Entrevista com Philippa Bowens e Fran Walsh

Escrito por Fábio Bettega
O Ain’t It Cool News entrevistou Philippa Bowens e Fran Walsh, as duas verdadeiras cabeças por trás da adaptação de “O Sen
 

O Ain’t It Cool News entrevistou Philippa Bowens e Fran Walsh, as duas verdadeiras cabeças por trás da adaptação de “O Senhor dos Anéis”. (E você sempre culpava o PJ, não é? 😉 )

Na indisponibilidade, para a maioria, dos documentários sobre o desenvolvimento do roteiro disponíveis nas Versões Estendidas, essa conversa com as duas ajuda a compreender a dificuldade do trabalho.

Aqui está um belo relato que põe em perspectiva as dificuldades naturais de se adaptar, mais o fato de SDA não ser um livro comum e as pressões dos engravatados da Miramax para criar um filme comercial que justificasse o investimento nele depositado.

AICN: Vocês estão aliviadas que tudo acabou, estão tristes ou algo entre essas duas coisas?

Philippa BOWENS: Oh, aliviadas. Com certeza. Por mim, certamente, porque era como um ensaio deixado abandonado, ou um projeto que era… que era muito “longo”. Mas, sério, foi uma jornada incrível.

AICN: O que pode falar sobre as complicações ao se fazer essas adaptações?

BOWENS: Uma coisa que sabíamos, o princípio guia em fazer essa adaptação, era que tinha de funcionar enquanto filme, primeira e principalmente. Enquanto três filmes. Então, isso era crítico e, esperávamos, ofenderíamos o menos possível os fãs de Tolkien durante esse percurso. Mas isso não era um problema. Nós tínhamos de fazer que funcionasse como filmes.

AICN: Você prefere Arwen dentro ou for a do Abismo de Helm?

BOWENS: Fora. E é por isso que ela caiu fora do Abismo de Helm.

AICN: Então, a decisão original de colocá-la lá foi…?

BOWENS: Nós escrevemos inicialmente o que era essencialmente um script comercial. Se observar Arwen nos livros, ela sentada em casa bordando um estandarte, aquilo não funcionaria em Hollywood. Você não pode empurrar aquilo para um script comercial.

AICN: Não daria para empurrar para lugar algum.

BOWENS: Nós tentamos escrever uma personagem que iria se comportar muito mais de acordo com os conceitos de um estúdio do que era uma personagem feminina principal, uma participação mais ativa. O que felizmente ocorreu durante o processo de filmagem, os comentários surgindo, trabalhando mais próximo dos atores, foi que as pessoas começaram a confiar mais no material. Incluindo nós mesmos. E compreendemos que poderíamos transformar isso numa história, ficando mais próximos do que está nos apêndices.

AICN: Na Edição Estendida de AS DUAS TORRES, você comentou em se fazer uma edição cronológica de todos os filmes. Pretende fazer isso como um projeto paralelo?

Fran WALSH: Eu acho que seria uma grande coisa a se fazer. Estava pensando outro dia que, se o fizéssemos, começaríamos com o prólogo do filme um, e então passaríamos à abertura do filme 3, com Andy (Serkis) e Déagol pescando e encontrando o Anel.

AICN: Você dirigiu essa cena com Andy?

WALSH: Sim. Sim, eu a filmei com ele. E, então, iríamos até Bilbo entrando na caverna. Estaríamos reinventando o modo de narrar do filme. Seria extraordinário. Eu adoraria porque usamos tantos flashbacks e cenas fora de seqüência. não sei se a New Line estaria aberta à essa idéia.

AICN: Em que ponto do projeto decidiu-se usar na abertura do filme 3 a cena entre Smégol e Déagol?

WALSH: Tínhamos a filosofia de “filmar tudo”. (Risos.) Por isso há tanto material para as edições estendidas em DVD. Logo, filmávamos o tanto que podíamos. Tentamos contar tanta história quanto possível. E editamos. Tentamos testar edições de cenas e ver o que acontecia. E, se não funcionava, se houvesse problemas na história, nós cortávamos. E pensávamos: “isso pode entrar no DVD”. Essa foi nossa filosofia. Ou poderia entrar no próximo filme, porque sempre havia um próximo no outro ano.

AICN: Não mais.

WALSH: Não mais. E foi isso que aconteceu com a seqüência de Saruman ao fim de AS DUAS TORRES. Tínhamos essa abundância de cenas climáticas ao fim do filme, com a inundação de Isengard, e a batalha do Abismo de Helm, e a saga de Gollum, Frodo e Sam. Sentíamos que esse desenlace com ele, algo de sete ou dez minutos, não servia à narrativa naquele momento. Então pensamos em colocar no filme 3, sem problemas. Mas, quando chegamos lá, tínhamos uma edição de mais de 4 horas de O RETORNO DO REI. Era evidente nesse ponto que não podíamos amarrar o fim do filme 2 com um personagem que não era importante nesse outro filme, com mais tanto ainda por vir, e precisávamos de todo tempo disponível. A decisão foi de colocar essa cena no DVD.

AICN: Isso foi feito no começo do ano.

WALSH: Sim. Seqüências mudam de posição, trocam de lugar. E sim, a cena de Andy e Déagol foi filmada para o filme 2.

BOWENS: Era para entrar quando Frodo dizia: “Era esse seu nome, não era?” E Gollum dizia: “Meu nome, meu nome”. Originalmente entraríamos aí num flashback.

AICN: Me pergunto se era um meio de fazer o público acompanhar melhor a história.

WALSH: Bem, sim. O que aconteceu foi que, embora filmada para o filme 2, quando a observamos e testamos, sentimos que funcionaria melhor no filme 3. E uma das razoes de ser assim foi porque o filme começaria com o Anel, sua descoberta através deste personagem, e fechar o arco do Anel com sua destruição. Sentimos que daria uma unidade ao filme. Parecia bom: se você tem de destruir essa coisa, vamos mostrar sua origem no começo. Parecia certo. E, também, em relação a Gollum… se mostraríamos seu fim, vamos mostrar como tudo começou. Fazia algum sentido, logo tomamos essa decisão bem no início da edição de AS DUAS TORRES.

AICN: Você mencionou terminar com um desenlace prolongado para AS DUAS TORRES. E aqui em RETORNO DO REI… [Nota: o filme tem um final longo para o padrão hollywoodiano, ao se mostrar o destino de Frodo após o fim do Anel; convenciona-se que o final não deve se estender muito além do clímax, o que RdR não faz.]

WALSH: Sim.

AICN: …como roteiristas, isso é incrivelmente traiçoeiro. Alguns diriam ser quase um suicídio, aquilo era apenas um desenlace.

WALSH: Sim, eu sei.

BOWENS: Veja, eu não acho que é. Acho que o filme é sobre o destino de Frodo. Nós compreendemos o destino do Anel, não é apenas um desenlace, é o destino de Frodo. E ainda resta uma parte da história a ser contada. Você destruiu o Anel e tem de pagar um preço, que é a sua própria destruição. Frodo não pode voltar ao normal. É uma parte crítica da narrativa. Não acho que seja um desenlace; é o fim do filme. O que foi demais para mim foi ver o filme com a platéia, e lá realmente funcionou. Eles na verdade ansiavam por isso. Na verdade, carrega em si algumas das partes mais emocionais da história.

AICN: Bem, é bastante ressonante…

BOWENS: Então, não parecia um risco. E Peter… tem bons instintos, geralmente muito fortes… e Fran certamente tem instinto, para saber o anseio do público. Ele sabia que não estávamos amarrando um filme, estávamos amarrando três.

AICN: Correto. Mas existe a idéia muito tangível da destruição do Anel. Você sente isso. E mesmo assim é traiçoeiro porque você está destruindo algo que é… que é o Olho de Sauron, que nem é um personagem. Mas então, quando isso termina… Quero dizer, parece…

BOWENS: Imagine o filme sem isso. É o que sempre digo. Retire esses finais, como ressoaria o filme? Na verdade, não ressoa até você destruir Frodo.

AICN: Por outro lado, há o final muito longo.

BOWENS: Ah, tá brincando? Poderíamos estender isso por mais de meia hora se quiséssemos mostrar o final completo.

AICN: Houve alguma discussão, em algum ponto, sobre um texto ou narração sobre o que acontece aos demais personagens? Parece que no livro muitos deles velejam até o Oeste.

BOWENS: Isso deverá aparecer no DVD.

AICN: Abençoado seja o DVD, certo?

BOWENS: Bem, na verdade, o que estes filmes fizeram foi, inadvertida e organicamente, produziram um tipo de narrativa através do qual você tem a tela grande, e que deve funcionar como parte de uma narrativa para a tela grande; o que é uma experiência diferente em relação ao DVD, que é outra forma de narrativa; ela pode ser bem mais episódica.

AICN: Falando do final, eu gostei desse filme porque acompanha uma história pessoal. Mas quando o vi, noite passada, algumas pessoas, logo após Frodo completar sua missão e a tela escureceu, pensaram ser o final e tentaram aplaudir.

BOWENS: Parte disso foi para mostrar que a história continua, mas também queríamos terminar o filme exatamente como o livro termina, que é literalmente na última frase do livro.

AICN: Enquanto as coisas se encaminhavam, vocês se encontraram, especialmente nos dois últimos filmes, escrevendo de acordo como os atores interpretavam?

WALSH: Sim, bastante.

AICN: Pode especificar algo?

BOWENS: Viggo Mortensen, durante todo o percurso, se tornou Aragorn. Aragorn era um personagem muito difícil de escrever, como os personagens principais geralmente o são. Os personagens mais fáceis de escrever são os interessantes, os personagens secundários – Língua de Cobra ou Gollum – que são falhos e interessantes. Mas, sabe, Aragorn foi difícil, e acho que não o compreendemos até Viggo chegar, de avião. E aí começamos a escrever voltadas para ele. Tínhamos um instinto e compreensão de que a jornada de Aragorn não iria se integrar ao filme, e essa percepção de que haveriam dúvida e questionamento; que lhe daríamos mais profundidade psicológica. Mas o que Viggo se saiu tão bem ao interpretá-lo, brilhantemente. Sua performance foi pausada, se observar os três filmes, realmente lindo. Tínhamos de ser muito cuidadosos com o personagem.

AICN: Vocês continuam a trabalhar com Peter em outras coisas, ou vão tirar um tempo longe do mundo de Peter Jackson?

BOWENS (para Fran): Você não pode. [Nota: Fran é esposa de PJ.]

AICN: Vocês estão presas a ele, digamos.

BOWENS: Na verdade, é muito legal habitar esse mundo. E esses dois são demais. Uma jornada.

AICN: Vocês vão “macacar”? [Nota: falam da refilmagem de KING KONG.]

BOWENS: Sim, vamos “macacar”. Já ia falar disso. É fantástico. Você toma o café da manhã, ou está tomando chá, e de repente conversa sobre isso. Peter está tendo idéias, Fran está com idéias, e eu estou sentada lá comendo meu cereal. “Eu quero ver esse filme! Eu quero ver esse filme!” Porque sei que será fantástico.

AICN: Então, vocês estão começando a partir de um antigo roteiro.

WALSH: Sim.

AICN: E será bem diferente.

WALSH: Estamos descartando muita coisa.

AICN: Vai sobrar algo?

WALSH: Algumas das cenas de ação continuam.

AICN: Por exemplo?

WALSH: Creio que há uma parte envolvendo um brontossauro.

AICN: O quão diferente vai ser?

WALSH: Será fiel ao filme de 1933.

AICN: E Naomi Watts estará nele?

WALSH: Assim esperamos.

BOWENS: Temos 99% de certeza.

WALSH: Estão finalizando uns detalhes.

AICN: Como é lidar com 19 personagens principais?

BOWENS: Certamente foi uma das coisas mais difíceis de se fazer. Nós trabalhamos, trabalhamos e trabalhamos. É assim que se faz. É um trabalho árduo. Sério. E, também, estando envolvido em cada parte do processo narrativo, Peter foi muito útil, abraçando o fato de que começamos essa jornada e que seria uma boa idéia que prosseguíssemos nela. Foi muito legal para mim ser incluída (por Peter e Fran) nesse processo, porque você precisa corrigir alguns erros durantes as refilmagens.

WALSH: Bem, não tínhamos escolha. Não podíamos descartar personagens, ou mata-los.

BOWENS: Haviam antigos recados da Miramax. [Nota: Miramax foi o estúdio que originalmente bancou SDA. PJ arduamente mudou-se para a New Line por não ter liberdade criativa.] Um desses recados foi: “Pra que vocês precisam de quatro hobbits? Se livrem de dois deles…”

WALSH: “Mate um hobbit”.

AICN: Sério?

BOWENS: Sim, mas, sabe, na verdade não é um recado estúpido. Ou tão estúpido quanto parece. Em termos de narrativa, sim, você compreende que talvez não precise de quatro hobbits na Sociedade, e fazer um morrer mais cedo tornaria os Cavaleiros Negros mais eficazes. Mas não daria para fazer, e se tornaria um problema contínuo. É assim que você faz durante o processo de adaptação.

WALSH: Lembro do pesadelo que foi aquela cena da SOCIEDADE DO ANEL em Valfenda, porque tínhamos naquela seqüência – não sei quantas páginas eram, 10 ou mais – sete personagens para introduzir. Tínhamos todos esses personagens que apareciam. Tinha a Arwen, tinha Elrond, Gimli, Boromir…

BOWENS: Bilbo aparecia novamente…

WALSH: Bilbo aparecia novamente. E, então, Gandalf tinha de explicar como ele voltou. A coisa continuava e continuava e era tipo… “BASTA”! A cada página estávamos tentando restabelecer ou introduzir um novo personagem e, o que era pior, tínhamos de tentar e disfarçar cada introdução.

Entrevistador: Mr. Beaks (mrbeaks@yahoo.com)

Fonte: Ain’t It Cool News
[url]http://www.aint-it-cool-news.com/display.cgi?id=16666[/url]

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