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Je Suis Malheureux, por Érico Assis

Bruce Torres

Let's be alone together.
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Tenho um blog próprio para (também) falar de quadrinhos. Há alguns dias mandei e-mails para uns cinquenta autores de HQ brasileiros perguntando sobre suas agendas para 2015: o que iam lançar, o que iam produzir. São listas e mais listas.

Mas também recebi respostas de, digamos, agenda vazia. Teve um “Acho que desisti. Empacotei todas minhas páginas de quadrinhos e tirei do estúdio”. Outro: “Mandei currículo para trabalhar num banco semana passada, ainda não recebi resposta”. E um terceiro: “Por enquanto tô só torcendo pra conseguir me manter vivo e alimentado até o meio do ano, as perspectivas são no sentido contrário!”.

Fico lisonjeado em ver que meu curto e-mail copiado e colado para um monte de gente provocou respostas que me transformaram em, vá lá, confidente. Respondi todos dentro do meu possível — embora eu tenha tendência a ser mais Zelig do que ombro amigo.

Mandei os e-mails no dia seguinte ao Charlie Hebdo (um dos que me responderam disse, entre parênteses, “tive sonhos vívidos de ser assassinado na prancheta essa noite”). Antes do massacre, a principal conversa entre os quadrinistas franceses era outra: a precarização. Já faz algum tempo que o número de publicações por ano no mercado franco-belga vem aumentando, as tiragens baixando e, como os autores vivem dos royalties, o rendimento caiu. Depois, uma mudança na previdência francesa botou os quadrinistas em outra categoria de contribuição, o que também mexeu com o lucro. Houve abaixo-assinado ao Ministério da Cultura, “greve de autógrafos” e provavelmente haveria manifestações no Festival d’Angoulême, no final deste mês. A reclamação parece ínfima depois do dia 7, mas ainda inquieta. Segundo o último relatório da Associação de Críticos e Jornalistas de Bande Dessinée, 1411 europeus vivem de fazer quadrinhos francófonos — mas metade ganha menos que o salário mínimo francês.

“Estamos todos fodidos, uns mais, outros menos”, dizia um dos e-mails. Não se sabe quantas pessoas vivem profissionalmente de quadrinhos no Brasil. Muitos combinam os quadrinhos a outras fontes de renda. Ou, em muitos casos, fazem quadrinhos e têm fontes de renda. Não é muito diferente da situação de quem faz literatura brasileira. Contudo, há um bom número de brasileiros — talvez dê para contar em mais que mãos e pés – que trabalha para mercados de quadrinho estrangeiro, principalmente os EUA, e têm aí sua principal ou única renda.

Os três e-mails me deixaram marcado, mas ainda assim eram três entre mais de cinquenta. Nos demais, recebi listas de projetos com cronograma bem definido, colaborações planejadas profissionalmente até 2017, planos para revistas e sites, organização para Catarses, FIQ e CCXP, “o que mais aparecer que eu puder der conta” e “2014 foi um bom ano”. Não vieram só de quem trabalha para o estrangeiro.

Sem desconsiderar a desolação da parcela de autores que teve um ano fraco ou está passando por um momento complicado, dá para pensar que a desolação é um avanço. Até poucos anos, ninguém ficava triste por não se dar bem nos quadrinhos. Era o modo default: praticamente ninguém podia viver de HQ ou falar de sucesso com HQs. Agora, você pode até se sentir triste quando as vacas não engordam — desde que lembre que isso há de passar.

* * * * *
Érico Assis é jornalista, professor universitário e tradutor. Do selo Quadrinhos na Cia., ele já traduziu Retalhos e Habibi, de Craig Thompson, Umbigo sem fundo, de Dash Shaw, e os três volumes de Scott Pilgrim contra o mundo, de Bryan Lee O’Malley, entre outros. Ele contribui quinzenalmente para o blog com textos sobre histórias em quadrinhos.

Fonte: http://www.blogdacompanhia.com.br/2015/01/je-suis-malheureux/
 

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