O Livro Negro de Arda – Parte 2 Capí­tulo 6

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Escrito por moriel
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A Valinor/Lothlórien tem a honra de dar continuidade à publicação de O
Livro Negro de Arda, publicando o sexto capítulo da segunda parte, chamado SOBRE A CHEGADA DOS HOMENS. Leia mais sobre esta obra aqui na Valinor e confira os demais capítulos já publicados, no índice da obra
 
 

PARTE SEGUNDA. MANDARAM ESQUECER
SOBRE A CHEGADA DOS HOMENS

…Quem sabe, quem contará sobre quando surgiram em Arta os Homens? Os sábios dizem – quando o Sol se levantou pela primeira vez sobre o mundo. Mas o Sol é mais antigo do que Arta, e o nascer dele foi visto muitas vezes por aqueles que tinham o dom de vê-lo, e isso foi muito antes dos Homens. Os Elfos sabem somente sobre aqueles Homens que chegaram ao Ocidente nos dias de Finrod Felagund, sobre aqueles que depois seriam chamados de as Três Hostes ou de Atani. Sobre os outros homens, que escolheram caminhos diferentes do caminho para o Ocidente, os Elfos nada sabiam. Também não sabiam que, desde o início, os Homens eram capazes de ver o Sol e a Lua, – muito antes de os Elfos verem a Face do Dia e a Face da Noite. Os Homens receberam dádivas estranhas, e muitas delas eram estranhas e incompreensíveis para os Elfos. E elas não foram dados de uma vez, como aos Elfos, mas acordavam gradativamente, e, ao descobrir em si um novo dom, o humano não o perdia depois, mas o polia, passando-o de geração em geração. Se, claro, ele mesmo não se assustasse com o próprio dom…

Sobre o Acordar dos Homens contam as lendas que hoje são guardadas por poucos. Naquele vale que os Eldar chamam de Hildórien, acordaram primeiro aqueles que são chamados de Nascidos-na-Noite, apesar de eles terem chegado na hora anterior a alvorada, quando o céu no Oriente já começa a clarear, mas as estrelas da noite ainda são brilhantes. As lendas nomeiam quatro povos: Ahhi, Noturnos, e Aoi, Homens das Sombras da Floresta; Ilchennir, Filhos da Lua, e Ochor’tenn’ayri, Aqueles-que-Vêem-e-Preservam.

Naquela hora em que no céu que clareia as estrelas ardem, como gotas de orvalho prontas para despencar, e sobre a terra escorre, num lento rio sonolento, uma cintilante neblina mágica, chegaram ao mundo os Elliri, Filhos da Estrela, o primeiro dos Povos do Amanhecer. Relva orvalhada e a neblina da manhã se dissolvendo – povo Ennir ert’Sin, e os primeiros raios do Sol dourado – homens de Eturu…

São chamadas de Filhos do Sol as Três Hostes dos Edain; e irmãos deles – o povo Asener, os homens de Hanatta e Nghatta, e tribos nômades que voam sobre a terra como o vento do meio-dia. E a sombra do meio-dia deu vida àqueles que se chamaram – Ullayr Ghellach, o Povo das Estrelas da Meia-Noite.

E no pôr-do-sol, entraram no mundo os povos de Ana e Daon. Os últimos raios claros – oferenda do Sol para o povo Daho, e na hora do nascimento das estrelas chegaram as hostes daquela terra que foi chamada de Angellemar, Vale onde Nascem as Estrelas. E quando o céu ainda não teve tempo de escurecer no Ocidente, nasceram os que foram nomeados Irmãos dos Lobos.

Nem todos os nomes foram ditos, e muitos povos não se recordam mais da Hora do Acordar. A sabedoria perdida dos Ohor’tenn’ayri guardava os nomes de todos os povos, mas hoje não há ninguém para contar sobre isso, pois esta hoste sumiu da face de Arta; misturou-se o sangue dos povos e dialetos deles, as lendas que eram transmitidas de boca em boca por muitas gerações tornaram-se vagas. E apesar de tudo, muitos lembram Daquele Que Vinha. Assim conta sobre ele o mito do Povo da Estrela:

 “E entre nos surgiu alguém, semelhante a nos, mas mais belo e mais sábio que nos. E ele veio na noite, e ele vestia as vestes do Escuro, e asas negras estavam nas costas dele. E os cabelos dele eram como a noite, e estrelas estavam enlaçadas neles, mas mais brilhantes que as estrelas eram os olhos dele. E ele falou conosco, e a fala se assemelhava à nossa, mas era diferente, e as palavras dele eram música, semelhantes a llien tayre omm ellar – canção que voa entre as estrelas; e tudo era compreensível para nos.

E ele disse: Eu vim até vocês, pois desejava vê-los.

E ele disse: eu não vim para levá-los pelos caminhos batidos; eu lhes apontarei os caminhos, mas vocês escolherão o seu pela própria vontade, e sozinhos seguirão por ele. Se desejarem, eu lhes darei os inícios dos conhecimentos que lhes ajudarão no caminho, mas vocês mesmos chegarão à sabedoria. E quando for assim, vocês serão iguais a mim, e acima de mim, pois vocês são livres e podem mudar os destinos do mundo…

E ele nos ensinava muitas coisas, e conversava conosco sobre tudo o que existe no mundo, e sobre tudo que é o corpo do mundo, e sobre a alma dele; e sobre estrelas incontáveis que brilham na escuridão… E ele nos falava sobre a criação do mundo, sobre a Grande Música e sobre os outros mundos que cintilam como pérolas entre as estrelas de Ëa. E ele contava como foram criadas as plantas e os animais, o Povo Mais Velho e os Homens, e ensinava a conversar com os espíritos das florestas, montanhas e águas, com animais e pássaros, ouvir as vozes da terra, das arvores e das ervas, canções das estrelas e canções do vento.

Ele apareceu mais de uma vez, e nos o esperávamos, pois tínhamos sede de novos conhecimentos e nos alegrávamos ao descobrir o novo; e também porque o amávamos. Mas ele não nos revelou o nome dele, e nos o chamávamos de Aquele que Amou e de Mestre. E nos entristecemos-nos quando, um dia, ele partiu e não voltou…”

Os homens não sabiam o nome Daquele Que Vinha, como não sabiam também quem era ele; e muitos o chamavam de Deus da Noite, e davam-lhe muitos nomes. E os Elliri o chamaram de Elgo Tchore, o que significa – Aquele que Ouve o Mundo, Que Veio na Noite.

Do vale do Acordar, os caminhos dos Homens se separaram, e cada povo achou uma terra que se tornou o lar dele. Somente os Elliri eram Andarilhos desde o início. Eles passaram, vagando, longos anos, e viram muitas terras, mas de nenhuma delas falaram – eis o nosso lar. E eles estavam felizes com a viagem, descobrindo para si o jovem mundo, os segredos e maravilhas dele. E no caminho, a Noite do Grande Feitiço os encontrou…

…E alguém exclamou de repente:

– Olhem!..

Abrindo as asas imensas, um Dragão voava silenciosamente no céu noturno. As escamas cor de mel e de cobre brilhavam com o ouro opaco no luar; ele dançava, expondo o corpo elegante para a luz mágica, e os homens ouviram o surdo ritmo do feitiço da dança. Eles olhavam, sem desviar os olhos, cedendo aos feitiços da Dança da Lua, e nos corações deles nascia a Música. A noite cantava, e estranhas flores pálidas e cintilantes se abriam, um aroma levemente amargo e triste flutuava no ar, e soava uma melodia baixa de flauta, e nela enlaçavam-se, com brilhos de fogos escuros com tons de ouro vermelho, as notas cálidas das flores de feto. A noite soava com acordes surdos de órgão – cantavam as árvores milenares, e os espíritos das florestas dançavam sem se ocultar dos olhares dos homens, e as canções deles eram indistinguíveis das canções das ervas e flores, e, sobre o veludo roxo e negro do céu de outono, as estrelas traçavam runas estranhas, e em uma dança encantada rodopiava o Dragão…

Innire, Aquela que Dança sob a Lua, enlaçou nos cabelos dela as brancas flores-estrelas, e saiu, e seguiu a dança; e os espíritos da floresta dançavam com ela. E naquela noite, os homens falavam nas línguas de ervas e flores, pois não queriam quebrar o silêncio com o som da voz: as flores e ervas eram as palavras deles, e as estrelas os coroavam…

Desde então, o dragão que dança no céu noturno sob a coroa da Sete estrelas, coroado com Uma, a mais brilhante, tornou-se para os Elliri o sinal de alta sabedoria e da magia.

Assim eles andavam pela terra – Andarilhos da Estrela. E chegou a hora em que, nas suas viagens, eles viram no silêncio da meia-noite a Coroa que baixou sobre as montanhas brancas do norte e, como a gema mais preciosa na Coroa do Mundo, brilhava a Estrela. E assim acabaram as andanças obscuras deles pela a face de Arta, pois a Estrela apontou-lhes o caminho, e agora eles sabiam para onde ir.

As lendas preservaram os nomes antigos. Havia um com o nome de Neyir, Aquele que Aponta o Caminho. Dizem que quando ele olhava para a Estrela, ele dizia – ela sofre e ama. E uma vez, depois de passar a noite sob o céu aberto, sem sono, em uma tristeza clara e estranha, ele veio até os chefes e disse:

– Eu sei – existe a Terra-sob-a-Estrela, e o meu coração me chama para lá. Eu quero, eu devo encontrá-la, por mais longo que seja o caminho. Quem irá comigo?

E os homens acreditaram nele, pois sabiam que Neyir vê mais longe do que os outros com o coração. E o seguiram, pois nos corações deles também batia o chamado da Estrela.

Por muitos dias e noites, por muitos anos eles seguiram a Estrela. Canções sobre a Grande Viagem são belas e tristes, cheias de saudade e esperança, pressentimento e fé, e nas canções soa o nome da Estrela – Meltor. Ninguém sabia porque a chamaram de Forca do Amor, mas também ninguém perguntava, pois eles não poderiam imaginar um outro nome para a Estrela: eles sentiam mais do que podiam perceber então.

E as Canções da Grande Viagem guardam o conto sobre os homens vestidos de negro, cujos olhos brilhavam como estrelas – sobre os sábios andarilhos que vinham para falar com os homens, que lhes traziam as próprias canções, sabedoria e conhecimentos. E o nome do povo deles era parecido com aquele que se deram os Andarilhos da Estrela: Elleri Ache.

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