com elas de maneira respeitosa e séria".

Para Marc Blecher, professor de política e estudos do leste asiático em Oberlin e crítico severo dos alertas de risco, essa política terá efeito adverso sobre os docentes, especialmente aqueles que não são professores titulares e não têm garantia vitalícia de emprego.

"Se eu fosse um professor jovem e lesse esse guia ao preparar o currículo de um curso, ficaria aterrorizado", disse Blecher. "Qualquer aluno que sinta que algo que aconteceu na classe lhe causou uma sensação adversa poderia apresentar queixa junto a diversos órgãos universitários, e isso criaria um processo muito tortuoso para todos".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/ilustr...e-causar-desconforto-aos-universitarios.shtml
 
Não tenho uma opinião muito firme e fixa sobre isso. A princípio me parece besteira esse alerta. Se alguém se sente afetado com um caso de racismo, estupro ou o que for que viu num livro acho que a questão é pra psicólogo. Mas não sei.
 
Se alguém se sente afetado com um caso de racismo, estupro ou o que for que viu num livro acho que a questão é pra psicólogo. Mas não sei.
Mas as pessoas em questão se sentem afetadas porque isso (racismo, estupro e outros tipos de violências) faz/fez parte da vida delas, não é o caso de uma pessoa comum ler simplesmente e se sentir afetado ou deprimido por uma história triste e/ou violenta.
Lembro de ter ficado bem chateada quando li A Estrada do Cormac McCarthy e Ensaio Sobre a Cegueira do Saramago, mas não é disso que se trata.

É importante lembrar que em nenhum momento eles falam em proibir os livros mas de alertar os possíveis leitores sobre o conteúdo.
Acho que pode ser benéfico sim, por exemplo, alguém que esteja atravessando um período de depressão talvez não devesse, naquele momento, ler a história de um suicida.
O caso que mais me chamou a atenção na matéria foi o da moça grávida vendo fotos de fetos abortados.
Deve ser uma situação difícil de enfrentar pois a pessoa está fragilizada por algo que aconteceu/acontece na sua vida, assim como deve ser difícil pra uma pessoa em tratamento contra um câncer ler algo sobre alguém com essa doença cujo tratamento falhou.
Não tem motivo pra pessoa ler ou assistir coisas que podem piorar sua situação.
E uma vez que os professores não têm como saber dos problemas de cada aluno, acredito que um alerta poderia evitar problemas, tipo um aluno veterano de guerra que não queira ler um livro sobre guerra, que lhe traga lembranças e sentimentos ruins (trauma de guerra é uma coisa muito séria) pode optar por outro livro, com outra temática.
Achei bem interessante.

O problema é, como na maioria das coisas, o negócio virar neura, e todo mundo pirar e não querer indicar livro algum porque aquele é racista e temos alunos negros e judeus; o outro livro é machista e temos alunas e o outro blablabla.
Aí se entra no campo da babaquice mesmo.
 
"causar sensações negativas em leitores que tenham sofrido racismo, colonialismo, perseguição religiosa, violência, suicídio e mais"
SOFRIDO SUICÍDIO!! Tenso isso.

A reação é bastante parecida mesmo JLM.

Acho que já existe esse tipo de 'alerta' chama-se sinópse. Creio que tudo é falta de um pouco de bom senso. Sendo assim esqueceram de colocar um 'alerta de perigo' na vida...

Talvez um Don't Panic em letras amarelas já ajudaria... Acho que tem que deveria ter um alerta nos meus livros de cálculo também, já que causa insônia aos leitores ¬¬
Tenha santa paciência, se o livro não está na sessão infantil/infanto-juvenil/jovem/etc. certamente ele pode trazer algo complexo, sério, desconfortável e traumatizante.

Acho que seria simples o professor avisar que próxima aula terá o filme tal. Os alunos também são responsáveis pela própria educação, tem que pesquisar um pouco também.
 
Acho que dá pra estabelecer um pacto entre público e responsáveis pela divulgação da obra - vide as classificações etárias de filmes, mas aqui seria apenas no que concerne as temáticas. Só acho meio complicado quando se trata de obras com viés aceitável no passado, como obras antissemitas (O Mercador de Veneza, Viagem ao Fim da Noite), machistas (Lisístrata - digam o que quiserem, Aristófanes tava era zombando da possibilidade de mulheres ditarem os rumos da política), colonialistas (Kim, Passagem para a Índia), etc., pois elas são fundamentais em algumas áreas dos estudos literários. É preciso unir, então, bom senso na recomendação das obras com uma mente aberta à possibilidade de encarar uma obra dificilmente palatável.
 
É o que acontece quando se passa muito tempo viciando as pessoa em alimentarem os próprios sintomas ao invés de tratarem a causa dos problemas. Não são ensinados a pensar nem ficarem fortes, mas a escolher preguiçosamente uma opção no menu. (Tipo "Nip Tuck" onde todo mundo só pensa em afundar mais no lixo).

Por sinal nos Eua há um debate com relação a crise de identidade nos tratamentos médicos e psicológicos. Ou seja, que pessoas com problemas mentais estão sendo exploradas pela imagem pública com o objetivo não de se curarem, mas de enxergarem o próprio problema como mina de ouro, numa condescendência medrosa, sendo conduzidas a acreditarem que nunca poderiam ser curadas.

De modo que, por causa disso, primeiramente o cidadão arranca os olhos, porque eles podem fazê-lo ver horrores inesperados em situações comuns, depois retira os ouvidos porque escutar também significa o risco de escutar o inferno a qualquer hora sem aviso, a seguir constrói uma máquina para substituir o coração e o cérebro porque não suporta a idéia de ter que usá-los para as emoções ou para testar seja no erro seja no acerto a própria cabeça. E quando finalmente a pessoa tiver se transformado em uma geléia sem recursos, ligada por tubos a aparelhos e fios, então a máquina sofrerá uma pane e o arremedo que a pessoa foi estimulada a ser será varrido da face do mundo.

Experimentar lutar no próprio mundo e vencer nele, que é bom, ninguém quer.
 
Patricia-Engel-Secco.jpg


Eu posso resolver isso...
 
Hoje me lembrei dessa discussão e de um fato envolvendo uma ex-professora minha dos tempos da faculdade: o marido foi morto na frente dela há alguns anos. Contudo, isso não impediu que ela gostasse de obras densas do sulista gótico norte-americano - Faulkner, McCullers, etc. Ao mesmo tempo, sou contra essa visão do "você DEVE superar isso" - nem em psicoterapias isso é proposto, e a catarse - para quem tem problemas, claro - pode resultar em uma piora do quadro até. (BTW, a Arte geralmente é usada como uma forma de terapia.) Defendo a Arte por ser um campo de desnudamento do ser humano e de encontro comum a todos, uma oportunidade de mostrar que tudo aquilo que temos como algo nosso na verdade é compartilhado por mais um monte de gente - parece até a estrofe final de "Message in a Bottle" :lol:. Acima mencionei que gostaria de ver, dentro do possível, um certo bom senso na escolha das obras - como um exemplo, ninguém apresentaria "120 Dias de Sodoma" para ler no primeiro dia de aula sobre literatura francesa. Ninguém dá um Henry Miller pra um amigo pudico ou convida uma pessoa que ama filmes-de-ação-pra-lá-de-movimentados pra uma sessão com um filme filipino com 8 horas de duração. A apresentação do cânone ou de qualquer recomendação sempre é dada considerando "n" questões, pois sabemos que um "choque" também pode ser contraproducente - como no caso da moça que citou o filme que a fez remeter ao trauma.
 
Última edição:
Eles têm que vender os clássicos gregos com tarjas pretas 18+ e pensar em todas as coisas possivelmente danosas ao público tão heterogêneo em sua frescurite:

"Adverte-se x leitorx de que esta obra contém cenas de nudez, de sexo, de violência contra homens, mulheres e animais (senão o Peta cai em cima), de carnivorismo, de machismo e misoginia, de discurso antidemocrático, de sacrifícios de animais a deuses pagãos (= satanismo), e linguajar pequeno-burguês empolado que vai fazê-lx sentir-se analfabetx. Leia por sua conta e risco. Ou opte pelo catálogo da Série Vaga-Lume."
 
Faltou mencionar que, a depender do clássico, constarão cenas de incesto, estupro, suicídio e infanticídio. Porque, néam, vai que alguém teve o filho assassinado e precisar estar de sobreaviso... A possibilidades são quase infinitas.
 
Eles têm que vender os clássicos gregos com tarjas pretas 18+ e pensar em todas as coisas possivelmente danosas ao público tão heterogêneo em sua frescurite:

"Adverte-se x leitorx de que esta obra contém cenas de nudez, de sexo, de violência contra homens, mulheres e animais (senão o Peta cai em cima), de carnivorismo, de machismo e misoginia, de discurso antidemocrático, de sacrifícios de animais a deuses pagãos (= satanismo), e linguajar pequeno-burguês empolado que vai fazê-lx sentir-se analfabetx. Leia por sua conta e risco. Ou opte pelo catálogo da Série Vaga-Lume."
Também não é bem assim, tipo alguns filmes não vêm com aviso de q contém sexo explícito ou cenas de violência? Qual o problema de um livro ter o mesmo tipo de aviso?
Vocês estão radicalizando demais talvez?
Não se trata de frescura pura e simples mas de pessoas terem contato com uma obra pra qual não estão preparadas seja pela idade ou algum problema específico. =/
 
Vocês estão radicalizando demais talvez?
Não se trata de frescura pura e simple mas de pessoas terem contato com uma obra pra qual não estão preparadas seja pela idade ou algum problema específico. =/
Mas para a idade já existe classificação. Daí é obrigação dos pais regularem o que os seus filhos estão assistindo ou não.

Quanto ao problema específico eu acho que atualmente o pessoal cada vez mais quer impor a coletividade problemas específicos e individuais. Geração egoísta que foi criada para achar que é especial e que tem que ser protegida de todas as dores do mundo.
 
Última edição:
Quanto ao problema específico eu acho que atualmente o pessoal cada vez mais quer impor a coletividade problemas específicos e individuais. Geração egoísta filha da puta.

Bom, ninguém está tentando te impedir de ler ou ver algo - aí, sim, seria um problema. Mas como em relação ao conteúdo de filmes, sim, pode ser problemático não para uns, mas para muitos. Contudo, talvez a solução resida justamente no esclarecimento aos alunos por parte do professor ou orientador com relação às obras recomendadas.
 

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