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O dicurso de um paraninfo da UFPR

Ranza

Macaco
Cara, lendo a coluna do Rodrigo Constantino hoje me deparei com esse discurso, achei bem interessante a intenção dele e gostaria de ouvir a opinião de vocês.

Antes de tudo peço que se atenham ao texto em si, e não a fonte.

O Dr. César Augusto Dartora é professor no curso de Engenharia Elétrica da UFPR e foi escolhido como paraninfo da turma que colou grau em 6 de março deste ano. É também leitor deste blog, e me mandou seu discurso por email. Gostei muito. Faltam professores com a coragem de dizer certas verdades. O fato de não ser da área de humanas sem dúvida ajuda, pois é bem menos contaminada pelo esquerdismo. Ainda assim, merece reprodução. Segue o discurso praticamente na íntegra:

Em minha conduta como docente priorizo a transmissão do conhecimento técnico-científico, que entendo ser meu dever enquanto formador de profissionais engenheiros, raramente desviando-me do foco técnico-científico já citado, para tratar de questões político-filosóficas. Grande parte das pessoas, inclusive dentro do meio acadêmico, procuram dar a estas últimas um viés puramente ideológico, doutrinário e desprovido de razão, fazendo de seus dogmas filosóficos e políticos meras seitas religiosas, pretensamente pautadas na razão e levando a um falso cientificismo. Eu, por outro lado, entendo que sempre que possível devemos submeter nossos dogmas e ideias à luz da razão e da ciência.

O método científico é a mais preciosa ferramenta já desenvolvida pelo intelecto humano. Ele é superior a todas as outras formas de conhecimento já gerados pela humanidade, porque é provido de lógica e livre da possibilidade de sofismas ou falsos silogismos. Segundo Karl Popper, a hipótese científica deve ser dotada de uma propriedade fundamental: A refutabilidade. Nenhuma hipótese que não possa de algum modo, ser testada, seja pela lógica matemática ou pela experiência, e desse modo validada ou refutada, é científica. A Engenharia está assentada sobre os alicerces das ciências exatas e naturais, e portanto, só pode conviver com as hipóteses ditas científicas. É portanto, dever do Engenheiro, portar-se de forma a investigar e analisar os fatos sob o viés técnico-científico.

Nenhum cientista, categoria a qual pertencem os engenheiros, deve ser fundamentalista, seguindo dogmas que não encontram amparo na lógica científica e na experiência. Suas teses e formulações devem ser passíveis de teste. Não devemos nos esquecer ainda de manter uma conduta ética e moral em todas as nossas atividades.

No entanto, viceja no Brasil um relativismo moral e ético de tal natureza que já não são mais possíveis as comparações. É público e notório que a opinião politicamente correta acerca das culturas preconiza não haver na humanidade culturas superiores ou inferiores, apenas diferentes, condicionadas às épocas e aos meios em que foram geradas. Nada pode ser mais mentiroso! Existem culturas superiores sim! Desde os primórdios da humanidade, o homem busca comodidade, conforto e proteção para amenizar as agruras da vida na natureza selvagem e se precaver das intempéries. Já dizia Platão que “a necessidade é a mãe da invenção”. E o homem moderno tem infinitas necessidades, não havendo nada de errado com isso. Qual é o pecado em querer evoluir, ter maior conforto e possibilidade de prevenção contra forças da natureza, as quais, cada vez mais, estamos controlando? Nesse sentido é inegável a superioridade da cultura ocidental moderna, solidamente forjada no método científico, sobre todas as outras, umas focadas apenas em aspectos religiosos ou tribais, outras em puro conhecimento empírico e na ausência de método.

[...] O desenvolvimento da internet, da telefonia celular e smart-phones tem produzido uma verdadeira revolução na forma como nos relacionamos com pessoas e empresas, criando um mundo totalmente impensável até mesmo na ficção científica de duas décadas atrás.

No entanto, é senso comum no Brasil dizer que somos explorados pelos países desenvolvidos, porque eles compram nossas commodities, como níquel, ferro, nióbio, petróleo e grãos, a preço de quase nada e nos devolvem produtos industrializados, de alto valor agregado do ponto de vista tecnológico, a preço de ouro! E deleitamo-nos a falar mal dos americanos e dos países desenvolvidos em geral! Bebendo Coca-Cola, comendo um Big Mac, enquanto digitamos uma mensagem qualquer no celular, é claro! E hoje não vivemos mais sem todas as bugigangas tecnológicas que na maior parte das vezes foram popularizadas por eles! E como elas facilitam nossas vidas! Mas há que ser dito! A troca que fazemos com os países desenvolvidos é muito justa! É graças àqueles que investiram em ciência e conhecimento que a qualidade de vida no mundo inteiro melhorou e vem melhorando gradativamente. É graças à cultura ocidental que tem como pedra fundamental hoje o método científico. De nada adianta ser fonte de todos os recursos naturais disponíveis e imagináveis do universo se não dispomos do conhecimento científico e tecnológico para fazer uso deles. E fomos nós mesmos que fizemos a escolha pela mediocridade, quando decidimos que educação e ciência não são importantes. Fizemos as escolhas erradas no passado e continuamos fazendo-as no presente.

[...] Nossos grandes cientistas nunca foram levados a sério. Disse o poeta Thomas Gray: “Onde a ignorância é felicidade, ser sábio é loucura!” Parece uma frase feita sob medida para o Brasil.Não investimos no futuro, o que sempre demanda sacrifícios. E ao invés de olharmos para o futuro, voltamos no tempo, tentamos reescrever a história criando comissões sem sentido como a tal Comissão da Verdade, para aplacar a sanha revanchista de falsos democratas de 1964, e aqui não vai nenhum elogio ao nefasto golpe. Qual o preço a pagar pelas futuras gerações por essa negligência?

Nós tivemos aqui pioneiros com Landell de Moura, César Lattes, Santos Dummont, Carlos Chagas. Mas em praticamente todas as áreas representativas da economia, ciência e cultura mundial, nós não estamos na vanguarda. A ciência não é levada a sério. Quem prosperou por essas bandas foi Charles Miller. Preferimos a criatividade dos que vivem da bola e usam chuteiras. Afinal somos o país do futebol. Confundimos o famoso jeitinho e a gambiarra, frutos da falta de planejamento, com criatividade. Há até estudos acadêmicos, acreditem, enaltecendo a gambiarra! Em nome da nossa cultura apenas diferente e da doutrinação ideológica, nossos alunos não são incentivados a ler Sócrates, Platão, Monteiro Lobato ou ouvir Mozart e Bethoveen. Beatles é música de estrangeiro, temos que valorizar o funk e artistas sem sal e sem conteúdo como Caetano Veloso e outros tais, endeusados pela mídia ufanista. Nossos estudantes lêem Marx em lugar de Adam Smith, conhecem Neymar, Michel Teló, Gilberto Gil e José Sarney mas não sabem quem foram Newton, Bohr, Feynman, Faraday, Beethoven, Shakespeare, Lennon e McCartney. Alguns dogmas propagados pelos vanguardistas da educação, muitos dos quais nunca ministraram uma única aula, nos incutem a falsa ideia de que criatividade e imaginação são mais importantes do que o conhecimento. Pois eu afirmo: só há espaço para criatividade e imaginação quando dominamos plenamente uma área de conhecimento. Não há gênio sem imensa carga de trabalho e transpiração. Mas nossas escolas se tornaram locais de discussões puramente conceituais. Avaliar o aluno quanto ao domínio das técnicas essenciais de leitura, escrita e cálculos matemáticos parece ser mais constrangedor do que deixá-lo analfabeto funcional, pois uma reprovação vai ferir seus sentimentos! É indigno, na visão de alguns, ter que meter a mão na massa, fazer cálculos, treinar, enfim, seguir a cartilha conservadora que tanto deu certo na questão da educação. Nossos alunos não são ensinados, são doutrinados.

Enquanto a educação definha com a falta de infraestrutura mínima, construímos estádios. Isso sim é importante, afinal somos o país do futebol e como nos ensinou o gênio Ronaldo, copa do mundo não se faz com escolas e hospitais, e sim com estádios! Quem precisa mesmo de leitos em hospitais e de investimento em saúde preventiva, saneamento básico, infraestrutura de estradas, portos e aeroportos? Pois eu vos digo: Vergonha não é perder a Copa em casa. Vergonha é ver que pessoas morrem na porta do hospital sem que se mova uma palha, enquanto o nosso dinheiro vai sendo jogado no esgoto em coisas supérfluas, quando não é desviado por corruptos. Vergonha é ter índices de homicídios maiores do que países em guerra civil. Até quando?

Deixo aqui uma lista de perguntas: Até quando a educação fundamental estará abandonada, formando ano a ano uma massa de analfabetos funcionais? Não será possível construir boas escolas, com padrão Fifa? Até quando teremos que ouvir de políticos promessas mirabolantes para resolver os mais simples problemas do dia-dia, sem nenhuma fundamentação técnica de viabilidade, apenas para garantir os votos da eleição? Quem não ouviu que teríamos metrô em praticamente todas as cidades de grande porte, mesmo sem precisar, que teríamos trem-bala e aeroportos de primeiro mundo? Até quanto vamos ter que discutir tragédias com data e hora marcada para acontecer, como a falta de água nos períodos de estiagem, os deslizamentos de terra e os alagamentos? Até quando a nossa indignação com algum fato vai durar somente até o telejornal do dia seguinte, diante de outro evento mais trágico ainda? Até quando vamos aturar esses políticos cujo único projeto é a perpetuação no poder e o enriquecimento dos seus grupos?

Eu confesso que quero viver em um lugar mais cartesiano e com maior planejamento, onde a gambiarra seja deixada de lado. Para isso, tenho a certeza de que a Universidade Federal do Paraná fez o máximo para torná-los excelentes Engenheiros Eletricistas. Ainda há esperanças! Está com vocês agora parte da responsabilidade de transformar esse país. A tarefa é árdua mas possível e aqui vão alguns conselhos.

Sejam corretos e façam a diferença para alguém. Amem o próximo verdadeiramente, cujo corolário é “não fazer aos outros o que não queres que façam contigo”. Ensinem a seus filhos que honestidade, retidão de caráter e boas maneiras não são virtudes e sim, obrigação. Tampouco se julguem investidos de virtudes morais superiores que os tornem tiranos perante familiares, amigos e demais pessoas.

Saibam que é preciso trabalhar muito, e para ser criativo é necessário sólido conhecimento. Por isso não deixem de aprender e se aperfeiçoar. Sejam tolerantes com as diferenças, porém firmes em suas ações e opiniões. Não se pode balançar ao sabor do vento e não é possível agradar a todos.

Defendam com rigor o método científico, e não se deixem enganar pela pseudo-ciência. Sempre amparados no método científico, quando suas ideias forem confrontadas, respondam com argumentos lógicos ou mudem de teoria, mas não usem da calúnia e a desqualificação pessoal para vencer o debate.

Não se deixem cegar pela falta de lógica e pelas paixões político-partidárias, clubísticas e religiosas. Combatam todo tipo de fundamentalismo e totalitarismo, porque ninguém é dono de uma verdade única e imutável. Prezem pela liberdade e pela igualdade de condições para as pessoas, sabendo que existem limites para ambas.

Sejam humildes. Saibam valorizar suas conquistas e o valor da meritocracia, sempre dando o devido reconhecimento a quem lhes foi importante na caminhada, desde as pessoas que garantem a limpeza do seu local de trabalho até aqueles que estão acima de vocês em hierarquia e conhecimento. Sejam sensíveis aos que o cercam e, sempre que possível, mudem para melhor suas atitudes e comportamento. Permitam-se momentos de lazer, diversão e confraternização, sem excessos. E acima de tudo, sejam felizes.
Que Deus nos abençoe e tenhamos todos uma boa noite.
 
Um ex-aluno meu acabou de comentar sobre esse trecho:

Nesse sentido é inegável a superioridade da cultura ocidental moderna, solidamente forjada no método científico, sobre todas as outras, umas focadas apenas em aspectos religiosos ou tribais, outras em puro conhecimento empírico e na ausência de método

contou que tinha japonês na primeira fila entre os formandos.

vixe.
 
Uma mistura de coisas razoáveis com absurdos.

Sobre o discurso do método científico no mesmo parágrafo que economia, eu digo o seguinte: A ciência econômica não obedece o método científico. O que não quer dizer que os argumentos não devam ser confrontados com os fatos. A questão, no entanto, é que em economia não é possível realizar os mesmo experimentos diversas vezes.

Concordo totalmente, no entanto, com o parágrafo abaixo:

Defendam com rigor o método científico, e não se deixem enganar pela pseudo-ciência. Sempre amparados no método científico, quando suas ideias forem confrontadas, respondam com argumentos lógicos ou mudem de teoria, mas não usem da calúnia e a desqualificação pessoal para vencer o debate.
 
@Paganus , eu escolho você!


E, na sequência,
pego uma pipoca.
Stephen-Colbert-Popcorn.gif
 
Os engenheiros estão entre os que mais sofrem com o analfabetismo funcional e a precariedade da educação quando entram no mercado de trabalho da construção civil. A quantidade de ignorância e teimosia nos maus hábitos que precisam ser contornados para disciplinar e reeducar os operários é algo que só quem participou na pele sabe dizer como é. (Por exemplo, necessidade de fazer o funcionário usar EPI).

Com exceção da parte de religião que foi colocada de um jeito gratuito (não sei quem cunhou a expressão mas religião não é só feita de fé), as outras constatações eu vejo sempre na rua principalmente essa:

No entanto, viceja no Brasil um relativismo moral e ético de tal natureza que já não são mais possíveis as comparações.

Outras declarações são polêmicas mas fazem muito sentido em boa parte com elas. Também penso que existam culturas (no sentido de produto cultural) que apontam para a própria eliminação (parcial ou total de um povo ou de todos) algumas mais e outras menos. Agora não é porque uma cultura seja pior que ela não mereça o benefício de ser reformulada com o tempo.
 
contou que tinha japonês na primeira fila entre os formandos.

vixe.
Realmente, ele poderia ter deixado claro que estava usando uma interpretação não-geográfica do termo (o Japão é um país "ocidental" para quase todos os efeitos).



Cita Popper e depois "que Deus nos abençoe" - CIENTIFICISTA POSER! :lol:
É o velho problema das expressões religiosas que já estão imbuídas na linguagem... Vide "Adeus".
 
É o velho problema das expressões religiosas que já estão imbuídas na linguagem... Vide "Adeus".

Mas não acho que seja o caso, não, Dermeister. =/
"Que Deus nos abençoe" é bem diferente de falar "adeus" ou exclamar "Nossa!" (que vem de "Nossa Senhora").

Pelo menos os ateus e os não cristãos (budistas e orientais, por exemplo) que conheço nunca usam expressões como "vá com Deus" ou "Deus te abençoe".
Além do que, certeza que o professor escreveu (e revisou) esse texto antes de discursar.
 
Excelente texto. Combate de uma só vez três grandes males: o misticismo, o relativismo (moral, estético e o epistemológico) e o estatismo (ainda que de forma menos direta). Clama por uma educação de verdade, onde o aluno adquire habilidades e conhecimentos técnicos necessários para o pensamento reto e claro, e não puramente um suposto "posicionamento crítico" (muitas vezes usado como eufemismo para pensamento ideológico) - posicionamento que só existe e é resultado do domínio daquelas habilidades e conhecimentos, e não pode ser buscado como algo "puro" e separado dessas técnicas, como se houvesse um "conhecimento crítico" alternativo ao "conhecimento técnico".

Pelo que entendi o texto não é cientificista: "(...) vemos submeter nossos dogmas e ideias à luz da razão e da ciência", "O método científico (...) é superior a todas as outras formas de conhecimento já gerados pela humanidade". Isto é, há razão fora da ciência e há outras formas de conhecimento - acontece que a ciência é a melhor delas, mas não é a única. Entendo então não se tratar de um cientificismo. Mesmo um católico poderia ter dito essas frases, já que segundo os católicos seus dogmas são submissíveis à "luz da razão", e a Revelação é sobrenatural, portanto não é um conhecimento "gerado pela humanidade" - diferentemente da filosofia e da teologia.

E concordo quando se diferencia cultura ocidental e países ocidentais. O Japão hoje é, por exemplo, um país com democracia parlamentar e com atividade científica altamente desenvolvida - e os dois se devem profundamente à herança e cultura ocidental. Ainda que alguém possa chamar de ciência, por exemplo, a astronomia antiga, é fato que todo cientista contemporâneo está imerso numa tradição iniciada pelos cientistas ocidentais ligados à chamada Revolução Científica, e que há uma diferença radical entre a ciência herdeira dessa tradição e a ciência anterior a ela - todo cientista contemporâneo japonês é muito mais ligado a essa tradição ocidental do que é ligado aos cientistas orientais de épocas anteriores ao contato com os ocidentais.
 
Última edição:
O querido prof. Dartora foi meu professor de várias disciplinas, conheço bem a figura, de tomar cerva com ele e ficar discutindo em aula qual era o melhor album do Black Sabbath. O jeito "gaúcho texano" dele é tão explícito que acho que é impossível mencionar qualquer coisa remotamente associada a política sem que ele entre no assunto com os dois pés com a empolgação que o paganos fala de religião.

Acho que ele conversando com a Melian ia ser, essencialmente, um cataclisma nuclear.
 
Eu fui teimoso. Vi que era coisa do Constantino - o porta voz da "direita coitadinha", que se sente injustiçada depois de tanta coisa que nos legou em tecnologia e longevidade -, mas mesmo assim segui com a leitura.

(É impressionante como a História prossegue e os argumentos de civilização e cultura superior não perdem força).

Péssimo discurso. Além do claro preconceito, dourado com uma preocupação social, coexistem em cada linha contradição e hipocrisia.

Para um homem que prega o esquecimento do passado, pois é uma perda de tempo ler e debater sobre acontecimentos de um ontem não tão distante, já que devemos voltar os olhos unicamente para o futuro, é contraditório o uso dessa argumentação tão antiga que tem na desqualificação do outro a justificativa para o seu domínio. Sim, domínio, pois apesar de toda pregação de ensino como prática que gere autonomia, pela posse da técnica, o discurso dá a benção às elites ilustradas que vivem e revivem "o fardo do homem branco" (frase que faz alusão não só a etnia) e sua imensa bondade de luz guia aos caminhos da ordem e do progresso. Se outrora o diferente, o inferior, andava nu e batia tambor no culto aos seus deuses, hoje, o diferente, o inferior, não sabe quem é Beethoven, mas canta "Aí, se eu te pego"; não lê Shakespeare, mas conhece cada verso de "O Homem na Estrada", do Mano Brown. E a contradição não reside apenas nos termos nada inéditos de civilização e barbárie - que, digo e reforço, foi - e continua sendo - a justificativa moral que fez a Europa e os Senhores do Norte dormirem em paz enquanto "salvavam" para si mesmos o mundo dos selvagens -ainda que a tiros de canhão. A contradição aparece, também, na hipocrisia dessa suposta preocupação em se universalizar a "alta cultura". Afinal, no íntimo daqueles que se julgam a "elite intelectual", não há interesse na popularização de Beethoven ou Shakespeare ou seja lá que outro refinamento. Isso seria o fim, seria o nivelamento cultural com a raia miúda. Essa massa sem méritos que não soube assimilar os valores de sua civilização e curte funk ostentação.

Por fim, além das contradições e hipocrisias, estamos diante de um discurso que procura combater vários "ismos" com o maior deles: o "burrismo".

Em tempo, a educação que busca criticidade também se constrói com o domínio da técnica. Educar é um processo de "hominização" e, nesse processo, o senso crítico que questiona a ordem vigente é um de seus pilares. E realmente ela é ideológica, mas não no sentido pejorativo com o qual se pretende desqualificá-la. Aos que insistem, fica a pergunta: Também não está imbuída de ideologia a "educação" que concede a técnica e reforça o status quo?
 
Última edição:
Cara eu demorei a comentar e o Haran falou primeiro.

De tudo tudo ai, o que eu mais gosto é quando ele trata a forma como nossa sociedade vem vivendo (a brasileira), que é muito mais baseada no achismo de que razão, planejamento fica pra depois, vamos fazer desse jeito porque eu vi em um lugar que "da certo". A parte política é outra, hoje parece que partido político é time de futebol, ninguém julga a competência, os resultados, os métodos, somente a ideia que se tem sobre o partido, igual um torcedor de futebol. No futebol, acabamos torcendo pra um time por razões emocionais e praticamente nunca por razões racionais, nunca vi uma pessoa torcer para um time porque ele tem as contas em dia, planos estratégicos elaborados e estatísticas positivas, e é assim que tenho visto a política, o que é péssimo.

Tinha umas coisas que queria falar, mas tem uma hora desde a primeira palavra e esta última, postar do trabalho é foda.

Tento editar a noite
 
Realmente, ele poderia ter deixado claro que estava usando uma interpretação não-geográfica do termo (o Japão é um país "ocidental" para quase todos os efeitos).




É o velho problema das expressões religiosas que já estão imbuídas na linguagem... Vide "Adeus".

Bem, penso que ele tenha feito uso natural das palavras (direito legítimo).

Os momentos de formatura não devem ser vistos unicamente pela perspectiva de acesso laico e total ao conteúdo mas no sentido de que se trata do último dia de lição (teste) dos alunos e que independente de tudo o mundo apresenta testes em que as motivações não precisam ser sempre laicas.

Quem assistiu "O advogado do Diabo" lembra quando o diabo comenta "estamos sempre negociando" e a guarda nunca pode ser abaixada no dia de folga.

A interpretação de um texto de professor universitário, principalmente no último dia de formatura, não merece ser vista de forma simplista. Em todos os cursos, muitos alunos saem da faculdade e só vão entender as últimas palavras muitos anos depois (alguns deles morrem sem entender).

O formando deve entrar no mercado sabendo que tudo o que lhe disserem deve ser analisado e peneirado para se aproveitar o que houver de intenção boa e repelir o que houver de má intenção porque não existem pronunciamentos puros de influência.

Quer dizer, seja em nome de Deus, Buda, Ganesh ou do vazio o aluno tem que entender que pronunciamentos não são blocos únicos indiferenciados e possuem momentos pessoais de expressão, que todo texto precisa de tolerância e o que é bom deve ser separado do que é ruim.

Entretanto há pressão para tudo ser preguiçosamente explícito e falsamente correto e que as pessoas não usem o cérebro para interpretar.

Para esses casos, o teste do último dia é justamente a espada eliminatória para alertar quem não tem disciplina de entender os fundamentos do método científico.

Por isso o professor tem direito de usar a expressão que desejar para torcer pelos alunos, porque eles concordaram que é obrigação deles filtrar as coisas (agora eles são colegas e iguais na profissão).

Se for unicamente visto de longe alguns pensam pobremente que o professor é só um robô criando um ambiente para pessoas meio-loucas massagearem o próprio ego enquanto cultivam a fraqueza interior e repetem decoreba.

Por isso o comment do Calib e do professor precisam ser vistos de forma esportiva. Porque a questão é que as pessoas estão ficando com medo da interpretação superficial em pronunciamentos de opinião como esse. E com isso abraçam a morte da mente crítica.
 
Última edição:
Cantona disse:
Sim, domínio, pois apesar de toda pregação de ensino como prática que gere autonomia, pela posse da técnica, o discurso dá a benção às elites ilustradas que vivem e revivem "o fardo do homem branco" (frase que faz alusão não só a etnia) e sua imensa bondade de luz guia aos caminhos da ordem e do progresso.

Eu não entendi. Por que alguém que está defendendo o pensamento técnico-científico estaria dando benção às elites ilustradas?
 
Última edição:
Eu não entendi. Por que alguém que está defendendo o pensamento técnico-científico estaria dando benção às elites ilustradas?

Nossos estudantes lêem Marx em lugar de Adam Smith, conhecem Neymar, Michel Teló, Gilberto Gil e José Sarney mas não sabem quem foram Newton, Bohr, Feynman, Faraday, Beethoven, Shakespeare, Lennon e McCartney.

Acho que ele ve a superioridade nos exemplos acima.

De qualquer forma, o texto não é apenas sobre isso.
 
Mas o Cantona falou em "o ensino como prática que gere autonomia" e "posse da técnica", ou seja, o caráter técnico e científico, e não dos exemplos como algo que dê benção as elites. E eu não entendi.

Quando o autor do discurso falou que preferiria que as decisões seguissem uma cartilha mais cartesiana, eu concordei. Eu acho que nossas instituições deveriam ser mais práticas, técnicas e objetivas nas tomadas de decisões. Isso eu concordo com autor.
 
Última edição:
Mas o Cantona falou em "o ensino como prática que gere autonomia" e "posse da técnica", ou seja, o caráter técnico e científico, e não dos exemplos como algo que dê benção as elites.

o discurso dá a benção às elites ilustradas que vivem e revivem "o fardo do homem branco" (frase que faz alusão não só a etnia) e sua imensa bondade de luz guia aos caminhos da ordem e do progresso

Acho que o sentido do que ele diz é: Apesar das elites opressoras terem escravizado, matado e torturado os inferiores bárbaros, hoje temos que ser gratos a elas, já que trouxeram para o resto do mundo a luz do método científico.
 

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