A questão é bem simples.
Tolkien nega alegorias, e assim afirma em cartas.
Porém, Eru Ilúvatar pode, tranquilamente, ser análogo ao Deus cristão.
Na Idade Média, baseados em idéias agostinianas, têm-se a primeira noção (ainda de Iavé) de um Deus criador, e esse Deus está fora do tempo, ou seja, fora do mundo da matéria. Esse conceito está alicerçado nos estudos de Agostinho acerca de Platão, que assim como Aristóteles, mas de forma um tanto quanto diversa (Aristóteles coloca o mundo sub-lunar e supra-lunar, sendo o sub o mundo terreno, da matéria e o supra o divino) nos coloca a idéia do eidolon, do mundo das idéias, que está fora do tempo, fora do mundo material, longe das paixões.
Ora, Agostinho como téorico do cristianismo (uma colocação propositalmente anacrônica minha) tenta, através da razão, legitimar a fé.
Sendo assim, ele norteia sua visão de Paraíso, de Deus, naquilo que havia desde os judeus primitivos (a questão do Verbo, Deus simplesmente "É", não se explica, nem questiona isso) e nas idéias de Platão.
Sendo assim, Deus está fora, e ao mesmo tempo presente no Mundo terreno por sua onipresença, mas fora do Tempo, ou seja, Ilúvatar (análogo ao Deus cristão) não está exatamente em Arda, portanto, não seria o caso de alguém vir antes, ou depois Dele, Ele é atemporal.
Porém, acerca disso tudo temos um grande problema. Essa analogia não foi ingênua, e nem tão pouco casual. Tolkie possuía conhecimento desses fatos, tanto como Católico fervoroso, como através da mente coletiva, do social dos cristãos, que foi difundido desde Agostinho, por volta do século IV, V a.C.
Sendo assim, no capítulo acerca de Tom, no momento em que Fruta D'Ouro usa o trato judaíco do Verbo, Ele "é", nos remete à uma possível interpretação de Tom Bombadil.
Durante o decorrer da Idade Média, como maravilhosamente colocado pelo Grande historiador Jacques Le Goff, a idéia do Deus Criador impiedoso e inatingível, pelo simples pressuposto da mente humana, "cai por terra".
Sendo assim, temos os cristãos se voltando para um Deus humano (presente na religião cristão, com o próprio Cristo), um Deus encarnado.
Ele ainda "é", porém, não mais atemporal, e agora atribuíssem a ele virtudes humanas (o conceito não se difunde aos defeitos, como no humanismo¹ greco-romano) e o homem vai nortear-se por ser a imagem e semelhança de Deus, a figura divina não mais é inatingível.
E a imagem de Tom, e de toda sua onipotência nos remete diretamente à essa questão.
Sem demais, de forma estritamente hipotética, Tom Bombadil pode representar sim a figura de Ilúvatar. E assim como a questão criacionista, e a escatológica, mais uma alegoria presente na obra.
A despeito da negação categórica do autor.
Estou tratando através do viés social, no qual Tolkien, como qualquer humano no século XX, estaria imbuído.
Abraços.
¹seria esse um termo anacrônico, mas mais uma vez tive necessadidade de ser didático.