Gerbur Forja-Quente
Defensor do Povo de Durin
Sabedoria de Sador Labadal - A Importância da Palavra Falada
Estou lendo "Os Filhos de Húrin" e tem muitas frases sábias nesse livro.
Estou no começo ainda, mas o engraçado é que acho que as frases mais sábias não são as de Thingol ou Melian, mas de Sador "Labadal", o servo manco da família de Húrin, que acaba se tornando um tutor importante na infância de Túrin.
O trecho que me chamou a atenção foi quando Morwen conta a Túrin seu plano de enviá-lo à Doriath para que ele não se torne um escravo dos lestenses que estão ocupando Hitlum. A primeira coisa que Túrin faz quando sua mãe lhe diz isso é ir falar com o seu tutor e confidente. Sador fica contente com a notícia, pois por mais dura que ela pareça ela é também uma oportunidade para que a linhagem de Húrin prospere. Mas o menino começa a chorar e muito sabiamente Sador questiona o garoto (mais ou menos assim):
_ Mas onde está aquele menino que disse que não via a hora de chegar o tempo em que ele poderia partir para ser o cavaleiro de algum rei élfico?
E Túrin enxuga as lágrimas e se lembre de ter dito isso respondendo:
_ Já que o filho de Húrin disse isso, não chorarei e cumprirei com a minha palavra. Mas sempre quando digo que vou fazer isso ou aquilo é sempre diferente de quando chega a hora de fazê-lo. Vou me policiar para não dizer mais tantas coisas.
Agora vem a frase foda do Sador:
_ É uma sábia decisão – Responde Sador – É o que muitos homens ensinam e poucos aprendem. “Deixe que os dias invisíveis passem. O dia de hoje é o bastante”.
Eu achei simplesmente incrível essa frase. Fiquei filosofando sobre ela e a relendo muitas vezes. O que ela de fato diz? Que dias invisíveis são esses? Porque o dia de hoje é o bastante? O que tudo isso tem a ver com o que falamos no dia-a-dia? Depois de muito refletir, cheguei a uma opinião do que essa frase de Sador disse para mim:
Cada palavra é uma pequena promessa. É um contrato.
Nesse momento Sador está ensinando honra ao garoto Túrin. Está dizendo que temos que ter cuidado com o que falamos, pois para os honestos, palavras não são vento, são contratos. Quando dizemos qualquer coisa temos que estar dispostos a agir da forma como falamos. Voltar atrás é coisa de moleque. Nem isso, pois mesmo as crianças são capazes de entender o certo e o errado e devem honrar o que dizem.
A palavra é um contrato. Quando se diz algo você se pronuncia, através da palavra falada. Não é a palavra escrita, mas ainda assim, é palavra. Quando se fala, não se assina um papel, mas coloca-se tua assinatura em teu destino. Se você cumprir com o que disse, começa a trilhar o caminho de uma pessoa honesta. Se você não dá valor à sua palavra e não a faz valer, começa a trilhar o caminho da desonestidade. Do engano. Da trapaça. O caminho fácil. O caminho de uma pessoa sem palavra.
Por isso é tão importante ser cuidadoso com o que se diz e honrar o que é dito.
Aquele que fala demais logo se transforma num mentiroso, pois logo as verdades que ele conhece se acabam e ele precisa inventar pequenas mentiras para poder continuar falando sem parar, como gosta. E com o tempo, sua palavra não vale mais nada. Pois todos sabem que pouco do que essa pessoa diz pode ser levado à serio. Uma vez que a pessoa não tem mais compromisso com as verdades que sua palavra carrega, desde que ela continue sempre sendo dita.
Olha que bonito isso. Quanto valor Tolkien dá a palavra falada. Ela tem igual importância quanto a palavra escrita. Palavra é palavra. Palavra é contrato. A palavra que você diz, define teu destino. O define enquanto ser humano, e com o tempo todos que olharem para você saberão quem você é por causa das coisas que você diz. Bonito, né? Para alguns, bonito e assustador, rs.
Sendo assim, Sador diz: “Deixe que os dias invisíveis passem. O dia de hoje é o bastante”.
Para mim, os “dias invisíveis” são os dias cotidianos, em que a cartilha de tua história é seguida à risca, o dia em que o ontem não se difere do hoje, tampouco do amanhã. O xérox do xérox. Dias assim são numerosos, mas não são a nossa vida.
A nossa vida é meia dúzia de dias em que as nossas palavras pesaram em nossos destinos. Dias em que suas ações honraram ou desonraram suas palavras. Dias memoráveis em que algo importante foi dito. Em que algo que foi dito foi realizado. Em que você foi marcado por algo que às vezes você não disse, mas escutou, e esse dia você nunca mais esqueceu. E essa palavra você carregou pelo resto de sua existência. Esses são os dias importantes, quando um tutor nos diz algo na infância, para Túrin esse mestre era Sador, para muitos de nós são nossos pais. Ou então aquele dia em que se disse pela primeira vez “eu te amo” para a pessoa amada, palavras difíceis de sair dos pulmões, você teve que juntar toda sua coragem para dizê-la, para admiti-la e assim pirografar tua alma com tuas juras. E depois que disse seu corpo ficou mais leve, pois o peso dessa verdade você arrancou de seu peito para apoiar em teu destino. Dói dizer isso (e se não dói, deveria). Ou então é aquele dia em que se brigou sério com alguém que tu gosta. Em que uma grande amizade foi rompida. Laços foram partidos. E a força das palavras ditas naquele dia foi tão grande que mesmo depois de anos nunca mais se reestabeleceu amizade com essa pessoa. Por medo ou vergonha de dizer a palavra “perdão”. Nem se lembra mais a causa da discussão mas seus efeitos são perenes, pois eles pesam no seu destino e mudam sua história. Todos os outros dias são invisíveis, mas estes não.
Os dias invisíveis são os dias em que você se segura para não dizer nada que tem vontade, mas que sabe que se dizer vai se arrepender pelo resto de seu tempo neste mundo. Então Sador diz, “deixe que esses dias passem”. A palavra é um contrato. Depois que você diz não há maneira de voltar atrás. Às vezes é melhor se calar e deixar que esse dia se transforme num dia invisível e seja apagado de sua memória.
Esse exercício é tão importante, quanto o de ter a coragem de se dizer algo que se deve dizer e arrancar aquele dia do esquecimento e da invisibilidade trazendo-lhe a luz do destino e registrando-lhe na alma. Transformando-o num dia importante o suficiente para ser sempre lembrado no decorrer da vida. Transformando o dia de hoje em um dia que se basta em si mesmo. Pois você não tem poder sobre o dia que passou nem sobre o que virá. Só se tem poder no dia de hoje. No dia presente. Hoje você pode mudar sua história. Hoje você pode reescrever seu destino. Mas só hoje, não ontem, nem amanhã. Somente hoje. Completando assim o ensinamento de Labadal: “O dia de hoje é o bastante”.
E a magia de tudo isso é que essas coisas acontecem pelo poder da palavra. Mesmo a falada. Quando você fala você escreve a história da sua vida.
Estou lendo "Os Filhos de Húrin" e tem muitas frases sábias nesse livro.
Estou no começo ainda, mas o engraçado é que acho que as frases mais sábias não são as de Thingol ou Melian, mas de Sador "Labadal", o servo manco da família de Húrin, que acaba se tornando um tutor importante na infância de Túrin.
O trecho que me chamou a atenção foi quando Morwen conta a Túrin seu plano de enviá-lo à Doriath para que ele não se torne um escravo dos lestenses que estão ocupando Hitlum. A primeira coisa que Túrin faz quando sua mãe lhe diz isso é ir falar com o seu tutor e confidente. Sador fica contente com a notícia, pois por mais dura que ela pareça ela é também uma oportunidade para que a linhagem de Húrin prospere. Mas o menino começa a chorar e muito sabiamente Sador questiona o garoto (mais ou menos assim):
_ Mas onde está aquele menino que disse que não via a hora de chegar o tempo em que ele poderia partir para ser o cavaleiro de algum rei élfico?
E Túrin enxuga as lágrimas e se lembre de ter dito isso respondendo:
_ Já que o filho de Húrin disse isso, não chorarei e cumprirei com a minha palavra. Mas sempre quando digo que vou fazer isso ou aquilo é sempre diferente de quando chega a hora de fazê-lo. Vou me policiar para não dizer mais tantas coisas.
Agora vem a frase foda do Sador:
_ É uma sábia decisão – Responde Sador – É o que muitos homens ensinam e poucos aprendem. “Deixe que os dias invisíveis passem. O dia de hoje é o bastante”.
Eu achei simplesmente incrível essa frase. Fiquei filosofando sobre ela e a relendo muitas vezes. O que ela de fato diz? Que dias invisíveis são esses? Porque o dia de hoje é o bastante? O que tudo isso tem a ver com o que falamos no dia-a-dia? Depois de muito refletir, cheguei a uma opinião do que essa frase de Sador disse para mim:
Cada palavra é uma pequena promessa. É um contrato.
Nesse momento Sador está ensinando honra ao garoto Túrin. Está dizendo que temos que ter cuidado com o que falamos, pois para os honestos, palavras não são vento, são contratos. Quando dizemos qualquer coisa temos que estar dispostos a agir da forma como falamos. Voltar atrás é coisa de moleque. Nem isso, pois mesmo as crianças são capazes de entender o certo e o errado e devem honrar o que dizem.
A palavra é um contrato. Quando se diz algo você se pronuncia, através da palavra falada. Não é a palavra escrita, mas ainda assim, é palavra. Quando se fala, não se assina um papel, mas coloca-se tua assinatura em teu destino. Se você cumprir com o que disse, começa a trilhar o caminho de uma pessoa honesta. Se você não dá valor à sua palavra e não a faz valer, começa a trilhar o caminho da desonestidade. Do engano. Da trapaça. O caminho fácil. O caminho de uma pessoa sem palavra.
Por isso é tão importante ser cuidadoso com o que se diz e honrar o que é dito.
Aquele que fala demais logo se transforma num mentiroso, pois logo as verdades que ele conhece se acabam e ele precisa inventar pequenas mentiras para poder continuar falando sem parar, como gosta. E com o tempo, sua palavra não vale mais nada. Pois todos sabem que pouco do que essa pessoa diz pode ser levado à serio. Uma vez que a pessoa não tem mais compromisso com as verdades que sua palavra carrega, desde que ela continue sempre sendo dita.
Olha que bonito isso. Quanto valor Tolkien dá a palavra falada. Ela tem igual importância quanto a palavra escrita. Palavra é palavra. Palavra é contrato. A palavra que você diz, define teu destino. O define enquanto ser humano, e com o tempo todos que olharem para você saberão quem você é por causa das coisas que você diz. Bonito, né? Para alguns, bonito e assustador, rs.
Sendo assim, Sador diz: “Deixe que os dias invisíveis passem. O dia de hoje é o bastante”.
Para mim, os “dias invisíveis” são os dias cotidianos, em que a cartilha de tua história é seguida à risca, o dia em que o ontem não se difere do hoje, tampouco do amanhã. O xérox do xérox. Dias assim são numerosos, mas não são a nossa vida.
A nossa vida é meia dúzia de dias em que as nossas palavras pesaram em nossos destinos. Dias em que suas ações honraram ou desonraram suas palavras. Dias memoráveis em que algo importante foi dito. Em que algo que foi dito foi realizado. Em que você foi marcado por algo que às vezes você não disse, mas escutou, e esse dia você nunca mais esqueceu. E essa palavra você carregou pelo resto de sua existência. Esses são os dias importantes, quando um tutor nos diz algo na infância, para Túrin esse mestre era Sador, para muitos de nós são nossos pais. Ou então aquele dia em que se disse pela primeira vez “eu te amo” para a pessoa amada, palavras difíceis de sair dos pulmões, você teve que juntar toda sua coragem para dizê-la, para admiti-la e assim pirografar tua alma com tuas juras. E depois que disse seu corpo ficou mais leve, pois o peso dessa verdade você arrancou de seu peito para apoiar em teu destino. Dói dizer isso (e se não dói, deveria). Ou então é aquele dia em que se brigou sério com alguém que tu gosta. Em que uma grande amizade foi rompida. Laços foram partidos. E a força das palavras ditas naquele dia foi tão grande que mesmo depois de anos nunca mais se reestabeleceu amizade com essa pessoa. Por medo ou vergonha de dizer a palavra “perdão”. Nem se lembra mais a causa da discussão mas seus efeitos são perenes, pois eles pesam no seu destino e mudam sua história. Todos os outros dias são invisíveis, mas estes não.
Os dias invisíveis são os dias em que você se segura para não dizer nada que tem vontade, mas que sabe que se dizer vai se arrepender pelo resto de seu tempo neste mundo. Então Sador diz, “deixe que esses dias passem”. A palavra é um contrato. Depois que você diz não há maneira de voltar atrás. Às vezes é melhor se calar e deixar que esse dia se transforme num dia invisível e seja apagado de sua memória.
Esse exercício é tão importante, quanto o de ter a coragem de se dizer algo que se deve dizer e arrancar aquele dia do esquecimento e da invisibilidade trazendo-lhe a luz do destino e registrando-lhe na alma. Transformando-o num dia importante o suficiente para ser sempre lembrado no decorrer da vida. Transformando o dia de hoje em um dia que se basta em si mesmo. Pois você não tem poder sobre o dia que passou nem sobre o que virá. Só se tem poder no dia de hoje. No dia presente. Hoje você pode mudar sua história. Hoje você pode reescrever seu destino. Mas só hoje, não ontem, nem amanhã. Somente hoje. Completando assim o ensinamento de Labadal: “O dia de hoje é o bastante”.
E a magia de tudo isso é que essas coisas acontecem pelo poder da palavra. Mesmo a falada. Quando você fala você escreve a história da sua vida.
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