Jorge Leberg
Palavras valem por mil imagens
Já postei esse tópico em outro fórum.
Valendo-me do Centenário de Morte de Machado de Assis que ocorre este ano, que tal voltarmos a uma discussão literária aparentemente “batida”: Capitu traiu ou não traiu?
Pode parecer que não há mais o que debater sobre esse tema, mas a verdade é que há. Quase sempre que relemos um livro ou reavivamos uma discussão acerca de alguma obra, nos apercebemos de itens e detalhes antes desconhecidos, adquirimos novas ou outras impressões, notamos coisas sob um olhar mais maduro, surgem cogitações inéditas, etc. Sob esse ângulo, é óbvio que ainda persiste o dilema da traição de Capitu, assim como persiste a dúvida sobre a loucura de Hamlet – realmente simulada ou real? – dentre outras do universo artístico-literário. São dilemas praticamente eternos.
Confesso que li Dom Casmurro uma única vez – mesmo o Machadinho sendo um de meus escritores diletos –, como é de praxe em relação às minhas “atividades” literárias. Não costumo reler livros pela imensidão do universo literário. O tempo que eu gastarei relendo um livro é o tempo que eu gastarei lendo outro. Portanto, raramente fiz releituras no meu itinerário livresco.
A impressão que tive foi a de que Bentinho transmutou-se gradativamente em um ciumento paranóico. Qualquer olhar ou ação mínima era ensejo para suspeitas, desconfianças da parte dele. É mais provável que Capitu fosse uma injustiçada, vítima de um ciúme doentio, que uma traidora. Mas também não podemos negar a personalidade enigmática e sinuosa de Capitu, o que a tornava não tão digna de confiança. Bentinho a retratava como uma “cigana de olhos oblíquos e dissimulados”, além de também descrever seus olhos como “de ressaca”, uma metáfora a seu olhar duvidoso, incerto quanto aos sentimentos demonstrados – já repararam no quanto é inescrutável o olhar de um indivíduo em estado de ressaca, após uma bebedeira daquelas? Entretanto, é bom frisar que o narrador da trama é Bentinho e, pois, a história ocorre sob a sua ótica.
Há uma tese intrigante acerca de Dom Casmurro, formulada pela estudiosa machadiana Helen Caldwell, a respeito do nome de Bento Santiago, o protagonista-narrador do romance. Bento, claro, significa “batizado” e deve-se a uma promessa da mãe do personagem. Santiago é uma combinação dos nomes “Santo” + “Iago”. Lembremos que Iago era o antagonista de Otelo, que imputava-lhe ciúmes através da força de coincidências e elucubrações sugestivas, a fim de destruir o amor de Otelo por Desdêmona, incitando-o a cometer um ato insano. Então, Bentinho seria o Iago de si mesmo, que à custa de coincidências impingia à sua própria consciência suspeitas de traição. Essa teoria explanatória faz muito sentido, se não olvidarmos o fato de que Machado de Assis era vidrado em Shakespeare. Todavia, essa combinação nominal, que muito provavelmente confirmaria a certeza da ciumeira obsessiva e imaginária de Bentinho, cai por terra se levarmos em consideração o fato de que pode ser uma pista falsa do próprio Machadinho. Ele não era bobo, e gostava de instigar e desnortear os leitores – principalmente através das digressões. E voltamos à estaca zero!
Agora, aos comentários!
Valendo-me do Centenário de Morte de Machado de Assis que ocorre este ano, que tal voltarmos a uma discussão literária aparentemente “batida”: Capitu traiu ou não traiu?
Pode parecer que não há mais o que debater sobre esse tema, mas a verdade é que há. Quase sempre que relemos um livro ou reavivamos uma discussão acerca de alguma obra, nos apercebemos de itens e detalhes antes desconhecidos, adquirimos novas ou outras impressões, notamos coisas sob um olhar mais maduro, surgem cogitações inéditas, etc. Sob esse ângulo, é óbvio que ainda persiste o dilema da traição de Capitu, assim como persiste a dúvida sobre a loucura de Hamlet – realmente simulada ou real? – dentre outras do universo artístico-literário. São dilemas praticamente eternos.
Confesso que li Dom Casmurro uma única vez – mesmo o Machadinho sendo um de meus escritores diletos –, como é de praxe em relação às minhas “atividades” literárias. Não costumo reler livros pela imensidão do universo literário. O tempo que eu gastarei relendo um livro é o tempo que eu gastarei lendo outro. Portanto, raramente fiz releituras no meu itinerário livresco.
A impressão que tive foi a de que Bentinho transmutou-se gradativamente em um ciumento paranóico. Qualquer olhar ou ação mínima era ensejo para suspeitas, desconfianças da parte dele. É mais provável que Capitu fosse uma injustiçada, vítima de um ciúme doentio, que uma traidora. Mas também não podemos negar a personalidade enigmática e sinuosa de Capitu, o que a tornava não tão digna de confiança. Bentinho a retratava como uma “cigana de olhos oblíquos e dissimulados”, além de também descrever seus olhos como “de ressaca”, uma metáfora a seu olhar duvidoso, incerto quanto aos sentimentos demonstrados – já repararam no quanto é inescrutável o olhar de um indivíduo em estado de ressaca, após uma bebedeira daquelas? Entretanto, é bom frisar que o narrador da trama é Bentinho e, pois, a história ocorre sob a sua ótica.
Há uma tese intrigante acerca de Dom Casmurro, formulada pela estudiosa machadiana Helen Caldwell, a respeito do nome de Bento Santiago, o protagonista-narrador do romance. Bento, claro, significa “batizado” e deve-se a uma promessa da mãe do personagem. Santiago é uma combinação dos nomes “Santo” + “Iago”. Lembremos que Iago era o antagonista de Otelo, que imputava-lhe ciúmes através da força de coincidências e elucubrações sugestivas, a fim de destruir o amor de Otelo por Desdêmona, incitando-o a cometer um ato insano. Então, Bentinho seria o Iago de si mesmo, que à custa de coincidências impingia à sua própria consciência suspeitas de traição. Essa teoria explanatória faz muito sentido, se não olvidarmos o fato de que Machado de Assis era vidrado em Shakespeare. Todavia, essa combinação nominal, que muito provavelmente confirmaria a certeza da ciumeira obsessiva e imaginária de Bentinho, cai por terra se levarmos em consideração o fato de que pode ser uma pista falsa do próprio Machadinho. Ele não era bobo, e gostava de instigar e desnortear os leitores – principalmente através das digressões. E voltamos à estaca zero!
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