Ciência da Terra-média: visão élfica

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Escrito por Reinaldo José Lopes

Do ponto de vista do amor próprio da humanidade, a cena mais humilhante de "O Senhor dos Anéis" provavelmente é quando Legolas Verdefolha faz comentários casuais sobre a cor do cabelo, a vestimenta e as armas dos cavaleiros de Rohan que estão à módica distância de cinco léguas (uns 23 km) do elfo.

 

"Penetrantes são os olhos dos elfos", comenta Aragorn, sem dúvida com um sorrisinho amarelo. Mas quão penetrantes?

Henry Gee, editor da revista científica "Nature", tem a pachorra de fazer essa cálculo sobre a acuidade visual élfico em seu livro "The Science of Middle-earth", grande inspiração desta série de textos. E o que ele descobre é surpreendente. O poderio visual dos elfos, se existisse no mundo real, seria suficiente para dar aos Primogênitos uma visão completamente inusitada do cosmos — ao menos diante da que os humanos têm, pelo menos.

Melhor que uma águia
Gee argumenta que as capacidades visuais de Legolas lhe permitem dois pontos separados por um metro de distância a 23 km de seus olhos. Um cálculo simples de trigonometria revela que isso equivale a uma acuidade visual de dois milésimos de grau, ou oito segundos de arco (lembre-se, a acuidade visual é medida de acordo com os valores de uma esfera, que é dividida em 360 graus, os quais, por sua vez, se subdividem em 60 minutos com 60 segundos cada).

Para se ter uma ideia de quão absurda é essa precisão visual, considere o seguinte dado astronômico. Tradicionalmente, o poder visual de seres humanos é medido com um par de estrelas, Mizar e Alcor, que ficam na constelação da Ursa Maior. Essas estrelas, em árabe, recebem o apelido de "cavalo e cavaleiro", porque estão tão juntas que só pessoas com visão muito boa conseguem distingui-las no céu a olho nu.

Agora começa a loucura.  Na verdade, com a ajuda de um telescópio, dá para perceber que Mizar é uma binária, ou seja, duas estrelas orbitando em torno uma da outra. Para Legolas, portanto, Mizar não é uma só estrela, mas duas.

(A coisa na verdade é mais complicada, porque cada membro do "par" de Mizar é, na verdade, também uma binária. Trata-se de um sistema quádruplo. Mas isso nem Legolas enxergaria – a atmosfera da Terra tem um efeito borrador que impediria a visão de qualquer maneira.)

E não é só isso. A capacidade visual élfica também permitiria que Legolas detectasse, quase em tempo real, o movimento de planetas no céu durante a noite. Ele levaria apenas seis minutos para ver Marte se mexer, por exemplo — coisa que o olhar humano precisaria de nove horas para conseguir.

Não é à toa, portanto, diz Gee, que as estrelas eram tão cruciais na cultura élfica. O céu visto pelos Eldar era incrivelmente mais "vivo" do que o que nós vemos.

Mas como?
A grande dúvida, porém, é como os elfos faziam esse truque absurdo. É aí que a porca torce o rabo.

Um dos jeitos de fazer isso seria aumentar a área coletora de luz dos olhos, mais ou menos como as câmeras fotográficas abrem seu obturador para deixar a luminosidade entrar.

Problema: pra conseguir isso assim na marra, os elfos precisariam abrir tanto as pupilas que elas iriam parar na nuca, coitados. Não ia ser uma cena bonita.

A conclusão de Gee: está tudo no sistema nervoso. Provavelmente a diferença entre nós e os Eldar era a presença de células receptoras de luz extremamente sensíveis na retina, que davam jeito de captar fótons (partículas de luz) vindas de muito, muito longe.

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E no próximo Ciência da Terra-média: o laboratório de Fëanor!

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