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Juiz dá sermão na sentença, será que agiu certo?

Beren

Wannabe Rider
Sentença longa, mas vale a pena ler até o final.

"Vistos. Narra o autor que é jogador de RPG (Role-playing Game ou Jogo de interpretação de papeis), há mais de dez anos, dedicando-se ao jogo chamado ¿Ragnarök¿. Esclarece que os jogos são vinculados à internet, de modo que podem ser acessados de qualquer computador, no mundo inteiro. Sintetiza o modo de jogar, que consiste em montar e evoluir personagens, que vão acumulando utensílios, poderes e ¿cash¿(dinheiro virtual utilizado). Assevera que, em julho de 2014, enquanto jogava, iniciou uma conversa com uma personagem feminina, mostrando os itens que possuía e o nível de seus personagens, quando um outro personagem aproximou-se e começou a insultá-lo. Diz que, em decorrência da situação, perdeu o controle de seu personagem, sendo remetido ao ponto de retorno do jogo, onde uma outra personagem largou diversos itens caros no chão, quando então passou a recolhê-los, objetivando ganhar mais experiência no jogo. Salienta que, diante disso, o jogo começou a apresentar falhas, não tendo conseguido mais acessar o servidor e, quando retomou o acesso, verificou que todos os itens do seu personagem, arrecadado nos dez anos de jogo haviam sumido. Sustenta ocorrência de danos morais indenizáveis, visto que passou por situação vexatória no jogo, frente aos outros jogadores, diante do rebaixamento de status no jogo (sic), além de desequilíbrio emocional em face da negativa das rés em restabelecer seus itens perdidos. Aduz perda patrimonial, em razão dos valores que despendeu para investir no jogo. Requer a procedência da ação, condenando as rés a indenização por danos morais e materiais. Pede AJG. Anexa documentos. O feito não merece processamento por absoluta falta de interesse processual da parte, bem como impossibilidade jurídica do pedido. Ainda que não se desconheça a abrangência da interação via internet nos dias atuais, não se pode confundir o mundo virtual com o mundo real. Evidente que eventual ofensa aos direitos de personalidade do indivíduo, perpetrado na esfera virtual, mas que transcenda e gere efeitos ao mundo real, deve ser tutelado e indenizado. No caso dos autos, todavia, a narrativa do autor causa, para dizer o mínimo, espanto ao juízo. Trata-se de um adulto, com 29 anos de idade, que afirma categoricamente em sua peça inicial que o jogo em questão é visto ¿como uma vida paralela, na qual se cria uma liberdade e realização de feitos, aquisição de itens, cumulação de fortunas e bens, que por vezes não são possíveis na vida real¿, fl. 13. Em decorrência de tal sentimento, de tamanha insatisfação com sua realidade, é que o autor depositou voluntariamente, durante os últimos dez anos de sua vida, tanta expectativa em um jogo, em um mundo imaginário, no qual sentia-se mais poderoso e afortunado, inclusive investindo valores, a fim de avançar mais rapidamente de nível. Perfeitamente compreensível que após dedicar horas ao jogo, durante tantos anos, o autor tenha ficado aborrecido com o ocorrido. O que não se pode compreender e nem aceitar é que um aborrecimento desta natureza, sirva de fundamento para pedido de indenização por danos morais. O Poder Judiciário - já assoberbado com tantas outras demandas aventureiras que, amparadas pela gratuidade de justiça, ingressam diariamente com o intuito de ganho fácil - tem milhares de questões realmente importantes que merecem atenção e investimento de dinheiro público na sua solução. A hipótese em comento, nem de longe pode ser considerada significativa o suficiente para que seja tutelada pelo Estado. Ocorre que o jogo, seja ele virtual ou não, trata-se de um passatempo, criado para divertir e distrair as pessoas em seus momentos de lazer. Se o autor, adulto com quase 30 anos de idade, limitou a sua existência nos últimos dez anos, a dedicar tempo e dinheiro para fomentar a imagem de um personagem de jogo, que só existe em um mundo intangível, certamente não é o socorro do Poder Judiciário que ele necessita. Se realmente o autor entende que seu personagem do jogo sofreu circunstância constrangedora perante aos demais personagens, está necessitando de ajuda psicológica que o faça perceber - além de que o jogo é apenas uma diversão, de modo que perder, não passar de nível e ser rebaixado, como no caso do jogo em questão, é apenas uma consequência, faz parte do jogo e jamais será uma circunstância vexatória, como fundamentado pelo autor em sua inicial - que um mundo paralelo virtual e fictício não pode ser alçado à principal fonte de lazer de qualquer pessoa, sobretudo uma pessoa adulta que certamente tem responsabilidades e coisas mais importantes com o que se preocupar na vida real. Em tempos de individualismo ferrenho, como nos dias atuais, um egocentrismo facilitado pela possibilidade de isolamento real ¿ e socialização apenas virtual ¿ do indivíduo, retroalimenta as piores mazelas sociais hoje enfrentadas no mundo real. A sociedade moderna a cada dia necessita de mais participação real, de maior envolvimento com os problemas do outro e de mais empatia e solidariedade com aqueles em situação vulnerável. Entretanto o que se vê é um comportamento tendente ao egoísmo, ao individualismo, à preocupação com o EU, o que é muito facilitado pela possibilidade quase ilimitada de uma vida apenas virtual, e isso não faz bem. Assim, dar trânsito a demandas tais como esta, seria um incentivo ainda maior para que as pessoas se encastelem, se isolem do coletivo e passem a dar importância apenas aquilo que afeta a si mesmas, deixando de lado a participação na vida real e a preocupação com temas que REALMENTE tenham repercussão nas vidas reais das pessoas, que afetem o direito de ir e vir, o direito à saúde, à liberdade, ao meio ambiente equilibrado, à dignidade, entre tantos outros direitos e garantias fundamentais que só são percebidos e exercidos plenamente através da vida real. A vida real em sociedade, com todos os seus problemas, ainda é a única forma civilizada de convivência criada pelo homem e vem sendo aperfeiçoada nos últimos milênios. E sem a participação efetiva das pessoas no cotidiano, sua estrutura ruirá e voltaremos aos tempos de anarquia e selvageria, o que não se pode admitir. Assim, demandas tais como esta, que demonstram uma única preocupação ¿ o EU ¿ não podem ser incentivadas. Um jogo virtual, por mais que tenha duração de cinco, dez ou mesmo vinte anos, sempre deverá ser encarado pelo que realmente é e sempre será: um JOGO. Se alguém resolve se apartar da vida real e investir dez anos de sua existência em um JOGO, deve estar ciente que o faz por sua conta e risco e que se mais adiante ocorrer algum problema que prejudique o seu JOGO, deverá ter maturidade e tolerância suficientes para fazer uma autocrítica e chegar à conclusão de que se isso lhe trouxe prejuízo, foi um prejuízo individual que deve ser arcado individualmente e assimilado psicologicamente por aquele que no tal JOGO se aventurou. Não se pode querer mover todo o aparato caro e pesado do Poder Judiciário, por intermédio do Estado-Juiz, para intervir em uma relação totalmente individualista e apartada do meio social, que foi criada apenas para distrair pessoas no seu tempo ocioso. Se alguém resolveu fazer de uma ¿distração para pessoas no seu tempo ocioso¿ o seu objetivo maior da vida real, deve arcar com as consequências. Não pode exigir que o Poder Judiciário deixe de lado centenas de milhares de demandas que versam sobre aposentadorias de idosos, fornecimento de tratamentos médicos para pessoas necessitadas, ações sobre acidentes reais de trânsito, questões relacionadas a delitos criminais e etc, para dedicar atenção exclusiva a um JOGO que, repito, pode ter adquirido grande importância para o autor na sua vida privada isolada e apartada da realidade, mas sempre foi e será um JOGO, nada mais do que isso. Caso contrário, em breve se verá o Poder Judiciário tendo de lidar com a frustração íntima daquele que perdeu uma partida de jogo de tabuleiro (WAR, banco imobiliário, jogo de damas, etc.), uma disputa de ¿par ou ímpar¿ ou uma aposta na loteria oficial. O que se vê nos dias de hoje é que as pessoas não querem (ou não sabem) lidar com qualquer tipo de frustração e creem que tudo deve ser compensado pecuniariamente. Eis a indústria do dano moral, que deve ser desestimulada. O pedido de indenização por dano patrimonial, outrossim, igualmente está fadado ao insucesso. Isso porque, o autor informa que investiu dinheiro em seu personagem, com o objetivo de se promover no universo do jogo. Tal objetivo, conforme depreende-se da narrativa da inicial, foi alcançado. Durante alguns anos o personagem do autor foi superior a centenas de outros personagens em razão do dinheiro investido. Isso reverteu-se em satisfação pessoal ao autor, que teve retorno do valor investido. Não pode agora, que não mais vai utilizar do serviço ¿ e não importa, aqui, por qual motivo - requerer a devolução de valores que voluntariamente gastou para destacar-se no jogo. A questão referente ao rebaixamento de nível e suas consequência na vida do autor, diz respeito ao dano extrapatrimonial, que já foi amplamente explanado acima. Não bastasse isso, veja-se que as faturas do cartão de crédito acostadas, que supostamente comprovam os valores despendidos, estão em nome de terceira pessoa, o que por si só já afastaria a legitimidade do autor para postular eventual restituição em juízo. Destarte, concluo que os fundamentos da presente demanda não se subsumem às previsões do nosso ordenamento jurídico atual, devendo o autor realizar autocrítica íntima e assimilar os supostos e alegados prejuízos que entende ter sofrido no mundo virtual, para tanto usando dos seus próprios recursos emocionais fornecidos pela vida real através da sua psique e não do Poder Judiciário. DIANTE DO EXPOSTO, forte no art. 267, inciso VI, do CPC, julgo extinto o feito. Custas pelo autor. Desde já determino que, a fim de ser apreciado o pedido de AJG, venha cópia da última declaração de ajuste anual entregue ao fisco (com protocolo e número do recibo para que os dados possam ser conferidos pelo juízo junto à Receita Federal). Caso se declare isento, comprove que não há declaração entregue à Receita nos últimos dois exercícios e comprove sobejamente sua renda, por meio escrito que melhor lhe aprouver, sob pena de indeferimento. Intime-se. D.L. "

Fonte: Post de um amigo no Facebook
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O que vocês acham? Agiu certo? Interpretou errado o autor? Está descontando sua frustração? hehe
 
achei exagerado... quem é ele para criticar o que uma pessoa adulta faz em momento de lazer?
concordo em não acatar o pedido de danos morais, pois isso não cabe, mas a partir do momento que a pessoa perdeu dinheiro com o ato, não interessa se é em um jogo, mundo virtual, universo paralelo ou qualquer merda, tem que caber danos materiais. O problema do sistema é que fica muito a cargo da decisão pessoal do juiz...
 
Sim, ele se alongou demais e acabou falando merda em alguns pontos.
Mas como juiz precisa justificar a sentença que ele lança, ele não podia só dizer "Meh, que processo idiota, cara. Extinto."
Achei tri que ele foi bem exigente ao final, para conceder AJG. Esse é o terror do Judiciário. O que tem de gente entrando com processo mongolão só porque consegue isenção de custas e tal... não tá no gibi.
 
Eu concordo com o Fusa que ele foi bem conservador tratando de jogo. Mas eu achei que ele pegou o cara 'pra Cristo' e descontou um bocado de frustração com a sociedade, e com a Indústria do Dano Moral, por isso se estendeu mais, hehe
 
Quando o Sejong disse que iria longe, não imaginei que viraria juiz. Não consigo ler um texto assim, sem parágrafos.
 
Claro que agiu errado.

Olha esse muro de palavras, sem nenhum parágrafo... Não importa o conteúdo, agiu errado.
 

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