O que aconteceria se Frodo mantivesse o Um Anel?

Escrito por Fábio Bettega
Por incrível que pareça, Tolkien manteve uma correspondência bastante
ativa com os fãs depois do lançamento de O Senhor dos Anéis,
esclarecendo os temas e personagens de seu universo ficcional. E sem
dúvida um dos exemplos mais fascinantes disso é uma longa carta escrita
em 1963 para Eileen Elgar, na qual Tolkien fala sobre o possível
“fracasso” de Frodo em resistir ao Anel e, além disso, tenta imaginar o
que aconteceria se o hobbit realmente tivesse vencido Gollum e tentado
manter o Anel para si.
 
 
 
“É um problema interessante: como Sauron teria agido ou Frodo teria resistido”, diz Tolkien. “Sauron
imediatamente enviou os Espectros do Anel. Eles estavam, naturalmente,
perfeitamente instruídos, e não se deixavam enganar quanto ao real
senhor do Anel. […] Mas a situação agora era diferente da que
ocorrera no Topo dos Ventos. Frodo havia crescido desde então. Será que
os Espectros estariam imunes ao poder do Anel se Frodo o reivindicasse
como instrumento de comando e dominação?

Não totalmente. Não acho que eles poderiam tê-lo atacado com
violência […]; teriam obedecido ou fingido obedecer a quaisquer
comandos menores dele que ṇo interferissem com sua misṣo Рimposta a
eles por Sauron, que através dos Anéis [que ele tinha consigo] exercia
o controle primário de suas vontades. […] Frodo havia se tornado uma
pessoa considerável, mas de um tipo especial: em crescimento espiritual
ao invés de em aumento de força física ou mental; sua vontade era muito
maior do que fôra, mas até aquele momento havia sido exercida para
resistir ao uso do Anel […]. Ele precisava de tempo, muito tempo,
antes que pudesse controlar o Anel […].


A situação de Frodo em relação aos Oito [nota de rodapé: O Rei Bruxo
havia sido reduzido à impotência] era semelhante à de um homem pequeno
e corajoso equipado com uma arma devastadora, enfrentado por oito
guerreiros selvagens de grande força e agilidade, armados com lâminas
envenenadas. A fraqueza do homem é que ele ainda não sabia como usar
sua arma, e era por temperamento e treinamento avesso à violência; a
fraqueza dos guerreiros era que essa arma era algo que os enchia de
medo por ser um objeto de terror em seu culto religioso, e que fazia
com que eles tratassem quem o usasse com servilismo. Acho que eles
teriam mostrado “servilismo”. Teriam saudado Frodo como “Senhor”. Com
belas palavras o teriam induzido a deixar as Sammath Naur – por
exemplo, “para ver seu novo reino e contemplar de longe com sua nova
visão a morada de poder que ele agora deveria reivindicar e adequar a
seus próprios propósitos”
.

Assim que ele saísse, um deles provavelmente destruiria a câmara,
mas Frodo já estaria imerso demais em grandes planos de domínio
reformado para dar atenção a isso. Mas se ele ainda conservasse alguma
sanidade e entendesse parcialmente o significado daquilo, de maneira
que se recussasse a ir com eles até Barad-dûr, eles simplesmente
esperariam. Até que Sauron em pessoa viesse. Em qualquer caso, um
confronto entre Frodo e Sauron logo teria lugar se o Anel ainda
estivesse intacto. O resultado seria inevitável. Frodo seria
completamente derrotado; desfeito em poeira, ou preservado em tormento
como um escravo gaguejante. Sauron não teria temido o Anel! Era dele, e
sujeito à sua vontade”
.

Tolkien prossegue, considerando as possibilidades de vitória se outros
personagens confrontassem pessoalmente Sauron com seu próprio Anel. “Dos “mortais”, nenhum – nem mesmo Aragorn”. Entre os elfos, nem mesmo Elrond e Galadriel seriam capazes de tal feito, pelo menos não num confronto direto: “Eles
teriam construído um império com generais poderosos e completamente
subservientes e exércitos e máquinas de guerra, até que pudessem
desafiar Sauron e destruí-lo pela força”
.

Entre todas essas possibilidades, quem poderia então tentar realmente
enfrentar Sauron cara a cara? Acertou quem apostou em Gandalf. “Apenas
Gandalf poderia dominá-lo – sendo um emissário dos Poderes e uma
criatura da mesma ordem, um espírito imortal tomando forma visível.
[…] Seria um equilíbrio delicado. De um lado, Sauron e a verdadeira
fidelidade do Anel a ele; do outro força superior, porque Sauron não
estava realmente em posse [do Anel], e talvez também porque ele estava
enfraquecido por longa corrupção e gasto de sua força para dominar
inferiores. Se Gandalf provasse ser o vencedor, o resultado seria para
Sauron idêntico à da destruição do Anel. […] Mas o Anel e todas as
suas obras durariam. Seria ele o mestre no fim”
.

Tolkien conclui afirmando que nem Mithrandir [como o próprio mago bem sabia] ficaria imune à corrupção do Um Anel. “Gandalf
como Senhor do Anel seria muito pior que Sauron. Ele continuaria
“justo”, mas levando em conta apenas suas próprias idéias. Ele
continuaria a governar e ordenar as coisas para o “bem”, e o benefício
de seus próprios súditos de acordo com sua sabedoria”
.

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